Acórdão nº 01004/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelCARLOS CARVALHO
Data da Resolução11 de Maio de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

RELATÓRIO 1.1.

A………..

, devidamente identificado nos autos, instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro [doravante «TAF/A»] a presente ação administrativa comum, sob forma sumária, contra o “ESTADO PORTUGUÊS”, para efetivação de responsabilidade civil extracontratual, peticionando, pela motivação inserta na petição inicial, a condenação deste no pagamento ao A. da quantia de 7.500,00 € a título de indemnização por danos não patrimoniais, bem como das despesas administrativas e de expediente, taxas de justiça, despesas de certidões, com tradução de documentos e honorários a advogado neste processo nos tribunais administrativos, bem como de quaisquer quantias eventualmente devidas a título de imposto que incida sobre as quantias recebidas do Estado, quantias essas acrescidas de juros legais desde a citação e até integral pagamento.

1.2.

O TAF/A, por sentença de 30.09.2015 [cfr. fls. 298/312 - paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário], julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência, condenou o R. pagar ao A. a quantia de 1.700,00 € [mil e setecentos euros], quantia essa acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação até integral pagamento, absolvendo o R. dos demais pedidos formulados.

1.3.

O A., inconformado recorreu para o TCA Norte [doravante «TCAN»], o qual através de acórdão de 06.05.2016 [cfr. fls. 400/408], concedeu provimento parcial ao recurso e, em consequência, revogou a decisão recorrida [na parte em que julgou improcedente o pedido de indemnização pela despesa com honorários de advogado, condenando-se o R./Recorrido no pagamento do valor que vier a ser apurado em incidente de liquidação de sentença] e, no demais, confirmou a sentença recorrida.

1.4.

Invocando o disposto no art. 150.º do CPTA o mesmo A., de novo inconformado agora com o acórdão proferido pelo «TCAN», interpôs, então, o presente recurso jurisdicional de revista [cfr. fls. 415/445], apresentando o seguinte quadro conclusivo que se reproduz: “...

  1. O Estado deve ser condenado a pagar pelo menos sete mil e quinhentos euros por danos morais ao autor, acrescidos dos juros legais desde a citação, pois a indemnização fixada é miserabilista.

  2. O autor por causa da lentidão da justiça sofreu ansiedade, depressão, angústia, incerteza. A depressão é uma doença grave. OU SEJA, FICOU GRAVEMENTE DOENTE POR CAUSA DA DEMORA DA JUSTIÇA.

  3. Tinha a expectativa de receber o prédio e o dinheiro resultante da ocupação e aplicá-lo. Não recebeu o prédio atempadamente e o resultado económico respetivo.

  4. O TCAN desconsiderou os factos anteriores.

  5. O tribunal fixou a indemnização não tendo em conta a duração do processo no próprio TAF.

  6. Segundo a jurisprudência europeia, os tribunais administrativos devem ter em conta o seu próprio atraso, majorando a indemnização, sendo certo que este processo se arrasta há mais de 9 anos.

  7. Como o tribunal decidiu, há violação da jurisprudência do Tribunal Europeu e do artigo 6.º, n.º 1, da Convenção e do artigo 1.º do Protocolo n.º 1 a ela anexo.

  8. Segundo o direito comparado acerca de processos nos tribunais nacionais e europeu em simultâneo, pode haver duas condenações pelos mesmos factos. E de forma autónoma por se tratar de diferentes jurisdições, diferentes ordenamentos, sendo a responsabilidade internacional diferente da nacional.

  9. Assim, as indemnizações cumulam-se e não se subtraem.

  10. Tanto assim que no TEDH também se questionava a violação do artigo 13.º e do artigo 1.º do Protocolo n.º 1 e doutros.

  11. Sobre isso o TCAN admite que a mesma questão das duplas condenações tem duas teses nos tribunais.

  12. O TAF não teve em conta que quando o TEDH decidiu e foi aí proposto o processo já existia esta ação no TAF.

  13. Foi por isso que o TEDH também fixou indemnização simbólica, pois compete ao TAF resolver a questão face ao princípio do esgotamento das vias de recurso internas, por força do artigo 35.º da Convenção.

  14. Foram violadas as disposições da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e Protocolo n.º 1 atrás citadas que devem ser interpretadas no sentido das conclusões anteriores.

  15. Assim, deve revogar-se as decisões das instâncias para se decidir em conformidade com as conclusões anteriores, e condenar-se o Estado nos precisos termos da P.I..

  16. E ainda majorando a indemnização, nos termos da jurisprudência europeia a fixar equitativamente pelo STA …”.

    1.5.

    Devidamente notificado o R., aqui ora recorrido, veio produzir contra-alegações [cfr. fls. 482/491], sem haver formulado qualquer síntese conclusiva, pugnando pela total improcedência do recurso e manutenção da decisão judicial recorrida.

    1.6.

    Pelo acórdão da formação de apreciação preliminar deste Supremo Tribunal prevista no n.º 5 do art. 150.º do CPTA, datado de 22.09.2016, veio a ser admitido o recurso de revista consignando-se na sua fundamentação que “o problema de base respeita à responsabilidade do Estado por alegados atrasos na administração da justiça, com violação do direito a uma decisão em prazo razoável. Disse-se no acórdão de 1.5.2013, P. 0144/13: «Em geral, este tipo de ações, que envolve diretamente a apreciação, além de outras, de disposições da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, atinge um grau de relevância que faz justificar a intervenção deste Supremo Tribunal em revista. Não se deve esquecer, nomeadamente, a própria submissão do Estado Português aos mecanismos de responsabilização que podem vir a ser interpostos perante outras instituições de aplicação da Convenção». (…) Naturalmente a justificação para admitir a revista excecional esvai-se à medida que sobre os aspetos relevantes vai recaindo jurisprudência deste Supremo Tribunal e a jurisprudência dos tribunais inferiores se conforma com ela e adota os critérios do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Sucede que no caso, tal como no recurso que se admitiu por acórdão de 28/4/2016, P. 488/16, está controvertida a conjugação a fazer entre indemnização já determinada pelo TEDH e o pedido de indemnização que se formula no processo nacional. E, como se disse naquele acórdão, embora haja já decisões deste Supremo em matéria aproximada, não se pode considerar que sobre ela haja jurisprudência consolidada. (…) Assim, a problemática tem importância fundamental, valendo, mutatis mutandis, as considerações genéricas acima retiradas do acórdão de 1.5.2013”.

    1.7.

    Colhidos os vistos legais foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.

  17. DAS QUESTÕES A DECIDIR Constitui objeto de apreciação nesta sede o erro de julgamento imputado pelo A./Recorrente ao acórdão recorrido quanto ao juízo no mesmo efetuado relativamente ao valor arbitrado pelos danos não patrimoniais por aquele sofridos a título de indemnização no quadro de responsabilidade civil extracontratual do R. por atraso na emissão de decisão judicial em prazo razoável, visto entender haver violação, nomeadamente, dos arts. 06.º e 35.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem [doravante «CEDH»], 01.º do Protocolo anexo à mesma Convenção, 496.º, n.º 1 do Código Civil [CC] [cfr. alegações e demais conclusões supra reproduzidas].

  18. FUNDAMENTAÇÃO 3.1.

    DE FACTO Resulta como assente nos autos o seguinte quadro factual: I) Em 28.01.1999, o A. interpôs no então designado Tribunal Judicial da Comarca de Ovar, uma ação declarativa, cuja petição inicial continha 16 artigos, em 03 páginas, e que foi distribuída ao 3.º juízo sob o número 562/99, tendo sido pago o preparo inicial de 19.000$00 [94,77 €], e que seguiu a seguinte tramitação processual: - Em 11.02.1999, foi enviada a citação por carta registada com aviso de receção; - Em 01.03.1999, foi apresenta a contestação, onde foi apresentado pedido reconvencional no valor de 3.000.001$00 [14.963,94 €]; - Em 15.03.1999, o A. respondeu à contestação; - Em 16.04.1999, foi ordenada a remessa dos autos ao Tribunal de Círculo de Santa Maria da Feira; - Em 24.05.1999, foi proferido um despacho; - Em 01.09.1999, foi proferido despacho; - Em 14.09.1999, foi apresentada avaliação do imóvel a que respeitam os autos; - Em 15.09.1999, foram os autos entregues da secção central do Tribunal Judicial da Comarca de Ovar; - Em 15.10.1999, foi proferido despacho; - Em 07.01.2000, foi proferido despacho; - Em 24.02.2000, foram os autos conclusos; - Em 14.04.2000, foi proferido despacho que ordenou a suspensão da instância até registo da ação; - Em 04.05.2000, o A. apresenta um requerimento defendendo que a ação não carece de ser registada; - Em 18.05.2000, os RR. provam o registo da reconvenção; - Em 26.05.2000, foi proferida decisão a manter o despacho que determinou que a ação fosse registada; - Em 18.09.2000, foi ordenada remessa dos autos à conta, por terem decorrido três meses sem que os AA. tivessem feito prova do registo da ação; - Em 18.09.2000, os AA. provam o registo da ação; - Em 21.12.2000, foi designada data para realização da tentativa de conciliação; - Em 29.01.2001, foi realizada a tentativa de conciliação, não tendo as partes chegado a acordo; - Em 06.02.2001, foram os autos conclusos, tendo sido proferido despacho em 15.07.2001; - Em 24.09.2001 foram os autos conclusos, tendo sido proferido despacho em 31.10.2001; - Em 31.10.2001, foi proferido despacho a determinar a junção de certidão da decisão proferida em outro processo; - Em 07.11.2001, foi pedida a indicada certidão; - Em 20.11.2001, foi junta a referida certidão aos autos da indicada decisão transitada em julgado em 29.01.2001; - Em 03.12.2001, foi proferido despacho a fixar o valor da causa em 32.000.000$00 [159.615,33 €]; - Em 22.01.2002 foram os autos conclusos, tendo sido proferido despacho em 23.12.2002; - Em 14.04.2003, foi proferido despacho saneador; - Em 24.06.2003, foi proferido despacho; - Em 27.10.2003, foi proferido despacho a admitir os requerimentos probatórios; - Em 28.10.2003, foram os...

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