Acórdão nº 01522/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelFONSECA CARVALHO
Data da Resolução03 de Maio de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam os Juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo Relatório Não se conformando com a sentença do TAF de Aveiro que julgou procedentes os embargos de terceiro deduzidos por Banco A…………… SA contra penhora, efectuada em 21 12 2007, na execução fiscal nº 4170200315069943. Em que é executada a sociedade B…………….. Ldª, de duas letras de câmbio no valor global de € 33549,70, veio a Fazenda Pública dela interpor recurso para a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo formulando as seguintes conclusões: 1 Na contestação o RFP invocou a ilegitimidade do embargante devido ao facto de os direitos de crédito não serem susceptíveis de posse para além de entender que o endosso em causa deveria ser qualificado como endosso impróprio ou imperfeito.

2 Contudo a sentença julgou improcedente a excepção da ilegitimidade processual determinando a procedência dos embargos o que implicou o cancelamento da penhora e a condenação da Fazenda Pública ao pagamento das custas.

3 Ora o embargante não pode utilizar o incidente de embargos de terceiro com os fundamentos alegados devendo ser declarado parte ilegítima para figurar na lide 4 No caso sub judice estão em causa direitos de crédito que pela sua natureza são insusceptíveis de posse e consequentemente não podem ser deduzidos embargos de terceiro contra as penhoras que incidam sobre os direitos de crédito (Vide ac da Relação do Porto de 20 11 1985 in processo 5550785.

5 A posse só é admissível em relação às coisas que podem ser objecto de propriedade ou direito real.

6 A propriedade e os restantes direitos reais incidem somente sobre as coisas corpóreas.

7 A propriedade do título de crédito (o documento físico que representa a letra de câmbio) não é susceptível de defesa através de embargos de terceiro.

8 O direito de crédito é a posição activa na relação obrigacional: o direito de exigir de outrem a prestação.

9 A titularidade do título de crédito (documento) habilita ou legitima o respectivo portador a exercer o direito nele incorporado mas não é susceptível de defesa através de embargos de terceiro pois o documento não consubstancia uma “res” corpórea.

10 Por outro lado estamos perante aquilo que a jurisprudência e a doutrina designam de endosso impróprio uma vez que neste caso por via do endosso não se transmite ao endossado os direitos emergentes dos títulos de crédito, sendo o efeito apenas o de habilitar o endossado (Banco ……….. SA) a cobrar o montante da letra em nome e por conta do endossante C………………. Ldª) titular desses direitos valendo o endosso como procuração.

11 O endosso impróprio não produz a sua plena e normal eficácia translativa na medida em que os direitos emergentes da letra continuam a pertencer ao subscritor do endosso (geralmente o sacador) não podendo por isso o endossado dispor desses mesmos direitos.

12 Esta espécie de endosso é geralmente concedida às instituições bancárias para cobrança de títulos de crédito em que ao banco endossado é concedido procuração ou mandato para cobrança, o banco é pois um procurador do depositante (cliente) agindo não só por conta deste mas também em seu nome na modalidade de mandata regulado no artigo 1178 do CC.

13 Consequentemente em caso de endosso impróprio o cumprimento por parte do endossado traduz-se na obrigação de diligenciar em tempo pela cobrança dos valores titulados pela letra e integrá-lo na respectiva conta de depósitos à ordem ou no caso de insucesso devolvê-lo ao cliente – endossante. Estando o banco obviamente habilitado a reclamar e receber o pagamento correspondente.

14 No caso concreto ao embargante não foi transmitido por via do endosso em branco qualquer dos direitos inerentes às quatro letras de câmbio em apreço tendo apenas sido incumbida pela B……………… Ldª de proceder enquanto mandatária e em nome desta à cobrança do valor titulado por aquelas letras 15 Também não se vislumbra que o embargante seja titular de um direito incompatível com a realização ou âmbito da penhora efectuada no processo de execução fiscal subjacente ao caso sub judice uma vez que a penhora das letras de câmbio não é incompatível com o direito de crédito que a embargante detém sobre a executada já que ele dispõe do contrato de desconto sob B……………… Ldª para garantir esse crédito.

16 De facto as letras que lhe foram entregues pelo endosso funcionam apenas como elemento acessório à cobrança.

17 Sendo certo que a penhora das letras a efectuar pela Administração Tributária em nada obsta o embargante (descontador) de accionar os vários contratos de desconto subscritos pela B……………… Ldª (descontário) com vista a obter o valor por ela descontado 18 Acrescente-se que o desconto é um contrato atípico em que o descontador apesar de usufruir simultaneamente de dois instrumentos aptos a obter a satisfação do seu direito no momento oportuno só poderá accionar um dos créditos pois só um é devido 19 A...

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