Acórdão nº 0954/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução13 de Setembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:*1.1.

A………….. interpôs reclamação judicial, nos termos do artigo 276.º do CPPT, no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto do despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia 2 que indeferiu o pedido de restituição do valor pago, 114.044.75€, por esta dívida ter sido considerada prescrita por acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, peticionando a sua anulação.

*1.2.

Aquele Tribunal, por sentença de 04/07/2017 (fls.75/89), julgou improcedente a reclamação.

*1.3.

É dessa decisão que o recorrente vem interpor recurso terminando as suas alegações com o seguinte quadro conclusivo: «

  1. O pagamento da dívida exequenda efectuado pelo executado e ora recorrente não pode ter-se como espontâneo em cumprimento de obrigação prescrita, nos termos e para os efeitos do n.º 2 do art.º 304.º do Código Civil B) O pagamento da dívida exequenda efectuado pelo executado e ora recorrente não pode ter-se como espontâneo em cumprimento de obrigação natural, nos termos e para os efeitos do n.°s 1 e 2 do art.º 403.º do Código Civil C) Em todo o caso, o disposto no n.º 2 do art.º 304.º do Código Civil não é aplicável à prescrição das dívidas tributárias D) O pagamento efectuado pelo Recorrente em data posterior à prescrição da dívida constitui a Administração Tributária no dever de restituir o valor pago e o Executado no direito a essa restituição, com o acréscimo dos juros legais E) A douta sentença sob recurso, ao considerar espontâneo o pagamento efectuado pelo Recorrente e ao ter como afastado o direito à restituição do imposto pago pelo mesmo Recorrente, incorreu em erro de julgamento F) A norma ínsita no art.° 304.º, n.º 2, do Código Civil, se interpretada – como o faz a douta sentença sob recurso – em conjugação com art.º 2.º, alínea d), da Lei Geral Tributária, no sentido de proibir a restituição de impostos pagos em data posterior àquela em que ocorreu a respectiva prescrição, é inconstitucional por violação do princípio da legalidade tributária».

    *1.4.

    Não foram apresentadas contra-alegações.

    *1.5.

    Por Despacho de 27/07/2017 (fls. 123) o recurso foi admitido.

    *1.6.

    Recebidos os autos neste Supremo Tribunal o Ministério Público emitiu a seguinte pronúncia: «Recorrente: A…………..

    Objecto do recurso: sentença declaratória da improcedência da reclamação apresentada contra decisão proferida pelo OEF de indeferimento de pedido de restituição de quantia paga no PEF n° 3204199801031996 (SF Vila Nova de Gaia 2) FUNDAMENTAÇÃO 1. O pagamento voluntário de dívida tributária, ainda que prescrita, corresponde ao cumprimento de uma obrigação natural fundada em dever de justiça (art. 402º CCivil) Não pode ser repetida a prestação realizada espontaneamente, em cumprimento de uma obrigação natural, ainda quando feita com ignorância da prescrição (arts. 304º nº 2 e 403º nº 1 CCivil) O pagamento voluntário não é necessariamente espontâneo; apenas se deve considerar espontânea a prestação efectuada livre de toda a coacção (art. 403º nº 2 CCivil) A coacção relevante é a coacção ilícita, estando excluída a coacção lícita correspondente ao exercício normal de um direito (art. 255º nº 3 CCivil) 2. No caso concreto, perante o quadro fáctico desenhado no probatório da sentença (als. A)/L) o pagamento voluntário da dívida exequenda efectuado pelo recorrente em 14.12.2016, não foi espontâneo, porque: -realizado após a prescrição da dívida exequenda ocorrido em 10.07.2005, declarada por acórdão do TCA Norte proferido em 24.01.2017 (factos provados al. L); -o processo de execução fiscal prosseguiu ilicitamente após a prescrição da dívida exequenda, mediante notificação do garante BPI para pagamento da quantia exequenda e acrescido até ao montante da garantia bancária prestada (factos provados al. C); -o pagamento foi efectuado no âmbito do programa PERES, aprovado pelo DL n° 67/2016, 3 novembro para obtenção de vantagem patrimonial (dispensa de pagamento de juros de mora e custas) O prosseguimento da execução após a prescrição da dívida exequenda constitui coacção ilícita, obrigando a administração tributária à restituição da quantia indevidamente paga, em cumprimento do princípio da legalidade que deve pautar a sua actuação (art. 266º nº 2 CRP; art. 55º LGT) Jurisprudência: acórdão STA 10.07.2013 processo nº 912/13 Doutrina: Jorge Lopes de Sousa Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado 6ª edição Volume III anotação 10 ao art.175º pp.290/291; Sobre a prescrição da obrigação tributária - Notas práticas Áreas Editora 2ª edição pp. 25/30) CONCLUSÃO O recurso não merece provimento.

    A sentença impugnada deve ser revogada e substituída por acórdão que ordene à administração tributária a devolução da prestação tributária indevidamente paga.».

    *1.7.

    Sem vistos legais cabe apreciar e decidir.

    *2.

    A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto: «

  2. Em 01/10/1998, foi instaurado contra o ora Reclamante o processo de execução fiscal n.º 3204199801031996, por dívida de Imposto sobre as Sucessões e Doações no valor de 22.863.923$00 (€ 114 044,77) – cfr. fls. 1 a 6 do processo de execução fiscal (PEF) n.º 3204199801031996 apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.

  3. Em 19/10/2015, o Reclamante requereu ao Chefe do Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia 2 a declaração de prescrição da dívida em cobrança no processo de execução fiscal n.º 3204199801031996 – cfr. fls. 50 a 52 do PEF apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.

  4. Em 14/01/2016 e 11/03/2016, o Banco “BPI” foi citado pelo Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia 2 para, no prazo de 30 dias, pagar a dívida exequenda e acrescido até ao montante da garantia bancária prestada (n.º PB 077/2006) – cfr. fls. 82 e 83 do PEF apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.

  5. Em 05/04/2016, o Chefe do Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia 2 indeferiu o pedido de declaração de prescrição mencionado na alínea B) supra — cfr. fls. 142 a 147 do PEF apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.

  6. Em 18/04/2016, o aqui Reclamante apresentou reclamação da decisão mencionada na alínea antecedente, pedindo a extinção da execução fiscal por prescrição da dívida – facto dado como provado através da consulta efetuada nesta data ao SITAF (processo n.º 1185/16.0BEPRT).

  7. Em 27/04/2016, o Chefe do Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia 2 determinou o prosseguimento da execução fiscal n.º 3204199801031996 contra a entidade garante (Banco “BPI”), dando conhecimento dessa decisão ao mandatário do Reclamante – cfr. fls. 161 a 166 do PEF apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.

  8. Em 12/05/2016, o aqui Reclamante manifestou a intenção de prestar garantia bancária para evitar o prosseguimento da execução fiscal n.º 3204199801031996 no decurso da reclamação mencionada na alínea E) supra – cfr. fls. 167 e 168 do PEF apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.

  9. Pela apresentação 3055, de 21/07/2016, foi registada a favor da Autoridade Tributária e Aduaneira / Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia 2 uma hipoteca voluntária, constituída pelo aqui Reclamante e por B…………., incidente sobre o prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia de Mafamude sob o artigo 8036, para garantia do pagamento da dívida em cobrança no processo de execução fiscal n.º 3204199801031996, sendo o montante global a garantir de € 150 370,58 – cfr. fls. 211 a 213 do PEF apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.

  10. Em 08/11/2016, no âmbito do processo n.º 1185/16.OBEPRT, foi proferida sentença a julgar improcedente a reclamação mencionada na alínea E) supra – facto dado como provado através da consulta efetuada nesta data ao SITAF.

  11. Em 14/12/2016, o Reclamante pagou o imposto em dívida no processo de execução fiscal n.º 3204199801031996, no valor de € 114 044,75, ao abrigo do Programa Especial de Redução do Endividamento ao...

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