Acórdão nº 0288/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelTERESA DE SOUSA
Data da Resolução28 de Setembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo Vem o Município de Silves interpor recurso do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS) que revogou o acórdão do TAF de Loulé de 24.01.2014, declarando a nulidade dos despachos impugnados de 13.02.2002, 17.11.2009 e 01.02.2010, concedendo provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público, apesar de, por evidente lapso, nele se referir “negar provimento aos recursos jurisdicionais interpostos pelo ora Recorrente e pela Contra-Interessada A…………….”, sendo que o que pretendia dizer-se era que se concedia provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público (o ali Recorrente).

Em alegações são formuladas as seguintes conclusões: 1.ª O presente recurso é interposto do acórdão do TCA Sul, de 03/11/2016, o qual concedeu provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público e, em consequência, anulou o acórdão do TAF de Loulé, por entender que o licenciamento destes autos não foi precedido de parecer prévio favorável da CRRA; foi deferido por motivos de ordem pessoal e subjetivos, não o podendo ter sido; que os motivos invocados não têm conexão com a realidade objetiva; e finalmente por falta de legitimidade, o que alegadamente representa violação das normas dos artigos 9.° e 34.°, ambos, do Decreto-Lei n.° 196/89, de 14 de Julho, 63.°, alínea c), do RJEU, 17.°, n.° 2, do e Regulamento do PDM de Silves e 26.°, n.° 2, do PROT-Algarve.” 2.

a O acórdão recorrido trouxe à colação a alegada falta de parecer prévio favorável da CRRA, para fundamentar a alegada nulidade dos despachos impugnados, facto este que não foi alegado pelo Ministério Público, não consta da sentença da 1a instância e também não consta do acórdão do TAF de Loulé, pelo que representa uma autêntica decisão surpresa, em manifesta violação do princípio do contraditório, o que inquina de nulidade o acórdão recorrido.

  1. a Sobre a questão de por razões ponderosas não se poderem compreender motivos de ordem pessoal e subjetivos, quer esse Venerando Tribunal, quer o mesmo TCA Sul, têm entendimentos divergentes do acórdão de que ora se recorre, tal como foi alegado e demonstrado pelo ora Recorrente, através da junção à presente peça processual de 5 (cinco) doutos acórdãos, todos eles transitados em julgado, a saber: acórdão de 28/01/2016, lavrado no processo n.° 01172/12, por esse Venerando Tribunal; acórdão de 09/04/2003, lavrado no processo n.° 0116/03, por esse Venerando Tribunal; acórdão de 21/02/2013, lavrado no processo n.° 08963/12, pelo TCA Sul; acórdão de 18/10/2012, lavrado no processo n.° 07521/11, pelo TCA Sul; acórdão de 19/04/2012, lavrado no processo n.° 07496/11, pelo TCA Sul.

  2. a O acórdão recorrido, ao sustentar que as razões ponderosas não se podem basear em motivos exclusivamente subjetivos, relacionados com a pessoa ou familiares do interessado, viola, por erro de interpretação e aplicação, as normas dos artigos 26.°, n.° 2, do PROT-Algarve e 17.°, n.° 2, do Regulamento do PDM de Silves, bem como o artigo 9.° do Código Civil.

  3. a O pedido de licenciamento da construção da moradia unifamiliar destes autos foi apresentado pelo particular em 15/06/2001, data em que este era o proprietário do prédio rústico onde a moradia foi implantada.

  4. a Na data em que a Câmara Municipal de Silves analisou o referido pedido apresentado pelo particular, nomeadamente se as razões invocadas por este se podiam subsumir ao conceito “razões ponderosas” previsto nos artigos 26.°, n.° 2, do PROT- Algarve e 17.°, n.° 2, do Regulamento do PDM de Silves, aquele era o proprietário do terreno onde pretendia implantar a moradia.

    7.ª A questão que se coloca, como muito bem foi referido na sentença confirmada pelo acórdão do TAF de Loulé, é a de saber se a venda pelo requerente da moradia em causa contende com a legalidade dos atos impugnados.

  5. a O Recorrente entende que o acórdão recorrido, ao sustentar a tese de que a alienação da moradia edificada é fator de ilegalidade dos atos licenciadores, viola o princípio tempus regit actum, o que se alega para os devidos efeitos.

  6. a Por outro lado, entende o Recorrente que tal entendimento do acórdão recorrido viola de forma insustentável o direito de propriedade privada, previsto no artigo 62.º da Constituição da República Portuguesa, o qual a todos garante o direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por morte, o que também se alega.

  7. a Ainda por outro lado, entende o Recorrente, ao contrário do sustentado no acórdão o recorrido, que, apresentado pelo particular um projeto de alteração ao referido projeto de arquitetura, não está a entidade administrativa obrigada a verificar, novamente, se as razões invocadas pelo particular se enquadram nos atrás citados preceitos legais.

    11.ª Mais entende o Recorrente que os factos alegados pelo acórdão recorrido que sustentam a alegada nulidade dos atos impugnados, fazendo-os repercutir na esfera jurídica do Recorrente e da Contra-lnteressada, designadamente a alegada má fé e a fraude à lei por parte do requerente do licenciamento, que não teve a possibilidade de exercer o seu direito de defesa no presente processo judicial, tornam impossível o exercício do direito de defesa por parte do Recorrente, o que constitui, no seu entender, uma violação do princípio da igualdade das partes, consagrado no artigo 6.° do CPTA.

    Finalmente, por dever de patrocínio, mas sem conceder: 12.

    a O acórdão recorrido conclui que, no caso vertente, não se verificam os pressupostos de aplicação do disposto no artigo 134.°, n.° 3, do CPA (efeitos putativos) - atualmente artigo 162.°, n.° 2, sustentado, em suma, que “se é certo que a contra-interessada pode ter agido de boa fé no decurso do procedimento de legalização da obra, não é menos certo que a conduta do Município demandado merece censura na medida em que deferiu o pedido de licenciamento sem que fosse obtido o referido parecer, e nas circunstâncias com afronta à lei geradora de nulidade, as quais não podia nem devia desconhecer”.

  8. a Ora, este é um entendimento e uma solução que, salvo o devido respeito, não se coaduna com as normas por que se rege um Estado de Direito Democrático.

  9. a Na verdade, o acórdão recorrido faz recair sobre a esfera jurídica da Contra-Interessada a referida censura, como se esta não tivesse agido de boa fé, para concluir pela não atribuição de efeitos putativos a este caso concreto, o que não se aceita.

    15.ª No caso vertente, não existem dúvidas de que a Contra-lnteressada adquiriu por compra a casa destes autos, de boa fé, ignorando em absoluto a situação de suposta ilegalidade da referida casa, convencida de que a referida construção obedecia as normas legais em vigor.

    16.ª O projeto de arquitetura foi aprovado a 10/10/2001, ao passo que esta ação judicial deu entrada em Tribunal a 13/12/2011.

    Por conseguinte, entre a data da aprovação do projeto de arquitetura e a data de entrada em juízo desta ação decorreram mais de 10 (dez) anos.

    17.ª Entende o Recorrente que estão reunidos os pressupostos para a aplicação, neste caso concreto, do disposto no artigo 162.°, n.° 3, do CPA (anterior 134.°, n.° 3).

    18.ª O acórdão recorrido, ao entender de forma diferente do Recorrente, fez, no entender do Recorrente, uma incorreta interpretação do citado preceito legal. Por outro lado, desrespeitou princípios fundamentais tais como os princípios da proporcionalidade, da tutela da confiança, da justiça, da boa fé, da paz social, da realização do interesse público e da boa gestão financeira dos recursos públicos e do direito a uma habitação condigna (vide artigos 2.°, 65.° e 266.°, todos da CRP), o que se alega para os legais e devidos efeitos.

  10. a Todas estas são questões que, pela sua notória e elevada relevância jurídica e social, se revestem de importância fundamental; por outro lado, a admissão do presente recurso é claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

  11. a Estão, pois, neste caso, reunidos todos os pressupostos para a admissão do presente recurso de revista, o que se requer.

    Por todo o exposto e pelo mais de Direito, cujo douto suprimento respeitosamente se solicita, deve:

    1. Admitir-se e julgar-se procedente, por provado, o presente recurso de revista; b) Revogar-se o acórdão recorrido, do TCA Sul, de 03/11/2016, com as legais consequências; O Recorrido apresentou contra-alegações nas quais conclui o seguinte: 1- O Ministério Público intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, em defesa da legalidade, do urbanismo e ordenamento do território (artigos 51º do ETAF e 9º, nº2, 46º, nº 1, 50º, nº 2 e 51º, nº 1 do CPTA), acção administrativa especial contra o Município de Silves, pedindo a declaração de nulidade dos despachos da Senhora Presidente da Câmara Municipal de Silves, de 13 de Fevereiro de 2002, que deferiu o pedido de licença de construção, de 17 de Novembro de 2009, que deferiu o pedido de licença de obras de alteração do projecto inicialmente licenciado e de 1 de Fevereiro de 2010, que deferiu o pedido de licença de utilização da moradia entretanto construída e identificada no artigo 1º da petição inicial.

      2- Por sentença de 31 de Dezembro de 2012, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, julgou a acção improcedente e não declarou a nulidade dos actos impugnados.

      3- Proferido Acórdão pelo Colectivo de Juízes do TAF de Loulé, a 24 de Janeiro de 2014, este aresto confirmou e manteve “nos seus exactos termos” a sentença reclamada, de 31 de Dezembro de 2012, (por isso, a mesma integra o Acórdão).

      4- Deste Acórdão interpôs o Ministério Público junto do TAF de Loulé, recurso jurisdicional para o Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), invocando que o douto Acórdão recorrido violou o artigo 17º, nº 1 e 2 e 30º, nº 2, do PDM de Silves e o artigo 26º, nº 1 e 2 do PROT-Algarve, além da violação do princípio da boa fé, e o artigo 6º A do CPA (violação da boa fé, por falta de requisito essencial, sendo nulo nos termos do artigo 133º, nº 1 e 2 c), CPA e, ainda a...

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