Acórdão nº 0977/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelANA PAULA LOBO
Data da Resolução03 de Novembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso JurisdicionalDecisão recorrida – Tribunal Tributário do Porto .

09 de Junho de 2016.

Julgou não verificados os pressupostos de que depende o decretamento das providências cautelares requeridas e, em consequência, indeferiu as mesmas.

Acordam nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A…………..

e MASSA INSOLVENTE DE A………… vieram interpor o presente recurso da decisão supra mencionada, proferida no processo cautelar n° 937/16.5REPRT, em que é Entidade Requerida AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, tendo em vista o decretamento de providência cautelar de natureza antecipatória, pela qual seja reconhecido que as Requerentes são duas entidades jurídicas diferentes, com personalidade tributária diferente, e que seja atribuído um novo número de identificação fiscal à 2. Requerente, distinto do da 1ª Requerente, tendo, para esse efeito formulado, a final da sua alegação, as seguintes conclusões: 1ª - A decisão em crise padece de flagrante erro de julgamento, o que motiva a interposição do presente recurso.

  1. - O Tribunal a quo procedeu a uma incorrecta análise do pedido das recorrentes, bem como a uma errónea interpretação e aplicação do direito ao caso concreto.

  2. - Para além da errada apreciação do direito aplicável, a decisão em crise, comporta principalmente uma insustentável injustiça e causa às partes enormes inconvenientes e dificuldades a que importa, de imediato, pôr cobro.

  3. - As requerentes são hoje entidades diversas, com patrimónios autónomos, prosseguindo actividades absolutamente distintas, geridas e administradas por pessoas diversas, com obrigações fiscais distintas e, nessa medida, são sujeitos fiscais autónomos, aos quais deve ser, provisoriamente, atribuído um número fiscal diferenciado, sob pena de verificar uma inadmissível promiscuidade entre elas.

  4. - As providências cautelares visam antecipar ou garantir o efeito útil do reconhecimento de um direito, isto é, “acautelar o efeito útil da acção”.

  5. - A tutela cautelar como modo de regulação provisória de um litígio é hoje unanimemente reconhecida como um corolário do princípio da tutela jurisdicional efectiva previsto no art. 20º n.° 1 da CRP e, especificamente, no que diz respeito à tutela jurisdicional efectiva em matéria administrativa, no art. 268° n.º 4 da CRP.

  6. - No plano específico do Direito Processual Tributário, a concretização do direito a uma tutela jurisdicional efectiva, na sua dimensão de direito a uma tutela cautelar, encontra a sua sede no art. 147º, n.° 6, do CPPT.

  7. - A tutela cautelar pode assumir uma dupla vertente: antecipatória ou conservatória.

  8. - As providências cautelares de natureza antecipatória são aquelas que, face à situação de urgência que lhes está associada, antecipam os efeitos jurídicos próprios da decisão a ser proferida na acção principal, bem como a realização do direito.

  9. - A providência requerida nos autos - providência antecipatória - visa obter a regulação provisória e cautelar de uma situação jurídica (reconhecimento que a A…………., ora recorrente e a Massa insolvente da A…………. são entidades fiscalmente diversas, com personalidade tributária diversa) mas também obter a antecipação provisória de determinado efeito jurídico (atribuição de um novo número de identificação fiscal à Massa Insolvente da A…………).

  10. - Apesar de se tratar de uma providência cautelar antecipatória, a medida não esgota os efeitos da acção principal, porquanto se trata de uma solução provisória que, sendo julgada procedente a acção principal, será por esta mantida, sendo julgada improcedente a acção principal, será por esta revogada, não sendo, nessa medida, irreversível.

  11. - A providência cautelar requerida, visando antecipar provisoriamente os efeitos da decisão final (atribuição de um NIF diverso que permita à partes cumprir as suas diversas obrigações fiscais), tem em vista obstar à ocorrência de prejuízos futuros ocasionados pela demora da decisão definitiva a proferir na acção administrativa para o reconhecimento de um direito e interesse em matéria tributária.

    14º - A medida cautelar requerida é provisória na medida em que, estando funcionalmente dirigidas a garantir a utilidade conferida no processo principal, têm uma eficácia limitada do tempo, nascendo para morrer, não se prescindindo de decisão final no processo principal.

  12. - A providência cautelar não esgota o efeito útil da própria acção principal, nem os efeitos que dela advêm pressupõem a resolução de mérito do litígio.

  13. - A decisão proferida no procedimento cautelar não faz caso julgado na acção principal correlativa, nem há litispendência entre ambas, nem o julgamento da matéria de facto ou da decisão proferida no procedimento cautelar não tem qualquer influência no julgamento da acção principal.

  14. - O Tribunal, na exacta medida em que julgou não verificados os pressupostos de que depende o decretamento da providência, incorreu em erro de julgamento.

  15. - O Tribunal a quo fez uma errada apreciação da matéria de facto que foi levada aos autos, não tendo alcançado, convenientemente, o cerne da questão e o problema prático que diariamente é colocado às recorrentes e, bem assim, a necessidade prática e imperiosa de aplicação da medida cautelar.

  16. - A situação jurídica vertida nas Circular n.° 1/2010 e n.° 10/2015 não é coadunável com a situação descrita nos autos, sendo, aliás, com ela incompatível, pois, in casu, não estamos perante uma mera declaração de insolvência de uma entidade no âmbito da qual se promoverá a liquidação de todo o seu património, culminando-se na extinção dessa entidade (situação à qual se aplica única e exclusivamente as instruções vertidas na Circular 10/2015 à única e exclusiva entidade existente: a sociedade insolvente.), mas sim perante um caso em que a MASSA INSOLVENTE vai ser integralmente liquidada e extinguir-se por essa via; ao mesmo tempo a A…………. vai continuar a sua actividade com toda a normalidade existindo, assim, duas entidades, perfeitamente autonomizadas, com obrigações tributárias totalmente diversas.

  17. - Cabe à AT, ainda que por imposição dos Tribunais, acompanhar as mais diversas soluções jurídicas que são hoje encontradas, designadamente, em sede de processos de insolvência e de recuperação de empresas, que conduzem, não raras vezes, a cisões ou fusões de sociedades, criação de patrimónios autónomos, trespasses de estabelecimentos, totais ou parciais, venda de activos, etc., soluções jurídicas às quais a AT tem necessariamente de se adaptar, deixando de se limitar a aplicar uma circular emitida tão só para os processos mais comuns e básicos de insolvência e de recuperação de empresa, não prevendo as demais soluções possíveis.

  18. - Cabe aos Tribunais, por sua vez, impor essa adaptação à AT, não pactuando com a recusa de aplicação de soluções práticas que vão ao encontro das necessidades dessas novas figuras jurídicas que contribuem para a recuperação do tecido empresarial português e que passam a constituir os sujeitos passivos de impostos.

  19. - In casu, por força da aprovação do Plano de Insolvência, passaram a existir duas entidades autónomas (a sociedade insolvente - hoje recuperada – A………… e a MASSA INSOLVENTE da A…………..), cuja distinção, em sede tributária, deve ser provisoriamente reconhecida e formalizada.

  20. - Na sua petição inicial, as Requerentes alegaram e demonstraram os concretos prejuízos e danos futuros cuja ocorrência se verificará por força da recusa da AT em atribuir um número de identificação fiscal diverso à Massa insolvente da A………….., que permita às Requerentes de forma individual cumprir as obrigações fiscais.

  21. - Os danos cuja ocorrência se verificará são concretos e reais, designadamente: a) A A…………. é uma sociedade, que por força do trânsito em julgado da sentença que homologou o Plano, já não se mostra insolvente e dispõe, até ao 15° dia do 7° mês do ano de 2016, de prazo para entregar a sua IES - INFORMAÇÃO EMPRESARIAL SIMPLIFICADA, b) A Massa Insolvente da A……………., segundo decorre da Circular n.° 10/2015, mantém a sua obrigação de proceder à entrega da respectiva IES.

    1. Quer a A…………., quer a Massa Insolvente da A………. têm obrigações diversas de manutenção da contabilidade organizada: a A……….. tem obrigação de manter a sua contabilidade organizada, enquanto sujeito passivo e a Massa Insolvente da A……………, de acordo com o previsto na Circular n.° 10/2015, tem igual obrigação.

    2. Face à iminente necessidade de prestar contas relativas ao exercício de 2015 quer por parte da A………….., quer por parte da Massa Insolvente da A…………, e de cumprir diferenciadas obrigações fiscais, é essencial e urgente que estas entidades o possam fazer de forma autónoma, sob pena das entidades se verem prejudicadas pelos lucros e/ou mais-valias que possam ser apuradas por uma e por outra, vendo-se obrigadas a pagar os impostos uma da outra.

  22. - Os prejuízos resultantes do incumprimento das obrigações tributárias, à presente data, afiguram-se como futuros, contudo, caso até dia 15° de julho do corrente ano (fim de prazo, para ambas as entidades, de entrega da IES — INFORMAÇÃO EMPRESARIAL SIMPLIFICADA) tais prejuízos tornar-se-ão efectivos, já que as Requerentes ver-se-ão impossibilitadas de entregar as suas declarações de IES de forma separada e apenas uma delas o poderá fazer (por apenas existir um NIF a associar a essa declaração).

  23. - A declaração de IES relativa ao NIF existente apenas poderá respeitar ou à actividade desenvolvida pela A………… ou à actividade desenvolvida pela Massa Insolvente da A………….., já que ambas as actividades foram desenvolvidas de forma absolutamente autónoma, pelo que uma delas terá necessariamente de entrar em incumprimento quanto às suas obrigações declarativas, sob pena de se verificar uma ilegal promiscuidade entre matérias tributáveis, lucros tributáveis e bases de cálculos de imposto de duas entidades que nada têm que ver uma com outra.

  24. - Por outro lado, não existe dano maior que a imposição da obrigação de: duas entidades diferenciadas (i)...

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