Acórdão nº 01371/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Dezembro de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA DO C
Data da Resolução14 de Dezembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal RELATÓRIO O Município da Guarda recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do artº 150º do CPTA, do acórdão proferido no TCAS em 14/05/2015 que revogando anterior pronúncia do TAF de Castelo Branco, conferiu procedência à acção – em que Z………….., S.A., demandara nos termos do artº 100º e segs do CPTA, aquele Município, X……………, S.A., e outras sociedades concorrentes ao concurso público para a adjudicação da prestação de serviços de recolha e transporte de resíduos sólidos urbanos e limpeza urbana no concelho da Guarda – já que aquele tribunal de 2ª instância, por considerar que a proposta vencedora da X…………….., devia ter sido excluída, condenou o aqui recorrente a adjudicar o contrato à autora.

Admitido o recurso de revista, interposto pelo Município da Guarda, por Acórdão proferido neste Supremo Tribunal Administrativo em 28 de Janeiro de 2016, foi decidido conceder provimento ao recurso, revogar o acórdão recorrido e em fazer subsistir, ainda que por motivos parcialmente diversos a decisão do TAF de Castelo Branco, que julgou a acção dos autos totalmente improcedente.

Não se conformando com este acórdão, veio a Z………………, S.A., nos termos do disposto no artº 152º do CPTA, interpor recurso para uniformização de jurisprudência, apresentando alegações com conclusões do seguinte teor: «A. No Acórdão Recorrido, decidiu-se que o pedido de esclarecimentos do Júri foi legítimo e que a declaração de aceitação do conteúdo do caderno de encargos prevalece sobre a expressão da afectação, na proposta da X…………., de dois técnicos a 5% quando o caderno de encargos exigia que essa afectação fosse permanente, concluindo que a proposta em questão não deve ser excluída.

  1. No Acórdão Fundamento, em situação factual idêntica, decidiu-se que o pedido de esclarecimentos dirigido pelo Júri ao concorrente é ilegal por violação do disposto no artigo 70º, nº 2, alínea b) do CCP e que a declaração de aceitação do conteúdo do caderno de encargos não prevalece (nem releva a prevalência da cláusula do caderno de encargos que impunha um prazo mais curto) sobre a expressão, na proposta do concorrente C….., de um prazo de implementação de 21 dias quando o caderno de encargos exigia que esse prazo fosse de 15 dias, concluindo que a proposta em questão deve ser excluída.

  2. As questões de Direito em equação apresentam-se de grande acuidade e relevância jurídica, uma vez que se trata da adequada qualificação jurídica de situações muito frequentes no domínio da contratação pública e da apreciação da legalidade da actuação dos intervenientes na fase procedimental, bem como da conformidade do conteúdo das propostas com os preceitos imperativos que regulam os procedimentos de formação dos contratos públicos.

  3. É manifesta a ocorrência de contradição entre as soluções jurídicas propugnadas por dois Acórdãos prolatados por este Supremo Tribunal relativamente às questões fundamentais de Direito atrás elencadas, debruçando-se ambos sobre factualidade idêntica e no âmbito do mesmo quadro normativo, o que, nos termos do disposto no artigo 152º, nº 1, alínea b) do CPTA, determina a admissibilidade do presente recurso.

  4. A melhor doutrina, por ser a que se afigura compatível com o quadro normativo vigente, é a sufragada no Acórdão Fundamento, que irrecusavelmente adopta uma correcta e rigorosa aplicação do Direito aos factos.

  5. O Acórdão Recorrido enveredou por um percurso cognitivo que, salvo o devido respeito, se afigura manifestamente incompatível com o quadro normativo aplicável e com a jurisprudência dominante (para não dizer unânime) deste Supremo Tribunal na matéria de facto sub specie.

  6. Salvo o devido respeito, merece censura a tese, propugnada no Acórdão Recorrido, segundo a qual a afectação a 5% dos técnicos na proposta da X…………. e divergente da exigida no caderno de encargos, poderia, muito equivocadamente, ser interpretada fora dos estritos limites das regras hermenêuticas aplicáveis aos negócios formais.

  7. O Acórdão Recorrido interpretou a proposta da X………… dentro de um inadmissível quadro de juízo de intenções, substituindo-se à própria proponente na reconstrução do seu próprio (da proponente) percurso cognitivo que, como inadmissivelmente considera o Acórdão, seria o sentido mais “correcto”, sem que essa intenção ou vontade esteja sequer longinquamente expressa no texto da declaração – ou seja, no conteúdo da proposta.

  8. O Acórdão Recorrido não acolhe, aliás, a tese de que a referida inscrição, na proposta da X…………, da afectação dos técnicos a 5% se pudesse hipoteticamente considerar um lapso ou erro manifesto que fosse susceptível de sanação de acordo com as regras previstas no artigo 249º do Código Civil.

    I. O douto Aresto recorrido começa por afirmar que, ao declarar que os técnicos serão afectados a 5% nos seus mapas financeiros, a concorrente X………… se refere inequivocamente ao tempo de permanência daqueles técnicos – logo, expressando uma condição, na sua proposta, que é divergente do tempo de permanência exigido no caderno de encargos – para depois afirmar que a expressão dessa condição (ou termo, como se sustenta na decisão a quo) não deve ser tida como o repúdio de um aspecto da execução do contrato não submetido à concorrência pelo caderno de encargos, afirmando-se que esse aspecto por essa concorrente aceite.

  9. Essa aceitação, revelada, segundo o Acórdão Recorrido, na declaração a que se refere a alínea a) do nº 1 do artigo 57º do CCP, no entendimento da aqui Recorrente e como bem se sustenta no Acórdão Fundamento, não prevalece nem pode prevalecer sobre os termos e condições da proposta se afigurem divergentes dos aspectos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos.

    L. Com as expressões “termos e condições das propostas” o legislador do CCP pretendeu manifestamente reportar-se ao conteúdo das declarações negociais da proposta quanto aos aspectos da execução do contrato nas suas diversas vertentes – técnica, jurídica ou financeira – e que exprimem as circunstâncias – os termos e as condições - dentro das quais o concorrente se dispõe a contratar.

  10. A afectação a 5% dos técnicos que se extrai da proposta da X………… condiciona a execução do contrato...

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