Acórdão nº 01406/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Dezembro de 2016

Magistrado ResponsávelASCENS
Data da Resolução14 de Dezembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.

1 – RELATÓRIO A A……………, Ldª, inconformada, parcialmente, com a decisão arbitral proferida no âmbito do processo nº 145/2014-T, pelo CAAD vem nos termos do art.º 152º do CPTA, aplicável ex vi nº2 do art.º 25º do Decreto lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro, interpor recurso para uniformização de jurisprudência por, no seu entender, esta decisão do CAAD estar em oposição com o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 05/07/2012 tirado no processo nº 0658/02.

Admitido o recurso por despacho do relator a fls. 78, as partes vieram apresentar alegações tendentes a demonstrar a oposição entre os citados acórdãos.

A recorrente, A………….. Ldª, apresentou alegação tendente a demonstrar alegada oposição de julgados, formulando as seguintes conclusões: «A decisão arbitral recorrida deverá ser anulada, na medida em que manteve as liquidações contestadas no tocante à não aceitação para efeitos de apuramento do lucro tributável IRC da Recorrente, dos valores pagos por aquela última aos respectivos trabalhadores, a título de horas extra, baixo, férias e prémios, por tal decisão se basear em solução de direito oposta à constante do Acórdão da 2ª Secção do STA de 05/07/2012, na medida em não considera que: 1. O art. 23.° e a al. g) do n.º 1 do art. 42.º, ambos do CIRC, apenas impõem para a dedutibilidade do custo a prova efectiva da existência do mesmo; 2. A existência de prova documental e justificação do custo consubstancia uma mera formalidade probatória: 3. O documento comprovativo do custo, para ser aceite para efeitos de IRC, basta ser escrito, em princípio externo com as características fundamentais da operação, mas não sendo impeditivo o facto de ter fonte diversa; 4. Provando-se a existência efectiva do custo o mesmo deverá ser aceite para efeitos fiscais.» A entidade recorrida, veio apresentar as suas contra alegações de recurso com o seguinte quadro conclusivo: «I. Ao contrário do invocado pela Recorrente, o Acórdão fundamento que sustenta o presente recurso, julgou pela não relevação como custo fiscal de gastos não devidamente documentados quando estes se consubstanciam em talões e meras notas internas que omitem as principais características dos documentos legalmente admissíveis para o efeito.

  1. Pois que a indedutibilidade de tais custos na matéria tributável das empresas traduz-se numa «sanção destinada a evitar um comportamento que põe em causa a aplicação da lei fiscal.» III. A transcrição ínsita no artigo 11.º do recurso reflecte o ponto I. do sumário do Acórdão fundamento, mas, salvo o devido respeito, não expressa a opinião de quem aí decidiu, pois que no ponto I do mesmo sumário se afirma que «Se a recorrente, além de não ter apresentado documentos externos identificadores das principais características das transacções, se limita a apresentar notas internas contabilizadas referindo-se a compras, carne, peixe, ovos e a meros talões de compras, sem identificação das principais características das operações efectuadas, tais como, o objecto, o adquirente, o fornecedor e o preço, não podem relevar como documentos comprovativos dos respectivos custos para efeitos do disposto nos arts. 23.º, n.º 1 alínea a) e 42.º. n.º 1 alínea g), do CIRC, preceito segundo o qual para o efeito da determinação do lucro tributável só relevam os encargos devidamente documentados.» o que, de resto, se coaduna com o que vem decidido no Acórdão arbitral ora sindicado.

  2. Também a extensa transcrição do Acórdão fundamento, ínsita no artigo 13.º do recurso, somente corresponde à opinião de alguns autores da nossa praça (e não do Tribunal), sendo certo que tais pareceres não se repercutiram na solução dada ao caso ali em análise.

  3. Pelo que inexiste controvérsia entre os Acórdãos em (aparente) oposição, que permitisse à Recorrente lançar mão do mecanismo uniformizador de jurisprudência.

  4. O Acórdão Recorrido versa sobre pagamentos efectuados, de forma sistemática, pela recorrente, aos seus trabalhadores, durante os anos de 2006, 2007, 2008 e 2009, que deliberadamente não foram contabilizados e, concomitantemente, não foram declarados nas suas declarações fiscais, nomeadamente no Anexo A da Declaração Anual de Informação Contabilística e Fiscal que integra a “Informação Empresarial Simplificada” (IES) bem como, e especialmente, na declaração modelo 10.

  5. Apesar de em momento algum ter admitido o pagamento de tais montantes (a título de remunerações ou outro), nem os mesmos terem sido sujeitos à tributação legalmente aplicável, a Recorrente pretende, pois, ao arrepio quer das normas contabilísticas, quer do CIRC — artigo 17.º afastar o desiderato da tributação pelo lucro real porque se rege o CIRC, pretendendo agora, assacar à Requerida a consideração de tais valores como custo em sede de IRC, requerendo a sua aceitação como custo fiscal, ainda que não tenha procedido à respectiva contabilização (intencional) dos mesmos.

  6. A Recorrente ignora, convenientemente, que os motivos que levaram à não consideração de tais valores como custo fiscal não foram as exigências formais dos documentos, mas sim, a contabilidade da mesma.

  7. Como provado, uma contabilidade que padece das anomalias detectadas pela Recorrida não serve para apurar o Lucro Tributável pois não respeita o disposto no artigo 17° n° 3 do Código do IRC, designadamente o requisito constante na primeira parte da alínea b) onde se estipula que a contabilidade deve “Reflectir todas as operações realizadas pelo sujeito passivo (…)” X. A desconsideração de tais montantes só se deve à conduta da Recorrente, como aliás a Recorrida sempre demonstrou.

  8. Considerarem-se as referidas remunerações como custo seria ignorar ou, pelo menos, desvalorizar, a obrigação que impende sobre a Recorrente quanto às exigências de contabilidade organizada, convidando, ao mesmo tempo, os trabalhadores beneficiários das referidas remunerações a ficarem fora do sistema.

  9. São requisitos de admissibilidade do recurso por uniformização de jurisprudência; a) a existência de contradição entre um acórdão arbitral e um acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo; b) o trânsito em julgado do acórdão fundamento; c) a existência de contradição sobre a mesma questão fundamental de direito; e, d) desconformidade entre a orientação perfilhada no acórdão impugnado e a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA; XIII. Relativamente àquilo em que se deve concretizar a “questão fundamental de direito” afigura-se essencial a existência de identidade da questão de direito sobre a qual se debruçaram os acórdãos em confronto, que tem subjacente a identidade dos respectivos pressupostos de facto e, ainda, que a oposição decorra de decisões expressas e não meramente implícitas.

  10. O recurso apresentado falha na verificação de qualquer destes pressupostos, sendo significativo o facto de a Recorrente não esboçar qualquer esforço no sentido de demonstrar a sua presença, limitando-se a dizer, sem escalpelizar o exacto contexto em que tal foi proferido, que, num lado, se afirma que as despesas indevidamente documentadas não se devem considerar para apuramento da matéria tributável (Acórdão arbitral) e que, no outro, se afirma que a dedutibilidade dos custos em sede de IRC apenas depende da prova efectiva da sua existência, pois a exigência da respectiva prova documental consubstancia uma mera formalidade probatória (Acórdão fundamento).

  11. O que, por si só, justifica se considere incumprido o disposto no n.º 3 do artigo 152º do CPTA quando exige que o Recorrente, na alegação, identifique de “forma precisa e circunstanciada, os aspectos de identidade que determinam a contradição alegada”.

  12. No caso concreto, não há similitude de factos.

  13. Enquanto no acórdão recorrido o que está em causa é (1) a inexistência de registo contabilístico de valores pagos aos trabalhadores da Recorrente referentes a horas extras, baixas, férias e prémios (2) a sua não declaração para efeitos de IRS e o (3) incumprimento de reter na fonte (e daí, se qualificarem como despesas não devidamente documentadas, nos termos do disposto no artigo 42.º n.º 1, al. g) do CIRC), no acórdão fundamento, diversamente, o que se discute é, (num caso em que o sujeito passivo registou contabilisticamente os custos incorridos em compras, peixe e ovos e os declarou para efeitos de apuramento da matéria tributável a não apresentação de documentos externos identificadores das principais características das transacções, limitando-se o sujeito passivo a apresentar notas internas sem a identificação das principais operações efectuadas (o que, por consequência, redundou na não relevação fiscal daqueles custos).

  14. Logo, as situações de facto não podem ser analisadas à luz do recurso para uniformização de jurisprudência.» O Ministério Público veio emitir parecer a fls. 111 e seguintes cujo conteúdo se apresenta por extracto: «PARECER 45/2015.

(…) A recorrente vem sindicar a pronúncia do Tribunal Arbitral (TA) no segmento em que manteve as liquidações sindicadas na parte relativa à manutenção da não aceitação dos gastos suportados pela recorrente com os trabalhadores, para efeitos fiscais, a título de horas extra, baixa, férias e prémios São requisitos do prosseguimento do presente recurso para uniformização de jurisprudência: (…) Ressalvado melhor juízo, parece-nos certo que não existe contradição entre as decisões em confronto.

De facto, na pronúncia arbitral estão em causa valores pagos aos trabalhadores da recorrente, a título de horas extra, baixas, férias e prémios, que aquela nunca admitiu, mas que a AT considera materialmente provados, que não foram relevados contabilisticamente, não foram declarados para efeitos de IRS, nem foram feitas retenções na fonte e que o Tribunal Arbitral não revelou como custos fiscais por não estarem devidamente documentados, de acordo com a lei comercial e fiscal, nos termos do estatuído no artigo 41.°/1/g) do CIRC.

No acórdão...

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