Acórdão nº 0845/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução18 de Abril de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: * 1.1.

C………………, Lda., inconformada com a decisão proferida no acórdão do TCAS de 10/11/2016, recurso 05741/12, fls.800/901, que negou provimento ao recurso da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, a qual considerou improcedente a impugnação judicial deduzida contra as liquidações adicionais de IVA do ano de 2007 (n°s 10011410, 10011412, 10011414 e 10011416) e respetivos juros compensatórios (liquidações n°s 10011411, 10011413, 10011416 e 10011417), vem interpor recurso para este Supremo Tribunal, por oposição com o acórdão do Pleno desta seção de 15/10/2014, proferido no recurso n.º 1374/13, fls. 912 e seguintes.

* 1.2.

Admitido o recurso e apresentadas alegações, nos termos do artigo 284.º, n.º 3, CPPT, foi proferido despacho entendendo verificar-se a invocada oposição e ordenando a notificação das partes para alegaram, nos termos do n.º 5 do mesmo artigo.

* 1.3. A recorrente apresentou alegações nas quais formulou as seguintes conclusões: «1º - A questão fundamental da presente oposição de acórdãos – Audiência Prévia – que fora julgada no Acórdão fundamento é precisamente a mesma que foi julgada no Acórdão recorrido, todavia as decisões finais nos dois Acórdãos são divergentes o que, determina a admissão do recurso em análise.

  1. - O Acórdão fundamento (cfr. 15/10/2014, no Processo nº 1374/13) traduz o que vem sendo o entendimento reiterado, pacífico e unânime da jurisprudência dos Tribunais Superiores pelo que o conflito entre Acórdãos deve resolver-se pelo que foi decidido pelo Acórdão fundamento proferido pelo STA.

  2. - O entendimento perfilhado pelo Acórdão recorrido afronta, de forma indelével, o princípio da verdade material e o princípio constitucional da tutela judicial efectiva ínsito no artigo 20º da C.R.P.

  3. - Na verdade, no Acórdão recorrido entende-se que a Administração tinha o dever de fornecer toda a prova recolhida em sede inspectiva, nomeadamente a circularização dos clientes não observando o disposto no artigo 60º e 62º do RCPIT, não tendo cumprimento à audição prévia para decisão final pois entendeu pela irrelevância da prova apresentada.

  4. - Todavia, o Acórdão recorrido vai no sentido de que a omissão praticada pela AT, em sede de inspectiva, seja uma preterição de formalidade essencial que se degradou-se em não essencial, por apelo ao princípio do aproveitamento dos actos pois não influenciaria na decisão final do procedimento inspectivo em causa (recurso à avaliação indirecta).

  5. - O Acórdão recorrido conclui pela existência de outros elementos, que não a circularização de clientes que, também, serviram de base para a aplicação dos métodos indirectos e que são capazes de servir de fundamento à decisão final proferida pela AT.

  6. - Opostamente, o Acórdão fundamento considera que ao não facultar o exercício da audiência prévia, está-se perante uma preterição de formalidade essencial, estando-se perante uma invalidade dos actos subsequentes, incluindo a liquidação, nos termos dos artigos 135º e 136º do CPA e artigo 99º, alínea d), do CPPT.

  7. - Com efeito, o Acórdão fundamento entende que no exercício de audição seja admitida a matéria de facto e prova que levam às correcções propostas ou que determinam a opção pela avaliação indirecta em detrimento da avaliação directa.

  8. - Do que consta do RIT nada se deixa cair sobre os depoimentos / esclarecimentos dos clientes, pelo que o entendimento da AT de que os mesmos não resultaram provas relevantes, não pode ser confirmada pelo Tribunal porque as declarações prestadas pelos clientes podem até ser contrárias às conclusões do RIT.

  9. - A essa luz, deveria a AT, tendo em atenção os deveres de imparcialidade, isenção e boa-fé, externar todos os factos e prova obtida, favoráveis ou desfavoráveis à sua pretensão.

  10. - Não é a posterior apreciação de outros vícios do acto - pressupostos legais para recurso à avaliação indirecta - que deve nortear a aplicação ao caso do princípio do aproveitamento do acto mas pela susceptibilidade de influenciar o conteúdo decisório do acto, motivo porque a audiência prévia terá de ser exercida.

  11. - A susceptibilidade referida fundar-se-á num juízo de prognose póstuma, pelo que não pode nem deve ser influenciado pela improcedência dos demais vícios suscitados.

  12. - O recurso a métodos indirectos impõe exigências específicas de fundamentação pelo que outra seria a decisão na parte relativa à prova que se relaciona com o depoimento dos clientes que abalaria substancialmente a fundamentação do recurso aos métodos indirectos.

  13. - O nosso entendimento é de que não estamos perante uma situação em que se verifique que, mesmo sem ter sido cumprida a formalidade - direito de audição - a decisão final do procedimento não poderia ser diferente, não havendo que concluir pelo aproveitamento do acto.».

* 1.4.

A recorrida não apresentou contra-alegações.

* 1.5. O Ministério Público emitiu a seguinte pronúncia: «1. São requisitos legais cumulativos do conhecimento do recurso por oposição de acórdãos: -identidade da questão fundamental de direito -ausência de alteração substancial da regulamentação jurídica -identidade de situações fácticas -antagonismo de soluções jurídicas (art. 284º CPPT; art. 27º nº 1 al. b) ETAF vigente; art. 152º nº 1 aI.

  1. CPTA) A alteração substancial da regulamentação jurídica relevante para afastar a existência de oposição de julgados verifica-se «sempre que as eventuais modificações legislativas possam servir de base a diferentes argumentos que possam ser valorados para determinação da solução jurídica» (acórdãos STA Pleno secção de Contencioso Tributário 19.06.96 processo n° 19532; 18.05.2005 processo nº 276/05) A oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas, entendida não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais (Jorge Lopes de Sousa Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado 6ª edição 2011 Volume IV p. 475; acórdão STJ 26.04.1995 processo nº 87156) A oposição de soluções jurídicas exige ainda pronúncia expressa sobre a questão, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta (acórdãos STA Pleno SCT 6.05.2009 processo nº 617/08, 26.09.2007 processo nº 452/07; acórdãos STA SCT 28.01.2009 processo nº 981/07); 22.10.2008 processo nº 224/08).

    1. Apreciação do caso concreto: A divergência de sentido das soluções das questões enunciadas pela recorrente e apreciadas nos arestos em confronto não radica em antagónicas interpretações das normas que constituíram os respectivos fundamentos jurídicos, antes em diferentes situações fácticas subjacentes, assim configuradas: a) acórdão recorrido -a alegada preterição de formalidade legal invalidante dos actos subsequentes (relatório de inspecção e acto de liquidação do imposto) consistiu na falta de menção no relatório dos autos de declarações dos clientes do sujeito passivo inspecionado; a administração tributária invocou ter procedido a diligências junto daqueles, mas não ter consignado o seu resultado por não terem sido apurados factos relevantes para a apreciação da verificação dos requisitos para o recurso à avaliação indirecta na determinação da matéria colectável do imposto (acórdão fls. 874/879) -norma legal aplicável: art. 62º nº 3 al. i) RCPIT b) acórdão fundamento -a alegada preterição de formalidade legal consistiu na omissão de audição do contribuinte antes da liquidação oficiosa da taxa de comercialização de produtos farmacêuticos e de higiene corporal, efectuada com base nos registos contabilísticos do sujeito passivo quanto ao volume de vendas (acórdão fls. 962/963) Norma legal aplicável: art. 60º nº 1 al. a) LGT A diversidade das situações fácticas em apreço determina a diversidade das questões jurídicas, na medida em que a sua solução depende da aplicação de regimes jurídicos distintos; ainda que se sustente a identidade da questão jurídica fundamental (violação do direito de audiência), a divergência das soluções jurídicas nos acórdãos em confronto resultaria de divergentes juízos de prognose póstuma formulados por cada um dos tribunais sobre a susceptibilidade de a realização das formalidades legais omitidas poder influenciar o sentido e conteúdo do acto final do procedimento administrativo (e não de antagónica interpretação e aplicação do art.60º nº 1 al. a) LGT).

      CONCLUSÃO O STA não deve tomar conhecimento do objecto do recurso, por inexistência de oposição de acórdãos.».

      * Por despacho de fls.990 foram as partes notificadas para se pronunciarem sobre a questão suscitada pelo MP tendo a recorrente sustentado que deverá o tribunal tomar conhecimento do recurso.

      * 1.6.

      Colheram-se os vistos legais.

      * 1.7. Cumpre apreciar e decidir se se verificam os pressupostos formais do recurso por oposição de acórdãos.

      Depois deverá averiguar-se se existe contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento.

      Só posteriormente, se a resposta à questão anterior for positiva, deverá averiguar-se se o acórdão recorrido sofre dos vícios que lhe são imputados.

      * 2.1.

      O acórdão recorrido do TCA deu como provada a seguinte matéria de facto: «1. A impugnante é uma pessoa colectiva exercendo a sua actividade de comércio enquadrada na CAE 47770. (“comércio a retalho de relógios e artigos de ourivesaria e joalharia em estabelecimento especializado) e enquadrada em IVA desde 1 de Janeiro de 2005 no regime normal de periodicidade trimestral (cf. cópia do relatório de inspecção junto a fis. 327 a 525, maxime fls. 332 do PAT).

    2. Em 24 de Junho de 2008 foi emitida a ordem de serviço nº 03498 determinando o procedimento externo de inspecção à ora impugnante tendo por âmbito o IRC e o IVA do exercício de 2007 (cf. relatório de inspecção junto a fls. 327 a 525, maxime fls. 331 do PAT).

    3. Em 17 de Abril de 2009 foi elaborado o relatório final da inspecção efectuada à ora impugnante e...

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