Acórdão nº 01486/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelFONSECA CARVALHO
Data da Resolução10 de Janeiro de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I. Relatório 1. O Ministério das Finanças vem, pelo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais interpor recurso do Acórdão do TCA Sul que julgou procedente a acção administrativa especial intentada pela A…………, S. A., condenando a entidade demandada a reapreciar o pedido formulado pela então autora, em conformidade com a interpretação da norma contida no artigo 69º do CIRC.

  1. Formulou as seguintes conclusões das suas alegações: 1. Nos termos e em obediência ao n° 4 do artigo 91º do CPTA, deveria o TCA, após a A. ter apresentado alegações (como terá apresentado, de acordo com o acórdão recorrido (pois que também nenhumas alegações foram notificadas à ora recorrente), ter procedido à específica notificação da entidade demandada para contra-alegar.

  2. Com a preterição dessa formalidade não se permitiu que a Administração, contra-alegando, exercesse o contraditório face ao que foi arguido pela Autor nas suas alegações, sendo, desse modo, violados os princípios do contraditório e da igualdade entre as partes e limitado o direito de defesa do réu, legal e constitucionalmente tutelados.

  3. Nos presentes autos acorre, assim, nulidade por omissão de notificação para alegações.

  4. Determinando essa notificação o início da contagem do prazo para o exercício desse direito, era a mesma uma formalidade legal imprescindível ou essencial.

  5. Sendo de fazer notar que não só o contraditório a exercer pela Administração nas suas contra-alegações sempre deveria ser considerado pelo Tribunal a quo como relevante para a decisão da causa, como essa relevância é, no caso em apreço, manifesta face ao teor do remanescente das nossas alegações de recurso jurisdicional e do cotejo da mesma com os fundamentos do acórdão recorrido (ou seja com a apreciação da causa).

  6. Foi, assim, omitida uma formalidade prescrita na lei e susceptível de influir na apreciação da causa, pelo que, se verifica uma nulidade, nos termos do nº 1 do artigo 195º do CPC.

  7. Pelo que, sob a pena de violação das disposições acima citadas, não pode o acórdão recorrido deixar de ser anulado por esse Supremo Tribunal.

  8. Acresce que o acórdão recorrido não pode também manter-se, pois que padece de erros de julgamento em matéria de facto, bem como em matéria de direito, tendo, designadamente, procedido a uma incorrecta interpretação e aplicação ao caso sub judice do artigo 69º do CIRC.

  9. No acórdão recorrido, ao procurar-se explicar-se porque é que, no entender dos Senhores Juízes Desembargadores, o acto do Secretário de Estado sindicado não se poderia manter, começa-se por elencar os alegados objectivos da reestruturação indicadas pelo contribuinte.

  10. Ora, antes de mais e por um lado, cumpre chamar a atenção desse Supremo Tribunal para o carácter totalmente genérica dos objectivos enunciados.

  11. Por outro lado, salvo o devido respeito diverso entendimento, o Acórdão Foggia aí citado (proferido na âmbito do referido Processo 0844/09 do STA), corrobora os termos desse acto Secretário de Estado.

  12. Isso, pois que, no caso em apreço, de um lado, são apresentados como objectivos da fusão, objectivos de redução de custos administrativos e de gestão, que decorrem da simplificação de estrutura inerente a uma fusão por incorporação e, de outra, temos a enorme dimensão do “benefício fiscal esperado”, de cerca de um milhão e quatrocentos mil euros.

  13. E diz-se nesse acórdão Foggia é que: “Por conseguinte, nada obsta, em princípio, a que uma operação de fusão que proceda a uma reestruturação ou a uma racionalização de um grupo e que permita reduzir os seus encargos administrativos e de gestão possa prosseguir razões económicas válidas. Contudo caso de uma operação de incorporação, como a que está em causa no processo principal da qual parece resultar que, atendendo à dimensão do benefício fiscal esperado, isto é, mais de 2 milhões de euros, a economia feita pelo grupo em causa, em termos de estrutura de custos, é perfeitamente marginal. E ainda que: “A este respeito, deve acrescentar-se que a economia de custos resultante da redução dos encargos administrativos de gestão que decorre do desaparecimento da sociedade incorporada é inerente a qualquer operação de fusão por incorporação na medida em que esta implica, por definição uma simplificação da estrutura do grupo.

  14. Salvo melhor opinião, o acórdão recorrido analisou aí menos bem os factos e aplicou e interpretou também deficientemente o artigo 69º do CIRC.

  15. Diz-se, seguidamente, no acórdão recorrido que “a Entidade Demandada considerou não existir razões económicas válidas para indeferir o pedido, pelo simples facto, da incorporada possuir um património negativo, o que tornaria «impossível» o cumprimento da alínea c) do n°1 da Circular 7/2005”.

  16. Porém, contrariamente ao que parece decorrer do douto acórdão recorrido, que, salvo o devido respeito, também aqui incorreu em erro de julgamento, desta feita em matéria de facto -) não foi isso que se disse na Informação n°1908/09 da DSIRC, junta ao PA, que fundamentou o despacho do Secretário de Estado que foi impugnado nos autos.

  17. Na verdade, foi a propósito do regime n°4 do artigo 69° do CIRC que nessa Informação se disse que “o facto do património líquido da incorporada ser negativo, torna impossível o cumprimento da alínea c) da Circular n°7/2005” (circular que explica aos serviços da AT como devem aplicar aquele n°4 do artigo 69° da CIRC) 18. E, como é bom de ver, dados os termos com que a AT se referiu a tal matéria (designadamente o uso do condicional) -., tratou-se aí de uma mera referência a uma situação hipotética.

  18. O que determinou o sentido do “acto objecto dos presentes autos” foi não ter sido demonstrado que a fusão foi realizada por razões económicas válidas.

  19. De facto, aquando da fusão, a sociedade incorporada — a B……… — transferiu para a ora recorrida (que a substituiu em todos os seus direitos e obrigações) o seu património, que in casu era património negativo.

  20. Ora, não se vê como é que o passivo que onerava, por superior ao activo, a sociedade incorporada, ou seja como um património negativo - e no caso, repare-se, muito negativo -, poderia constituir um contributo positivo para a sociedade incorporante.

  21. Tal passivo vai onerar e sobrecarregar a incorporante, pelo que só pode dificultá-la na sua alegada missão de reorganização e na obtenção de resultados positivos futuros.

  22. O que impunha concluir que a integração da B…….. não podia ter, de facto, qualquer efeito positivo para a sociedade incorporante.

  23. Assim, no caso em apreço, a existirem, após a operação fusão, resultados positivos (como se considerava nas projecções juntas ao PA), não decorriam os mesmos de contributo da incorporada, mas antes da própria incorporante.

  24. Sendo de ter presente que o interesse económico da fusão não poderá ser visto, exclusivamente, na simples perspectiva da melhoria do interesse da incorporada. Tendo antes, de ser examinada num âmbito mais vasto, no qual é preponderante o efeito que o património líquido negativo da incorporada provoca na incorporante, bem como na economia.

  25. Ou, como se entendeu no Acórdão do TCA Sul de 09-04-2013, Processo 03811/10, “Não é qualquer operação de fusão que permite ao interessado beneficiar do disposto no art. 69º do CIRC, tem que se tratar de uma operação de fusão com características bem definidas, que permita alavancar a operação da sociedade incorporante e que tenha efeitos positivos a nível de desenvolvimento económico”.

  26. Tais características, como vimos, não se verificavam in casu e desse circunstancialismo decorria que o pressuposto legal do interesse económico da fusão, exigível nos termos do nº 2 do artigo 69º do CIRC, não se verificava.

  27. Salvo melhor opinião, ao assim não entender, o douto acórdão recorrido interpretou e aplicou incorrectamente esse preceito, incorrendo em erro de julgamento em matéria de direito.

  28. Os factos contrariam a alegação de que a B……… teria potencial ou capacidade para gerar proveitos.

  29. O entendimento da Administração é reforçado com a análise da estrutura de capitais da B………. do exercício anterior à fusão: a soma dos resultados transitados negativos com o resultado líquido negativo desse ano ascendia a € 1 379 529,22, quando o capital social era somente de € 5 000,00.

  30. O que quer dizer que a B………. era economicamente inviável, estando abrangida pelo regime estabelecido no artigo 35º do Código das Sociedades Comerciais para os casos de “perde de metade do capital”, onde se prevê, nomeadamente a hipótese de dissolução da sociedade.

  31. E, repare-se ainda — face ao que é aduzido e transcrito no acórdão recorrido como supostas justificações da operação - que, já antes da fusão, a sociedade ora recorrida e a B………. a tinham as suas sedes administrativas no mesmo local e, estando as decisões operacionais ou executivas centralizadas no mesmo local, é de intuir que fossem tomadas de forma concertada 33. E não se entende como a fusão por incorporação sub judice — operação envolvendo apenas empresas já integradas em grupo, sendo a sociedade incorporada já detida a 100% pela incorporante e, obviamente, sob a sua orientação estratégica — poderia (de per si) produzir alterações ou efeitos significativos do ponto de vista económico.

  32. E, note-se ainda, tudo indica que a situação patrimonial negativa da sociedade incorporada tinha carácter estrutural, dada a persistência e consistência dos resultados líquidos negativos apresentados pela mesma desde 2002 em diante e, assim sendo, tal défice não poderia deixar de limitar o apuramento de “resultados futuros” na esfera da sociedade incorporante.

  33. O que corrobora que os resultados positivos da entidade incorporante, ora recorrida, em conformidade com as projecções pela mesma efectuadas (e que constam do PA), teriam de resultar da sua própria contribuição, ou, então, teriam de decorrer de outros factores extrínsecos à fusão.

  34. E não podia o TCA ter-se limitado a desconhecer tudo o que nessa...

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