Acórdão nº 0683/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelFONSECA DA PAZ
Data da Resolução18 de Janeiro de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO: RELATÓRIO A “A………………, SA”, com sede na Rua ……….., n.º ….., Porto, alegando que, na sequência de concurso público, lhe fora adjudicada a empreitada de construção das novas instalações da Directoria do Porto da Polícia Judiciária e que, por responsabilidade do dono da obra, o prazo de execução dessa empreitada foi sucessivamente prorrogado, de que emergiram sobrecustos, intentou, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) do Porto, acção administrativa comum, contra o Estado Português, pedindo condenação deste a pagar-lhe a quantia de € 2.072.430,42, acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos, até efectivo e integral pagamento.

Por decisão datada de 12 de Outubro de 2012, foi julgada procedente a excepção da caducidade do direito de acção, absolvendo-se o R. da instância.

Desta decisão, a A. interpôs recurso para o TCA Norte, ao qual veio a ser negado provimento.

Inconformado com tal acórdão, a A. interpôs revista, para este STA, tendo, na respectiva alegação, formulado as seguintes conclusões: “1.ª - A questão cuja apreciação se requer a este Venerando Supremo Tribunal de Justiça, pela sua relevância jurídica, reveste-se de indiscutível importância fundamental, do mesmo passo que a admissão da revista é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, num “domínio em que as especificidades próprias do Direito Processual Administrativo exigem uma resposta específica, que o CPTA não fornece de modo cabal e que, por isso, deve ser fornecida, no vértice do sistema, pelo Supremo Tribunal Administrativo” pelo que verificados estão os requisitos ou limites impostos pelo Art° 150º do CPTA para se admitir a revista excepcional (PARECER do Professor Mário Aroso de Almeida aqui junto, págs. 30 e 31).

  1. - Na esteira do que tem vindo a ser sustentado por este Venerando Supremo Tribunal, a questão sub judice “...

    apresenta contornos indiciadores de que a solução pode ser um paradigma ou orientação para se apreciarem outros casos” (ver, por todos, Acs. STA, de 27-09-2013 e de 05-11-2013, in www.gde.mj.jsta.nsf).

  2. - Entende-se naquele douto aresto “...

    impõe-se a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa como condição para dissipar dúvidas sobre o quadro legal que regula certa situação, vendo-se a clara necessidade de uma melhor aplicação do direito com o significado de boa administração da justiça em sentido amplo e objectivo, isto é, que o recurso não visa primariamente a correcção de erros judiciários”.

  3. - A presente revista tem por objecto as seguintes duas questões jurídicas e processuais: a) numa segunda acção interposta por um particular contra o Estado que adjectiva um pedido de indemnização fundado em responsabilidade contratual pode o Estado invocar procedentemente a caducidade do direito de propôr a acção, quando um Ministério (no caso, o Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação) foi demandado e citado para uma primeira acção com o mesmo objecto ou causa de pedir e pedido se essa acção foi tempestivamente proposta, isto é, dentro do respectivo prazo legal, e terminou com a absolvição da instância do Ministério por se ter entendido que este carecia de personalidade judiciária, que radicava no Estado? Ou, numa outra formulação: Qual a relevância da primeira acção proposta contra o Ministério, para efeitos da invocação e conhecimento da caducidade, na segunda acção proposta contra o Estado? b) Pode o Estado invocar procedentemente a caducidade do direito de um particular propôr uma acção que adjectiva um pedido de indemnização fundado em responsabilidade contratual quando não inexiste qualquer decisão que dê origem ao início de contagem do prazo para propositura da acção? 5ª - Discorda-se, em, absoluto, do entendimento sufragado no Acórdão recorrido quando pretende que a instauração/citação na Ac. 184/05, proposta em 14.01.2005, não tem efeitos interruptivos da caducidade no âmbito da presente acção por os RR serem entidades diferentes e a absolvição da instância em relação ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação na 1ª acção não ter qualquer relevância processual em relação ao “novo” Réu Estado Português - art° 289°, n° 2 do Cód. Proc. Civil -, pois que têm personalidades jurídicas distintas.

    6.º - Entendimento contrário, e que, quanto a nós, é o correcto, tem sido sufragado quer pela Jurisprudência, quer pela Doutrina, como se retira, por todos, do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 08.05.2008, Processo 01509/06, Secção de Contencioso Administrativo, 2° Juízo, que se transcreve: “II - Tendo sido demandado numa acção sobre responsabilidade o Ministério em vez do Estado, tendo em conta o princípio da prevalência das decisões de fundo sobre as decisões de forma, não deve ter lugar a absolvição da instância mas antes deve o autor ser convidado a suprir a excepção de ilegitimidade passiva que se verifica neste caso - artigos , 11°, n° 2, e 88°, n.° 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

    (…) Acresce que o Ministério das Actividades Económicas e do Trabalho não é uma pessoa jurídica diversa do Estado Português. Precisamente por ser um departamento da Administração Central destituído de personalidade jurídica - artigo 1° da respectiva Lei Orgânica aprovada pelo Decreto-Lei n° 186/2003, de 20 de Agosto.

    O que significa que ao ser citado este Ministério não foi citada pessoa jurídica distinta do Estado Português. http://www.dgsi.pt/jtca (Sic., com sublinhado nosso).

  4. - “(…) O n.° 2 do artigo 10.º do CPTA confere personalidade judiciária aos Ministérios no âmbito do contencioso administrativo, podendo, assim, dizer-se que, no contencioso administrativo português, os Ministérios são serviços do Estado genericamente dotados de personalidade judiciária; no plano substantivo, não deve, no entanto, esquecer-se que, na realidade, Estado e Ministérios não são entidades distintas; um Ministério é um serviço da Administração do Estado, que integra a estrutura do próprio Estado; quando o CPTA estabelece que certos tipos de ações não devem ser propostos contra o Estado, mas contra os seus Ministérios, ele não está a determinar que essas ações sejam propostas contra outra entidade que não o Estado, isto é, contra uma qualquer entidade terceira em relação ao Estado, mas apenas a estabelecer que, nesse tipo específico de ações, o Estado seja demandado através desses seus serviços, que, para o efeito, são dotados de personalidade judiciária; quando uma ação que devia ser proposta contra o Estado, por não se enquadrar na previsão do n° 2 do artigo 10.º do CPTA, tenha sido indevidamente proposta contra um dos seus Ministérios, não pode deixar de reconhecer-se, no plano substantivo, que a ação não foi proposta contra pessoa diferente do Estado, O que sucede é, muito simplesmente, que o autor demandou o Estado através de um seu serviço, o Ministério, num dos tipos de casos que excecionalmente escapam ao universo amplíssimo das situações em que esse procedimento é admitido pelo n.° 2 do artigo 10.º do CPTA, que, precisamente para esse efeito, confere personalidade judiciária aos Ministérios em relação a uma amplíssima categoria de ações; a ação que a Consulente intentou em 14 de janeiro de 2005 contra o MOPTH foi uma ação através da qual ela demandou o Estado através desse seu serviço e, portanto, uma ação da qual o Estado teve pleno conhecimento através do seu serviço, para todos os efeitos para os quais a sua propositura podia relevar. Diferente perspetiva seria de um exacerbado formalismo, na medida em que, ao longo de toda a relação que manteve com o Estado, no âmbito do contrato de empreitada que com ele celebrou, foi sempre com o MOPTH, enquanto serviço do Estado, que a Consulente se relacionou, tendo sido sempre através dos órgãos do MOPTH que o Estado lhe comunicou as suas posições. Afigurar-se-ia, por isso, de um incompreensível artificialismo pretender-se que o Estado foi alheio à ação proposta contra o MOPTH, como se nunca dela tivesse tido conhecimento.” (apud Professor Mário Aroso de Almeida, PARECER junto, págs. 27, 28 e 29).

  5. - Ainda que diferentes fossem os Réus, numa e noutra acção, o que se não concebe nem concede, sempre a primeira acção, proposta em 14.01.2005, tinha relevância para a segunda, proposta em 11.06.2007, no que respeita ao Réu Estado e para impedir a caducidade do direito de acção, como sustenta o Prof. Doutor Alberto dos Reis, em comentário ao art° 294° do Cód. Proc. Civil de 1939: “O que se quis então dizer na segunda alínea do artigo 294°: Quis-se dizer o seguinte: proposta uma acção e absolvido o réu da instância, se o mesmo autor propuser segunda acção sobre o mesmo objecto dentro de 30 dias, aproveita-lhe o facto de ter proposto a acção anterior, quer a segunda acção seja dirigida contra o mesmo réu, quer seja dirigida contra réu diferente, de sorte que se a primeira acção foi proposta em tempo, nada importa que a segunda o não seja” (in, Código de Processo Civil anotado, Volume I, pág 397, com sublinhado nosso).

  6. - Também no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 02.02.2012, Processo: 07978/11, Secção de Contencioso Administrativo, 2° Juízo, é citado o Professor JOSÉ LEBRE DE FREITAS, in CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO, Vol. 1, pag. 518, em anotação ao artigo 289° do CPC, no seguinte sentido: “Os efeitos da propositura ou da citação não se mantêm, porém, quando tal não seja possível É o que acontece, quanto aos efeitos decorrentes da citação, quando, absolvido o Réu da instância, o Autor vem propor a nova acção contra pessoa diversa: o efeito interruptivo da prescrição (...) não pode, dada a sua natureza pessoal estender-se ao novo Réu demandado. Já não assim quando, estando em causa a caducidade do direito, o Autor da segunda acção seja o mesmo, ainda que o Réu seja diferente” cfr. em idêntico sentido ALBERTO DOS REIS, COMENTÁRIO, Vol III, pag. 423 - 426 e CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO, Vol...

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