Acórdão nº 0756/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelASCENS
Data da Resolução24 de Janeiro de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 - RELATÓRIO A Representante da Fazenda Pública, vem recorrer da decisão do TAF do Porto, exarada a fls. 150 e seguintes, que julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida pelo Banco A…….., SA, melhor identificado nos autos, e consequentemente anulou a decisão de arquivamento do recurso hierárquico interposto da decisão de indeferimento parcial da reclamação por ele deduzida contra a liquidação de IRC de 2001 Inconformada com o assim decidido, apresentou a Representante da Fazenda Pública as respectivas alegações que resumiu nas seguintes conclusões: «A. A sentença recorrida formulou, salvo melhor opinião, um juízo errado na apreciação da decisão do recurso hierárquico que não foi precedida de notificação para exercício de direito de audição por parte da impugnante, conforme sentença recorrida, “consubstancia uma preterição de formalidade essencial com efeitos invalidantes da decisão de recurso hierárquico (e não, naturalmente da liquidação)” B. Com base na matéria de facto dada como provada no caso em apreço e antes do recurso hierárquico, apresentado com os mesmos motivos e fundamentos jurídicos da reclamação e conforme exposição no direito de audição no momento do projecto de conclusões do relatório de inspecção, o impugnante exerceu o direito de audição, e concedido o direito para uma segunda participação em sede de reclamação graciosa, optou por não intervir.

  1. Segundo Rui Duarte Morais in Manual de Procedimento e Processo Tributário, ano 2012, pág. 36. nova audição em sede de recurso hierárquico seria “inútil, uma vez que o interessado já teve oportunidade de se pronunciar sobre os elementos relevantes para a decisão (a própria petição de reclamação ou recurso constitui oportunidade para ele expressar as razões da sua discordância com a decisão anterior)” D. No entender de Lima Guerreiro in LGT anotada ano 2001, pág. 275 a 281, nas anotações ao art. 60° da LGT refere que “o direito de audição é exercido geralmente por uma única vez no procedimento: finda a instrução e antes da decisão. Não pode ser utilizado para introduzir dilações sucessivas no procedimento… Em caso de o objecto do direito de audição constituir um acto preparatório da liquidação, como são os previstos nas alíneas c), d) e e) do número 1 do presente artigo, o contribuinte não deve ser, de novo, ouvido antes de esta se realizar, a não ser quando a liquidação se fundamente em elementos distintos daqueles por que o direito de audição inicialmente se concretizou”.

  2. E seguindo o mesmo raciocínio que “o direito de audição não se aplica necessariamente aos chamados procedimentos de segundo grau, incluindo reclamações ou recursos hierárquicos. De acordo com o princípio da unidade do procedimento, apenas quando, nos procedimentos de segundo grau, se abrir nova fase instrutória, tem lugar o direito de audição. Não há, nos procedimentos de segundo grau, direito de audição, quando a decisão se deva basear nos mesmos factos em que fundamentou a decisão anterior F. Existe uma errónea aplicação do normativo do art. 60° n.º 3 da LGT, pelo que, contrariamente ao doutamente decidido, não se verifica a existência de qualquer preterição de uma formalidade essencial na decisão do recurso hierárquico, pois tal formalidade já tinha sido cumprida anteriormente no procedimento tributário.

  3. No caso em concreto, a haver novo direito de audição prévia antes da decisão final do recurso hierárquico, não existindo factos novos, constituiria uma medida dilatória da decisão final do procedimento, e com a repetição dos mesmos argumentos pela impugnante, seria um acto inútil sem relevância para o procedimento. Não existindo novidade nos factos, tendo já sido ouvida a impugnante, foram concedidos todos os direitos e garantias de participação, sendo que do indeferimento do recurso hierárquico, a impugnante apenas optou por articular, em sede de impugnação, aspectos procedimentais, actos e vícios que se situam em momentos posteriores à liquidação discutida e fora da génese desta.

  4. No recurso hierárquico, a impugnante não trouxe factos novos ao processo susceptíveis de alterar a decisão de indeferimento da reclamação graciosa. A AT regida pelas instruções sobre a dispensa do direito de audição veiculadas através da Circular n.º 13/99, de 08.07.99, no ponto 3, da Direcção de Serviços de Justiça Tributária e art. 60° n.º 3 da LGT entendeu, correctamente, dispensar nova audição ao contribuinte. O que o legislador pretendeu acautelar foi a audição dos contribuintes em qualquer das fases do procedimento que culmina com a liquidação, não tendo o mesmo que exercer esse direito em cada uma das diferentes fases procedimentais, a não ser que se invoquem factos novos sobre os quais o mesmo se não tenha pronunciado.

    1. Isso mesmo resulta também do disposto no artigo 103°, n.º 2, alínea a) do CPA, nos termos do qual a audiência dos interessados pode ser dispensada se estes já se tiverem pronunciado no procedimento sobres as questões que importem à decisão e sobre as provas produzidas.

  5. Pelo que a sentença encontra-se viciada de erro de julgamento na matéria de direito, não podendo manter-se na ordem jurídica, nunca poderia ser exigida a formalidade da audição prévia antes do indeferimento do recurso hierárquico, por no caso em concreto ser possível a dispensa da audição prévia nos termos do art. 60° n.º 3 da LGT, quando esse direito já foi exercido previamente no procedimento, em sede de relatório de inspecção, assim como foi concedido novamente direito de participação em sede de reclamação graciosa.

    Deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, com as legais consequências.» O Recorrido, Banco A………., S.A., veio apresentar as suas contra alegações que as resumiu nas seguintes conclusões: «(a) A Recorrente nada disse em sede de contestação a propósito do vício invocado pelo Recorrido e que o Tribunal a quo considerou verificar-se.

    (b) Por outro lado, na decisão objecto da presente acção o Director de Finanças de Lisboa, aqui representado pela Recorrente, nada referira quanto aos motivos que terão estado na origem da (pelo menos implícita) decisão de não notificação do Recorrido para efeitos de exercício do direito de audição previamente à decisão do recurso hierárquico.

    (c) Tal significa que a Recorrente considera que o Tribunal a quo errou na sua decisão por não ter atendido a (alegadas) razões que não foram invocadas na sede própria.

    (d) A jurisprudência tem vindo a considerar inadmissível a fundamentação a posteriori do acto tributário, enfatizando, por outro lado, a adequação da apreciação pelo tribunal apenas da fundamentação contemporânea do mesmo acto.

    (e) Assim, nada nas alegações de recurso da Recorrente é susceptível de afectar a adequação da decisão do Tribunal a quo quando formulou o seu juízo sobre a legalidade da correcção em análise à luz da fundamentação contemporânea do acto tributário, sendo irrelevante no âmbito do presente recurso a fundamentação a posteriori aqui implicitamente preconizada pela Recorrente.

    (f) Mas, ainda que fosse de admitir que a Recorrente pode em sede de recurso tentar fundamentar a decisão do seu representado, ainda assim haveria que concluir que as suas alegações não procedem, porque não se verificam na situação em análise os pressupostos da alegada decisão de dispensa de notificação para exercício do direito de audição.

    (g) Com efeito, o Recorrido invocou como fundamento da anulação da decisão do recurso hierárquico, entre outros, a ilegalidade da decisão de indeferimento parcial da reclamação por violação dos princípios constitucionais da boa fé e da imparcialidade nas relações entre os particulares e a Administração Pública, vício que se reporta à decisão da reclamação que precedeu o recurso hierárquico, o que significa que os fundamentos invocados pelo Recorrido no recurso hierárquico não são os mesmos da reclamação, não procedendo o que a este respeito é invocado pela Recorrente.

    (h) Por outro lado, o Recorrido invocou em sede de recurso hierárquico o facto de em processo de reclamação relativo ao IRC do mesmo ano de 2001, em que se discute também uma das questões discutidas no presente processo (a relativa aos juros de mora), em que o coordenador que emite o parecer que é submetido a despacho é o coordenador que emitiu o parecer no procedimento e em que o chefe de divisão que emitiu o despacho sobre o parecer e assinou os ofícios é o chefe de divisão que emitiu o despacho sobre o parecer e assinou os ofícios no procedimento, a decisão ir no sentido oposto à do procedimento de reclamação aqui relevante porque decisão diversa fora preconizada pela Direcção de Serviços de Inspecção Tributária, facto que não tinha sido invocado em sede de reclamação, o que significa que o Recorrido trouxe factos novos no âmbito do recurso hierárquico, pelo que não procede o que a este respeito é invocado pela Recorrente.

    (i) Invocou o Recorrido como fundamento da anulação da decisão do recurso hierárquico, entre outros, a respectiva falta de fundamentação e a violação do princípio da decisão a que se encontra obrigada a Administração Tributária, questões relevantes para efeitos de apreciação da decisão e que poderiam ter sido suscitadas pelo Recorrido em sede de exercício do direito de audição caso para o efeito lhe tivesse sido dada a oportunidade, o que significa que não foi dada ao Recorrido oportunidade para se pronunciar sobre todas as questões que importam à decisão do recurso hierárquico, pelo que não procede o que a este respeito é invocado pela Recorrente.

    (j) Conforme alegado e demonstrado nos presentes autos, a decisão de arquivamento do recurso hierárquico baseia-se em informação e pareceres dos serviços, pelo que não procede a alegação da Recorrente de que no procedimento de recurso hierárquico não foi aberta fase instrutória, o que, na tese da...

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