Acórdão nº 01128/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Março de 2018
Magistrado Responsável | PEDRO DELGADO |
Data da Resolução | 22 de Março de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – A…………, SA, com os demais sinais dos autos, vem interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que julgou improcedente a impugnação judicial por ela interposta contra o indeferimento de reclamação graciosa da liquidação de IMT, no valor total de 302.414,14.
Apresenta as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «1 - Ao contrário do que se entendeu na decisão recorrida, a questão principal a apreciar no caso “sub judice” não tem que ver com a automaticidade da atribuição do benefício fiscal, mas sim com a revogabilidade de um acto administrativo considerado inválido, por violação de lei.
2 - Atendendo ao disposto nos artigos 141º do CPA e 58º do CPTA, a revogação do acto de liquidação é extemporânea, porque a revogação ocorreu fora do prazo legalmente fixado para o efeito, e que é de um ano; 3 - Ao corrigir um acto de liquidação anteriormente emitido, a AT começa por violar dois princípios fundamentais do sistema jurídico-fiscal e constitucional português: o da não retroactividade da lei fiscal e o da certeza e seguranças jurídicas, pelo que a revogação desse acto padece igualmente do vício da inconstitucionalidade 4 - Para além disso, a violação censurável do princípio da confiança e da boa fé, por manifesto abuso do direito, na modalidade do venire contra factum proprium, uma vez que a AT, como vimos, concorreu, de forma indispensável e inultrapassável, para a solução efectivada em final do ano 2011 (30.12), 5 - A liquidação efectuada pela AT baseia-se numa alteração de interpretação do conceito “destinado a instalação” produzida pelo STA; ora, uma alteração de interpretação do STA sobre uma determinada norma legal para mais, uma norma de natureza jurídico-fiscal, só pode produzir efeitos para o futuro, sob pena de, sendo (essa interpretação) desfavorável ao contribuinte, como é o caso, se imputar a este, retroactivamente, um dever ou um ónus que ele não poderia cumprir por não o poder conhecer; 6 — O conceito de instalação adoptado pelo STA é manifestamente errado, pelo que a isenção de IMT deve ser aplicada à presente situação.» 2 – Não foram apresentadas contra alegações.
3 – O Ministério Público emitiu fundamentado parecer que, na parte relevante, se transcreve: «(….) 3. A questão que vem colocada a este tribunal consiste em saber se o ato de liquidação oficiosa da AT padece do vício de ilegalidade, por violar direitos constituídos da Recorrente e o disposto no artigo 20º do Dec.-Lei nº 423/83, de 5 de Dezembro, e 141º do CPA.
3.1 A Recorrente começa por insurgir-se contra o entendimento sufragado na sentença relativamente à qualificação do benefício fiscal como benefício automático e aos efeitos que o tribunal “a quo” retirou de tal qualificação, já que no seu entender a questão que se coloca é a de saber se é possível à AT revogar um ato administrativo com base na sua ilegalidade para além do prazo de um ano.
Como decorre da sentença recorrida, o tribunal “a quo” partiu da qualificação do benefício fiscal em causa como de aplicação automática, para concluir que neste caso não há qualquer ato de concessão de benefício e nessa medida não se aplica o regime de revogação de atos inválidos previsto no artigo 141º do CPA.
E afigura-se-nos que a decisão está correta. Estando perante um benefício fiscal que não necessita de prévio reconhecimento, a AT não é chamada a pronunciar-se sobre a sua concessão e nessa medida não pratica nenhum ato administrativo de concessão de benefício. E não pode equiparar-se para esses efeitos o ato do sujeito passivo ao fazer a autoliquidação do IMT. Ainda que haja intervenção dos serviços da AT ao receber a declaração do sujeito passivo, essa intervenção não implica a definição de direitos e obrigações na situação jurídica concreta, mas uma mera confirmação dos dados fornecidos pelo sujeito passivo, o qual é o único responsável pelos mesmos. E essa confirmação não consubstancia qualquer juízo sobre o direito ao benefício. Com efeito, várias teses têm sido desenvolvidas sobre a natureza do ato de “autoliquidação” (Enunciadas no excelente artigo de Lourenço de Freitas, “Autoliquidação: contributo para uma análise da sua natureza jurídica”, Ciência de Técnica Fiscal nº 405, pág. 7 a 49.) designadamente se o mesmo configura um ato administrativo tributário, mas não subsistem dúvidas que o recebimento da declaração pelos Serviços da AT não configura qualquer tomada de posição por parte desta. Daí que o CPPT (art.131º) imponha a reclamação administrativa obrigatória como via de acesso na impugnação contenciosa de tais atos, de modo a que a AT possa tomar uma posição de conformação sobre o mesmo.
E assim sendo, não há da parte dos Serviços da Administração Tributária a prática de qualquer ato administrativo na receção de tal declaração. Não tendo sido praticado ato administrativo não se coloca a questão da admissão da sua revogabilidade. Daí que a posterior intervenção da AT não dependa da observação do regime de revogabilidade dos atos administrativos constitutivos de direitos.
Assim e só aquando da pronúncia da AT, no âmbito da sua competência de controlo da declaração, se possa considerar que estamos perante a prática de um ato administrativo produtor de efeitos.
Entendemos, assim, que a sentença recorrida não padece nesta parte do vício que lhe é assacado pela Recorrente, motivo pelo qual o recurso deve ser julgado nesta parte improcedente.
3.2 Importa por último apreciar a questão da isenção de IMT prevista o artigo 20°, n° 1, do Dec.-Lei n° 423/83, de 5 de Dezembro.
A questão suscitada pelos Recorrentes tem vindo a ser apreciada e decidida no Supremo Tribunal Administrativo, o qual, em julgamento ampliado, nos termos do art. 148° do CPTA, proferiu o acórdão de 23/1/2013, no âmbito do processo n° 968/12, que deu origem ao acórdão uniformizador de jurisprudência n° 3/2013 (publicado no Diário da República, 1ª série, n° 44, de 4/3/2013, pp. 1197 a 1217). O referido aresto uniformizou a jurisprudência no sentido de que o conceito de «instalação», para efeitos dos benefícios a que se reporta o n° 1 do art. 20°, do Decreto-Lei n° 423/83, de 5 de Dezembro, reporta-se à aquisição de prédios (ou de fracções autónomas) para construção de empreendimentos turísticos, depois de devidamente licenciadas as respectivas operações urbanísticas, visando beneficiar as empresas que se dedicam à actividade de promoção/criação dos mesmos e não os adquirentes de fracções autónomas em empreendimentos construídos/instalados em regime de propriedade plural, uma vez que esta tem a ver com a «exploração» e não com a «instalação».
A referida doutrina tem sido sustentada noutros acórdãos do STA que lhe seguiram: acórdãos do STA de 30/01/2013, recursos nºs. 971/12, 972/12, 999/12, 1003/12 e 1193/12 e 01194/12; de 06/02/2013, recurso n° 1000/12; de 17/4/2013, processos nºs. 1023/12, 1070/12 e 1002/12; de 23/04/2013, recurso n° 01195/12; de 30/04/2013, recurso n° 0973/12; de 11/09/2013, recurso n° 01049/13; de 09/10/2013, recursos n° 01015/13, 01040/13 e 01050/13; de 30/10/2013, recursos n° 01048/13 e 01052/13; e de 02/03/2016, rec. n.º 01330/15.
A citada orientação jurisprudencial do STA, que merece a nossa adesão, foi acolhida na sentença recorrida e foi com base na mesma que o Mmo. Juiz “a quo” se decidiu pela improcedência da ação.
Atento que o Recorrente não acrescenta qualquer outro elemento relevante à discussão, entendemos que a sentença recorrida deve ser confirmada igualmente nesta parte e o recurso ser julgado improcedente.» 4 - Colhidos os vistos legais, cabe decidir.
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