Acórdão nº 0986/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 16 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelASCENS
Data da Resolução16 de Maio de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – RELATÓRIO A………., Ldª, melhor identificada nos autos, vem recorrer para este Supremo Tribunal da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a impugnação por ela deduzida contra a segunda avaliação do prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia de Santa Maria dos Olivais sob o artigo 3980, actualmente inscrito na matriz da freguesia do Parque das Nações sob o artigo nº 361.

Inconformada com o assim decidido, apresentou as respectivas alegações que resumiu nas seguintes conclusões: «1. O sentido e alcance da decisão ora sindicada não pode manter-se na Ordem Jurídica por nela se admitir a subsistência e a produção de efeitos de um acto administrativo decisório não fundamentado.

  1. O resultado da avaliação dos autos encontra-se absolutamente destituída de qualquer fundamentação, o que é absolutamente inadmissível, atendendo à respectiva natureza decisória que afecta os legítimos direitos e interesses do contribuinte.

  2. Com efeito, no que concerne à determinação das áreas do imóvel objecto de avaliação, são as mesmas distintas das que resultam da ficha de caracterização do imóvel, tal como decorrentes do PP3.

  3. A ser certa a determinação feita pela Administração Tributária das áreas a considerar, não pode a Recorrente apurar da respectiva correcção, em virtude de lhe ter sido ostensivamente omitida qualquer informação relativa à correspondente fonte de conhecimento e de recurso.

  4. Nos termos do disposto no art.º 45.º n.º 5 do CIMI, quando o documento comprovativo de viabilidade construtiva apenas faça referência aos índices do PDM, devem os peritos avaliadores estimar, fundamentadamente, as áreas médias de construção da zona envolvente.

  5. Ora, tal fundamentação inexiste no caso vertente, limitando-se a Administração Tributária a reproduzir a sobredita norma legal, o que, manifestamente, não pode nem constitui o cumprimento daquela obrigação legal de fundamentação.

  6. O dever de fundamentação do acto decisório dos autos resulta não só do disposto no art. 77.º da LGT, mas também do Código de Procedimento Administrativo, aplicável nesta sede ex vi do disposto no art. 2.º al. c) daquele primeiro diploma legal.

  7. Resulta, assim, dos art. 152.º e 153.º do CPA, em consonância com o princípio vertido no art.º 268.º da Constituição da República Portuguesa, que qualquer decisão é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de Direito que a motivaram.

  8. Incorreu, por conseguinte, a Administração Tributária no vício de falta de fundamentação, ainda que sucinta.

  9. É que, no caso concreto, nem sequer estamos perante uma fundamentação obscura ou insuficiente, mas sim, como se alegou, perante total ausência de fundamentação, o que, só por si, determina a anulação do acto administrativo de decisão.

  10. Ao contribuinte não é exigível conformar-se com um acto decisório não fundamentado, desconhecendo as razões de Direito e de facto que o motivaram, para além de o mesmo se apresentar em total contradição com a realidade fáctica dos autos.

  11. No art.º 152.º do CPA estabelecem-se os requisitos da fundamentação dos actos administrativos.

  12. Equivale à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto.

  13. A fundamentação deve dar a conhecer ao interessado o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor da decisão para decidir no sentido em que decidiu e não em qualquer outro.

  14. Se a fundamentação não esclarecer concretamente a motivação do acto, por obscuridade, contradição, insuficiência ou pura omissão, o acto considera-se não fundamentado e a omissão de fundamentação constitui causa de anulabilidade do acto nos termos do disposto no art.º 163.º do CPA.

  15. Os órgãos administrativos têm o dever de exteriorizar, de uma forma suficiente e congruente, as razões de facto e de Direito que estão na base das respectivas decisões, de molde a que um destinatário normal, se colocado no lugar do real destinatário, possa reconstituir o itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pelo órgão decisor e, dessa forma, possa ficar a conhecer as razões pelas quais se decidiu em determinado sentido e não noutro, para que possa aderir ou reagir contra elas.

  16. Pelo exposto, o acto ora sindicado padece do vício de falta de fundamentação, que, no caso dos autos, tem valor acrescido, na medida em que contraria a pretensão da ora Recorrente, veiculada através do prévio pedido de realização de segunda avaliação ao imóvel dos autos, o que se invoca para efeitos de anulação do mesmo, com todas as devidas e legais consequências.

  17. Outrossim, padece o invocado acto de avaliação do vício de violação de Lei, motivado por erro sobre os correspondentes pressupostos de facto e de Direito, quer no que à determinação das áreas do imóvel em razão da respectiva afectação diz respeito, quer no que concerne aos coeficientes de localização e de qualidade e conforto aplicados pela Administração Tributária.

  18. Com efeito, a Administração Tributária subverteu os coeficientes de localização previstos na tabela anexa à Portaria n.º 1119/2009 de 30 de Setembro, aplicando percentagens máximas e, por conseguinte, excessivas sem qualquer fundamentação ou motivação.

  19. Note-se que a lmpugnante já havia alertado a Administração Tributária para a necessidade de corrigir a aplicação dos referidos coeficientes aquando do pedido de realização de segunda avaliação ao imóvel dos autos, contudo, fez a mesma “tábua rasa” dos argumentos aduzidos, aplicando distorcidamente coeficientes que a Lei não admite para o caso em apreço porque próprios de outro Serviço de Finanças, o que nunca poderia deixar de ser relevado para efeitos de decisão da segunda avaliação.

  20. É que, para além de a decisão omitir o seu dever acrescido de fundamentação porque contrária à pretensão da lmpugnante, o que constitui vício de falta de fundamentação como se arguiu, ainda tratou a Administração Tributária de violar abrupta e grosseiramente o disposto na Lei, com a manifesta cobertura do Tribunal a quo.

  21. A decisão de avaliação proferida, neste tocante, configura uma interpretação errada e lesiva dos interesses por aquela prosseguidos, para além de constituir uma interpretação não intencionada pelo legislador e, nessa medida, uma interpretação abusiva da Portaria n.º 1119/2009 de 30 de Setembro.

  22. Ademais, no que respeita ao cômputo dos coeficientes de afectação e de qualidade e conforto, fez a Administração Tributária uma interpretação analógica proibida pelo art. 11.º n.º 4 da LGT.

  23. Com efeito, no caso vertente a realidade tributária é um terreno para construção nos termos do art.º 6.º, n.º 3 do CIMI, tratando-se, por conseguinte, de uma das espécies de prédio urbano cujo valor patrimonial deverá ser determinado por avaliação directa por força do disposto no art. 15.º n.º 2 do ClMl.

  24. Ora, para efeitos da avaliação desta espécie de prédios urbanos, o art. 45.º do CIMI prevê especificamente um modo de determinar o correspondente valor patrimonial tributário, qual seja, “o valor patrimonial tributário dos terrenos para construção é o somatório do valor da área de implantação do edifício a construir, que é a situada dentro do perímetro de fixação do edifício ao solo, medido pela parte exterior, adicionado do valor do terreno adjacente à implantação”.

  25. Outrossim, na fixação da percentagem do valor do terreno de implantação têm-se em consideração as características referidas no número 3 do art.º 42.º do mesmo diploma legal, respeitantes à localização.

  26. Não faz a Lei, por conseguinte, qualquer referência aos coeficientes de afectação, de qualidade e conforto para o apuramento do valor patrimonial tributário de terrenos para construção.

  27. Contrariamente, o art.º 38.º n.º 1 do mesmo diploma legal, versando sobre a avaliação dos prédios urbanos destinados a habitação, comércio, indústria e serviços, determina que o cálculo do correspondente valor patrimonial tributário se faça por recurso à fórmula “Vt=VcxAxCaxClxCqxCv”.

  28. Ora, esta norma e, por conseguinte, esta fórmula, só têm aplicação aos prédios ai discriminados, isto é, àqueles que já se encontram edificados para habitação, comércio, indústria e serviços.

  29. Nele não foram pelo legislador incluídos os terrenos para construção nos quais inexista erigida qualquer edificação, ainda que aqueles constituam prédios urbanos.

  30. Assim, para apuramento e determinação do correspondente valor patrimonial tributário apenas haverá que recorrer ao disposto no invocado art.º 45.º, onde apenas é relevada a área de implantação do edifício a construir e o terreno adjacente e as características do art.º 42.º n.º 3 do mesmo diploma legal.

  31. Os restantes coeficientes, tal como previstos na fórmula destinada a prédios edificados, só a estes pode ser aplicada como tais.

  32. Computando na avaliação dos autos os ditos coeficientes de afectação, de qualidade e de conforto, violou a Administração Tributária e, no seguimento destes autos, o próprio Tribunal o quo no entendimento perfilhado, o estatuído na Lei a propósito do procedimento de avaliação de terrenos para construção.

  33. Aliás, tal interpretação, para além de não ter um mínimo de correspondência com a letra da Lei, determina a violação do princípio da legalidade e de reserva de lei, tal como plasmados no art.º 103.º n.º 2 da CRP, pois que faz aplicar analogicamente à avaliação da realidade tributária dos autos um critério de avaliação reservado a outro tipo de realidades, bem distintas daquela.

  34. Em matéria tributária, a analogia está absolutamente vedada nos termos do disposto no art. 11.º n.º 4 da LGT.

  35. Nos termos do disposto nos artigos 3.º n.º 1 do CPA e 55º da LGT, a Administração Tributária deve actuar em obediência à lei e ao Direito, dentro dos limites dos poderes que lhes estejam atribuídos e em conformidade com os fins para que os mesmos poderes lhes foram...

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