Acórdão nº 587/13.8TASJM.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 19 de Novembro de 2014

Magistrado ResponsávelPEDRO VAZ PATO
Data da Resolução19 de Novembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 587/13.8TASJM.P1 Acordam os juízes, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto I – B…, C…, D… e E… vieram interpor recurso do douto acórdão do 3º Juízo do Tribunal Judicial de São João da Madeira que os condenou, pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 202º, e); 203º, nº 1; e 204º, nº 2, e), do Código Penal; o primeiro na pena de três anos de prisão; o segundo na pena de três anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com regime de prova; o terceiro na pena de três anos de prisão; e o quarto (agravado pela reincidência nos termos dos artigos 75º e 76º do mesmo Código) na pena de três anos e oito meses de prisão; e condenou os quatro a pagar à massa insolvente de “F…, Ldª” a quantia de €10.755,25, acrescida de juros de mora.

Da motivação dos recursos interpostos pelos arguidos B…, C… e D… constam as seguintes conclusões: «1ª- O presente recurso tem como objecto a matéria de facto e de direito do acórdão proferido nos presentes autos em que os arguidos, tendo sido acusados pela prática em co-autoria de um crime de furto qualificado da previsão dos arts. 203º, nº 1, 204º, nº 1, al. a) e nº 2, al. e), do CP, foram condenados na pena de três anos de prisão efectiva quanto aos arguidos B… e suspensa por igual período para o arguido C….

  1. - Ponto de facto incorrectamente julgado: “No dia 18 de Agosto de 2013, os arguidos, na sequência de um plano previamente delineado entre si, deslocaram-se por duas vezes, numa viatura da marca Renault, modelo .., de cor cinzenta, até às instalações fabris da sociedade F…, S.A., sitas na …, na cidade de São João da Madeira, área desta comarca, pelas 15.20h e pelas 18.30h.” 3ª- A prova que impõe decisão diversa da recorrida é o depoimento prestado pela testemunha de acusação G…, em audiência de julgamento, gravadas, conforme depoimento registado no CD áudio de 12:04:44 a 12:21:35.

  2. - Na verdade, do depoimento da referida testemunha não resulta inequivocamente terem os arguidos se deslocado no dia 18 de Agosto de 2013 às instalações da ofendida por duas vezes.

  3. - A referida testemunha declara mesmo não conseguir fazer o reconhecimento dos indivíduos constantes das imagens captadas.

  4. - E da comparação entre o auto de visionamento de fls. 256, ss. dos autos e o suporte fotográfico de fls. 520, ss. dos autos também não resulta a identificação dos arguidos com um mínimo de certeza, já que estamos perante imagens de fraca qualidade, de baixa resolução, portanto, sem nitidez, a preto e branco, captadas a grande distância, sem pormenorização dos envolvidos, fotogramas de 7x5,5 cm em que as figuras têm cerca de 1 cm de altura, o que prejudica, sem dúvida, a conclusão constante do douto acórdão de que «a estatura e a indumentária das pessoas que ali se visualizam não permite qualquer dúvida de que são as mesmas.». Acresce o facto de os fotogramas de fls. 266, ss. e os de fls. 520, ss. não poderem ser sequer comparados em virtude de os primeiros terem a maior parte da sua área com sombra o que impede qualquer possível identificação ou comparação.

  5. - Assim, o facto referido foi incorrectamente julgado como provado.

  6. - Ponto de facto incorrectamente julgado: “Os arguidos retiraram (das instalações da ofendida) vários caixotes com 511 peças de vestuário … ascendendo o valor global das mesmas a 10.984,25 €.” 9ª- A prova que impõe decisão diversa da recorrida é o depoimento prestado pela testemunha de acusação H… (administrador judicial), em audiência de julgamento, conforme depoimento registado no CD áudio de 12:22:28 a 12:36:06.

  7. - A referida testemunha afirma ser aquele valor o correspondente ao valor contabilístico, ao custo de produção, não correspondendo, no entanto, ao efectivo preço de venda.

  8. - O preço de venda, conforme depoimento da testemunha situou-se entre um terço e metade daquele valor, ou seja, entre € 3.661,42 e € 5.492,12.

  9. - Havendo esta discrepância de valor dos bens furtados, e não se tendo apurado o concreto valor dos bens, tal deve ser valorado a favor dos arguidos, por aplicação do princípio in dubio pro reo, com tal ficando, de igual modo, prejudicada a qualificativa “valor elevado” do crime de furto.

  10. - Assim, o facto referido foi incorrectamente julgado como provado.

  11. - Ponto de facto incorrectamente julgado: “Após chegarem à dita fábrica, os arguidos retiraram o resto dos vidros de uma das janelas laterais que já se encontrava partida e entraram pela mesma no interior das instalações.» No douto acórdão é ainda considerado que «Atentos os factos dados como provados, resulta inequívoco o preenchimento dos elementos objectivos e subjectivos típicos do crime de furto qualificado por parte dos arguidos, atenta a introdução no local em referência mediante escalamento …” 15ª- A prova que impõe decisão diversa da recorrida é o depoimento prestado pelo arguido C… em audiência de julgamento, conforme depoimento registado no CD áudio de 11:08:58 a 11:19:55 e a testemunha de acusação G…, em audiência de julgamento, conforme depoimento registado no CD áudio de 12:04:44 a 12:21:35.

  12. - Escalar é o acto ou efeito de subir ou trepar e pressupõe a transposição de obstáculos.

  13. - Ora, dos depoimentos acima identificados resulta que a janela por onde entraram os arguidos C… e E… tinha já o vidro partido e situava-se a centímetros do chão.

  14. - Assim, o facto referido foi incorrectamente julgado como provado.

  15. - Não se verificando, in casu, as qualificativas agravantes do crime de furto, deveriam os arguidos ter sido absolvidos do crime de furto qualificado de que vinham acusados.

    Do arguido B…: 20ª- Ponto de facto incorrectamente julgado: O Tribunal a quo considerou que “no decurso da audiência de julgamento se apurou de forma categórica que os arguidos não se tinham ali deslocado por uma única vez, mas sim por duas vezes … tal elemento permitiu contrariar a versão do único arguido que não tinha admitido a prática dos factos, o B…, que afirmou que apenas ali tinha levado os outros arguidos e que nada sabia sobre a natureza dos objectos que os arguidos carregaram para o seu veículo uma vez que no local onde tinha estacionado nem sequer visualizou o modo como os outros tinham penetrado no armazém.” 21ª- A prova que impõe decisão diversa da recorrida é o depoimento prestado pelo arguido B… em audiência de julgamento, conforme depoimento registado no CD áudio de 10:55:50 a 11:08:54 e o arguido E…, em audiência de julgamento, conforme depoimento registado no CD áudio de 11:31:32 a 11:46:58.

  16. - Na verdade, resulta provado – e não podemos esquecer que o Tribunal a quo fundamenta a sua convicção nas declarações dos arguidos C…, D… e E… – que o B… apenas se disponibilizou para ajudar o E… permanecendo sempre no seu carro, não tendo sequer acesso visual às instalações da ofendida, pelo que devia ser absolvido do crime de que vem acusado.

  17. - A não se entender assim, o mesmo não pode ser condenado como co-autor, mas apenas como auxiliar dos restantes arguidos, sendo a pena a aplicar sensivelmente diminuída; ao não entender assim, o Tribunal violou o art. 27º do CP.

  18. - Por outro lado, resulta ainda provado, nomeadamente, do relatório social junto aos autos, que: - O processo de crescimento e de socialização do arguido deu-se em ambiente familiar conturbado devido ao consumo abusivo de bebidas alcoólicas do pai; - Depois de concluir o 1º ciclo de escolaridade o arguido começou a inserção laboral na construção civil que exerceu até fase recente; - No início da idade adulta iniciou o consumo de estupefacientes; - O que levou a práticas criminais tendo sido condenado em penas suspensas na execução e penas de multa.

    - Em 2009 aderiu ao acompanhamento no CRI, dando continuidade ao programa de substituição opiácea com metadona que iniciou no cumprimento de pena de prisão subsidiária a multa “o que lhe permitiu adquirir o equilíbrio necessário para começar a trabalhar na actividade de jardineiro, numa empresa da especialidade.” - Mas em 2011 ficou desempregado.

    - Em 2012 faleceram ambos os pais, o que provocou um nível de perturbação emocional que o desestabilizou e o fez retomar o consumo de estupefacientes.

    - O arguido era apoiado pela irmã I… e também pela irmã J….

    - Entrado no EPP a 09-04-2014 o arguido foi sensibilizado e aderiu ao contrato de desvinculação aditiva e está a respeitar o programa.

  19. - Acresce que o Tribunal a quo, no âmbito da determinação da pena concreta, refere que em relação ao arguido B… há que considerar (i) a existência de inúmeras condenações penais e (ii) a todo o passado do arguido, nele se incluindo as habilitações literárias, as condições sociais, familiares e económicas … bem como as suas condições de vida actuais.

  20. - Desde logo, quanto às condenações a que foi sujeito o arguido verifica-se que a maior parte se refere a crime de condução sem habilitação legal, não havendo qualquer condenação por crime de furto, sendo que a última condenação foi já em 21-02-2007, ou seja, há mais de sete anos.

  21. - Por outro lado, quanto às habilitações literárias e condição económica ou social não podem ser levadas em conta, em virtude do princípio da igualdade constante do artigo 13º da CRP, que estatui, nomeadamente, no seu nº 2 que ninguém pode ser prejudicado em razão de instrução, situação económica e condição social.

  22. - De qualquer forma, o que se conclui da análise do relatório social é que o arguido, apesar de um ambiente familiar degradado tem tentado gerir a sua vida trabalhando desde novo. Apesar do seu esforço acabou desempregado, o que conjugado com a morte dos pais em 2012, principalmente, da mãe originou um agravamento das condições económicas, sociais e anímicas do arguido. Apesar disso, o arguido era apoiado pelas irmãs, o que demonstra a existência de apoio a nível familiar, inclusive no futuro. Actualmente, encontra-se a cumprir um contrato de desvinculação aditiva.

  23. - Conforme consta do art. 50º do CP, o tribunal decretará a suspensão da execução da pena de prisão aplicada em medida...

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