Acórdão nº 135/13.0GCLMG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 22 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelMARIA MANUELA PAUP
Data da Resolução22 de Outubro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo número 135/13.0GCLMG.P1 Acordam em conferência na Primeira Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I) Relatório No processo comum coletivo com o número acima referido que correu termos pelo 1º juízo da comarca de Lamego foi julgado o arguido B… pela prática de: - dois crimes de violência doméstica agravados p. e p. pelo art. 152.º n.º1, sendo um dos crimes pela ali. a) e o outro pela ali. d) e n.º 2 do Código Penal; - um crime de ofensa à integridade física qualificada p. e p. pelos art.s 143.º n.º1, 145º, n.º 1, ali.a) e n.º 2, este último com referência à ali. a) do n.º 2 do art.132º, todos do C.P.; - um crime de ameaça agravada p. e p. pelo art.s 153.º n.º1 e 155, n.º1, ali. a), ambos do C.P.; e - um crime de detenção de arma proibida p. e p. pelo art. 86º, n.º1, ali. c), da Lei n.º 5/2006 de 23 de Fevereiro, na redação da Lei n.º 17/2009, de 6 de Maio e condenado, respetivamente nas penas de: 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão, pelo crime de violência doméstica agravado que tem como ofendida a cônjuge C…; 2 (dois) anos e 9 (nove) meses de prisão, pelo crime de violência doméstica que tem como ofendida a filha, menor, D…; 10 (dez) meses de prisão, pelo crime de ofensa à integridade física qualificada, tendo como ofendido o filho, E…; 1 (um) ano e 3 (três) meses de prisão, pelo crime de ameaça agravada, tendo como ofendido o filho, E…; e 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão, pelo crime de detenção de arma proibida.

Efetuado o cúmulo jurídico das penas o arguido veio a ser condenado na pena única de 5 (cinco) anos e 8 (oito) meses de prisão.

Inconformado com a decisão proferida dela veio o arguido apresentar o presente recurso alegando o que consta de folhas 783 a 797 dos autos, que ora aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos e que condensa nas seguintes conclusões: “DE FACTO 1º - Encontra-se erradamente julgada a matéria constante dos pontos 4º; 14º; 31º; 33º; 41º; 49º;50º; 51º; 65º e 69º da matéria considerada provada, porquanto: No ponto 4 da matéria provada não existiu prova bastante para que se considerasse provado que o recorrente fosse desde sempre bastante ciumento em relação à ofendida, a controlasse em todos os movimentos, a proibisse de sair de casa, submetendo à sua vontade e autorização essas saídas ou a isolasse socialmente; No ponto 14º da matéria provada por estar em contradição com o que se por provado na 2ª parte do ponto 3º da matéria considerada provada; No ponto 31º da matéria provada por para além das declarações da ofendida C… nenhuma outra prova se produziu em audiência para que se desse como provado aquele facto; No ponto 33º da matéria provada, porquanto ser notório a inexistência de quaisquer indícios de queimadura no canto da boca da ofendida C…; No ponto 41º da matéria provada porquanto resultar da prova produzida em audiência que o arguido não estava em Portugal, mas sim em França a trabalhar; No ponto 49º, 50º e 51º da matéria provada, porquanto ao contrário do que resulta da prova produzida, quem detinha a pistola constante no ponto 48º era a ofendida, sendo ela que a guardava e a escondia em sitio desconhecido do recorrente.

No ponto 65º da matéria provada, porquanto não se produziu prova para que o Tribunal pudesse dar como provado que todos os factos ou a maior parte deles ocorreram na presença dos menores, sem se encontrarem elencados os específicos factos presenciados pelos filhos, considerando-se as expressões “muitas vezes” e múltiplas ocasiões, conceitos vagos e genéricos.

No ponto 69º da matéria provada, porquanto não resulta da prova que as conversas telefónicas que o recorrente fez à ofendida C… estava a ser feita por telemóvel em alta voz, razão pela qual não se pode dar como provado que o recorrente tivesse conhecimento de que a sua filha D… ouviu todo o conteúdo da conversa.

DE DIREITO: 1º - Errada qualificação dos factos que consideraram que o recorrente praticou o crime de detenção de arma proibida p. e p. nos termos do disposto no art. 86º n.º 1, ali. c) do RJAM, porquanto não resultar da prova produzida qualquer factualidade donde se possa inferir a sua detenção quando foi apreendida, razão pela qual se requer a absolvição do recorrente; 2º - O recorrente discorda da atribuição de medianamente acentuado o grau de ilicitude dos factos cometidos contra a sua filha D…, sendo certo que à excepção dos factos 38º; 40º; 61 ali. j); em nenhum outro refere a presença da filha D… na ocorrência dos factos.

  1. - Inexistem factos na matéria considerada apurada sob os pontos 67º e 70º que consubstanciem a prática pelo recorrente de um crime de ofensas corporais qualificadas na pessoa do filho E…, por não se ter verificado a circunstância da especial censurabilidade ou preversidade geradora de uma culpa agravada.

  2. - Considerando corretamente subsumidos os factos, a conduta do recorrente consubstanciaria a prática de um crime de ofensa à integridade física simples p. e p. nos termos do art. 143º do C.P.

  3. - Se se pudesse considerar corretamente subsumidos os factos à actuação do recorrente, adequava-se ao caso, uma pena de prisão inferior a 5 anos, atentos os crimes praticados e face os critérios do art. 71º e 77º do C.P., suspensa na sua execução, por se verificarem os pressupostos ínsitos no art. 50º do C.P.

  4. - A decisão recorrida não visou a reintegração do recorrente na sociedade, violando assim as normas contidas no art.º 40º do C.P.

  5. - Não teve em consideração o relatório de perícia Médico-Legal nem o relatório social para determinação da sanção, no que respeita às conclusões ali chegaram uns e outros, nomeadamente não atenderam ao que se encontra dito no relatório pericial quanto à capacidade de socialização e de crítica e juízo social do recorrente e do seu conhecimento das regras e normas sociais, inexistindo qualquer perigosidade do agente.

  6. - A decisão recorrida não apurou as condições económicas actuais do recorrente, havendo falta de pronúncia quanto a esta facto, pelo que violado foi o disposto no art. 71º al. d) do C.P.

  7. - A decisão recorrida não atendeu às declarações prestadas em sede de julgamento pelos ofendidos C… e E… e o perdão que ambos verbalizaram em sede de audiência bem como às circunstâncias atenuantes da pena, nomeadamente a significativa reaproximação familiar e a reinserção laboral e estabilização económica do recorrente, pelo que violado foi o disposto no art. previstas no art. 72º n.º 1 e 73º do C.P..

A este recurso respondeu o Ministério Público (folhas 812 a 816) e a assistente (folhas 818 a 821) pugnando ambos pela manutenção do decidido.

A mesma posição foi assumida pela Digna Procuradora Geral Adjunta junto deste Tribunal da Relação.

Colhidos os Vistos foram os autos submetidos a conferência.

II) – Fundamentação A decisão recorrida considerou provados e não provados os factos seguintes: (transcrição) II - Fundamentação 2.1. Os factos provados Discutida a causa e produzida a prova, resultam assentes os seguintes factos: 1. O arguido contraiu casamento civil, sem convenção antenupcial, com C…, em 18 de Setembro de 1994.

  1. Deste casamento, nasceram E… e D…, a 6 de Abril de 1995 e a 14 de Julho de 2001, respectivamente.

  2. Após contraírem matrimónio, o mencionado casal passou a residir na zona de …/…, tendo posteriormente, por volta de 2008, passado a viver em …, .., fixando aí residência, na Rua …, s/n.

  3. O arguido sempre se revelou bastante ciumento em relação à ofendida, sua mulher, C… e, em virtude do sentimento de posse que mantinha relativamente à mulher, o arguido restringia os contactos da mesma com terceiros, procurava controlar todos os seus movimentos, tentando saber com quem estava ou falava, proibindo-a de sair de casa, quando queria, submetendo à sua vontade e autorização essas saídas, isolando-a socialmente.

  4. Neste quadro e sob qualquer pretexto, sobretudo quando ingeria bebidas alcoólicas em excesso, o que acontecia frequentemente, o arguido, no interior da residência do casal, discutia com a mulher, imputando-lhe a responsabilidade por todas as adversidades que atravessavam como casal e dirigia-lhe expressões ofensivas da sua honra e consideração, tais como "puta", "vaca" e "porca", imputando-lhe amantes, tendo, por várias vezes, a agredido fisicamente, desferindo-lhe empurrões, bofetadas, murros e pontapés, atingindo-a em várias partes do corpo, chegando, em determinadas ocasiões, a puxá-la pelos cabelos, arrastando-a pelo chão, sofrendo, a ofendida, em consequência das agressões físicas perpetradas pelo arguido, hematomas e escoriações, nas zonas do corpo atingidas; 6. Ultimamente, no período de Agosto até ao início de Outubro de de 2013, em que esteve em França, a trabalhar, acompanhado do filho E…, o arguido anunciava à ofendida C… que a ia matar, bem como aos dois filhos e que após se suicidaria, descrevendo, pormenorizadamente, a forma como o iria fazer, nos termos que infra se descrevem.

  5. As expressões dirigidas pelo arguido à ofendida C…, sua mulher, no âmbito das discussões que com ela despoletava, nos termos descritos em 5, bem como as condutas mencionadas em 5, tiveram muitas vezes lugar, na presença dos filhos, E… e D…, então menores, ficando nessas situações os mesmos muito assustados, com medo do pai.

  6. O descrito comportamento do arguido levou a que a ofendida C… se isolasse socialmente e tivesse receio de manter com qualquer pessoa um diálogo que despoletasse a ira daquele e culminasse em ofensas verbais e/ou em agressões físicas, tendo, chegado mesmo, em duas situações, a tentar o suicídio, mediante a ingestão de comprimidos/medicamentos e de um líquido de limpeza, nunca tendo a ofendida recorrido a assistência médica e escondendo de terceiros as lesões que lhe eram provocadas pelo arguido, seu marido e, quando questionada acerca da causa das mesmas, omitindo a verdade, referindo que tinha caído, embatido nalgum objecto, etc.

  7. Em ocasiões em que o arguido estava a agredir fisicamente a mulher, C…, da forma descrita em 5, os...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT