Acórdão nº 1565/11.7TBMCN.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 17 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelM
Data da Resolução17 de Dezembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação n.º 1565/11.7TBMCN.P1 Acordam no Tribunal da Relação do Porto 1. Relatório B… intentou, em 2011.11.02, contra C… acção declarativa com processo comum sob a forma ordinária para investigação da paternidade, pedindo no essencial que se decida que é filho do R., com fundamento em presunções legais de paternidade — a posse de estado a que se refere alínea a) do n.º 1 do artigo 1871.º CC, e a existência de relações sexuais do pretenso progenitor com a sua mãe durante o período legal de concepção a que se refere a alínea e) do n.° 1 do mesmo artigo.

Contestou o R., excepcionando a caducidade da acção, por na sua actual redacção o artigo 1817.º, n.º 1, CC dispor que a acção de investigação de paternidade só pode ser proposta durante a menoridade do investigante ou nos dez anos posteriores à sua maioridade ou emancipação. Assim, uma vez que o autor nasceu em 1973.03.17 a sua maioridade ocorreu em 1991.03.17, razão pela qual na data da propositura da presente acção já havia decorrido tal prazo de 10 anos.

Impugnou também a factualidade alegada pelo autor na sua petição inicial.

Replicou o A., sustentando que o seu direito não está sujeito a qualquer prazo de caducidade, por força do disposto nos artigos 18.º, n.ºs 2 e 3, e 26.º, n.º 1, CRP, donde resulta que o actual artigo 1817.º CC, na redacção dada pelo artigo 1.º da Lei n.º 14/2009, de 1 de Abril, é materialmente inconstitucional, por contrariar o princípio da imprescritibilidade do direito à obtenção/declaração, por parte do respectivo interessado, da paternidade.

Foi proferido despacho saneador, no qual se julgou procedente a excepção peremptória de caducidade do direito de acção e se absolveu o R. do pedido contra ele formulado.

Inconformado, apelou o A., apresentando as seguintes conclusões: «1º O estabelecimento da paternidade insere-se no acervo dos direitos pessoalíssimos, entre os quais, o de conhecer e ver reconhecida a verdade biológica da filiação, a ascendência e marca genética de cada pessoa; 2º Contém, em si mesmo, por isso, o direito de investigar a maternidade ou paternidade; 3º Tal direito fundamental tem protecção constitucional, como vertente que é, do direito à integridade moral, à identidade pessoal e ao desenvolvimento da personalidade (arts. 16º, 18º, 25º, nº 1 e 26º, nº 1 da C.R.P.) 4º O Estado não pode, pois, restringir o assentamento da filiação/identidade pessoal, através de prazos de caducidade, sejam eles quais forem.

  1. O direito a investigar a paternidade é, portanto, imprescritível, não se justificando qualquer limite temporal para o seu exercício.

  2. O douto Ac. do Tribunal Constitucional nº 23/2006, que declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, do nº 1 do art. 1817º do C. Civil “… na medida em que prevê, para a caducidade do direito de investigar a paternidade, um prazo de dois anos a partir da maioridade do investigante”, apesar da aparente limitação do seu segmento decisório, contém em si a ideia da imprescritibilidade das acções que tenham por objecto o reconhecimento judicial da paternidade ou maternidade.

  3. A redacção actual do nº 1 do art. 1817º do C. Civil, conferida pela Lei 14/2009, é também ela inconstitucional, por violação dos arts. 16º, nº 1, 18º, 25º, nº 1, 26º, nº 1 e 36º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa.

Contra-alegou o R., pugnando pela manutenção do decidido.

  1. Fundamentos de facto A 1.ª instância considerou provados os seguintes factos, que não foram objecto de impugnação: 1. B… nasceu em 17 de Março de 1973.

  2. Encontra-se registado como sendo filho de D… e de pai incógnito.

  3. A acção para investigação da paternidade deu entrada em juízo no dia 2 de Novembro de 2011.

  4. Do mérito do recurso O objecto do recurso, delimitado pelas conclusões das alegações (artigo 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1 CPC), salvo questões do conhecimento oficioso não transitadas (artigo 608.º, n.º 2, in fine, e 635.º, n.º 5, CPC), consubstancia-se em saber se o do n.º 1 do artigo 1817.º, CC, na redacção conferida pela Lei n.º 14/2009, ao estabelecer que a acção de investigação de paternidade deve ser intentada durante a menoridade do investigante, ou nos 10 anos posteriores à sua maioridade ou emancipação, padece de inconstitucionalidade.

    A inconstitucionalidade do anterior prazo de dois anos a contar da maioridade ou emancipação previsto no n.º 1 do artigo 1817.º CC foi declarada, com força obrigatória e geral pelo Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 23/2006, Paulo Mota Pinto.

    A consequência da declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória e geral consta do artigo 282.º, n.º 1, CRP: o efeito da declaração de inconstitucionalidade de uma norma com força obrigatória e geral é a repristinação da norma que ela tenha revogado.

    No entanto, face às questões de ordem constitucional que suscitava a repristinação da norma revogada, como nos dá conta o acórdão do STJ, de 2011.11.15, Martins de Sousa, www.dgsi.pt.jstj, proc. 49/07.2TBRSD.P1.S1, a jurisprudência dos tribunais superiores, designadamente o STJ, se inclinou no sentido de que a acção de investigação de paternidade é imprescritível, não sendo aplicável o prazo de prescrição ordinária, como tem sido entendimento dos Tribunais superiores, em especial o STJ.

    A título meramente exemplificativo refira-se os acórdãos do STJ, de: — 2012.09.20, Serra Batista, www.dgsi.pt.jstj, proc. 1847/08.5TVLSB-A.L1.S1; — 2012.05.24, Granja da Fonseca, www.dgsi.pt.jstj, proc. 37/07.9TBVNG.P1.S1; — 2009.07.07, Oliveira Rocha, www.dgsi.pt.jstj, proc. 1124/05.3TBLGS.S1; — 2008.07.03, Pires da Rosa, www.dgsi.pt.jstj, proc. 07B3451; — 2008.04.17, Fonseca Ramos, proc. 08A474; — 2007.10.23, Mário Cruz, www.dgsi.pt.jstj, proc. 07A2736; — 2007.01.31, Borges Soeiro, www.dgsi.pt.jstj, proc. 06A4303; — 2006.12.14, Alves Velho, www.dgsi.pt.jstj, proc.06A2489.

    Entretanto, foi publicada a Lei n.º 14/2009, de 1 de Abril, que estabeleceu novos prazos para a investigação de paternidade: dez anos posteriores à maioridade ou emancipação (n.º 1), três anos a contar de diversas situações enunciadas nos n.ºs 2 e 3.

    O Tribunal Constitucional esteve dividido nesta matéria até à prolação do acórdão do Plenário n.º 401/2011, Cura Mariano, nos termos do artigo 79.º D da Lei 28/82, que, por uma maioria de 7 contra 6, decidiu não julgar inconstitucional a norma do artigo 1817.º, n.º 1, CC, na redacção da Lei n.º...

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