Acórdão nº 2434/10.3TMPRT-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 29 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelANA PAULA AMORIM
Data da Resolução29 de Setembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Alim-Fundo-2434-10.3TMPRT-A Trib. Familia e Menores do Porto Proc. 2434/10.3TMPRT-A Recorrente: Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social Recorrido: Ministério Público - Juiz Desembargador Relator: Ana Paula Amorim Juízes Desembargadores Adjuntos: Rita Romeira Manuel Fernandes* * *Acordam neste Tribunal da Relação do Porto (5ª secção judicial – 3ª Secção Cível) I. Relatório Nos presentes autos de incumprimento da prestação de alimentos, instaurado por apenso ao processo de regulação do exercício das responsabilidades parentais, nos termos do art. 181º, 183º/3 e 189º da Organização Tutelar de Menores, em que figuram como: - REQUERENTE: Ministério Público, em representação do menor B…, nascido a 29 de Junho de 2009; e - REQUERIDO: C…, residente na …, nº .., casa ., ….-… Porto veio o Ministério Público requerer o cumprimento coercivo da prestação de alimentos atribuída ao menor, perante a situação de incumprimento do progenitor.

-Notificado o requerido não apresentou alegações.

-Após vista nos autos ao Digno Ministério Público e em conformidade com a douta promoção diligenciou-se junto do ISS por obter informação sobre a situação profissional e económica do requerido e solicitou-se a elaboração do relatório sócio económico do agregado familiar onde o menor B… se encontra inserido, não só para a verificação do alegado incumprimento - art.° 181.°, n.° 4 da OTM - mas igualmente para o eventual apuramento dos requisitos exigidos pelo Decreto-Lei 164/99, 13/05, art° 4º, n.° 2.

-O Ministério Público deu o seu parecer, concluindo no sentido de se atribuir ao Fundo de Garantia de Alimentos devidos ao Menor o encargo de proceder ao pagamento da pensão de alimentos devidos ao menor pelo pai.

-Proferiu-se sentença com a decisão que se transcreve: “Pelo exposto, ao abrigo do preceituado no art. 2º da Lei nº 75/98, de 19-11 e nos arts. 3º nº 3 e 4º do Dec.-Lei nº 164/99, de 13-05, decide-se: - fixar em 100,00€ (cem euros) o montante mensal que o Estado, em substituição do devedor, deve prestar a título de alimentos ao menor, quantias estas que deverão ser entregues à progenitora.

Notifique, nos termos do art.º 4º nº 3 do Dec. - Lei nº 164/99, de 13-05, sendo o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social (na qualidade de gestor do Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores) a fim de diligenciar pelo imediato pagamento das prestações mensais fixadas, nos termos do art. 4º nºs 4 e 5 do mesmo Dec. - Lei.

Notifique, ainda, a progenitora nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 9º nº 4 do citado Dec. Lei nº 164/99”.

-O Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social veio interpor recurso da sentença.

-Nas alegações que apresentou o apelante recorrente formulou as seguintes conclusões: A.

Vem o presente recurso interposto da decisão de 11/03/2014 de fls. (…), que determinou a intervenção do FGADM - em substituição do progenitor devedor – de forma a este assegurar o pagamento da prestação de alimentos.

B.

Acontece que do teor do despacho recorrido resulta que o Tribunal a quo, não aplicou a nova redacção da alínea b) do n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 164/99, de 13/05 introduzida pela Lei n.º 64/2012, de 20 de Dezembro, donde passou a considerar-se para efeitos de valor de referência a ter em conta para efeitos de apuramento do rendimento per capita do agregado familiar do menor, o indexante dos apoios sociais (IAS), em vez do salário mínimo nacional.

C.

Do despacho recorrido resulta expressamente que o Tribunal recorrido, considerou para efeitos de valor de referência a ter em conta para efeitos de apuramento do rendimento per capita do agregado familiar do menor, o salário mínimo nacional.

D.

Do despacho recorrido não consta quais os rendimentos que foram considerados e qual foi a forma de ponderação de cada elemento do mesmo [agregado familiar], para efeitos de apuramento da capitação de rendimentos [art.º 1.ª, in fine, da Lei n.º 75/98, de 19/11 e art.º 3.º, n.ºs 1, alínea b), 2, 3 do DL 164/99, de 13/05].

E.

O despacho é assim, nulo, por falta de fundamentação legal – face à não aplicação dos critérios legais em vigor à data do despacho – e factual, violando o disposto nos artigos 154.º e 615, n.º 1, alínea b), ambos do CPC.

F.

Foi também violado o princípio do contraditório, estatuído nos artigos 3.° e 415.°, n.º 1, do CPC, segundo os quais, enquanto parte, nenhuma questão de direito ou de facto pode ser decidida sem que tenha tido possibilidade de sobre ela se pronunciar, nem admitida ou produzida prova sem que tal ocorra – neste sentido, vd. Acórdão proferido no agravo n.º 20030B/1999.P2. de 26/06/2012.

G.

Vem também o presente recurso interposto da decisão proferida pelo Tribunal a quo, na parte em que condenou o FGADM a proceder ao pagamento de prestação de alimentos superior, pelo valor de € 100,00 (cem euros), em substituição do progenitor incumpridor por valor superior ao fixado para este, no valor de € 50,00 (cinquenta euros).

H.

Sobre a impossibilidade de ser fixada ao FGADM uma prestação superior a que se encontrava vinculado o progenitor em incumprimento, já se pronunciaram os Tribunais Superiores, referindo-se entre outros, os acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação de Lisboa, de 30/01/2014, Proc. N.º 130/06.5TBCLD-E.L1-6; de 30/01/2014, Proc. N.º 306/06.5TBAGH-A.L1-6; de 19/12/2013, Proc. N.º 122/10.0TBVPV-B.L1-6; de 12/12/2013, Proc. N.º 2214/11.9TMLSB-A.L1-2; de 08/11/2012, Proc. N.º 1529/03; o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 19/02/2013, Proc. N.º 3819/04; o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, de 10/10/2013, Proc. N.º 3609/06.5; de 25/02/2013, Proc. N.º 30/09; e o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora, de 14/11/2013, Proc. N.º 292/07.4 I.

Ao contrário do entendimento do Tribunal a quo, a obrigação de prestação de alimentos pelo FGADM é autónoma da prestação alimentícia decorrente do poder paternal e não decorre automaticamente da lei, sendo necessária uma decisão judicial que a imponha, ou seja, até essa decisão não existe qualquer obrigação.

J.

O n.º 1 do artigo 3.º da Lei n.º 75/98 não deixa dúvidas que o montante que o tribunal fixa a cargo do Estado é para este prestar "em substituição do devedor".

K.

Existe uma "substituição", apenas enquanto houver a obrigação original, por se verificarem os seus pressupostos e ocorrer incumprimento da mesma, o que seria diferente se estivéssemos perante uma obrigação diversa, desligada da originária.

L.

A sub-rogação não pode exceder a medida da sub-rogação total, porquanto, se o terceiro paga mais do que ao devedor competia pagar, ele não tem o direito de exigir do devedor o reembolso pelo excesso, e só poderá exigir do credor a restituição do que este recebeu indevidamente - cfr. artigo 593.° do Código Civil – é legítimo concluir-se que, ao estabelecer esta sub-rogação legal, o legislador não podia deixar de ter implícito que a prestação a cargo do Fundo nunca poderia ser superior ao montante máximo da prestação alimentícia a que o menor tinha direito.

M.

Não tem qualquer suporte legal fixar-se uma prestação alimentícia a cargo do FGADM superior à fixada ao progenitor, pois a diferença que daí resulta é fixada apenas para o FGADM e é uma obrigação nova.

N.

A manter-se a decisão, a obrigação e responsabilidade de prestar alimentos deixará de ser imputável aos progenitores obrigados, passando a ser única e exclusivamente da responsabilidade do FGADM.

O.

Existiu, assim, violação do disposto no n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei nº 164/99, de 13 de Maio, uma vez que o FGADM não é o obrigado à prestação de alimentos, assumindo apenas a obrigação, como interveniente acidental que se substitui ao progenitor [obrigado judicialmente] incumpridor.

Termina por pedir que se julgue procedente o presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, devendo ser substituída por outra que: a) Declare a nulidade do despacho recorrido porquanto decide sobre o mérito da causa sem se encontrar fundamentado; b) Declare a violação pelo despacho recorrido do princípio do contraditório, legalmente consagrado; e sem prescindir, c) Revogar a decisão recorrida, na parte que condena o FGADM em valor superior ao fixado ao progenitor em incumprimento, nos termos e com os devidos efeitos legais.

-O Digno Ministério Público veio responder ao recurso onde, em síntese, formulou as seguintes conclusões: 1 - O Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP., manifesta a sua discordância contra a aliás douta decisão proferida no dia 11 de Março de 2014 e constante dos autos a fls. 18 a 20, que fixou em € 100,00 (cem) euros o montante mensal que o Estado deve prestar a título de alimentos ao menor B…, nascido a 29-6-2009 e, portanto, actualmente com 4 anos de idade, a suportar pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores (FGADM) através daquela entidade.

2 - Alega o recorrente, em resumo, que: A - Sendo os seguintes os pressupostos para que o FGADM seja chamado a assegurar as prestações de alimentos atribuídas a menores residentes no território nacional: - que o progenitor esteja judicialmente obrigado a alimentos; - que seja impossível a cobrança das prestações em dívida nos termos do artº 189º da OTM; e, - que o alimentado não tenha rendimento ilíquido superior ao valor do indexante dos apoios sociais (IAS), nem beneficie de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontre, superiores ao valor do IAS, no caso, fazendo a decisão recorrida apelo ao salário mínimo nacional, resulta de tal decisão que o Tribunal não teve presente as alterações introduzidas aos Diplomas que regulamentam o FGADM, decisão que não se pronunciou, assim, sobre todos os pressupostos legais, que, nos termos da legislação aplicável, têm de se verificar no caso concreto.

B – Foi também violado o princípio do contraditório estatuído nos arts. 3º e 415º, nº1, do C.P.Civil, normativos “segundo os quais, enquanto parte, nenhuma questão de direito ou de facto pode ser decidida sem que tenha tido possibilidade de sobre ela...

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