Acórdão nº 28/12.8TACPV.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelCASTELA RIO
Data da Resolução24 de Setembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Na 1ª Secção Judicial / Criminal do TRP acordam em Conferência os Juízes no Recurso Penal 28/12.8TACPV.P1 vindo do Tribunal Judicial de Castelo de Paiva Submetido o Arguido B… [1] a JULGAMENTO por Tribunal SINGULAR no Processo COMUM 28/12.8TACPV do TJCPV, a AUDIÊNCIA culminou na SENTENÇA [2] que o condenou em 100 dias de multa pela autoria material em 16.01.2012 de um crime doloso de dano simples p.p. pelo art 212-1 do Código Penal [3], em 100 dias de multa pela autoria material em 24.02.2012 de um crime doloso de dano simples p.p. pelo art 212-1, em cúmulo jurídico ex vi art 77 em 150 dias de multa única a 5,5 € diários e nas custas criminais sendo 1 UC de taxa de justiça ut arts 513 e 514 do CPP e 8-9 e Tabela III do RCP.

Inconformado com o decidido, o ARGUIDO tempestivamente interpôs RECURSO pela Declaração de interposição com MOTIVAÇÃO a fls 272-294 = 299-321 rematada com as seguintes 19 CONCLUSÕES [4]: 1. O presente recurso incide sobre a sentença que condenou o arguido pela prática, em autoria material e na forma consumada, de dois crimes de dano, na pena única de 150 (cento e cinquenta) dias de muita, à taxa diária de € 5,50, o que perfaz o montante global de 825,00 €.

  1. No presente processo vinha o arguido acusado da prática de um crime de dano previsto e punido pelo art.° 212.°, n.° 1 do C.P., punível com pena de prisão até 3 anos ou pena de multa.

  2. Após a audiência de julgamento, na leitura da sentença, a meritíssima juiz julgou adequado condenar o arguido pela prática de dois crimes de dano simples.

  3. Atenta a moldura penal prevista para o crime de dano e a condenação do arguido pela prática de dois crimes de dano em concurso real, sempre o Tribunal Singular seria incompetente para julgar o presente processo.

  4. Pelo que, a Sentença de que ora se recorre é nula por violação do disposto no art.° 16 do CPP.

  5. Ocorreu uma nulidade insanável, por violação das regras da competência do tribunal, prevista no artigo 119° CP.

  6. O que desde já se invoca para os devidos efeitos.

  7. A sentença recorrida violou o disposto nos artigos 358° e 359° do Código Penal porque alterou a qualificação jurídica dos factos, condenando o arguido não por um crime de dano previsto no art.° 212.°, n.° 1 do CP, conforme o mesmo se encontrava acusado, mas sim, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de dois crimes de dano.

  8. O Tribunal a quo deveria pois, comunicar previamente ao arguido essa alteração, dar-lhe oportunidade de se defender e então, em função disso, proferir sentença.

  9. Nos termos do n.° 3 do art.° 412.° al. a) do C.P.P. considera o recorrente incorretamente dados como provados os pontos 5. e 6. da matéria dada como provada e, bem assim incorretamente dados como não provados os factos b), c), d) e e).

  10. Já que, tal factualidade dada como provada não encontra suporte na prova produzida em Audiência de Discussão e Julgamento, não decorrendo, da mesma, a prova dos elementos objetivos e subjetivos do crime pelo qual o arguido foi acusado e condenado.

  11. Por outro lado, os pontos b), c), d) e e) da matéria de facto dada como não provada deveriam ser dados como provados já que resulta inequivocamente das declarações do arguido, do depoimento das testemunhas, e demais elementos dos autos, a sua prova.

  12. A Sentença violou a norma jurídica prevista no art.° 212.° do C.P., nomeadamente a falta de preenchimento dos elementos objetivos e subjetivos previsto para condenar o arguido pelo crime de dano.

  13. Atenta a matéria de facto provada, não existe dano, pois a coisa, não sofreu dano ou afetação relevante da função, nomeadamente, o caminho não deixou de ser transitável fruto dos “buracos” existentes.

  14. Não existe assim, de acordo com a matéria provada, o dano relevante suposto pelo tipo objetivo de crime.

  15. No caso presente estamos perante conduta do recorrente, clara e inequivocamente dirigida à “danificação”, caso assim se entenda, de bens que a ele pertencem, já que o cimento que pavimenta o caminho do arguido, atentas as Leis civis, não pode ser considerada coisa alheia.

  16. Atenta a explicação dada pelo arguido para praticar tais factos, ao que acresce o peticionado ação executiva n.° 1 74/06.7TBCPV, resulta claro e óbvio que o arguido não podia ter atuado com a previsão e vontade de destruir danificar objeto/obra alheia contra uma imposição legal, ou seja não atuou com dolo.

  17. Caso se entenda que o arguido praticou a conduta criminosa de que vinha acusado sempre se dirá que a Meritíssima Juiz não poderia ter condenado ao arguido por dois crimes de dano, ocorrendo em manifesta violação do disposto no art. 30.°, n.° 2 CP.

  18. Já que, nos presentes autos estão reunidos os pressupostos do crime continuado.

    ● Nestes termos, E nos mais de Direito, Deverão … Dar provimento ao presente recurso, revogar a decisão proferida, substituindo-a por outra que absolva o arguido» [5].

    ADMITIDO o Recurso a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo para este TRP ut arts 399, 401-1-b, 406-1, 407-2-a, 408-1-a e 427 do CPP por Despacho a fls 322 notificado aos Sujeitos Processuais inclusive nos termos e para os efeitos dos arts 411-6 e 413-1 do CPP, o MINISTÉRIO PÚBLICO apresentou RESPOSTA a fls 325-332 concluindo que: 1. Após a comunicação a que alude o art. 358.°, n.° 1 e pode requerer a aplicação do disposto no art. 16.°, n.° 3 do C.P.P., continuando o processo a ser julgado em Tribunal Singular.

  19. A alteração da qualificação jurídica impõe uma prévia comunicação ao arguido para que este, querendo, possa requerer prazo para preparar te adequar a sua defesa à nova qualificação jurídica, assim se evitando decisões surpresa.

  20. No caso vertente o Tribunal não procedeu a tal comunicação como se impunha, o que implica que a decisão proferida tenha de ser revogada e ordenada a descida do processo à primeira instância para que se proceda a tal comunicação ao arguido.

  21. O Tribunal, apreciou livremente a prova produzida, fazendo uma correcta e objectiva interpretação da globalidade da prova produzida, tendo em conta as regras da experiência e a normalidade e a causalidade das coisas.

  22. O recurso sobre a matéria de facto não funciona como um segundo julgamento, devendo o Tribunal da Relação limitar-se a fazer uso do seu poder de alteração da decisão de facto quando resulte inequivocamente da gravação dos depoimentos que a decisão não tem suporte no que foi dito pelas testemunhas; ou que a apreciação da prova na sua globalidade impõe necessariamente uma decisão distinta.

  23. Não é esse o caso do presente processo, encontrando-se a factualidade provada assente na prova testemunhal produzida.

  24. O nosso ordenamento jurídico, à semelhança do que acontece no crime de furto, não estabelece um valor mínimo para que a destruição total ou parcial de uma coisa seja penalmente relevante. O diminuto valor da coisa danificada deverá ser relevada apenas em sede de determinação da medida da pena, como aconteceu.

  25. Com a sua actuação o arguido desfigurou, e destruiu parcialmente tal caminho, dificultando o acesso da ofendida a sua casa, pessoa idosa e com dificuldade de se deslocar, potenciando ainda que a água que se passou a acumular no local escorra para dentro da casa da mesma.

  26. O arguido sabia perfeitamente que tal cimento havia sido colocado pela ofendida a sua expensas, mas mesmo assim entendeu destruir o mesmo, o que integra o elemento subjectivo do crime de dano.

  27. O caso vertente não configura um crime continuado uma vez que o arguido preencheu por 2 vezes a factualidade típica, com um intervalo temporal de mais de um mês, de forma distinta e sem que se verifique qualquer elemento externo que permita concluir pela diminuição da culpa do mesmo.

  28. Assim, deverá o presente Recurso proceder nos termos supra descritos, assim se fazendo a habitual, JUSTIÇA» [6].

    Em Vista ut art 416-1 do CPP o Exmo Procurador da República servindo como Procurador Geral Adjunto emitiu a fls 338-342 II o seguinte PARECER: «II – Nulidade da sentença por violação das regras de competência.

    O arguido foi acusado da prática de um crime de dano, no entanto, a Mm.a Juiz a quo entendeu que o factualismo que lhe era imputado (que se deu integralmente por provado em audiência de julgamento) consubstanciava a prática de dois crimes de dano.

    Acontece que tal qualificativa determinava a alteração da competência do Tribunal, por força do disposto no art.° 14.°, n.° 2, al. b), do Código de Processo Penal, uma vez que o limite máximo da pena excedia os cinco anos de prisão.

    Defende o Exm.° Procurador-Adjunto (e bem) que, após a comunicação a que alude o art.° 358.°, n.°s 1 e 3, do Código de Processo Penal, o Ministério Público poderia requerer a aplicação do disposto no art.° 16.°, n.° 3, do mesmo diploma, continuando o processo a ser julgado em Tribunal Singular, na esteira, aliás, do defendido por Paulo Pinto Albuquerque («Comentário do Código de Processo Penal», 3ª Ed. pág. 906).

    O problema é que, no caso dos autos, a Mm.a Juiz não cumpriu o art.° 358.° do Código de Processo Penal e, consequentemente, não deu oportunidade ao Ministério Público de usar da faculdade prevista no art.° 16.°, n.° 3, do Código de Processo Penal.

    Ou seja, a Mm.a Juiz proferiu decisão num processo em que estava em causa a possibilidade de aplicação abstracta de uma pena de prisão superior a cinco anos e sem que o Ministério Público tivesse requerido a intervenção do Tribunal Singular, violando, assim, as regras da competência.

    Tal actuação constitui uma nulidade insanável ex vi do disposto no art.° 119.°, aI. e), do Código de Processo Penal.

    III) — Nulidade da sentença por incumprimento do art.° 358.° do Código de Processo Penal.

    Estatui o art.° 379.°, n.° 1, aI. b), do Código de Processo Penal que é nula a sentença que condenar por factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, fora dos casos e das condições previstos nos art.°s 358.° e 359.º.

    O n.° 3 do art.° 358.° equipara a alteração da qualificação jurídica à alteração não substancial de factos...

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