Acórdão nº 11028/09.5TDPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelV
Data da Resolução24 de Setembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso nº 11028/09.5DPPRT.P1 Origem: 2ª Secção do 2º Juízo Criminal do Porto Acordam, em conferência, na 1ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto: I – Em processo comum com intervenção de tribunal singular, o Ministério Público acusou B…, filha de C… e de D…, natural da freguesia …, concelho de Vila Nova de Gaia, nascida em 26/11/1962, divorciada, com residência na Rua …, .., …, Vila Nova de Gaia, portadora do B.I. nº ……., e E…, filho de F… e de G…, natural da freguesia …, concelho do Porto, nascido em 02/06/1960, com residência na Rua …, …, …, .° Esq., …, Vila Nova de Gaia, portador do B.I. nº ……., atualmente preso no Estabelecimento Prisional do Porto, imputando-lhes a coautoria de um crime de emissão de cheque sem provisão previsto e punido pelo artigo 11.º, n.º 1, al. b), do DL 454/91, de 28/12, na redação introduzida pelo DL 316/97, de 19/11 e considerando as alterações decorrentes da Lei nº 48/2005, 29/08 e artigo 26º do C. Penal.

“H…, S.A.,” deduziu pedido de indemnização civil contra os arguidos/demandados.

A final da audiência de julgamento, foi proferida sentença, em que se decidiu: A) Condenar a arguida B… como coautora de um crime de emissão de cheque sem provisão, na forma consumada, p. e p. pelos arts. 11.º, n.º 1 al. b) do DL 454/91, de 28-12, na redação do DL 316/97 de 19-11 e Lei nº 48/05, de 29-08 na pena de 60 (sessenta) dias de multa, à taxa diária de € 5 (cinco euros), num total de € 300 (trezentos euros); B) Condenar o arguido E… como coautor de um crime de emissão de cheque sem provisão, na forma consumada, p. e p. pelos art. 11.º, n.º 1 al. b) do DL 454/91, de 28-12, na redação do DL 316/97 de 19-11 e Lei nº 48/05, de 29-08, na pena de 5 (cinco) meses de prisão; C) Julgar totalmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido, e, em consequência condenar solidariamente os demandados a pagarem à demandante “H…, SA” a quantia de € 452,87 (quatrocentos e cinquenta e dois euros e oitenta e sete cêntimos), acrescida de juros vencidos desde 14-05-2009 à taxa anual de 4% (Portaria 291/03, de 08-04), e ainda os vincendos, à taxa legal que vigorar até integral pagamento (…).

Inconformado com o assim decidido, veio o arguido E… interpor o presente recurso, cuja motivação condensou nas seguintes conclusões: «1. O Tribunal a quo condenou o arguido E… pela prática, em coautoria, de um crime de emissão de cheque sem provisão, na forma consumada, previsto e punível pelo disposto no artigo 11º, n° 1, al. b), do DL n.º 454/91, de 28 de Dezembro, numa pena de prisão efetiva de 5 meses; 2. Não se conformando com a mesma, o arguido vem desta decisão interpor recurso; 3. A Sentença encontra-se ferida de nulidade, porquanto a Mª Sra. Juiz a quo não se pronunciou sobre dois documentos que foram juntos em audiência pelo arguido E…, mais precisamente duas certidões, uma relativa à Sentença proferida no processo que sob o n.º 17187/09.0TDPRT correu termos no 3º Juízo Criminal, 1ª Secção do Tribunal dos juízos Criminais do Porto, e outra relativa ao processo que com o nº 423/10.7TDPRT correu termos no 3.° Juízo Criminal, 2ª Secção dos Juízos Criminais do Porto, constantes a fls. dos autos; 4. A relevância destes documentos decorre do facto de nestes dois processos o aqui arguido E… ser ali testemunha indica da pelo Ministério Público, tendo o seu depoimento, quer em sede de inquérito, quer em sede de julgamento, sido essencial à condenação da arguida B… pela prática de vários crimes de emissão de cheques sem provisão; 5. Acresce que, maior é a relevância desses documentos, quando em ambos, como neste em que se apresenta recurso da Sentença proferida, a arguida B… apresenta a mesma versão dos factos, pretendendo imputar ao arguido C… a responsabilidade por todos os atos praticados por si, desde a abertura da conta até à comunicação ao banco do extravio dos cheques emitidos; 6. Com a acrescida importância decorrente do facto de a conta sobre a qual foram sacados pela arguida B… os cheques emitidos no processo nº 17187/09.0TDPRT, do 3.° Juízo, 1ª Secção, ser a mesma que foi objeto dos presentes autos, sendo que num e noutro processo os resultados foram bem diversos (neste processo foi o arguido E… condenado, tendo no outro sido testemunha indicada pelo Ministério Público, não colhendo a versão também aí apresentada pela arguida B…); 7. Não se tendo a Mª Sra. Juiz "a quo" pronunciado sobre estes documentos, máxime sobre a certidão que evidenciava o facto de haver decisões contraditórias sobre a forma como a mesma conta bancária teria sido aberta junto do banco, prejudicou de forma decisiva os direitos de defesa do arguido, uma vez que não se pronunciou sobre um argumento decisivo dessa defesa, que portanto ficou sem qualquer valoração ou análise; 8. Com esta omissão de pronúncia sobre um facto que foi trazido pelo arguido à audiência de julgamento para suportar a sua defesa, o tribunal a quo não se pronunciou sobre questão relativamente à qual teria de tomar posição, o que gera a NULIDADE DA SENTENÇA, o que expressamente se invoca, nos termos do disposto no artº 379.°, nº 1, al, c) do Código de Processo Penal; 9. Para além de este comportamento do julgamento ser uma demonstração de que não foram asseguradas ao arguido C… todas as garantias de defesa que lhe deveriam ter sido asseguradas, havendo a ressaltar esta clara violação do disposto da garantia constitucional decorrente do disposto no artº 32.°, nº 1, da Constituição da República.

10. Dispõe o artigo 355° do Código de Processo Penal que: "1 - Não valem em julgamento, nomeadamente para o efeito de formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido prestadas ou examinadas em audiência. 2 - Ressalvam-se do disposto no número anterior as provas contidas em atos processuais cuja leitura, visualização ou audição em audiência sejam permitidas, nos termos da lei." Ou seja, via de regra, apenas a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento será válida para que o tribunal forme a sua convicção.

11. Continua o artigo 124° do Código de Processo Penal estipulando que "constituem objeto de prova todos os factos juridicamente relevantes para a existência ou inexistência do crime, a punibilidade ou não punibilidade do arguido e a determinação da pena ou da medida de segurança aplicáveis".

12. Assim, devem as testemunhas ser ouvidas sobre os factos de que tenham conhecimento direto e constituam objeto de prova (artigo 128°, nº 1 Código de Processo Penal) e não sobre outros a serem analisados noutras sedes.

13. No caso sub iudice, tribunal a quo deu como provados todos os factos constantes da acusação. E fê-lo referindo que o fazia com base na prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, tal como previsto no artigo 355° do CPP.

14. Contudo, nenhuma das testemunhas ouvidas em audiência tinha conhecimento direto dos mesmos, como o próprio afirma no texto da sua decisão: "O tribunal formou a sua convicção quanto ao julgamento da matéria assente na conjugação crítica da prova produzida, à luz das regras da experiência, atendendo-se assim, designadamente, às declarações prestados pelos arguidos em audiência de julgamento (com destaque para as declarações da coarguida B…), aos documentos juntos aos autos e depoimento das testemunhas I…, J… e K… que apesar de não revelarem conhecimento direto e concreto da situação relativa ao cheque dos autos, mostram-se de interesse no esclarecimento da atuação conjunta dos arguidos, nos termos que melhor "infra" se explanam, com especial relevância do depoimento da primeira testemunha referida. (..) ".

15. A prova testemunhal está, nos termos do artigo 127º Código de Processo Penal, sujeita à livre apreciação do tribunal, sendo que esta tem, todavia, os seus limites.

16. De facto, a livre apreciação da prova não permite que o intérprete pretenda demonstrar um facto que se encontra em total contradição com os meios de prova que lhe servem de objeto; 17. No caso concreto, a Sentença dá como provados o conluio entre o arguido E… e a arguida B… para a abertura de conta por esta junto do L…, na emissão de cheque junto do hipermercado H… para aquisição de uma série de objetos, bem como a vontade concretizada de declarar o cheque emitido como extraviado, apenas com base nos depoimentos da arguida B…, reforçado pelo depoimento da testemunha I…; 18. Esta testemunha foi para a Ma Sra. Juíza a quo credível, não por ter presenciado qualquer facto constante da acusação, mas por ter narrado um caso ocorrido consigo em que o arguido E… terá atuado da mesma forma narrada nos presentes autos; 19. Sucede que, a Sentença omite por completo que o processo que a D. I… intentou contra o arguido E… pela eventual prática por este de factos semelhantes aos aqui trazidos foi objeto de despacho de arquivamento, já tornado definitivo, por não terem sido julgados como verificados quaisquer indícios da prática pelo arguido E… de qualquer crime; 20. A que acresce o facto, igualmente não valorado pela decisão agora em recurso, da D. I… ter referido que se encontrava de relações cortadas com o arguido E…, o que não acontecia com a arguida B…, situação geradora de uma natural parcialidade no depoimento prestado, o que não foi tido em conta.

21. E se a testemunha I… nada trouxe de válido, as restantes indicadas pela acusação nada de relevante trouxeram ao processo, uma vez que não presenciaram qualquer ato em que transparecesse, quer o acordo inicial para a abertura de conta junto do L…, quer qualquer dos restantes atos que cabia à acusação demonstrar para lograr a condenação do arguido E… pelos factos que lhe eram imputados; 22. Conclusões deste género são necessariamente violadoras de todos os princípios basilares do direito penal e processual penal; 23. A liberdade de apreciação prevista no artigo 127° do CPP não é completamente discricionária. Diz-nos o Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra de 16-10-2007, proferido no âmbito do processo n." 1238/07-1 (disponível in www.dgsi.pt) que...

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