Acórdão nº 994/14.9TTPNF.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Abril de 2015
Magistrado Responsável | RUI PENHA |
Data da Resolução | 13 de Abril de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo nº 994/14.9TTPNF.P1 Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto I. Relatório B…, residente na Rua …, nº …, …, patrocinado por mandatário judicial e beneficiando de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, veio intentar contra C…, Lda., com sede na …, nº …, Lote nº .., Marco de Canavezes, a presente acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento.
Foi designada e realizada a audiência de partes, não se tendo logrado obter acordo destas.
A ré apresentou articulado motivador, nos termos previstos no artigo 98º-J, do CPT, pedindo que se declare o despedimento do autor lícito.
Alega, em síntese: 1. O trabalhador vinha desempenhando, na altura da cessação do seu contrato de trabalho, as funções de Técnico de Cablagem, 2. Auferindo, como contrapartida da prestação de trabalho, a quantia mensal ilíquida de €625,00.
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Tendo sido despedido a 30/05/2014, na sequência de um processo disciplinar levado a cabo pelo Empregador.
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A aludida decisão de despedimento resultou da ponderação da gravidade e do grau de culpa das condutas do trabalhador.
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Em concreto, as condutas do trabalhador consubstanciam-se no seguinte: 6. O empregador procede ao registo dos tempos de trabalho através de sistema informático, vulgarmente denominado “relógio de ponto”.
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Cada trabalhador procede à “picagem” do ponto imediatamente antes de começar a trabalhar, bem como imediatamente após terminar a sua jornada laboral.
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Mensalmente o sistema informático emite mapa denominado “Resultados mensais por funcionário”, onde consta o registo de assiduidade de determinado trabalhador em determinado mês.
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No caso em apreço, o trabalhador tinha como horário de trabalho o seguinte: Das 08h00 às 12h30 e das 14h00 às 17h30.
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Ao longo de vários meses, que antecederam a abertura do processo disciplinar, o trabalhador desrespeitou, de forma sistemática o seu horário de trabalho, 11. Ora chegando constantemente atrasado, 12. Ora sem sequer comparecendo no seu posto de trabalho, sem dar conhecimento prévio desse facto, nem sequer apresentar justificação para a sua ausência.
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Com esse comportamento o trabalhador provocou prejuízos sérios ao empregador, uma vez que o mesmo efetua trabalho “em série”, pelo que a sua não comparência provocou atrasos no processo de laboração.
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Além disso o trabalhador violou também, de forma sistemática o dever de colaboração com os demais colegas, uma vez que de cada vez que faltava ou se atrasava outro colega tinha de ocupar o seu lugar, atrasando o seu próprio trabalho.
O autor veio contestar e reconvir, pedindo a condenação da ré a pagar ao A. a indemnização em substituição da reintegração no valor de €4.375,50, bem como condenada a pagar as retribuições devidas até ao trânsito em julgado da decisão final; e a pagar o valor de €503,35 relativo a trabalho suplementar.
Alega, em síntese: 1. O legal representante da Ré, na data de 27.03.2014, encontrava-se internado num Hospital em frança, em estado de coma e não chegou a recuperar o estado de saúde, pois veio a falecer uns dias antes da data de audiência de partes.
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A assinatura que consta quer da carta a comunicar o despedimento quer da carta a nomear instrutora, não é a assinatura do legal representante da Ré.
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Daqui resulta que a instrutora do processo disciplinar não tinha poderes para instruir o processo disciplinar, pelo que é nulo o processo disciplinar ou mesmo inexistente.
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O mandatário do A. respondeu à nota de culpa, juntou procuração e remeteu-a com a resposta à nota de culpa à instrutora do processo disciplinar.
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Na resposta à nota de culpa requereu a inquirição de testemunhas.
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A Sra. instrutora do processo disciplinar procedeu à inquirição de testemunhas, mas não notificou o mandatário do A. dessas diligências de inquirição de testemunhas, para querendo estar presente.
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A Ré impôs ao A. a prestação de trabalho suplementar em tal dimensão, que nem tão pouco lhe permitiu o descanso entre um período laboral e o seguinte, perfizesse as 11 horas legalmente previstas.
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Apesar de tudo isto, de não lhe ser pago o trabalho suplementar e de algumas das horas de trabalho que a Ré invoca como se de faltas ao trabalho se tratasse, são horas ou minutos em que o trabalhador inicia o horário de trabalho um pouco mais tarde por, no dia anterior ter trabalhado até às 24.00h ou mais.
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No período a que dizem respeito as alegadas faltas ao trabalho, que consistem essencialmente em alegados atrasos ao trabalho, só nesse período, o A. prestou 89 horas de trabalho suplementar, que não foi remunerado, sendo que parte desse trabalho suplementar foi prestado em horário nocturno, e para além disso não foi proporcionado o descanso compensatório.
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Atrasos esses que na realidade não ocorreram, pois havia um acordo em que se tolerava e permitia como forma de compensar a disponibilidade do A a prestar trabalho para além do horário de trabalho sempre que lhe era solicitado.
A ré respondeu, pugnando pela validade do processo disciplinar, e alegando ter pago o trabalho suplementar prestado autor.
Foi admitido o pedido reconvencional.
Foi proferido despacho saneador, que transitou em julgado, e fixado o objecto da prova, bem como a matéria de facto provada.
Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento, com gravação da prova produzida.
Foi proferida sentença, na qual decidiu: I. Declarar a licitude do despedimento do trabalhador B… efectuado pela empregadora “C…, Lda.” II. Absolver a empregadora “C…, Lda.” do pedido de condenação no pagamento da quantia de €4.375,50 (quatro mil e trezentos e setenta e cinco euros e cinquenta cêntimos) a título de indemnização em substituição da reintegração.
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Condenar a empregadora “C…, Lda.” no pagamento ao autor B… da quantia de €226,35 (duzentos e vinte e seis euros e trinta e cinco cêntimos).
Inconformado interpôs o autor o presente recurso de apelação, concluindo: 1. A matéria de facto dada como provada e não provada, carece de reapreciação, na medida em que a douta decisão deveria ter-se dado como provado que a assinatura que consta da carta referida em J) dos factos assentes não é a assinatura do legal representante da Ré, mas sim do superior hierárquico do A., o Sr. D… e, nesta medida, deveria ter dado como provado a al. c) dos factos não provados.
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Por outro lado, na al. f) dos factos não provados, foi dado como não provado que a “assinatura que consta da carta referida em s) dos factos não provados não é do legal representante da ré, mas sim de D…”.
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Deveria ter-se dado como provado esta matéria.
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Dos depoimentos prestados em audiência de julgamento nomeadamente dos depoimentos prestado pela testemunha E… e F…, as referidas testemunhas foram peremptórias em afirmar que o poder disciplinar foi exercido pelo superior hierárquico D… e reconheceram a assinatura aposta na carta a comunicar o despedimento como sendo a assinatura do D….
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Por outro lado, a Recorrida reconhece no seu articulado Resposta art. 5º quem exerceu o poder disciplinar foi o superior hierárquico D… (cfr art. 5º da resposta “Neste caso (como em todos os outros) o poder disciplinar foi exercido pelo superior hierárquico máximo do Autor, que, como este bem sabe, é o Director Geral da Ré o Exmo Sr. D…”.
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Dos autos não consta delegação de poderes disciplinares ao Sr. D….
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Quem outorgou procuração à ilustre mandatária da Recorrida e quem a nomeou instrutora do processo disciplinar, foi o legal representante da Ré.
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A ser assim, é o reconhecimento de que o poder disciplinar não estava delegado no Sr. D….
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Tendo a decisão de despedimento sido tomada por quem não tinha poderes, o procedimento disciplinar é inexistente, ou nulo, configurando-se a ilicitude do despedimento por falta de procedimento disciplinar, ao abrigo do artigo 381º do CT.
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O recorrente contestou a nota de culpa mediante mandatário por si constituído que juntou procuração com a referida contestação da nota de culpa.
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A instrutora do processo disciplinar inquiriu parte das testemunhas arrolados na defesa, uma vez que referiu que uma delas não compareceu e outra se recusou a assinar o auto de declarações.
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A instrutora do processo disciplinar não notificou o mandatário do recorrente da diligência de inquirição de testemunhas.
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Por essa razão não pode confirmar ou infirmar a ausência de uma testemunha ou recusa de uma outra em assinar o auto de declarações.
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O arguido tem o direito a um processo justo, o que passa pela explicação de algumas regras e princípios de defesa constitucionalmente estabelecidos para o processo penal. (ar. 32º, nº 3 e 5 da CRP).
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Esse direito de defesa passa pelo seu mandatário acompanhar as diligências de inquirição de testemunhas.
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O Recorrente foi despedido com justa causa por faltas ao trabalho.
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É certo que as faltas ao trabalho são uma das causas justificativas do despedimento nos termos do disposto no art. 351º do CT, contudo, para isso, impõe-se que se verifique o requisito previsto no nº 1 do art. 351º do CT, isto é, é necessário que se demonstre que o comportamento culposo do trabalhador, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.
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Impõe ainda a lei – art. 351º, nº 2 al. g) do CT que as faltas ao trabalho determinem directamente prejuízos ou riscos graves para a empresa.
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A verdade é que a Recorrida não alegou nem provou a gravidade que os atrasos ao trabalho provocaram na organização da Ré, apenas referiu ter ocorrido perturbação na organização do trabalho e que o trabalhador foi substituído por outro.
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A lei só não exige a demonstração do prejuízo ou gravidade quando as faltas ao trabalho em cada ano civil atinjam cinco seguidas ou dez interpoladas.
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O recorrente, quer no ano civil de 2013, quer no ano civil de 2014, não atingiu cinco faltas seguidas ou dez interpoladas.
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Pois as faltas ao trabalho consistem em atrasos ao trabalho, e nesses casos em que ocorreram...
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