Acórdão nº 145/06.3TTMAI-G.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 27 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelEDUARDO PETERSEN SILVA
Data da Resolução27 de Abril de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 145/06.3TTMAI-G.P1 Apelação Relator: Eduardo Petersen Silva (reg. nº 444) Adjunto: Desembargadora Paula Maria Roberto Adjunto: Desembargadora Fernanda Soares Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório Na execução que corre termos sob o nº 145/06.3TTMAI.1 e em que é exequente B… e executada C…, S.A., da sentença proferida em 2.4.2013, no âmbito do processo 145/06.3TTMAI-F, intentado pelo exequente contra D…, E…, F…, C…., S.A.” foi proferida sentença de cuja parte dispositiva consta: “(…) declaram-se ineficazes os negócios de compra e venda celebrados entre “G…, Ldª” e “C…, S.A.” dos veículos melhor identificados em II – 69 supra, necessários à satisfação do crédito remanescente do autor reconhecido nos processos nº 7/05 e 596/05, que os poderá executar conforme dispõe o artigo 616º/1 do Código Civil.

No mais absolvem-se os Réus do pedido”.

Após comunicação da agente de execução no sentido de que “os veículos, melhor identificados em II-69 da sentença condenatória que deu origem aos presentes autos, já não constam das pesquisas, em anexo, como sendo da propriedade da Executada”, veio o exequente pedir o prosseguimento da execução com penhora de bens próprios da executada para obter o pagamento da quantia exequenda, a saber a penhora dos saldos das contas bancárias da executada, pois que “verificando-se que a mesma já não é proprietária dos bens, e tendo ficado provado que a adquirente, aqui executada, adquiriu os mesmos de má-fé, mantém-se a responsabilidade da executada nos termos legalmente previstos”.

Sobre este pedido recaiu o despacho de fls. 104 e ss. deste apenso, que sobre a questão de saber se a execução pode prosseguir sobre outros bens da executada que não aqueles identificados na sentença que foi dada à execução, o indeferiu, após concluir que “Temos para nós (…) que tal pedido terá de ser formulado em nova acção de impugnação pauliana, agora na modalidade prevista no nº 2 ou no nº 3 do artigo 616º, não podendo proceder no âmbito da presente execução, desde logo, por extravasar o título executivo (…)”.

Inconformado, interpôs o exequente o presente recurso, apresentando a final as seguintes conclusões: 1. Nos presentes Autos o título executivo é uma Sentença transitada em julgado, sendo pacífico que é pelo título que se determina o fim e os limites da acção executiva – cfr. nº 5 do artigo 10º do CPC.

  1. A sentença não é composta apenas pela sua parte dispositiva, fazendo parte integrante da mesma o relatório, fundamentos, decisão e aspectos complementares.

  2. A acção executiva que tem por objecto uma sentença condenatória é pois o instrumento concedido pelo ordenamento jurídico para assegurar a realização efectiva das pretensões materiais incorporadas no título executivo.

  3. Ou seja, o processo executivo tem por fim garantir a eficácia da sentença proferida na acção declarativa, como refere Miguel Teixeira de Sousa, in “Estudos sobre o novo processo civil, II Edição”, “Este processo é, neste caso, o instrumento do instrumento que é a acção declarativa, ou, noutros termos, a garantia da garantia”.

  4. Nos termos previstos no artigo 55º do CPC “A execução fundada em Sentença condenatória pode ser promovida não só contra o devedor, mas ainda contra as pessoas em relação às quais a Sentença tenha força de caso julgado”.

  5. É manifesto que a sentença proferida tem força de caso julgado contra a aqui executada, que foi parte na acção declarativa que deu origem à mesma.

  6. Impõe-se pois apreciar o conteúdo da Sentença proferida e que constituiu o título executivo nos presentes autos.

  7. Na sentença proferida foram julgados verificados e provados os requisitos legalmente previstos para a procedência da requerida impugnação pauliana. Designadamente, foi apreciada a conduta da executada, estando provado nos autos que a mesma agiu com declarada má-fé.

  8. Como melhor consta do Acórdão do TRP, de 04/02/2014, in www.dgsi.pt, as acções paulianas “Concebidas como meio de conservação da garantia geral de cumprimento das obrigações, aquele tipo de acções, contrariamente ao que acontecia no Código de Seabra, em que era encarada como uma acção rescisória ou anulatória (artigo 1044º desse Código), revestem, presentemente, apenas um carácter pessoal ou obrigacional [2]; isto é, o credor, nessas acções, exerce um direito de crédito à eliminação do prejuízo que lhe causaram os actos de natureza patrimonial praticados pelo devedor com influência negativa no seu património, seja em virtude da diminuição do correspondente activo, seja pelo aumento do respectivo passivo. Em qualquer caso, verificados os pressupostos legais, o credor tem direito a ver negada a eficácia de qualquer um dos referidos actos em relação a si próprio. Mas não só. O credor tem direito igualmente à restituição dos bens, na medida do seu interesse, podendo executá-los no património do obrigado à restituição ou, sendo esta última inviável, o valor do bem transmitido ou o enriquecimento obtido com a sua aquisição, consoante a adquirente esteja de boa ou má fé (artigo 616º, nº 1 a 3, do Código Civil)” – sublinhado nosso.

  9. E, é desta última faculdade que o exequente nos presentes autos pretende lançar mão, ou seja, verificando-se, como se verifica, inviável a execução dos bens transmitidos no património do obrigado à restituição, tem necessariamente que admitir-se a possibilidade de o mesmo poder executar no património de tal obrigado (a aqui executada) o valor correspondente.

  10. Para o uso de tal expediente não está o exequente obrigado a intentar nova acção declarativa uma vez que do título executivo (sentença condenatória) constam já todos os elementos necessários à finalidade pretendida.

  11. Com efeito, da Sentença que constitui o título executivo nos presentes autos resulta provado que o negócio de transmissão dos bens foi um negócio oneroso, e que a executada agiu de má-fé, porque tinha conhecimento na qualidade de adquirente dos bens, que o vendedor com a referida venda se pretendeu colocar em posição de nada poder pagar ao aqui Exequente (cujos créditos, recorde-se, estão reconhecidos por diversas sentenças já transitadas em julgado).

  12. Reitera-se, assim, que, porque a executada foi parte na acção de impugnação pauliana que precedeu a presente execução, está a mesma abrangida pela força do caso julgado decorrente de tal decisão, respondendo a mesma pela manutenção da garantia patrimonial do crédito do exequente.

  13. Assim, o expediente previsto no nº 2 do artigo 616º do Código Civil (ou seja a responsabilidade do adquirente de má-fé pelos bens que tenha alienado) é o corolário lógico inerente à Sentença proferida e aos princípios que fundamentam a mesma, constando já do título executivo todos os factos necessários à aplicação do sobredito preceito legal.

  14. Afigura-se evidente que o facto de na sentença constar a menção apenas ao nº 1 do artigo 616º do CC (proferida neste termos atenta a factualidade conhecida à data), não é impeditivo de agora, e perante a nova factualidade apurada, como condição de exequibilidade efectiva da sentença proferida, aplicar-se o disposto no nº 2 de tal preceito legal.

  15. Até porque, para tanto, constam já da referida sentença, os elementos necessários a tal, sendo certo que não estamos perante realidade ou sujeitos diversos, mas apenas perante a actuação legal necessária e ao alcance do julgador para permitir a efectiva exequibilidade de tal sentença.

  16. Com efeito, o Exequente só agora tomou conhecimento do facto de os referidos bens já não integrarem o património da executada, sendo certo que a alienação dos mesmos ocorreu após a citação da executada para a acção declarativa de impugnação pauliana no âmbito da qual foi proferida a sentença dada à execução.

  17. De outro forma, tal decisão judicial (confirmada por acórdão deste Venerando Tribunal) constitui um documento vazio e sem qualquer efeito prático, ou útil, estando encontrada a forma de contornar os efeitos decorrentes da procedência de uma acção de impugnação pauliana.

  18. Tal entendimento, é uma absoluta sonegação de justiça, com que aliás o exequente se tem vindo a deparar nos últimos anos, conforme decorre do historial de processos apensos ao presente.

  19. A necessidade de intentar nova acção declarativa para julgar factos que já se encontram julgados e decididos em definitivo na sentença que constitui o título executivo nos presentes autos, coloca o exequente na posição de ser confrontado com a excepção de caso julgado.

  20. Com efeito, tal hipótese só seria de considerar se o exequente pretendesse atingir o património de um terceiro adquirente dos bens que não tivesse sido parte na acção pauliana – o que não é manifestamente o caso.

  21. Passando agora à análise da decisão recorrida, não pode deixar de concluir-se, o Tribunal a quo convoca para fundamentação da sua decisão, entre outros, o acórdão deste Venerando Tribunal proferido a 06/07/2010 no processo 772/10.4TTBVNG-B.P1.

  22. Salvo melhor opinião, e uma vez consultado tal aresto, conclui-se que não existe paralelismo entre as situações apreciadas, não podendo ser aplicadas aos presentes autos as conclusões contidas no mesmo.

  23. Sendo manifesto que do mesmo não resultam sequer as conclusões contidas no Despacho ora em crise, designadamente a necessidade de propositura de uma nova acção de impugnação pauliana para aplicação do disposto no nº 2 do artigo 616º do CPC.

  24. O que consta do citado acórdão é tão só que: “Todavia, os efeitos da impugnação pauliana não se esgotam na possibilidade do credor executar o bem dela objecto no património do obrigado à restituição (o adquirente).

    O instituto da impugnação pauliana destina-se não à restauração do património do devedor mas antes à reconstituição da garantia patrimonial do crédito do impugnante – neutralizam-se algumas das consequências do acto impugnado relativamente ao credor impugnante, sem que a validade do acto impugnado seja afectada, numa demonstração da sua filiação nos quadros da ineficácia stricto sensu; os bens alienados...

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