Acórdão nº 1529/14.9TBPRD.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelVIEIRA E CUNHA
Data da Resolução14 de Abril de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

● Rec.1529/14.9TBPRD.P1. Relator – Vieira e Cunha. Adjuntos – Des. Maria Eiró e Des. João Proença Costa. Decisão de 1ª instância – 14/01/2015.

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto Súmula do Processo Recurso de apelação interposto na acção com processo especial de Revitalização nº1529/14.9TBPRD, da Instância Central da Comarca de Porto Este, Secção de Comércio.

Apelante / Requerente – B…, S.A.

Apelados/Credores Reclamantes – C…, S.A., e Estado Português (Autoridade Tributária e Aduaneira).

Tese da Requerente É uma sociedade comercial que tem por objecto a construção civil e a compra e venda de imóveis, com experiência em obras públicas, a nível nacional.

Fez investimentos avultados na área da concessão e abastecimento de águas, em empresa que não lhe reembolsou suprimentos, e em tecnologias de aberturas sem vala.

Todavia, a crise das obras públicas, nacional e mundial, reflectiu-se na Requerente, tornando os seus rendimentos insuficientes para prover ao passivo.

A Requerente foi declarada insolvente em 2011, e foi submetida a plano de insolvência, que vem cumprindo.

A sua recuperação, possível, no momento actual de recuperação económica, passa por uma medida suplementar de revitalização, tal como prevista no CIRE.

Foi admitido liminarmente o processo, por despacho judicial, e nomeado administrador provisório. Foram citados os credores constantes da relação respectiva.

Pelo Administrador Judicial Provisório foi junto o resultado da votação a que se refere o artº 17º-F nº4 CIRE, relativa ao plano de recuperação, com menção de que o mesmo foi aprovado por credores que representam € 65.762.144,58, tendo votado contra credores que representam € 8.626.828,68, entre eles a Autoridade Tributária e Aduaneira, com um crédito de € 10.441,63.

Foi reconhecido o crédito da Fazenda Nacional, como crédito privilegiado, por se ter vencido nos doze meses anteriores ao início do processo de insolvência – artº 97º CIRE.

A Fazenda Nacional votou contra a aprovação do Plano – cfr. fls. 1073 a 1076 – por se prever o pagamento das dívidas por compensação de créditos de IVA, por tais créditos serem futuros e incertos.

Igualmente o credor C… votou contra a aprovação do Plano, com base em que o plano de recuperação estabelece uma diferenciação injustificada entre os créditos comuns e garantidos já anteriormente reconhecidos no âmbito do plano de insolvência homologado no pº nº 2892/11.9TBPRD e os créditos constituídos após a aprovação do mesmo, no que diz respeito ao prazo de pagamento e ao número de prestações, em manifesto prejuízo dos primeiros.

Foi assim proferida a sentença judicial de que se recorre, a qual decidiu recusar o Plano de Recuperação, por força do disposto nos artºs 17º nº 5 e 215º do CIRE.

Conclusões do Recurso de Apelação: 1º O recurso aqui em análise, tem por objecto a douta decisão de não homologação do Plano de Recuperação, sujeito a apreciação e votado favoravelmente pelos Credores, decisão essa proferida em 14.01.2015, com a qual a Recorrente não se pode conformar.

2º De facto, o Tribunal, tendo por referência o voto da AT contra o Plano apresentado pela Requerente, decidiu pela não homologação do aludido Plano, fundamentando a sua decisão na alegada violação de normas imperativas de natureza fiscal (indisponibilidade dos créditos fiscais), mais considerando que, “… a homologação do plano de insolvência sem consentimento da Fazenda Nacional constitui violação não negligenciável das normas imperativas que a estabelecem, atento o vertido no artigo 30º/2, da LGT …” 3º Salvo o devido respeito (que é o maior) sem razão. Isto porque, D.1. DA NEGLIGENCIABILIDADE DAS NORMAS TRIBUTÁRIAS PERTINENTES 4º No caso concreto é de sublinhar, desde já, o seguinte: • O Plano apresentado pela aqui Recorrente (e aprovado pela maioria dos Credores) não prevê qualquer redução ou perdão de capital devido à AT, mas sim e apenas a sua compensação com créditos de IVA.

• A AT não teve o cuidado (sequer) de apurar se havia (ou não) créditos de IVA a favor da Recorrente (do que resultaria a não violação dos invocados preceitos legais, já que a haver tais créditos a compensação poderia ser imediata…).

• Num universo de créditos no valor global de 74.388.973,26 euros, votaram contra o Plano credores representativos de (apenas) 8.626.828,68 euros (ou seja, representativos de pouco mais de 10%...!), sendo que a AT é titular de um crédito “insignificante”, quantificado em 10.441,63 euros, correspondente a cerca de 0,014% do total dos créditos.

• A compensação de créditos proposta (entre a Recorrente e a AT) é um meio idóneo de cumprimento e consequente extinção de obrigações.

5º Perante este enquadramento concreto a AT (no mínimo), de forma diligente, sempre poderia (deveria…) apurar se tais créditos existiam (ou não), para então votar.

6º Mas não foi isso o que fez, já que, insensível à situação de dificuldade em que se encontrava a Recorrente e os seus legítimos interesses (bem assim como dos seus trabalhadores, credores, giro comercial, etc.) e sem atender ao valor diminuto do seu invocado crédito, não se deu (sequer…) ao trabalho de verificar se tais créditos compensatórios existiam (ou não), limitando-se a votar contra o Plano.

7º Do que sempre resultaria, que a atitude da AT incorreu num manifesto abuso de direito (art. 334 do CC), por ofensa grosseira à boa fé e bons costumes - Abuso de direito que aqui se deixa alegado para todos os efeitos legais.

8º De todo o modo, tendo em conta o enquadramento fáctico evidenciado nos autos, cumpre apreciar se uma violação de normas de direito fiscal no presente caso (a existir) seria (ou não) negligenciável, podendo-se desde já adiantar que, qualquer eventual violação do disposto nos artigos 30, nº 2 e 3 e 36, nº 2 da LGT, não consubstancia, no caso concreto, uma violação não negligenciável de regras procedimentais ou normas aplicáveis ao seu conteúdo.

9º Tal é a orientação largamente maioritária da Jurisprudência [entre muitos outros confrontar os doutos Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra (Acórdão no Proc. 1285/12.5TBMPS-F.C1, de 01.04.2014) e do Supremo Tribunal de Justiça (Acórdão no Proc. 3525/12.1TBPTM-A.E1.S1, de 09.07.2014)], cuja douta fundamentação aqui se dá por integrada e reproduzida (e que aliás se encontra parcialmente transcrita nas alegações supra), limitando-se a Recorrente, nesta sede conclusiva, a transcrever o referido Acórdão do STJ num pequeno excerto que é elucidativo: “… II – Estando em causa um crédito da Fazenda Nacional correspondente a 3,46% do montante global dos créditos e tendo o plano de recuperação do devedor sido aprovado por credores titulares de 75,63% daquele montante, pode ser havida como negligenciável, atenta a natureza e finalidade associadas ao direito insolvencial, a violação de normas tributárias aplicáveis ao conteúdo do plano”.

10º Ora, no presente caso, o Plano apresentado mereceu o voto favorável dos credores representantes de aproximadamente 88,40% dos créditos, representando a AT, como se disse, 0,014% dos mesmos.

11º Assim e pelos argumentos supra expendidos, no caso aqui em apreço, mais evidente (gritante e notória) se mostra a negligenciabilidade das normas em causa (ainda que houvesse uma violação das mesmas, o que a AT não se deu, sequer, ao trabalho de verificar).

12º Termos em que e no caso concreto, só se pode concluir que qualquer eventual violação do disposto nos artigos 30, nº 2 e 3 e 36, nº 2 da LGT, não consubstancia uma violação não negligenciável de regras procedimentais ou normas aplicáveis ao seu conteúdo.

13º Isto é, Ao decidir como decidiu, o Tribunal violou, por erro de interpretação e ou aplicação as disposições aplicáveis ao caso, designadamente os preceitos legais supra invocados (designadamente os arts. 30, nº 2 e 3 e 36, nº 2 da LGT; 97, 192, 215 do CIRE; 58, 59 e 61 da CRP), do que decorre dever a mesma ser anulada e ou pelo menos revogada, no sentido antes referido (ou seja, de considerar negligenciável qualquer eventual violação do disposto nos arts. 30, nºs 2 e 3 e 36, nº 2 da LGT). Sem prescindir, D.2. DA (INDEVIDA) NÃO HOMOLOGAÇÃO DO PLANO 14º Mas ainda que assim não fosse e se considerasse que a violação eventualmente verificada era não negligenciável (no que não se concede e só se admite por mero dever de ofício), nunca a mesma seria passível de importar a não homologação do Plano como um todo. Na verdade, 15º O Plano de Recuperação deve consubstanciar uma ampla liberdade de estipulação dos credores da Requerente do processo de revitalização, constituindo aquele um negócio atípico.

16º Exactamente por isso, no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 08.05.2014 (proferido no processo 7965/13.0T2SNT.L1-2) foi decidido que “… tendo sido aprovado o Plano de Recuperação da empresa “A”, sem que a Fazendo Nacional o haja aprovado ou haja anuído quanto à modificação do seu crédito, tal Plano não lhe é oponível, pelo que a decisão que o homologou deverá manter-se, com a ressalva que o plano de recuperação da empresa “A” é ineficaz em relação ao credor Fazenda Nacional.”.

17º Os nossos Tribunais têm procedido à homologação do Plano Especial de Revitalização aprovado, ainda que impondo, em determinados casos, algumas alterações ao mesmo.

18º E ao nível dos Tribunais da Relação tem-se admitido que um plano de recuperação aprovado pelos credores, sem respeitar o regime previsto nas leis tributárias, possa ser homologado, restringindo os seus efeitos relativamente aos créditos do Estado ou da Segurança Social, que não hajam por estes sido aprovados ou obtida a competente e necessária autorização – entre muitos outros, vide Acs. R.G. de 18.06.2013 (Pº 4021/12.2TBGMR.G1) e de 15.10.2013 (Pº 8604/12.2TBBRG.G1), Ac. R.P. de 26.11.2013 (Pº 1071/12.2TYVNG.P1), Ac. R.G. de 06.03.2014 (Pº 643/13.2TBBCL-AG1) todos disponíveis in www.dgsi.pt.

19º E para ilustrar tal entendimento, veja-se, a argumentação sustentada no Ac. R.G. de 06.03.2014 (Pº 643/13.2TBBCL-AG1): “… Ora, verificando-se que o plano de recuperação...

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