Acórdão nº 7302/08.6TBMTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelFERNANDO SAM
Data da Resolução10 de Novembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 7302/08.6TBMTS.P1 Da Comarca do Porto – Instância Local de Matosinhos – Secção Cível – J4, à qual foi distribuído após a extinção do Tribunal da Comarca da mesma localidade, onde fora distribuído ao 6.º Juízo Cível, após entrada na longínqua data de 28/10/2008.

Relator: Fernando Samões 1.º Adjunto: Dr. Vieira e Cunha 2.º Adjunto: Dr.ª Maria Eiró*Acordam no Tribunal da Relação do Porto – 2.ª Secção: I. Relatório B…, NIPC ………, com sede na Rua …, n.º …, ..º andar, salas ../.., Porto, instaurou acção declarativa com processo sumário contra C…, divorciado, motorista, residente na Rua …, n.º …, …, Matosinhos, pedindo que o réu seja condenado a pagar-lhe a quantia de 8.915,00 €, acrescida de juros legais desde 30/4/2008.

Para tanto, alegou, em resumo, que prestou serviços, a pedido do réu, no âmbito da actividade da advocacia dos seus sócios, em processos que moveu contra a sua entidade patronal, importando os honorários em falta em 9.315,00 €, quantia correspondente a 20% do valor proposto por aquela entidade para efeitos de transacção (50.000,00 €), que o réu recusou, deduzida do valor de 684,75 € (correspondentes a 20% do que acabou por receber após condenação - 3.423,75 €), que já recebeu, a qual, depois de deduzida a quantia de 400 €, que recebeu a título de provisão, importa em 8.915,00 €, que o demandado não pagou, não obstante ter sido interpelado em 30/4/2008.

O réu contestou por impugnação e por excepção, invocando, em síntese, a falta de alegação de factos essenciais à satisfação da pretensão, o cumprimento defeituoso, a nulidade do critério utilizado na fixação dos honorários por se traduzir em quota litis, legalmente proibida, o não cumprimento do contrato e a inexigibilidade dos juros, concluindo pela sua absolvição do pedido.

A autora respondeu defendendo a improcedência das excepções invocadas.

Proferido despacho saneador tabelar e dispensada a condensação, foi pedido laudo à Ordem dos Advogados, por sugestão da autora, que, depois de obtido, só foi notificado ao réu no dia designado para a audiência de julgamento, o que, por não ter prescindido do prazo de vista, determinou o seu adiamento, acabando a mesma por ser realizada, depois de incidentes para aqui irrelevantes, apenas em 16 de Abril de 2015.

E, em 27/4/2015, foi lavrada sentença, em cujo dispositivo consta: “Pelo exposto julgo a presente acção parcialmente procedente e: 1. condeno o réu a pagar à autora a quantia de €5,000,00 (cinco mil euros); 2. julgo improcedentes as demais excepções invocadas”.

Inconformado com o assim decidido, o réu interpôs recurso para este Tribunal e apresentou as suas alegações com as seguintes raras, extensas e complexas[1] conclusões: “1- O apelante discorda da condenação de que injustamente foi alvo pela censurada e Sentença, fundamentando o seu recurso em questões de facto e de Direito, que leva ao douto e superior conhecimento do ilustre tribunal ad quem com vista a obter a sua anulação, revogando-se a Decisão Final e substituindo-se por douto Acórdão que reponha a legalidade, julgando a ação e o pedido formulado pela A. improcedentes.

2- Por conseguinte, submetem-se à apreciação do venerando Tribunal, as questões que se epigrafaram do modo seguinte: DO ERRO DE PROCEDIMENTO E DA VIOLAÇÃO DE LEI (Da Insuficiência de Alegação de Factos essenciais e Erro de Julgamento); DA NULIDADE DA SENTENÇA; IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO PROFERIDA SOBRE A MATÉRIA DE FACTO (Erro de Julgamento e Reapreciação da prova); DO ERRO DE JULGAMENTO EM MATÉRIA DE DIREITO (Erro na Interpretação das Normas Aplicadas e Erro na Determinação das Normas Aplicáveis); DA EXCEPÇÃO DO NÃO CUMPRIMENTO; DA INSUSTENTABILIDADE LEGAL DA CONDENAÇÃO/FALTA DE FUNDAMENTO LEGAL.

3-Entendeu o apelante estruturar as suas Alegações de recurso, começando por suscitar a questão do erro de procedimento, porque a nosso ver, esse erro e a concomitante violação de lei, afeta intrínseca e fatalmente a validade da Sentença, questão esta que, merecendo provimento, até dispensará o Tribunal ad quem de tomar conhecimento sobre aqueloutras questões, cuja apreciação adviria prejudicada, assim seja a mesma deferida e consequentemente decretada a improcedência da ação, com absolvição do R..

4- Dispõe o art.º 5.º, n.º 1 do CPC que à parte cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir, sendo requisito da própria petição inicial a exposição dos factos que constituem a causa de pedir e as razões de direito que servem de fundamento à ação (art.º 552.º, n.º 1, al. d) do CPC) mais impondo o art.º 342.º do CC que, à parte que alega um direito, cabe a prova dos factos que constituem a causa de pedir.

5- Ónus de alegação e de prova, cuja disciplina processual faz recair sobre o autor um dever de invocação completa e cabal da factualidade que ao direito reclamado subjaza, sob pena de improcedência, a final.

6- Obedecendo tal regime aos princípios de substanciação e do dispositivo, está vedado ao tribunal suprir a falta de invocação circunstanciada em sede de Sentença Final, posto que, sem os factos de que emerge o pedido, não pode o tribunal julgar a causa favoravelmente ao seu peticionante.

7- Dispondo o art.º 607.º, n.º 4, do CPC que na fundamentação da Sentença, o meritíssimo Juiz deve declarar os factos que considera provados e não provados, selecionando - segundo as regras da prova e da experiência comum - dentre os que tenham sido alegados na ação, aqueles que julgue comprovados ou não provados.

8- Normas e princípios, que, conjugadamente interpretados, significam que o Tribunal tem de ater-se aos factos provados que tenham sido objeto de completa e cuidada alegação, não podendo ele substituir-se ao sujeito ativo na alegação dos factos essenciais à procedência da ação, nessa matéria regendo também o princípio da autoresponsabilização das partes, em virtude do que se encontra cerceado ao Tribunal suprir as insuficiências alegatórias de que peque a P.I., sobretudo na fase da prolação da Sentença.

9- Assim sendo, como surte doutrinal e jurisprudencialmente pacificado, é incontroverso que se impunha à A., ora apelada, o cumprimento de determinados deveres, dado que, àquele que alega o direito ao recebimento dos honorários, incumbe invocar, de conformidade com a lei, todos os factos constitutivos do direito a que se arroga, de harmonia com o correspetivo regime legal a que se encontra vinculado, no caso, ao Estatuto da Ordem dos Advogados, ao Regulamento de Laudo de Honorários e ao disposto nos art.ºs 1.157.º e seg.s do Código Civil, para que, só assim, possam ser objecto de válida Decisão Final.

10- Atendendo ao disposto nos art.ºs 5.º e 7.º, n.º 6, do Regulamento de Laudo de Honorários aprovado sob o n.º 40/2005, de 29/4, publicado na 2.ª série do Diário da República de 20/5/2005, a conta de honorários deve ser apresentada ao cliente por escrito, mencionar o IVA que for devido e ser assinada pelo emitente; “A conta deve enumerar e discriminar os serviços prestados”; os “honorários devem ser separados das despesas e encargos, sendo todos os valores especificados e datados”; e “A conta deve mencionar todas as provisões recebidas”.

Sendo que a elaboração da conta nesses termos, é condição de admissibilidade do pedido de laudo pelo advogado. (art.º 7.º, n.º 6 do RLH) 11-Por outro lado, em consonância com o que impõe o art.º 100.º do EOA (Lei 84/84, de 16/3, com sucessivas alterações, designadamente pela Lei 15/2005, de 26/1, DL 226/2008, de 20/11 e Lei 12/2010, de 25/6) “os honorários do advogado devem corresponder a uma compensação económica adequada pelos serviços efectivamente prestados”; E, “Na falta de convenção prévia reduzida a escrito, o advogado apresenta ao cliente a respetiva conta de honorários com discriminação dos serviços prestados”; “Na fixação dos honorários deve o advogado atender à importância dos serviços prestados, à dificuldade e urgência do assunto, ao grau de criatividade intelectual da sua prestação, ao resultado obtido, ao tempo despendido, às responsabilidades por ele assumidas e aos demais usos profissionais”.

12-Analisando, por conseguinte, o que foi objeto de alegação por parte da A., designadamente na sua P.I., verifica-se que jamais esta cumpriu com o ónus de alegação, como, nos termos dos citados preceitos lhe competia, tendo-se limitado a alegar que patrocinou o R. numa ação no tribunal do trabalho em que foram peticionados créditos laborais no montante de 109,756,30€, referindo os serviços prestados no âmbito dessa ação, que esta foi julgada parcialmente procedente, por via do que o ali A., ora R., recebeu € 3.423,75, tendo pago à A. 684,75€ (correspondentes a 20% do valor recebido) a título de honorários, que o cliente resolveu mudar de advogado, tendo apresentado a conta de honorários ao R. por carta de 9/4/2008, no valor de € 9.315,00 (junta a fls 61 dos autos) e que através dela debitou todas as diligências processuais e extraprocessuais com o cliente, incluindo as despesas e o IVA e que a A. considerou o valor de 50.000€, que o R. não aceitou receber, conforme proposto pela sua entidade empregadora, tendo debitado ao cliente os honorários na mesma proporção (20%) do valor anteriormente pago, porque era o que tinha sido estipulado (havendo recebimento de quantias que se previam elevadas) e por ser essa a prática nos processos de colegas do cliente contra a mesma empresa (mais de 30 processos).

13- Como dessa carta e dos articulados se confirma, a A. nunca alegou, em lado nenhum, que havia fixado os honorários com base nos critérios legais de fixação preceituados no n.º 3 do art.º 100.º do EOA, antes pelo contrário, tendo a A. invocado que os honorários foram lançados de acordo com o estipulado com o cliente, com base nos 20% sobre o pressuposto valor de 50.000€ que a empregadora lhe propusera para acordo; mas que, no julgamento da presente ação, veio a provar-se que o mencionado valor proposto pela E… implicava a cessação do contrato de trabalho, como resulta do ponto 12 dos Factos Provados.

14- Assim, dado...

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