Acórdão nº 4507/13.1TBMTS-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 12 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelFILIPE CARO
Data da Resolução12 de Novembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 4507/13.1TBMTS-A.P1 (apelação) Comarca do Porto – Inst. Central – 1ª Secção de Execução Relator: Filipe Caroço (por vencimento) Adj. Desemb. Pedro Martins Adj. Desemb. Pedro Lima Costa[1] Acordam no Tribunal da Relação do Porto I.

B…, SA., instaurou no dia 10.7.2013 execução para pagamento de quantia certa contra C…, SA., a fim de cobrar a quantia de € 620.617,74, acrescida de juros de mora à taxa supletiva legal prevista para as dívidas comerciais, juros esses contados sobre o capital de € 575.293,56 desde a referida data até integral pagamento.

No requerimento executivo invocam-se duas garantias bancárias, datadas de 6.8.2007 e de 25.8.2009, em que o executado se compromete a pagar verbas à exequente em vez da sociedade D…, SA., no âmbito de dois contratos de compra exclusiva com mútuo celebrados entre a exequente e esta sociedade.

No dia 16.10.2013, já ao abrigo do novo Código de Processo Civil[2], aprovado pelo art.º 1 da Lei 41/2013, de 26 de junho, o executado deduziu os embargos que constituem o presente apenso A, com o seguinte pedido: “Termos em que deverá ser julgada procedente a presente oposição, por provada e, consequentemente, ser o Banco Executado absolvido do pedido nesta execução.

” Para o efeito, alegou --- aqui sumariamente --- que o acionamento das garantias bancárias visa defraudar o executado, uma vez que têm subjacente o incumprimento de contratos de compra exclusiva com mútuo gratuito (juntos como documentos 1 e 2 e datados de 24.10.2007 e 3.8.2009), os quais já seriam contratos inusitados no comércio jurídico, mas que foram feitos, ou aparentados, para enganarem o executado. São contratos simulados, celebrados pela sociedade D…, que veio a ser declarada insolvente em 16.7.2012, na certeza de que não foram emprestadas pela exequente a essa sociedade as verbas de € 500.000,00 e de € 200.000,00.

Se tivessem existido, tais empréstimos seriam nulos por vício de forma, pois a lei civil exige escritura pública ou documento autenticado, na certeza de que por natureza um mútuo gratuito não é um contrato mercantil.

Sendo os alegados mútuos inexistentes ou nulos, as garantias bancárias são inválidas. Têm natureza de fiança bancária e são meramente acessórias da obrigação principal, ficando dependentes da existência e validade das obrigações contraídas pela sociedade D…, nos termos dos art.ºs 627º, nº 1 e 632º, nº 1, do Código Civil.

Essa natureza não é afastada pela menção, nas garantias, de pagamento à primeira solicitação.

Não pode produzir efeito a declaração de renúncia aos meios de defesa, declaração que consta nas garantias, pois é nula a cláusula do contrato de fiança em que o fiador se obrigue a não opor ao credor os meios de defesa que tem o devedor.

É legítima a recusa de pagamento da garantia em caso de ausência manifesta de direito do beneficiário, uma vez que tal pagamento corporizaria enriquecimento sem causa, sendo operante a exceção de fraude manifesta ou abuso evidente, além de se poder objetar ao beneficiário o abuso de direito.

O executado deve ter, nestes autos, a possibilidade de provar que está a ser vítima de tentativa de fraude manifesta, pelo que requer, entre outros meios de prova testemunhal e de depoimento de parte da exequente, que a exequente apresente cópias dos cheques que atestem o pagamento de € 500.000,00 e de € 200.000,00 à sociedade D…, respetivamente em 24.10.2007 e 3.8.2009, com extratos bancários redundantes seja do lado da conta bancária da exequente seja do lado da conta bancária da sociedade D…, bem como que sejam exibidos elementos da contabilidade desta última sociedade documentando aqueles recebimentos.

Liminarmente recebidos os embargos, a exequente apresentou contestação onde conclui pela procedência total da pretensão executiva e reclama a condenação do exequente em multa e a pagar-lhe indemnização não inferior a € 50.000,00 por litigância de má fé, já no despacho saneador.

Para tal, alega essencialmente que o executado litiga de má fé, nomeadamente porque antes de ter sido instaurada a execução já tinha declarado à exequente que “o C… aceita e reconhece a autonomia das garantias bancárias prestadas, não sendo sua intenção contestar ou por qualquer forma opor-se à sua execução”.

A exequente emprestou efetivamente as quantias referidas nos contratos de 24/10/2007 e 3/8/2009.

A exequente junta cópia de cheques de € 474.845, € 25.155 e € 17.732 e cópia de extrato da sua conta bancária que alude a tais cheques, tendo-se destinado os dois primeiros cheques a satisfazer os € 500.000 emprestados, ao passo que o cheque de € 17.732 se destinou a pagar a diferença entre os € 200.000 emprestados no segundo contrato e créditos que a exequente tinha junto da sociedade D…, nos valores de € 95.468 e € 86.800.

Os contratos não tinham de ser celebrados por escritura pública, sendo as duas garantias instrumento suficiente para a cobrança da verba exequenda, além de não ter a exequente de provar o que quer que seja para as executar. São garantias bancárias autónomas, com a cláusula “on first demand” e não meras “fianças bancárias”, sendo que não há qualquer invalidade ou fraude nos contratos de mútuo que estão na sua base.

As partes quiseram, assim, excluir qualquer condição para o pagamento das quantias garantidas. Com a sua subscrição, a executada abdicou de discutir o cumprimento ou incumprimento do contrato, sendo suficiente, para ficar obrigado a pagar as quantias em causa, a simples interpelação.

O executado apresentou resposta relativamente ao pedido de condenação por litigância de má fé, onde considerou que o mesmo deve improceder.

O executado prestou caução, pelo que a execução foi suspensa no dia 17.1.2014.

O tribunal recorrido designou data para a realização de audiência prévia nos seguintes termos: «Para a realização de audiência prévia, nos termos e para os efeitos do art. 591.°, n.° 1, als. a) a d), do NCPC, designo o dia 03.04.2014, pelas 14h30m.

» Na data agendada iniciou-se aquela audiência, mas, a pedido das partes, foi suspensa a instância, tendo em vista a sua conciliação, ao abrigo do art.º 272º, nº 4, do Código de Processo Civil.

Perante a informação de que não tinha sido possível o acordo das partes, no dia 9.6.2014 foi proferido o seguinte despacho: «Não obstante ter sido inicialmente agendada audiência prévia, entende o tribunal que, considerando, por um lado, que se frustrou a tentativa de conciliação --- uma das razões da convocação de audiência prévia ---, e, por outro lado, que, em face dos factos alegados e comprovados nos autos, o estado do processo permite, sem necessidade de mais provas, a apreciação total do mérito dos presentes embargos, o qual foi já discutido nos articulados, dispensa-se a realização/continuação da audiência prévia, nos termos do art. 593.°, n.° 1, do NCPC, por referência aos arts. 591.°. n.° 1. al. d), e 595.° do NCPC.

» (sic) Passou-se então, sem mais, na mesma peça processual, a proferir despacho saneador-sentença, no qual se julgaram os embargos de executado totalmente improcedentes.

*Inconformado, o executado apelou do despacho saneador-sentença, a fim de ser revogado e ser ordenado o prosseguimento do incidente de embargos de executado, apresentando as seguintes CONCLUSÕES: O executado apresenta as seguintes conclusões: «A. O apelante prestou, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 733 n° 1 al. a) do NCPC, caução mediante fiança bancária no âmbito dos embargos de executados à margem melhor identificados, com vista à suspensão da execução até ao trânsito em julgado da decisão que pudesse vir a ser proferida.

B. Quanto a este facto, dispõe o n° 6 do art. 733 do NCPC “Quando seja prestada caução nos termos do n° 1, aplica-se, com as necessárias adaptações, o disposto nos n°s 3 e 4 do art. 650”.

C. Ora o supra referido artigo refere no seu n° 3 “se a caução tiver sido prestada por fiança, garantia bancária ou seguro caução, a mesma mantém-se até ao trânsito em julgado da decisão final proferida no último recurso interposto, só podendo ser libertada em caso de absolvição do pedido ou tendo a parte sido condenada, provando que cumpriu a obrigação no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado”.

D.

Assim e de acordo com o disposto nos artigos supra referidos, em conjugação com o art. 647 n° 2, ao presente recurso deve ser atribuído efeito suspensivo, decorrente da caução prestada anteriormente, nos termos e para os efeitos do art. 733 n° 1 al. a) do NCPC.

E. O Mmo Juiz a quo agendou uma audiência prévia, nos termos e para os efeitos do art. 591 n° 1, als. a) a d) do NCPC, para o dia 3/4/2014, a qual, apesar de ter sido iniciada, foi adiada com o intuito de as partes chegarem a acordo.

F. A frustração desta tentativa de conciliação levou a que o Mmo Juiz a quo considerasse em 2/6/2014 que o estado do processo permitia, sem necessidade de mais prova, a apreciação total do mérito da causa, tendo nesse momento dispensado a realização/continuação de audiência prévia, e, sem mais, proferido a douta sentença de que ora se recorre.

G. Decisão essa que surpreendeu o ora apelante, uma vez que dos autos não decorriam quaisquer indícios que o Mmo Juiz iria agir deste modo.

H. Se os autos permitiam a decisão do mérito, sem mais qualquer acto, porque foi agendada a primeira audiência prévia, ao invés de se ter proferido despacho de dispensa da mesma? I. O certo é que o apelante considera que os autos não permitiam a tomada desta decisão surpresa e esse facto é confirmado pela própria sentença.

J.

Isto porque a página tantas o Mmo Juiz a quo refere “Acontece que o que está aqui em causa para apreciação neste processo não é se a alegação da embargante corresponde ou não à verdade – o que exigiria produção de prova – (…)” (sublinhado e negrito nosso).

K.

E um pouco mais à frente o Mmo Juiz a quo refere mais uma vez “(...) exige-se um mais, o qual, deverá ser traduzido pela posse por parte do garante de elementos de prova (no essencial documental) consistentes que tornem líquida/patente a...

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