Acórdão nº 1454/13.0TTPNF.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução08 de Julho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

ACÓRDÃO PROCESSO Nº 1454/13.0TTPNF.P1 RG 473 RELATOR: ANTÓNIO JOSÉ ASCENSÃO RAMOS 1º ADJUNTO: DES. EDUARDO PETERSEN SILVA 2º ADJUNTO: DES. PAULA MARIA ROBERTO PARTES: RECORRENTE: B… – COMPANHIA DE SEGUROS.

RECORRIDOS: C… E INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL, IP.

◊◊◊Acordam os Juízes que compõem a Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:◊◊◊I – RELATÓRIO 1.

Frustrada a tentativa de conciliação, C…, viúva, residente na Rua …, …, ….-… …, Penafiel, intentou a presente acção especial emergente de acidente de trabalho contra “B… COMPANHIA DE SEGUROS” e “D…, LDA.”, que as rés sejam condenadas na medida das respectivas responsabilidades a pagarem-lhe a título de pensão por morte o montante de €2.327,40, a quantia de €5.533,70 relativa a subsídio por morte, a quantia de €10,00 relativa a despesas de deslocação a tribunal, a quantia de €3.689,13 de despesas de funeral com transladação, a quantia de €5.000,00 por dano moral, sendo todas as quantias acrescidas de juros de mora desde o seu vencimento e até integral pagamento.

Alegou, para o efeito, em síntese e com utilidade, que que é esposa do sinistrado E…, sendo que este era trabalhador da 2.ª ré, exercendo as funções de trabalhador agrícola, auferindo a retribuição de €485,00 x 14 + €88.00 x 11.

Alegou, também, que no dia 5/7/2013, pelas 15h30m, quando o sinistrado estava a trabalhar em Felgueiras sob as ordens, direção e fiscalização da 2.ª ré, começou a vomitar e perdeu a consciência, estando o mesmo a tremer, com espasmos e convulsões. A causa da morte do seu marido foi golpe de calor que deriva de uma prolongada exposição ao calor, com o consequente aumento da temperatura corporal.

Alegou, por fim, que entre a autora e o seu marido existia muita união, amor e entreajuda, sendo que o desaparecimento do mesmo foi abrupto e trágico, tendo a autora, em consequência da morte daquele, sofrido uma indescritível dor e angústia.

◊◊◊2.

O INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, IP. veio, a fls. 67 e seguintes, deduzir contra as rés um pedido de reembolso.

Alega, para tanto e em suma, que pagou à autora o subsídio por morte no valor de €1.257,66, bem como pensões de sobrevivência no período de Agosto de 2012 a Junho de 2014 no montante de €3.431,67, sendo o valor mensal actual de €274,53.

◊◊◊3.

Citadas ambas as rés contestaram.

3.1.

A Ré “B… COMPANHIA DE SEGUROS”, pugnou pela improcedência do pedido.

Aceitou a ré a existência do contrato de seguro, bem como a transferência para si da responsabilidade pelo valor anual alegado na petição inicial.

Não aceitou, no entanto, qualquer responsabilidade por entender que o evento participado não integra o conceito de acidente de trabalho já que a morte do trabalhador resultou de uma exposição durante cerca de 5h30m a elevadas temperaturas que na altura eram de cerca de 38º a 40º, o que provocou uma forte insolação e desidratação.

Por outro lado, entende que qualquer indemnização a pagar por si à autora deverá limitar-se à responsabilidade para si transferida pelo que os danos morais não se enquadram na mesma.

3.2.

A ré “D…, LDA.”, alegou que o sinistrado sempre teve total autonomia para se deslocar para uma sombra, tido sempre acesso fácil a água, quer para beber, quer para se refrescar.

Sempre tiveram os trabalhadores, incluindo a infeliz vítima, a possibilidade de repousar/descansar quando o entendessem, nomeadamente nos dias de temperaturas mais elevadas.

Termina pedindo a sua absolvição.

◊◊◊4.

A Ré “B… COMPANHIA DE SEGUROS” contestou o pedido de reembolso deduzido pelo Instituto de Segurança Social alegando que este não tem direito ao reembolso do subsídio por morte e pensão de sobrevivência por se tratarem de obrigações próprias da segurança social.

◊◊◊5.

Respondeu a Autora à contestação apresentada pela seguradora defendendo o alegado na petição inicial.

◊◊◊6.

Foi proferido despacho saneador onde se afirmou a validade e regularidade da instância, tendo sido selecionada a matéria de facto assente e controvertida.

◊◊◊7.

Procedeu-se a julgamento, após o que foi proferida sentença, cuja parte decisória tem o seguinte conteúdo: “

  1. Pelo exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente, por provada, e, em consequência: 1. Condeno a ré “B… Companhia de Seguros” a pagar à autora C… as seguintes quantias: a) €10,00 (dez euros) acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos, contados desde 18/2/2014 e até efetivo e integral pagamento.

    1. €5.533,70 (cinco mil e quinhentos e trinta e três euros e setenta cêntimos) a título de subsídio por morte, acrescido de juros de mora, à taxa legal, contados desde 18/2/2014 e até efetivo e integral pagamento.

    2. A pensão anual de €2.327,40 (dois mil e trezentos e vinte e sete euros e quarenta cêntimos) devida a partir de 6/7/2013, acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a data de vencimento de cada uma das prestações e até efetivo e integral pagamento.

    1. Absolvo a ré “D…, Lda.” dos pedidos formulados pela autora.

    2. Absolvo a ré “B… Companhia de Seguros” do demais peticionado pela autora.

    Custas da acção pela autora e pela ré “B… Companhia de Seguros” na proporção de, respetivamente, 52% para a autora e 48% para a ré, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia a autora.

  2. Mais se decide julgar procedente o pedido formulado pelo Instituto de Segurança Social, IP e, em consequência, condenar a ré “B… Companhia de Seguros” a pagar-lhe: 1. A quantia de €1.257,66 (mil e duzentos e cinquenta e sete euros e sessenta e seis cêntimos) paga à autora a título de subsídio por morte, acrescida de juros de mora contados, à taxa legal, desde a citação, com a inerente desoneração do pagamento de tal quantia até tal limite, por parte dessa ré, à autora.

    1. A quantia de €6.382,89 (seis mil e trezentos e oitenta e dois euros e oitenta e nove cêntimos), acrescida das pensões que forem pagas até ao trânsito em julgado da presente sentença, bem como de juros de mora contados sobre o valor de €3.431,67 (três mil e quatrocentos e trinta e um euros e sessenta e sete cêntimos) desde a citação e até efetivo e integral pagamento e sobre as prestações vencidas na pendência da presente acção e até ao trânsito em julgado desde o mês seguinte àquele a que respeitam, em relação ao montante de cada pensão, até efetivo e integral pagamento, com a inerente desoneração do pagamento de tal quantia até tal limite, por parte dessa ré, à autora.

    Custas quanto a esse pedido pela ré “B… Companhia de Seguros”* * * * *Fixo o valor da acção em €38.688,20 (trinta e oito mil e seiscentos e oitenta e oito euros e vinte cêntimos) Notifique e registe.”◊◊◊8.

    Inconformada com a sentença a Ré “B… COMPANHIA DE SEGUROS”.

    veio interpor recurso, pedindo a sua revogação e a sua absolvição, assim concluindo: I.

    Não configura o conceito de acidente de trabalho a doença denominada de «golpe de calor», definida como uma doença súbita, derivada de uma prolongada exposição ao calor, com o consequente aumento súbito da temperatura corporal, por resultar duma causa interna ao sinistrado e não duma causa externa ao mesmo, como se impunha para que aquele evento fosse considerado um acidente daquele tipo.

    II.

    Não configura o conceito de acidente de trabalho a doença denominada de «golpe de calor», definida como uma doença súbita, derivada de uma prolongada exposição ao calor, com o consequente aumento súbito da temperatura corporal, quando o prolongamento daquela exposição, não sendo uma condição necessária à execução do trabalho (mas apenas a exposição em si mesma), dependeu apenas do próprio sinistrado, que podia, a qualquer momento, interromper aquela exposição e colocar-se à sombra ou refrescar-se com água, o que tudo estava ao seu alcance.

    III.

    O facto de o sinistrado optar por prolongar aquela exposição, nada fazendo, como podia, para a interromper, torna a ocorrência daquela doença algo não só possível, como também previsível e até provável, para o lesado e para qualquer outro trabalhador normal nas mesmas circunstâncias, por ser uma consequência conhecida, normal e frequente daquele tipo de exposição (e até inevitável, dependendo apenas, para cada pessoa, do tempo da exposição, o qual, maior ou menor, acaba, pois, por ser o único fator imprevisível da ocorrência da doença), deixando, como tal, de se poder falar daquela ocorrência como um evento fortuito, súbito e imprevisto e, como tal, num acidente para efeitos do previsto no artº 8º da Lei nº 98/09, de 4 de Setembro.

    IV.

    A Segurança Social é uma instituição “vocacionada para a proteção, entre outros, do evento “morte” dos beneficiários desse regime” (cfr. ac. da RC de 18.10.2005, in www.dgsi.pt), tendo o pagamento do subsídio por morte e pensões de sobrevivência a finalidade compensar o acréscimo de encargos para o agregado familiar decorrentes da morte do beneficiário, facilitando, do ponto de vista económico, a reorganização da vida familiar, constituindo obrigações próprias da segurança social.

    V.

    Isto porque, tais prestações são devidas independentemente da causa da morte, e tendo por base apenas nos descontos feitos pela vítima.

    VI.

    Ao admitir o reembolso de tais subsídios e prestações por parte dos responsáveis civis acabaríamos por cair no insólito de transformar um particular em perene pagador de pensões, em substituição da segurança social, VII.

    A sentença recorrida, ao decidir da forma que o fez, violou, pois, o disposto nos art.s 70º da Lei 4/2007, de 16 de Janeiro, e o previsto na Lei 98/2009, de 4 de Setembro, o que tudo deverá levar à alteração daquela referida decisão por uma outra que absolva a recorrente do pedido contra ela formulado.

    VIII.

    A recorrente foi condenada a pagar dois subsídios por morte: um no valor de € 5.533,70 à autora (alínea b) do ponto 1. da alínea A) daquela decisão), e outro à Segurança Social no valor de € 1.257,66, (ponto 1. da alínea B)) o que tudo constitui uma clara duplicação de condenação nos mesmos valores e que deverá levar, pelo menos, à dedução na primeira condenação do valor da segunda.

    ◊◊◊9.

    A Autora...

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