Acórdão nº 1749/10.5TTPRT.P2 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelPAULA LEAL DE CARVALHO
Data da Resolução08 de Julho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Procº nº 1749/10.5TTPRT.P2 Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 832) Adjuntos: Des. Rui Penha Des. Maria José Costa Pinto Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B… intentou a presente ação declarativa, com processo comum[1], contra C…, alegando, em síntese, que: Entre o conhecimento das infrações contantes da nota de culpa pelo R. e a instauração do procedimento disciplinar decorreram mais de 60 dias; e, por outro lado, entre a prática não continuada das infrações imputadas e a notificação da nota de culpa – recebida aos 05.08.09, decorreu mais de um ano. Assim, verificou-se a prescrição do procedimento disciplinar e das infrações contidas na nota de culpa.

Se assim não for, a nota de culpa não passa de um relatório difuso e confuso, em que não existe uma descrição de factos concretos, situados no tempo e no espaço, com indicação dos seus autores, não permitindo uma correta defesa já que nem se saberá ao certo do que é que a A. é acusada, pelo que é nula.

Também a decisão é nula já que foram tomados em conta não os factos constantes da nota de culpa, mas de um relatório do instrutor que considerou factos que nem constavam da nota de culpa.

Em Julho de 2007, o Réu, de forma unilateral e sem o consentimento dos trabalhadores, dividiu os salários fixos em duas parcelas denominadas de “remuneração base” e, outra, de “complemento de mérito”, tendo aquele sido reduzido em €255,5 e passado a ser recebido a título de complemento de mérito.

Em Julho de 2009, com o procedimento disciplinar, o Réu suprimiu-lhe tal complemento invocando o art. 44º, nº 3, al. b) do Estatuto dos Trabalhadores do C…, em consequência do que, até à data de 15.10.10, deixou de receber €4.735,50; A sanção aplicada é injusta e “não poderá deixar de ser visível, para quem lendo as 103 folhas da nota de culpa, venha justamente a concluir que afinal à arguida, apenas são atribuídos factos referidos na al. a) do nº 24 e no nº 48 dessa Nota” (art. 23º p.i.)”.

Mais invoca (arts. 24º a 41º), pelos fundamentos que alega, a pequena gravidade das infrações imputadas que lhe são imputadas (não individualmente mas também a colegas administrativos) e a inexistência de qualquer causalidade entre o comportamento dos três administrativos e a ocorrência das irregularidades verificadas por parte da gerência.

Termina a petição inicial nos seguintes termos: “42º Concluindo, para não cairmos no mesmo defeito da nota de culpa: a) – A arguida perante a insignificância dos factos que lhe são imputados, da sua irrelevância causal e das circunstâncias em que sem culpa sua eles foram praticados, invocando os seus 14 anos de serviço sem mácula, pretende ser absolvida.

  1. – Ou, quando não, punida com uma mera repreensão verbal que lhe permitirá receber a quantia correspondente ao tal complemente de mérito futuro e atrasado.

  2. – Complemente esse que deverá ser declarado ilegal, visto que não foi criado por adição do salário vigente mas por subtracção já que implicou uma redução do mesmo de montante igual.”. [sic] O Réu contestou (em 360º artigos) e em que: - Transcreve o teor da nota de culpa (esta constituída por 103 páginas e 269 artigos); - alega que o procedimento disciplinar foi instaurado dentro dos 60 dias posteriores ao conhecimento da infração pelo Conselho de Administração, pelo que não se verifica a caducidade do procedimento disciplinar [na sequência de factos apurados pela Direção de Auditoria e Inspeção e do respetivo Relatório nº 82/09, de 07.07.09 (constante de fls. 3 a 1170 do PD), aos 13.07.09, a Direção de Recursos Humanos elaborou proposta de instauração de processo disciplinar com intenção de despedimento relativamente aos trabalhadores D…, E…, F... e G… e, sem intenção de despedimento, relativamente à A. e a os trabalhadores H… e I…; aos 16.07.09, o conselho de Administração deliberou instaurar os procedimentos disciplinares propostos e, em 17.07.09, foi deduzida a nota de culpa – arts. 303 a 308].

    - Aos 20.07.09, por a A. se encontrar de férias, a nota de culpa foi remetida para a sua morada, por correio registado, o qual foi devolvido por não reclamado e, aos 04.08.09, a nota de culpa foi recebida pessoalmente pela A. (art. 309), não se verificando a prescrição das infrações disciplinares; - A nota de culpa não padece dos vícios invocados, sendo que a A. bem compreendeu o que lhe é imputado, como decorre dos arts. 12, 21 e 37 da resposta à mesma e dos arts. 23, 24 e 29 a 32 e 42º, al. a) da petição inicial, para além de que lhe foram atribuídos os facto constantes dos arts. 8, 24, 48 e 61 da Nota de Culpa; - A suspensão e retirada do complemento de mérito está em consonância com o normativo em vigor do Réu. Por fim alega a existência de factos que, em seu entender, justificam a sanção disciplinar aplicada – de repreensão registada.

    Termina concluindo no sentido da improcedência da ação, bem como das “exceções” arguidas pela A., julgando-se o processo disciplinar válido, bem como válida a sanção disciplinar aplicada, devendo ser absolvida de todos os pedidos formulados.

    Realizada audiência preliminar, foi nesta proferido despacho saneador/sentença (fls. 1929 a 1934) em que se decidiu julgar a ação procedente e, em consequência: “- anular a sanção disciplinar de repreensão registada aplicada pela ré à autora, com o consequente eliminação do registo de sanções previsto no artigo 376º do Código do Trabalho de 2003.

    “- condenar a ré a pagar à autora toda as quantias relativas de “complemento a título de mérito”, no valor mensal de € 225,50 retiradas desde 24 de Julho de 2009, passando novamente a pagá-las mensalmente de acordo com a sua Circular Interna nº 1243.” Foi aí, também, fixado à ação o valor de €19.735,50.

    Tendo o Réu recorrido de tal decisão, aos 29.10.2012 foi por esta Relação proferido o acórdão de fls. 2079 a 2098 que decidiu nos seguintes termos: “Em face do exposto, acorda-se em conceder parcial provimento ao recurso, em consequência do que se revoga a decisão recorrida que considerou a ação procedente e condenou o Réu no pedido por haver considerado inválida a nota de culpa e prescritas as infrações disciplinares nela imputadas à A., a qual é substituída pelo presente acórdão em que se decide considerar válida a nota de culpa no que se reporta às concretas imputações constantes dos seus arts. 24º, al. a) e 61º, al. c), mais se determinando o prosseguimento dos autos, de acordo com a necessária tramitação legal, incluindo realização da audiência de discussão e julgamento, com o conhecimento, a final e em conformidade, da questão da prescrição das (eventuais) infrações disciplinares imputadas e das demais questões objeto da ação.” Tendo a ação prosseguido na 1ª instância, foi nesta proferido o despacho de fls. 2109 a determinar ao Réu a apresentação de nova contestação contendo apenas os factos imputados à A. na decisão de despedimento e nota de culpa, na sequência do que foi apresentada a contestação de fls. 2117 a 2160, à qual a A. respondeu nos termos de fls. 2165 a 2168.

    Procedeu-se à seleção da matéria de facto, consignando-se a assente e elaborando-se base instrutória, que foi objeto de reclamações por parte da A. e do Réu, indeferidas conforme despacho de fls. 2225.

    Realizada a audiência de julgamento, conforme ata de fls. 2252 a 2265, no seu início as partes acordaram num facto e foi proferido despacho a aditar à base instrutória três quesitos adicionais; produzida a prova e respondidos os quesitos da base instrutória (ata de fls. 2256 a 2260), foi proferida sentença (fls. 2261 a 2297) que decidiu nos seguintes termos: «julga-se a ação totalmente procedente, declarando-se a prescrição das infrações imputadas à Autora bem como a anulação da sanção de repreensão registada e condena-se a Ré a anular esse registo e a devolver à Autora as quantias devidas a título de “complemento de mérito” que não lhe foram pagas.».

    Inconformado, veio o Réu recorrer, formulando, a final das suas alegações (fls. 2299 a 2333), as seguintes conclusões: “1. O presente recurso vem interposto da douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo a fls._, que decidiu no sentido de se verificar a prescrição das infracções disciplinares imputadas à autora no âmbito do procedimento disciplinar que foi instaurado pela Recorrente, e consequentemente condenou a Ré a anular a sanção aplicada à autora (repreensão registada) bem como na devolução de quantias devidas a título de “complemento de mérito”.

    1. Salvo o devido respeito, que é muito, não pode a Recorrente concordar a fundamentação e subsequente decisão tomada pelo Tribunal a quo.

    2. Refere preliminarmente o Tribunal a quo que, atento o circunstancialismo em que se verificaram as infracções praticadas pela Autora, estaríamos perante uma “continuação da actividade” e nesse sentido, perante uma infracção continuada, devendo assim o início do prazo prescricional ser contado a partir de 25/07/2008, data em que foi praticada a última conferência irregular de assinatura.

    3. Mais refere o Tribunal a quo que, nesse sentido, se afigura essencial decidir qual a data em que a Autora, ora Recorrida, se deve considerar notificada da nota de culpa: se no 3º dia útil após o envio da carta pelo correio, ou na data do recebimento em mão da nota de culpa, em 04.08.2009.

    4. No presente processo, ficaram provados designadamente os seguintes factos: 3-A nota de culpa elaborada pela Ré no âmbito do procedimento disciplinar movido por esta foi pessoalmente entregue à A. no dia 4 de Agosto de 2009—alínea C); 14-A Autora esteve de férias de 20/07/2009 a 31/07/2009—alínea O); 21-Em 20.07.2009, por a Autora se encontrar de férias, a nota de culpa foi remetida para a sua morada, por correio registado, sob o n.º de registo EA ........ . PT (com o peso de 5,976 KG)—resposta ao quesito 9.º; 22-Em 21.7.2009, a entrega não foi conseguida, constando do site dos CTT o motivo de “destinatário ausente, empresa encerrada, avisados na Estação …”—resposta ao quesito 10.º; 23-Foi deixado o correspondente aviso...

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