Acórdão nº 643/14.5T2AVR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 02 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelMADEIRA PINTO
Data da Resolução02 de Julho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Procº 643/14.5T2AVR.P1 Relator: Madeira Pinto Adjuntos: Carlos Portela Pedro Lima da Costa*I-Relatório: A "B…, C.R.L" impugnou judicialmente o despacho da Conservadora do Registo Predial de Aveiro, proferido a 22 de Outubro de 2013 - que qualificou de provisório por dúvidas o pedido de registo de aquisição lavrado pela Ap. n.° 1232, de 30 de Setembro de 2013, sobre a fracção "C" do prédio descrito sob o n.° 2940 (…) e fracção "G" do prédio descrito sob o n.° 2397 (…), ambas do concelho de Olhão, que havia sido apresentado pela Exma. Sra. Notária, C… - bem como o despacho do Presidente do Instituto dos Registos e Notariado, proferido a 27 de Fevereiro de 2014, que havia indeferido liminarmente o recurso hierárquico apresentado na sequência do aludido despacho de qualificação.

Para além da interposição do recurso de impugnação, a "B…, C.R.L" deduziu incidente de intervenção provocada da Exma. Sra. Notária, C….

O Ministério Público emitiu o parecer a que alude o artigo 146.°, n.° 1, do Código de Registo Predial, no sentido da improcedência da impugnação judicial, por ilegitimidade da impugnante (cfr. fls. 56 a 67, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

Foi proferida a sentença, exarada de fls. 58 a 61 (cujo teor aqui damos por inteiramente reproduzida) que - tendo concluído pela inadmissibilidade legal do aludido incidente de intervenção provocada e, bem assim pela falta de legitimidade da impugnante - não admitiu o recurso contencioso apresentado pela "B…, C.R.L".

Inconformada, apelou a "B…, C.R.L", apontando a sua discordância relativamente ao decidido, nos termos constantes de fls. 63 a 86, focando matéria de direito.

O recurso foi interposto em tempo.

São as seguintes as conclusões do recurso da apelante: 1 - Estando o Notário obrigado por força do artigo 8°-B n°l do Código do Registo Predial a promover o registo dos factos origatoriamente sujeitos a registo e objecto de escritura pública que celebre, e tendo a recorrente, adquirente da relação substantiva subjacente, adquirido imóveis apreendidos em processo de insolvência mediante escritura pública outorgada em Cartório Notarial, cabe ao Notário a obrigação de requerer o registo de aquisição desses imóveis a favor do comprador e fica este titular adquirente da relação substantiva impedido de apresentar esse registo.

2-O artigo 8°-B, n°l do CRP não atribui a Notária a escolha de se constituir sujeito da obrigação de registar, antes tal preceito estipula imperativamente que a Notária é o sujeito da obrigação de registar, relativamente aos factos sujeitos a registo transaccionados por meio de escrituras públicas em que tem intervenção.

3 - Proferido despacho de qualificação desse registo apresentado pelo Notário como provisório por dúvidas, e perante a inércia deste, o titular adquirente da relação substantiva, ora recorrente, e comprador, tem legitimidade para impugnar o despacho de qualificação.

4- A não ser assim, cabendo por imperativo legal ao Notário a obrigação de apresentar o registo de aquisição e perante a inércia deste em face do despacho de qualificação de provisório por dúvidas, não o impugnando, ficaria o adquirente privado de reagir perante facto que o desfavorece, uma vez que apenas com o registo definitivo da aquisição a seu favor dos imóveis, poderá transaccionar os mesmo, atento o actual princípio de obrigatoriedade do registo predial.

5 - Com o actual Código do Registo Predial,o registo predial não se destina apenas a dar publicidade à situação jurídica dos imóveis, mas ele é também materialmente constitutivo de direitos, poi, se bem que o impugnante haja sido constituído proprietário dos imóveis por efeito da outorga da escritura de compra e venda, instituído o princípio do registo predial obrigatório, o titular adquirente não pode efectivar o seu direito de colocar os prédios em circulação no comércio jurídico sem que a titularidade sobre os mesmos esteja definitivamente registada a seu favor no registo predial.

6 - Sendo o Notário o sujeito obrigatório do dever de registar, estando ao adquirente vedado fazê-lo, pois não será admitido a tal, atento o disposto no artigo 8°-B n°l do CRP, nem faria sentido, sujeitos diversos submeterem a registo o mesmo facto, nem o Código o admite, e não impugnando o Notário o despacho de qualificação provisório por dúvidas, desfavorável ao adquirente, que sobre o pedido de registo recair, a leitura a fazer do artigo 141°, n°4 do Código do Registo Predial , é que , em caso de ser o Notário o sujeito obrigatório do dever de submeter o facto a registo, o mesmo representa , ainda que tacitamente, o titular adquirente da relação substantiva, e este tem legitimidade para recorrer do despacho de qualificação do registo, desfavorável para ele, sob pena de, retirando-se do citado preceito, que o titular adquirente, ora impugnante, não tem legitimidade para impugnar o referido despacho, serem violados, com a aplicação do preceito, os princípios da justiça e da proporcionalidade e o acesso ao Direito e à Justiça , todos consagrados na Constituição da República, razões por que, no caso dos autos, deve ser desaplicada a regra do n°4 do artigo 141° do Código do Registo Predial.

7 - Entendendo-se , ao contrário, que, não obstante o que se deixa dito nas conclusões anteriores, que o titular adquirente da relação substantiva subjacente, que não foi apresentante do registo, não tem , por não ser o apresentante, legitimidade para impugnar o despacho de qualificação, só por si, deverá admitir-se a intervenção provocada da Notária apresentante do registo, para associado com ela, poder o impugnante assegurar a sua legitimidade.

8 - Decorre do disposto no artigo 156° do Código do Registo Predial que é direito subsidiário o Código de Processo Civil quanto a actos, prazos e processos, tendo aqui aplicação subsidiária, com as necessárias adaptações o disposto no n°l do artigo 316° do Código de Processo Civil quanto à intervenção provocada da entidade notarial, por o recurso jurisdicional interposto da decisão do conservador/instituto dos registos e do notariado ter estrutura semelhante a um processo de partes e a uma acção declarativa e pela razão do que se pretende, não a "audição" da notária, tal como ela está configurada na fase administrativa da impugnação das decisões do conservador, mas sim assegurar a legitimidade activa da ora recorrente e adquirente, que tem um interesse directo na impugnação do despacho.

9 - Nem se diga que a relação de registo é de interesse e ordem pública e pertinente é dar a conhecer a situação registral dos prédios, porque, embora esta afirmação seja verdadeira, está também em causa a economia nacional, que fica prejudicada se aos privados, no caso uma instituição bancária, for vedado transaccionarem os seus bens.

10 - O art°. 92 n° 2, alínea a) do CRP estipula que quando existe sobre o bem registo de aquisição ou direito a favor de pessoa diferente do insolvente, o registo deve ser efectuado provisoriamente por natureza, devendo ser citado o titular inscrito para declarar se o prédio ou direito lhe pertence, pelo que registada a título definitivo a declaração de insolvência relativamente a prédio que não seja da titularidade exclusiva da insolvente ou de que ela não tenha a propriedade plena, presume-se que foram respeitadas as determinações do artº. 119 do CRP, presunção que se retira do artº. 7o do mesmo Código.

11 - Por força do artigo 264 n° 1, a) e 141 n°l, alínea b), ambos do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, podem ser apreendidos em processo de insolvência bens comuns do casal, qualquer que seja o regime de bens,salvo o da separação, não tendo aplicação em processo de insolvência o art. 825° do CPC revogado nem o estatuto processual do cônjuge do executado previsto no Código de Processo Civil vigente.

12 - Nos termos do disposto no artigo 141°, n°l, alínea c) do CIRE, em confronto com o artigo 159° do mesmo Código, podem ser apreendidos em processo de insolvência bens de que o insolvente não é o único titular ou de que não tenha a propriedade plena, ainda que o outro titular seja um terceiro e não seja cônjuge nem ex-cônjuge do insolvente.

13 - Com a declaração de insolvência o insolvente perde de imediato o direito de dispor e de administrar os seus bens, cuja titularidade, não obstante, se mantém na sua esfera jurídica...

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