Acórdão nº 25/14.9T8PNF.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 19 de Outubro de 2015
Magistrado Responsável | EDUARDO PETERSEN SILVA |
Data da Resolução | 19 de Outubro de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo nº 25/14.9T8PNF.P1 Apelação Relator: Eduardo Petersen Silva (reg. nº 467) Adjunto: Desembargadora Paula Maria Roberto Adjunto: Desembargadora Fernanda Soares Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório B…, residente em Paços de Ferreira veio intentar a presente acção declarativa de condenação emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum, contra C…, LDA., sociedade comercial com o NIPC ………, com sede na Rua …, n.º …, Paços de Ferreira, pedindo que se declare ilícito o seu despedimento e em consequência se condene a Ré a pagar-lhe: - a quantia de €6.183,75 a título de indemnização de antiguidade prevista no art. 391.º do Código de trabalho; - a quantia de €970,00 a título de férias e subsídio de férias vencido a 1/1/2014 e reportado ao ano anterior; - a quantia de €48,32 a título do valor remanescente de proporcionais de férias, subsídio de natal e subsídio de férias relativos ao ano de cessação do contrato considerando o crédito do autor, a esse título de €777,32 e no pressuposto de que a quantia paga pela ré no dia 5/8/2014 de €729,00 se reportou a esse montante; - as retribuições salariais desde a data de despedimento até à data do trânsito em julgado da presente acção, nomeadamente as já vencidas reportadas aos meses de Julho (após o dia 11), Agosto e Setembro de 2014, o que perfaz o valor global de €1.212,50; - a quantia de €3.500,00 a título de danos não patrimoniais sofridos pelo autor em consequência do despedimento; - as despesas suportadas em consequência do despedimento, no que se apurar em sede de ampliação do pedido ou liquidação de sentença; - os juros contabilizados à taxa legal desde a citação sobre as mencionadas quantias.
Alegou o Autor, em síntese, que em 29.5.2014 foi chamado ao escritório da empresa pelo responsável da Ré, que lhe pediu para assinar um documento segundo o qual o dinheiro que o pai do Autor lhe havia emprestado não se destinava a ele, mas a um irmão do Autor, assim pretendendo aquele responsável que o Autor, no futuro, não se assumisse como herdeiro do crédito. O Autor recusou e no dia seguinte foi novamente chamado e reiterando a negativa, acto contínuo, o responsável comunicou-lhe que estava suspenso, que iria ser levantado um processo disciplinar e iria receber uma nota de culpa. Tendo em conta que a comunicação foi transmitida verbalmente, o Autor escreveu à Ré: “Serve a presente para formalizar que no passado dia 30 de Maio de 2014, sexta-feira, V. Ex.as me comunicaram que me encontrava suspenso temporariamente do exercício das minhas funções da empresa e que seria notificado de uma nota de culpa, tendo ficado impedido de exercer as minhas funções na empresa, por facto exclusivamente imputável a V. Ex.as”.
Por carta de 12 de Junho de 2014, a Ré procedeu ao envio da nota de culpa, à qual o A. respondeu, sucedendo que após esta resposta, em 1 de Julho de 2014, a Ré escreveu ao Autor, sob a epígrafe “Abandono do Trabalho”, que “desde o passado dia 17 de Junho de 2014 que V. Exª falta ao serviço desta firma, não tendo feito qualquer comunicação do motivo da ausência (…) presume-se que V. Exª abandonou o trabalho, não havendo da sua parte intenção de o retomar”.
O Autor respondeu que a Ré bem sabia que não haviam faltas injustificadas nem abandono, pois tinha sido ela quem o impedira de trabalhar e lhe comunicara que teria de ir para casa porque estava suspenso em consequência do processo disciplinar, e, invocando que a carta da Ré não era totalmente elucidativa, pediu que confirmassem se pretendia proceder à comunicação de cessação do contrato de trabalho ou se pretendiam que retomasse o serviço, ao que a Ré respondeu procedendo à comunicação da cessação do contrato por abandono do trabalho.
Não estão preenchidos os requisitos do abandono do trabalho, pelo que a comunicação da Ré constitui um despedimento ilícito.
Contestou a Ré, invocando em síntese que tendo tido conhecimento dos factos que vieram a constar da nota de culpa, o A. foi chamado para lhe ser comunicada a sua suspensão, a qual se recusou a receber em mão, tendo em consequência sido o seu conteúdo lido e explicado e entregue perante três pessoas que testemunharam o sucedido. Tal suspensão iria decorrer entre os dias 2 a 16 de Junho de 2014, tendo o Autor ficado ciente deste facto, tanto que menciona na sua carta que estava suspenso temporariamente e que seria notificado de uma nota de culpa. A Ré limitou o período de suspensão ao mínimo indispensável para aferir com a maior certeza possível a ocorrência dos factos. A nota de culpa foi enviada a 12 de Junho. Foi o A. que não retomou a laboração a 17 desse mês, nem justificou as faltas, que se deram por mais de dez dias seguidos, assim revelando com toda a certeza a intenção de não retomar o trabalho. Durante e após o período da suspensão o Autor andou a procurar outro trabalho ou um local para se estabelecer por conta própria.
Ocorreu pois abandono do trabalho e não despedimento ilícito.
Respondeu o A. sustentando que nunca a Ré a leu, apresentou, entregou ou tentou entregar a suposta declaração de suspensão, sendo falso que estivessem outras pessoas no escritório além de si e do responsável da Ré, reiterando que a suspensão foi operada verbalmente. Pediu a condenação da Ré como litigante de má-fé.
Foi proferido despacho saneador, fixando à acção o valor de €11.914,57, dispensando a audiência prévia e assentando os factos admitidos por acordo, definindo o tema de prova.
Após a realização da audiência de discussão e julgamento, gravada, foi proferida sentença de cuja parte dispositiva consta: “Pelo exposto, decide-se julgar a presente acção parcialmente procedente e, em consequência, condena-se a ré, C…, Lda., no pagamento ao autor, B…, da quantia de €11,47 (onze euros e quarenta e sete cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, contados desde a citação e até efectivo e integral pagamento, absolvendo-se a ré do demais peticionado.
Custas por autor e ré, na proporção de, respectivamente, 99% e 1%, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia o autor”.
Inconformado, interpôs o Autor o presente recurso, apresentando a final as seguintes conclusões: A – A sentença recorrida viola os preceitos legais e princípios jurídicos aplicáveis, afigurando-se como profundamente injusta.
B – A sentença errou ao não considerar como ilícito o despedimento do recorrente e ao não condenar a recorrida no pedido, nessa consequência.
C - Não existiu qualquer abandono de trabalho do recorrente; assim deveria o tribunal a quo ter concluído pela mera análise dos factos que resultaram provados no despacho saneador e da documentação junta aos autos.
D – A ausência do recorrente ao serviço da recorrida resultou de facto imputável à entidade empregadora, que no dia 30 de Maio comunicou ao trabalhador que estava suspenso do exercício da sua actividade profissional em consequência de um processo disciplinar.
E – Não se pode aceitar que uma entidade patronal possa invocar abandono de trabalho após ter suspendido o trabalhador, e após o trabalhador ter comunicado por escrito que o motivo da sua ausência decorria de facto imputável à entidade empregadora.
F - A figura processual da cessação do contrato de trabalho por abandono do trabalho exige a verificação de específicos pressupostos para que possa ser invocada, para além da ausência do trabalhador ao serviço da empresa. O que não aconteceu na situação em apreço.
G - Nunca existiu qualquer comportamento do recorrente que pudesse sustentar o abandono de trabalho; Não existiu e não se verificou a ocorrência de factos que revelassem, com toda a probabilidade, a intenção do recorrente em não retomar o trabalho; Não ocorreu qualquer falta de comunicação/ informação do motivo da ausência, pois o recorrente enviou a 3.06.2014 uma carta registada com aviso de recepção à recorrida, a fls. 28, a dar-lhe conta que o motivo da sua ausência ao serviço da empresa decorria de facto imputável à entidade patronal, que o suspendeu, impedindo-o de exercer as suas funções; a recorrida sabia qual o motivo da ausência; foi a recorrida quem criou o motivo que justificou a ausência do trabalhador.
H - Incorreu o tribunal a quo em erro na qualificação jurídica dos factos e violação do art.º 403º do C.T.
I – O despedimento do recorrido ocorreu na pendência de um processo disciplinar, após comunicação de suspensão da actividade do trabalhador. É notória a intenção da recorrida de impedir que o recorrente voltasse a exercer a sua actividade ao serviço da empresa; na própria nota de culpa se refere que “o comportamento doloso acima descrito, pela sua gravidade e consequências, torna imediatamente impossível a subsistência do seu contrato de trabalho e constitui justa causa para o seu despedimento, nos termos do que se dispõe no Art.º 351º n.º 1 e 2 alínea e) do Código do Trabalho.” (o destaque e sublinhado é nosso) J – À carta do recorrente de 3.06.2014 (fls 28) a recorrida não respondeu e remeteu-se ao silêncio, nunca esclarecendo, em momento algum, que a suspensão da actividade do trabalhador seria apenas até ao dia 16.06.2014, e não obstante a carta do recorrente de 7.07.2014, a fls 42, em que o autor deixou claro que nunca existiu qualquer abandono de trabalho, a recorrida manteve o seu propósito de cessar o contrato, de forma manifestamente ilegal e ilícita.
L – Sem conceder, se porventura a comunicação de suspensão tivesse sido realizada até ao dia 16.06.2014, sempre se imporia que a recorrida considerasse as faltas como injustificadas e, em consequência, procedesse a um aditamento à nota de culpa com base nessas alegadas faltas mas nunca poderia considerar que existiu abandono do trabalho, porque nenhum outro facto existiu que pudesse sustentar essa circunstância.
M – A utilização de testemunhas para fazer prova de uma alegada entrega em mão de uma declaração de suspensão de um trabalhador no âmbito de um processo disciplinar é surreal e inaceitável! N – A lei impõe...
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