Acórdão nº 894/14.2T8VNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 28 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelVITOR AMARAL
Data da Resolução28 de Outubro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação n.º 894/14.2T8VNG.P1 1.ª Secção Cível Acordam no Tribunal da Relação do Porto: ***I – Relatório “B… ”, com os sinais dos autos, intentou ação de condenação com processo comum, contra “Fundo de Garantia Automóvel” (doravante, FGA), também com os sinais dos autos, pedindo a condenação do R. a pagar-lhe a quantia de € 63.564,43, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento.

Para tanto, alegou, em síntese, que: - no exercício da sua atividade seguradora, celebrou um contrato de seguro do ramo responsabilidade civil automóvel, referente ao veículo automóvel de matrícula “..-..-TU”, com transferência do risco de tal responsabilidade por acidentes de viação causados por esse veículo, o qual foi interveniente num acidente de viação em que também interveio o veículo de matrícula “..-..-JC”, com o veículo “TU” a transitar fora de mão e a embater no “JC”; - porém, no momento precedente ao acidente (simultaneamente de viação e de trabalho) o veículo “TU” seguia pela hemi-faixa direita, atento o seu sentido de marcha, altura em que se deparou com um veículo de matrícula desconhecida que, não parando perante um sinal de “Stop”, se atravessou à frente do “TU”, obrigando o condutor deste a desviar-se e embater no “JC”; - a A. foi condenada judicialmente a pagar a pessoa lesada no acidente indemnização, tendo-lhe pago o valor de € 95.612,05, bem como à seguradora “C… ”, seguradora de acidentes de trabalho, o montante de € 10.328,67, perfazendo a quantia global satisfeita de € 105.940,72; - a culpa na produção do acidente foi, em concorrência com a do condutor do veículo “TU”, do condutor da viatura de matrícula desconhecida (na proporção de 60% para este); - o FGA está obrigado a garantir a satisfação das indemnizações devidas por lesões corporais, quando o responsável seja desconhecido, como é o caso (art.ºs 21.º e segs. do DLei n.º 522/85, de 31-12, aplicável por o acidente ter ocorrido em 17/05/2003); - assim, tem a A. direito de regresso contra o R., na medida das respetivas culpas quanto às aludidas quantias pagas, perfazendo os peticionados € 63.564,43, a que acrescem juros moratórios.

Contestou o R.: - excecionado, para além do caso julgado quanto a parte do pedido, a impossibilidade de a A. exercer o direito pretendido contra o R. no que concerne às importâncias pagas à “C…”, visto que o direito de regresso de uma seguradora por força do pago ao abrigo da cobertura de acidente de trabalho, apenas poderá ser exercido junto do causador do acidente, não podendo qualificar-se como tal o FGA, com a consequente improcedência nessa parte do pedido; e - impugnando diversa factualidade, designadamente atinente ao acidente, atribuindo a responsabilidade pelo mesmo ao condutor do veículo “TU”, com a consequente improcedência da ação.

Em resposta, a A. concluiu como na sua petição.

Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador, julgando-se pela total improcedência da exceção de caso julgado.

Em seguida, conheceu-se de meritis, julgando-se totalmente improcedente a ação, com a consequente absolvição in totum do R..

Inconformada, veio a A. interpor o presente recurso (fls. 195 e segs.), apresentando as seguintes Conclusões «I. O tribunal recorrido baseou a sua posição restritiva do conceito de lesado para efeitos da legitimidade da demanda do FGA por recurso à extensão do entendimento que tem sido defendido quanto aos casos envolvendo companhias de seguro em sede de seguros de acidentes de trabalho, nos casos de sinistros simultaneamente de trabalho e de viação, entendimento esse que encontrou suporte na formulação da norma plasmada inicialmente nos nºs 1 e 4 da Base XXXVII da Lei 2127, de 3 de Agosto de 1965, depois nos nº 1 e 4 do artigo 31º da Lei nº 100/97, de 13 de Setembro – aplicável ao caso em apreço - e, finalmente, nos nº 1 e 4 do artigo 17º da Lei 98/2009, de 4 de Setembro, actualmente em vigor.

  1. Sobre a aplicação de tal norma no âmbito do exercício do direito de regresso de seguradora laboral em acidente simultaneamente laboral e de viação – e APENAS nessa âmbito - versaram os acórdãos invocados pela sentença ora em crise, ou seja, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 05.05.2011 e de 30.05.2013.

  2. O tribunal recorrido veio estender a argumentação expendida pelo réu FGA à totalidade do pedido formulado pela autor, aqui recorrente, isto é, também ao âmbito do direito de ressarcimento da recorrente pelas quantias não relativas à indemnização laboral atribuída, extensão essa que nem o próprio réu FGA defendeu na sua contestação, por bem saber que a mesma não tem qualquer fundamento legal.

  3. Argumentando, como tal, que o direito de regresso de que beneficia uma seguradora por força das subvenções pagas ao abrigo de uma cobertura de acidente de trabalho, apenas poderá ser exercido junto de quem tenha dado causa ao acidente, não podendo qualificar-se o réu como causador do acidente de viação, que simultaneamente se configura como acidente laboral.

  4. Ainda que se discorde de tal entendimento defendido pelo réu FGA, como se discorda, o mesmo cinge-se ao âmbito “laboral” da questão em apreço, já nada se dizendo quanto ao valor do pedido que excede esse âmbito, como também não o diz a lei, ao contrário do entendimento sustentado pelo tribunal recorrido.

  5. Bem como tal não decorre ainda do considerando nº 49 constante da Directiva 2009/103/CE, que, para todos os efeitos, não encontrou qualquer acolhimento legal na legislação nacional.

  6. Não se coloca, na situação em apreço, e ao contrário do que sucede nos dois acórdãos acima referenciados, a tónica da discussão à possibilidade de extensão do conceito legal de “causador” do acidente simultaneamente de viação e laboral – exigido, entre outros, pelo artigo 31º da Lei 100/97, de 13 de Setembro – ao FGA.

  7. Antes se colocando, sim, a discussão nos presentes autos na possibilidade do FGA ser considerado como responsável, ao abrigo do disposto nos artigos 21º e seguintes do Decreto-Lei 522/85, de 31 de Dezembro, em conjugação com o disposto no nº 2 do artigo 497º do Código Civil, perante a recorrente – enquanto lesada sub-rogada – uma vez que o co-responsável pelo sinistro em apreço se afigura como desconhecido.

  8. E tal possibilidade, ao contrário do sustentado pelo tribunal recorrido, não encontra qualquer impedimento legal, antes encontrando apoio na letra da lei.

  9. Não exigindo a lei – em concreto, o artigo 497º, nº 2 do Código Civil em conjugação com os artigos 21º e seguintes do Decreto-Lei nº 522/85, de 31 de Dezembro –, também ao contrário do que sustenta o...

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