Acórdão nº 1973/09.3T2OVR-D.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 19 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelCARLOS GIL
Data da Resolução19 de Janeiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

1973/09.3T2OVR-D.P1 Sumário do acórdão proferido no processo nº 1973/09.3T2OVR-D.P1 elaborado pelo seu relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil: 1. Tendo o tribunal a quo concluído na fase do despacho saneador que quer por força da “rectificação” da data em que os embargantes tiveram conhecimento das penhoras, quer ainda pela inobservância do ónus de alegação por parte da arguente da excepção de intempestividade dos embargos de terceiro, estava impossibilitado de conhecer dessa excepção e não tendo essa decisão sido impugnada, estava vedado ao tribunal a quo regressar à cognição da mesma questão em sede de sentença final, produzindo um juízo em frontal dissonância com aquele primeiro ou sequer reproduzindo o mesmo juízo anterior.

  1. Os factos concretizadores não podem operar em relação a todos os factos essenciais integradores de certa causa de pedir ou de certa excepção peremptória, mas apenas em relação a alguns desses factos pois, é necessário que sejam alegados os factos essenciais que permitam individualizar quer a causa de pedir, quer a defesa por excepção e assim possibilitem a formação do caso julgado material.

  2. Para que uma certa procuração seja irrevogável, não basta que isso se declare no instrumento respectivo ou que se afirme que é outorgada no interesse próprio do mandatário, sendo necessário que se comprove a existência de uma relação subjacente àquela outorga que fundamente essa irrevogabilidade nos termos previstos no nº 3, do artigo 265º do Código Civil.

  3. No caso de posse exercida em nome alheio, é a pessoa em nome de quem a posse é exercida que tem posse em nome próprio e que goza da tutela possessória e não a pessoa que pratica os actos materiais integradores do corpus da posse, em nome de outrem, pois que se trata de uma mera detentora (artigo 1253º, alínea c), do Código Civil).

    *** * ***Acordam, em audiência, os juízes abaixo-assinados da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto: 1. Relatório[1] A 14 de Junho de 2011, por apenso à acção executiva sob forma comum nº 1973/09.3T2OVR, para pagamento de quantia certa, pendente nos Juízos de Execução de Ovar, instaurada por B…, Lda.

    contra a sociedade C…, Lda.

    , vieram D… e E… deduzir embargos de terceiro contra a exequente B…, Lda.

    [2] pedindo a condenação da embargada a reconhecer que os embargantes são[3] das fracções penhoradas, devendo ordenar-se o levantamento das penhoras incidentes sobre as fracções autónomas AM, AO e X do prédio urbano constituído em propriedade horizontal descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o nº 1163/19980121 e o cancelamento dos respectivos registos, requerendo ainda a suspensão imediata da venda das referidas fracções autónomas.

    Para fundamentar as suas pretensões, os embargantes alegam, em síntese, que o embargante celebrou há mais de onze anos com a sociedade executada três contratos-promessa, nos termos dos quais esta sociedade lhe prometeu vender as fracções penhoradas designadas pelas letras “AM”, “AO” e “X”, e lhe entregou, em simultâneo, as chaves das aludidas fracções, tendo o embargante pago o preço integral, pelo que desde essa data tomou posse das mesmas; não obstante as interpelações à sociedade “C…, Lda.”, para celebrar os contratos definitivos, estes não foram celebrados; em 27 de Novembro de 2000, os sócios e gerentes da sociedade executada outorgaram procuração irrevogável a favor do embargante a quem conferiram poderes para, prometer vender e vender pelo preço global de cento e onze milhões e quatrocentos mil escudos (€555.660,85), as fracções, “AF”,“AM”, “AO”, “AS” “AT” “BG” “BH”e “X”, sendo as fracções AM, AO e AS pelo preço unitário de doze milhões e quinhentos mil escudos, a fracção AT pelo preço de treze milhões de escudos, a fracção AF pelo preço de treze milhões e quatrocentos mil escudos, a fracção BH pelo preço de quinze milhões e quinhentos mil escudos e as fracções BG e X pelo preço de dezasseis milhões de escudos; desde finais de 2000 as referidas fracções estão arrendadas a terceiros, com excepção da fracção “AM” que se encontra devoluta desde finais de Fevereiro de 2011, sendo o embargante que assegura a manutenção e conservação das ditas fracções sempre que lhe é solicitada alguma reparação pelos arrendatários.

    Os embargos foram liminarmente recebidos, determinando-se a suspensão da acção executiva no que se refere às fracções objecto dos embargos e a notificação das partes primitivas na acção executiva para, querendo, deduzirem contestação.

    A exequente contestou suscitando a intempestividade dos embargos, aceitando para tanto como confissão a alegação dos embargantes de que teriam tido conhecimento da penhora no dia 17 de Maio de 2010 e impugnou a generalidade dos factos alegados na petição inicial.

    Por despacho proferido a 29 de Março de 2012, considerou-se ser o Juízo de Execução incompetente, em razão da matéria, para preparar e julgar a acção no que se refere ao pedido de reconhecimento do domínio ou propriedade das fracções quando invocado pelo embargante, sendo ainda os embargantes convidados a esclarecer se existe algum lapso na data que alegam como sendo aquela em que tiveram conhecimento das penhoras.

    Os embargantes responderam ao convite alegando ter sido em 17 de Maio de 2011 que tiveram conhecimento das penhoras, requerendo a rectificação do lapso de escrita que afirmam ter cometido, requerimento que não mereceu oposição da embargada contestante, nem da executada.

    Dispensou-se a realização da audiência preliminar, proferiu-se despacho saneador, decidindo-se que em face da rectificação da data de conhecimento das penhoras por parte dos embargantes, da não oposição da exequente e da preclusão da alegação de factos referentes a esta questão, não era possível conhecer da excepção de intempestividade dos embargos[4].

    Procedeu-se à condensação da factualidade considerada relevante para a boa decisão da causa, discriminando-se os factos assentes dos controvertidos, estes últimos a integrar a base instrutória.

    Após isso, a embargada contestante ofereceu as suas provas.

    Por despacho proferido a 18 de Novembro de 2013, as partes foram informadas que era aplicável aos autos o Código de Processo Civil, aprovado em anexo à Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, tendo sido notificadas para o efeito do disposto no artigo 5º, n.º 4 da citada lei.

    Os embargantes reiteraram o requerimento probatório junto com a petição inicial.

    Realizou-se a audiência final em duas sessões, tendo os embargantes requerido na primeira a prestação de declarações por parte do embargante à matéria dos artigos 1º a 7º da base instrutória, requerimento que foi deferido.

    A 22 de Abril de 2014 foi proferida sentença em que se enunciou como única questão a decidir a tempestividade dos embargos, sendo os embargos rejeitados com fundamento na sua intempestividade.

    Inconformados com a sentença, os embargantes interpuseram recurso de apelação, terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões: “A) Os embargos não são extemporâneos; B) A Ré discorda da resposta dada à matéria de facto; C) Devem ser considerados como provados: 4 – Exceptuando-se a fracção “AM” que se contra devoluta, desde finais de Fevereiro de 2011.

    5 – O arrendatário da fracção “X” para uma renda mensal no montante de €350,00 (trezentos e cinquenta euros).

    6 – O arrendatário da fracção “AO” para uma renda mensal no montante de €250,00 (duzentos e cinquenta euros).

    7 – Os contratos de água e luz referentes a cada uma das fracções estão em nome dos respectivos arrendatários.

    1. A sentença é nula.

    2. Houve excesso de pronúncia, o que constitui uma nulidade; F) Não foi proferido despacho de admissibilidade de um novo facto (“Os embargantes tiveram conhecimento das penhoras incidentes sobre as fracções “AM”, “AO” e “X” no dia 17 de Maio de 2011”), o que constitui uma nulidade; G) O depoimento de parte foi valorado quanto a factos que não estavam incluídos na base instrutória, o que constitui uma nulidade.” Não foram oferecidas contra-alegações.

    O Sr. Juiz a quo pronunciou-se sobre as nulidades arguidas pelos recorrentes, remetendo para o que sobre os alegados vícios exarou na sentença recorrida.

    As partes foram notificadas para, querendo, se pronunciarem sobre se a decisão de intempestividade dos embargos proferida em sede de sentença final colide com a decisão de impossibilidade de conhecimento da mesma intempestividade na fase do despacho saneador, ocorrendo deste modo violação do caso julgado.

    Os recorrentes pronunciaram-se no sentido de existir caso julgado quanto à questão da tempestividade dos embargos, enquanto a recorrida B…, Lda. se pronunciou no sentido do conhecimento dessa questão ter sido relegado para final e que a decisão se baseou em confissão.

    Colhidos os vistos legais e nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir.

  4. Questões a decidir tendo em conta o objecto do recurso delimitado pelos recorrentes nas conclusões das suas alegações (artigos 635º, nº 3 e 4 e 639º, nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil, na redacção aplicável a estes autos), por ordem lógica e sem prejuízo da apreciação de questões de conhecimento oficioso, observado que seja, quando necessário, o disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil 2.1 Da violação do caso julgado decorrente da decisão de intempestividade dos embargos proferida em sede de sentença final quando na fase do despacho saneador se proferiu decisão de impossibilidade de conhecimento da mesma intempestividade; 2.2 Da nulidade da sentença recorrida por excesso de pronúncia e das nulidades processuais por não ter sido aditada à base instrutória factualidade relativa ao conhecimento das penhoras embargadas pelos embargantes e por terem sido valoradas as declarações de parte do embargante sobre factos não incluídos na base instrutória; 2.3 Da reapreciação das respostas aos artigos 8º a 11º da base instrutória[5]; 2.4 Dos reflexos da eventual...

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