Acórdão nº 13890/07.7TBVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Janeiro de 2015
Magistrado Responsável | FERNANDO SAM |
Data da Resolução | 13 de Janeiro de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo n.º 13890/07.7TBVNG.P1 Da 2.ª Vara de Competência Mista do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, entretanto extinto, agora da Instância Central, da mesma localidade, 3.ª Secção Cível – J2, Comarca do Porto.
Relator: Fernando Samões 1.º Adjunto: Dr. Vieira e Cunha 2.º Adjunto: Dr.ª Maria Eiró*Acordam no Tribunal da Relação do Porto - 2.ª Secção: I. Relatório B… e mulher C…; D… e mulher E…; F… e mulher G…; e H… instauraram, em 3/12/2007, a presente acção declarativa com processo comum e forma ordinária contra: 1.
I…, falecida em 17/2/2011, tendo sido julgados habilitados como seus únicos herdeiros os seus filhos J…, K… e L…; 2.
J… e marido M…; 3.
K… e marido A…; 4.
L… e mulher O…, aquele falecido em 12/10/2012, tendo sido habilitados como seus únicos herdeiros, para além da sua esposa, a sua filha P…; 5.
Q… 6.
T…; 7.
U… e marido V…; e 8.
W…, S.A., todos melhor identificados nos autos, pedindo: a) Que seja declarada a ineficácia do contrato de compra e venda celebrado entre os 1.ª a 7.ºs RR e referente ao imóvel que descreveram no art.º 7.º da P.I.; b) Que seja ainda julgado nulo, por simulação absoluta, o mesmo contrato e, em consequência, sejam cancelados os registos de propriedade efectuados a favor dos 5.º e 6.ºs RR e da hipoteca por estes constituída a favor do 8.º R..
Para tanto, alegaram, em resumo, o seguinte: Por sentença, transitada em julgado em 18/5/2006, proferida nos autos de acção ordinária que, com o n.º 9272/05.3TBVNG, correram termos pela 2.ª Vara de Competência Mista de Vila Nova de Gaia, os 3.ºs RR foram, além do mais, condenados: - o X… a pagar aos l.ºs. AA., B… e mulher, a quantia de € 20.775,00; - o mesmo R., a pagar aos 2.ºs AA., D… e mulher, também a quantia de € 20.775,00; - a K1… a pagar aos 3.ºs AA., F… e mulher, igualmente a quantia de € 20.775,00; - a mesma Ré, a pagar ao 4.º A., H…, também a importância de € 20.775,00.
Tal acção foi intentada em 18 de Outubro de 2005, tendo os aí RR sido para ela citados em 1 de Fevereiro de 2006.
No dia 10 de Março de 2006, todos os RR outorgaram numa escritura de compra e venda através da qual os 1.ª a 4ºs. RR., inclusive, declararam vender, pelo preço de € 55.000,00, que aí declararam ter já recebido, o prédio descrito na 1.ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia, sob o nº 03778/100106 aos 5.º e 6.ª RR.
Esse prédio era o único bem de valor que os 3.ºs RR possuíam ainda que registado em comum e sem determinação de parte com os 1.ª, 2.ª e 4.º RR.
Todos os RR, que são parentes ou afins entre si, com excepção do 5.º que vive em união de facto com a 6.ª Ré, e do 8.º, actuaram de forma conluiada com o propósito de impedirem os AA de obterem satisfação integral ou parcial do seu crédito.
O direito de propriedade sobre o dito prédio mostra-se inscrito a favor dos 5.º e 6.ª RR., que o deram de hipoteca a favor do 8.º Réu para garantir o pagamento do empréstimo que contraíram no montante de € 55.000,00, e encargos até ao valor máximo de € 75.350,00.
Contestou apenas o W…, S.A., impugnando a generalidade dos factos alegados pelos AA, por desconhecimento, e alegando que procedeu, sempre, de boa-fé convencido de que, ao celebrar o contrato de mútuo com os 5.º e 6.ª RR, não prejudicaria os legítimos interesses de terceiros, concluindo, pelo menos quanto a si, pela improcedência da acção.
Dispensada a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador tabelar e feita a condensação, com selecção dos factos assentes e organização da base instrutória, de que reclamaram os autores e o Banco, obtendo êxito parcial.
Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com gravação da prova nela produzida.
E, em data que desconhecemos[1], mas compreendida entre 18/11/2013 e 6/3/2014, foi proferida sentença que, na sequência da verificação da simulação, julgou a acção procedente e declarou a “nulidade dos negócios jurídicos de compra e venda e constituição de hipoteca celebrados no dia 10 de Março de 2006, através de escritura pública lavrada no Cartório Notarial da Notária Y… referida em 4º dos factos provados e que tinha por objecto o prédio descrito em 3º dos factos provados” e, em consequência, determinou “o cancelamento dos registos efectuados com base em tal acto; de aquisição a favor dos 5º e 6ºs RR. e de constituição de hipoteca a favor do 8º Réu.” Inconformados com o assim decidido, interpuseram recurso de apelação a ré T… e o réu W… e apresentaram as respectivas alegações com as seguintes conclusões: Da ré T…: “I - A recorrente não se conforma com a douta sentença recorrida que declarou a nulidade dos negócios jurídicos referidos em 4.º dos factos provados e, em consequência determinou o cancelamento dos registos efectuados com base em tal acto.
II - O trânsito em julgado da decisão que determinou a condenação dos 3.ºs RR a pagar aos recorridos uma determinada quantia é posterior à escritura de venda, cuja nulidade foi declarada, pelo que não se verifica nos autos o requisito da anterioridade do crédito, a intenção de causar prejuízo e a diminuição da garantia patrimonial.
III - A recorrente não teve a intenção de prejudicar os recorridos ao outorgar a escritura de compra e venda, na medida em que a decisão que determinou o crédito dos recorrentes poderia ainda ser objecto de recurso, não sendo ainda definitiva, por força do trânsito em julgado, por outro lado nada deve aos recorridos, pelo que a venda da sua quota-parte no imóvel não os poderia prejudicar.
IV - Os recorridos não peticionaram a chamada “Impugnação Pauliana” do contrato de compra e venda celebrado entre os Réus, ao abrigo do disposto no art.º 610.º do Cód. Civil, que é o meio idóneo destinado a anular actos que envolvam a diminuição da garantia patrimonial.
V - Os Autores não peticionaram nos autos o direito de obterem o pagamento dos seus créditos sobre os 3.ºs RR, à custa do património dos 5.º e 6.º R., nos termos do art.º 610.º e 616.º do Código Civil., tendo-se limitado a arguir a nulidade do negócio, por simulação absoluta.
VI - Os recorridos não lograram provar nos autos os requisitos da impugnação pauliana, nomeadamente a anterioridade do crédito e a má-fé dos terceiros, como tal a acção deveria ter sido julgada totalmente improcedente VII – Os Autores apenas detém um direito de crédito sobre os 3.ºs RR, pelo que admitir-se a posição plasmada na sentença, com a declaração da nulidade do negócio, resulta uma eventual ampliação da garantia patrimonial do AA sobre a totalidade do prédio, o que é inadmissível em face da lei.
VIII - Os recorridos não são interessados para efeitos de invocação da simulação, na medida em que não são detentores de qualquer posição jurídica relevante que impeça os RR de concretizarem o negócio declarado nulo pela sentença em causa, pois, como se disse não são credores dos 1.º, 2.ºs e 4.ºs RR.
IX - A douta sentença recorrida, ao julgar a acção procedente, violou expressamente as disposições constantes dos artºs. 240.º, 242º., 286º., 610.º e 616.º do Código Civil.
X - Como tal deverá ser substituída por douto Acórdão que a revogue e, em consequência, julgue a acção totalmente improcedente.
Nestes termos e nos que Vossas Excelências mui doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso, julgando-se a acção totalmente improcedente.
Dessa forma, e como sempre, será feita inteira e sã JUSTIÇA.” Do réu Banco: “1ª- A resposta dada aos art. 3º, 4º, 5º e 6º da BI deveria ter sido de “não provado” pelo que devem as respostas dadas a essa matéria ser alterada, considerando-se essa matéria de facto como não provada.
-
- Alterada a matéria de facto no sentido pugnado pelo Recorrente, é forçoso concluir que não se mostram verificados os pressupostos da simulação da compra e venda celebrada entre os RR, pelo que não deveria a douta sentença ter decretado a nulidade da compra e venda e da hipoteca constituída a favor do recorrente.
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Demonstrada que ficou a boa-fé do recorrente, não pode proceder relativamente a si o pedido de ineficácia da compra e venda em consequência da eventual procedência da impugnação pauliana do negócio.
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Ao não entender assim, a douta sentença fez uma incorreta aplicação do disposto no art. 240º do CC.
Nestes termos deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, revogar-se a douta sentença da 1ª instância.” Os autores contra-alegaram, apenas em resposta ao recurso da ré T…, defendendo a confirmação da sentença recorrida.
Tudo visto, cumpre apreciar e decidir o mérito dos presentes recursos.
Sabido que o seu objecto e âmbito estão delimitados pelas conclusões dos recorrentes [cfr. art.ºs 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do NCPC, aqui aplicável, com excepção do disposto no n.º 3 do seu art.º 671.º, visto se tratar de uma sentença proferida após a data da sua entrada em vigor, ainda que a acção tenha sido instaurada antes de 1/1/2008 (cfr. art.ºs 5.º, n.º 1, 7.º, n.º 1, e 8.º, da Lei n.º 41/2013, de 26/6)], não podendo este Tribunal de 2.ª instância conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser em situações excepcionais que aqui não relevam, e tendo presente que se apreciam questões e não razões, as questões que importa dirimir consistem em saber: a) Se pode/deve ser alterada a matéria de facto; b) Se os Autores não invocaram a impugnação pauliana e não provaram os respectivos requisitos, como deviam; c) Se não estão verificados os requisitos da simulação; d) Se os Autores não são interessados para efeitos de invocação da simulação; e) E se o pedido de ineficácia da compra e venda em consequência da impugnação pauliana não pode proceder relativamente ao Banco, por ter agido de boa fé.
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Fundamentação 1. De facto Na sentença recorrida foram dados como...
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