Acórdão nº 722/13.6TTMAI.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 05 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelJO
Data da Resolução05 de Janeiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. n.º 722/13.6TTMAI.P1 Secção Social do Tribunal da Relação do Porto Relator: João Nunes; Adjuntos: (1) António José Ramos, (2) Eduardo Petersen Silva.

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório B… (NIF ………, residente na Rua …, n.º …, ….-… …) intentou, através da apresentação do formulário a que aludem os artigos 98.º-C e 98.º-D, do Código de Processo do Trabalho, acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento contra C…, Lda.

(NIPC ………, com sede na Rua …, n.º.., ….-… …), declarando a sua oposição ao despedimento, promovido por esta, e requerendo que seja declarada a ilicitude ou irregularidade do mesmo, com as legais consequências.

Designada e realizada a audiência de partes, na mesma não se logrou obter o acordo destas.

Após, veio a empregadora, nos termos previstos nos artigos 98.º-I, n.º 4, alínea a) e 98.º-J, n.º 1, ambos do Código de Processo do Trabalho (doravante CPT), apresentar articulado a motivar o despedimento.

Para o efeito alegou, em suma, que o trabalhador foi admitido ao seu serviço em 6 de Abril de 2000, para desempenhar as funções de “polidor manual”, e que no exercício das mesmas contactava com fornecedores da Ré, com quem agendou encontros fora das instalações desta.

Em tais encontros sugeriu aos fornecedores da Ré que aumentassem o preço dos bens a fornecer a esta, de modo a que a margem de lucro excedente lhe fosse (ao Autor) entregue para seu benefício próprio; caso o fornecedor não procedesse de acordo com as referidas instruções do Autor, este dava indicações à Ré de que os produtos desse fornecedor eram de fraca qualidade, sugerindo outros fornecedores para a Ré.

E, de modo a fundamentar e convencer da fraca qualidade dos produtos fornecidos pelas empresas que não aceitavam o “conluio”, o trabalhador/Autor manuseava-os de forma deficiente e danificava-os propositadamente, retirando-lhes qualidade e provocando prejuízos à Ré: de seguida dava instruções ao departamento de encomendas da Ré para ser utilizado outro fornecedor devido à perda de qualidade dos materiais que haviam sido fornecidos por empresas que não haviam aceite as propostas do Autor.

Acrescenta a Ré que dada a confiança que tinha no Autor, na sequência das instruções deste procurava outros fornecedores dos produtos necessários, não fazendo mais nenhuma encomenda ao fornecedor com os produtos de “má qualidade”, concluindo que por essa via o Autor obteve para si um enriquecimento ilícito e causou prejuízos, patrimoniais e não patrimoniais, não só à Ré como aos seus fornecedores, incorrendo em infracções graves, provocando a falta de confiança no mesmo e a existência de justa causa para o despedimento.

Respondeu o trabalhador/Autor, por excepção e por impugnação: (i) por excepção, sustentando a invalidade do procedimento disciplinar, uma vez que a nota de culpa não contêm uma descrição circunstanciada dos factos que lhe são imputados; por impugnação, a negar a prática dos factos que lhe foram imputados.

Em reconvenção, pediu a condenação da Ré no pagamento de uma indemnização pela ilicitude do despedimento, a fixar entre 15 e 45 dias da retribuição completa por cada ano ou fracção, no pagamento das retribuições desde o despedimento ata à data do trânsito em julgado da decisão que declare a ilicitude do mesmo e ainda uma indemnização de € 10.000,00 a título de danos não patrimoniais.

Termina concluindo: a) que se julgue procedente a excepção de invalidade do procedimento disciplinar, e ilícito o despedimento; b) caso assim se não entenda, que se julgue não provada e improcedente a justa causa invocada pela Ré para o despedimento; c) em qualquer dos casos, que se condene a Ré no pagamento de uma indemnização de antiguidade, nas retribuições devidas desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que declarou o mesmo ilícito, e ainda numa indemnização de € 10.000,00 a título de danos não patrimoniais.

Respondeu a Ré, a afirmar a validade do procedimento disciplinar, por a nota de culpa se encontrar suficientemente circunstanciada, e a pugnar pela improcedência da reconvenção, concluindo, pois, tal como no articulado inicial que apresentou, pela licitude do despedimento.

Seguidamente foi admitido o pedido reconvencional e proferido saneador-sentença que, com fundamento na invalidade do procedimento disciplinar – por a nota de culpa não conter uma descrição circunstanciada dos factos imputados ao trabalhador –, declarou ilícito o despedimento do trabalhador/Autor, tendo os autos prosseguido para apreciação dos demais pedidos formulados na reconvenção.

Inconformada com a referida decisão que declarou ilícito o despedimento, a Ré dela interpôs recurso para este tribunal, recurso que foi admitido na 1.ª instância como de apelação, com subida imediata, em separado e com efeito meramente devolutivo.

No mesmo despacho foi fixado valor à causa (€ 25.468,87).

Entretanto, tendo os autos prosseguido para apreciação dos restantes pedidos formulados pelo Autor, procedeu-se a audiência de julgamento em 04-06-2014, no âmbito da qual a Ré requereu que se oficiasse à Segurança Social a fim de se apurar da situação contributiva do Autor, no que respeita a atribuição ou não de subsídio de desemprego, ou outro subsídio, após a cessação do contrato de trabalho e até ao trânsito em julgado da decisão.

Sobre tal requerimento recaiu o seguinte despacho: «Não obstante existir jurisprudência em sentido contrário, entendo que o desconto das quantias recebidas pelo trabalhador após o despedimento, nomeadamente a título de subsídios pagos pela Segurança Social, pode ser oficiosamente conhecida, pelo que o tribunal a final ordenará tais descontos, devendo as partes liquidar tais quantias após o trânsito em julgado.

Assim, por neste momento considerar não ser indispensável para a decisão a proferir, defiro o requerido quanto à notificação, muito embora determine que se conclua de imediato a audiência, sendo depois proferida a sentença.».

Em 12-06-2014 foi junto aos autos um documento remetido pelo Centro Distrital do Porto da Segurança Social, notificado às partes, do qual consta a seguinte informação: «O beneficiário B…, requereu, Subsídio de Doença por Internamento desde 2013-09-22 A 2013-10-03.

A partir de 2013-10-04, até à presente data o beneficiário encontra-se com Subsídio de Doença.».

Em 17-06-2014 foi proferida sentença, cuja parte decisória é do seguinte teor: «Nestes termos e pelo exposto: a) julgo a reconvenção parcialmente procedente por provada e condeno a entidade empregadora C…, Lda. a pagar a B…: i. as retribuições que este deixou de auferir entre a data do despedimento (20/12/2013) e o trânsito em julgado da presente sentença, à razão de 813,07€ (oitocentos e treze euros e sete cêntimos) mensais, acrescidas de juros de mora à taxa legal de 4%, desde a data de vencimento de cada retribuição até integral pagamento, descontado do valor correspondente ao montante das retribuições que tenha obtido com a cessação do contrato e não obteria sem esta e dos montantes eventualmente recebidos a título de subsídio de desemprego (art.º 390.º do Código do Trabalho), tudo a liquidar posteriormente nos termos do disposto no art.º 358.º, n.º 2 do Código de Processo Civil; ii. uma indemnização em substituição da reintegração, no valor de 8.372,27€ (oito mil, trezentos e setenta e dois euros e vinte e sete cêntimos), a que acrescerá a quantia diária de 1,60€ (um euro e sessenta cêntimos) até ao trânsito em julgado desta sentença, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, desde a data desta sentença até integral pagamento; iii. a quantia de 1.500,00€ (mil e quinhentos euros) a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, desde a data desta sentença até integral pagamento; b) nos termos do disposto no art.º 98.º-N, n.º 1 do Código de Processo do Trabalho, determino que o pagamento das retribuições devidas ao trabalhador após o decurso de 12 meses desde a apresentação do formulário de fls. 2 (deduzidos os períodos referidos no art.º 98.º-O do Código de Processo do Trabalho) – caso a decisão final deste processo não transite antes de tal data – seja efetuado pela entidade competente da área da Segurança Social.».

Inconformada com a sentença, a Ré dela interpôs recurso para este tribunal, tendo nas alegações apresentadas formulado as seguintes conclusões: «I - O Digníssimo Tribunal a quo condenou a Recorrente no pagamento de retribuições intercalares, sem, no entanto, fazer reflectir nessa condenação a matéria de facto que conheceu oficiosamente e não levou à lista da matéria dada como provada.

II - Com efeito, antes do encerramento da audiência de discussão e julgamento, foi oficiosamente requerido pelo Tribunal a quo que fosse oficiada a Segurança Social para informar os autos das prestações auferidas pelo Recorrido entre 20-12-2013 – data do despedimento do Requerido – até ao presente.

III - Todavia, não foram os factos constantes do referido documento, tal como se impunha, levados pelo Ilustre Tribunal a quo à lista dos factos provados e, por conseguinte, considerados na decisão proferida sobre a causa, o que impõe para uma melhor aplicação do direito.

IV - Com efeito, o Tribunal a quo estava obrigado, seja por força do princípio do inquisitório, seja por força do princípio da aquisição processual, a fazer reflectir na sentença os factos que conheceu em virtude da sua iniciativa oficiosa.

V - Na verdade, conforme dispõe o número 2 do artigo 5.º do Código de Processo Civil “Além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo juiz: a) os factos instrumentais que resultem da instrução da causa; b) os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultam da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar; c) os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções.” VI - E, por...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT