Acórdão nº 844/14.6TAPVZ.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução11 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Rec 844.14.6TAPVZ.P1 TRP 1ª Secção Criminal Acordam os juízes em conferência no Tribunal da Relação do Porto No Recurso de Contra ordenação nº 844.14.6TAPVZ que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Vila do Conde, Instancia Local, Secção - Juiz 1, em que é arguido B… foi pela Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária pela prática de uma contraordenação de transposição da linha longitudinal contínua (marca M1), separadora de sentidos de trânsito, decidido em 23/1/2013 condenar o arguido na sanção acessória de inibição de conduzir, já especialmente atenuada, pelo período de 30 dias.

Interpôs o arguido recurso de impugnação para o Tribunal que por sentença de 31/10/2014 proferiu a seguinte decisão: “Pelo exposto, e ao abrigo das referidas disposições legais, Julgo o presente recurso de impugnação judicial, interposto por B…, improcedente, e em consequência confirmo a decisão da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária que pela prática de uma contraordenação muito grave de transposição de linha longitudinal contínua (M1), separadora de sentidos de trânsito – prevista e punida nos termos das disposições conjugadas dos artºs 60º, nº 1, e 65º, al. a), do Regulamento de Sinalização do Trânsito e do artº 146º, al. o), do Código da Estrada – o condenou numa sanção acessória, especialmente atenuada, de trinta dias de inibição de conduzir; As custas do processo ficam a cargo do arguido/recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 1 UC (mínimo legal).

Recorre o arguido, o qual no final da sua motivação apresenta as seguintes “CONCLUSÕES: A.

Vem o arguido acusado da prática de factos que de acordo com a acusação deduzida integram a prática de uma contraordenação muito grave de transposição de linha longitudinal contínua (M1), separadora de sentidos de trânsito-prevista e punida nos termos das disposições conjugadas dos art.ºs60 n.º1 e 65.º al. a) do Regulamento de Sinalização do Trânsito e dos art.º 146.º al.o) do Código da Estrada.

B.

Sucede que, o recorrente apenas teve um processo de contraordenação do qual foi notificado a 18.02.1013, tendo sido alvo de recurso no dia 10.03.2013, que se trata do processo de contraordenação n.º 278905277, após o qual recebeu a notificação com decisão final no dia 26.08.2013, já com a contraordenação n.º 278905285 conforme foi devidamente explicado e documentado ao meritíssimo tribunal a quo.

C.

Na verdade, do confronto entre as duas notificações, verificou o recorrente de que se trata da mesma contraordenação à qual foi atribuída dois autos com números diferentes, no entanto, das mesmas se extrai que se trata apenas de uma e da mesma infracção.

D.

Ora, da referida infracção o arguido, ora recorrente já foi condenado e já cumpriu, inclusive, a pena aplicada.

E.

Neste sentido, não pode o arguido vir a ser julgado duas vezes pela mesma infracção, cometida uma única vez, nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar.

F.

A situação supra referenciada e confirmada pela presente decisão do Tribunal a quo constitui uma violação do princípio consagrado do ne bis in idem.

G.

Muito sinteticamente diremos que o ne bis in idem tem por finalidade obstar a uma dupla submissão de um indivíduo a um mesmo processo, por um lado tendo em vista assegurar a sua paz jurídica e configurando, de outro passo, uma limitação ao poder punitivo do Estado.

H.

Ancorado na estrutura acusatória do processo que enforma o nosso processo penal, a proibição da dupla apreciação significa, numa primeira leitura, que ninguém pode ser julgado mais de uma vez e não, como por vezes é referido, que ninguém pode ser punido mais de uma vez.

I.

Por isso esta garantia constitucional deve ser vista como da proibição da dupla perseguição penal do indivíduo, estendendo-se, portanto, não apenas ao julgamento em sentido formal.

J.

Nesta perspectiva, a delimitação do objecto do processo pela acusação tem ainda como efeito que a garantia conferida pelo princípio ne bis in idem implique que se proíba a investigação e o posterior julgamento não só do que foi mas também do que poderia ter sido conhecido no primeiro processo.

K.

Na verdade, como refere Henrique Salinas, «a preclusão, contudo, não diz apenas respeito ao que foi conhecido, pois também abrange o que podia ter sido conhecido no processo anterior».

L.

Para este efeito, teremos de recorrer aos poderes de cognição do acto que procedeu à delimitação originária do processo, a acusação em sentido material, tendo em conta um objecto unitário do processo.

M.

O que se proíbe é, no fundo, que um mesmo e concreto objecto do processo possa fundar um segundo processo penal, entendendo-se aqui por crime não um certo tipo legal abstractamente definido como crime mas, outrossim, um comportamento espácio-temporalmente determinado, um determinado acontecimento histórico, um facto naturalístico concreto ou um pedaço de vida de um indivíduo já objecto de uma sentença ou decisão que se lhe equipare, mas independentemente do nomem iuris que lhe tenha sido ou venha a ser atribuído, no primeiro ou no processo subsequentemente instaurado.

N.

Quer dizer, o que verdadeiramente interessa é o facto e não a sua subsunção jurídica.

...

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