Acórdão nº 472/13.3TAPNF.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelERNESTO NASCIMENTO
Data da Resolução11 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo 472/13.3TAPNF da Comarca do Porto Este – Marco de Canaveses, Instância Central – Sec. Instrução J1 Relator - Ernesto Nascimento Adjunto – Artur Oliveira Acordam, em conferência, na 2ª secção criminal do Tribunal da Relação do Porto I. Relatório I. 1. Deduzida acusação particular pela assistente B… contra os arguidos C…, D… e E…, a quem, com base em duas notícias publicadas no F…, imputa a prática dos crimes de difamação, publicidade e calúnia e ofensa a pessoa – acompanhada, entretanto pelo MP – requereram os arguidos a Instrução, que terminou com a prolação de despacho de não pronúncia dos arguidos.

  1. 2. Inconformada com o assim decidido, interpôs a assistente o presente recurso – pugnando pela revogação de tal decisão e a sua substituição por uma outra que pronuncie os arguidos, nos termos constantes da acusação particular (ainda que com correcções de terminologia quanto aos nomes dos ilícitos) - apresentando aquilo que denomina de conclusões, mas que dada a sua extensão ao longo de 277!!! números, como tal não podem ser consideradas, pelo menos, na noção legal de resumo das razões do pedido e, que por isso aqui se não transcrevem, apenas se enunciando as questões aí suscitadas e que são a de saber se, se a decisão é nula, por força dos artigos 97.º/4 e 5, 374.º/2 e 379.º/1 alínea a) C P Penal; verificam todos os vícios do n.º 2 do artigo 410.º C P Penal.

  2. 3. Responderam, quer o Magistrado do MP, quer os arguidos, em ambos os casos, pugnando pelo não provimento do recurso II. Subidos os autos a este Tribunal o Exmo. Sr. Procurador Geral Adjunto, aderindo à resposta do MP em 1.ª instância entende, da mesma forma, que o recurso não merece provimento.

    No exame preliminar o relator deixou exarado o entendimento de que o recurso fora admitido com o efeito adequado e que nada obstava ao seu conhecimento.

    Seguiram-se os vistos legais.

    Foram os autos submetidos à conferência e dos correspondentes trabalhos resultou o presente acórdão.

  3. Fundamentação III. 1. Tendo presente que o objecto dos recursos é balizado pelas conclusões da motivação apresentada pelo recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas - a não ser que sejam de conhecimento oficioso - e, que nos recursos se apreciam questões e não razões, bem como, não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, então, as questões suscitadas nos presentes resumem-se, tão só em de saber se, se a decisão é nula, por força dos artigos 97.º/4 e 5, 374.º/2 e 379.º/1 alínea a) C P Penal; verificam todos os vícios do n.º 2 do artigo 410.º C P Penal.

  4. 2. Apreciando.

  5. 2. 1. A nulidade.

    “O dever de fundamentação das decisões judiciais é uma garantia integrante do próprio Estado de direito democrático, artigo 2º da Constituição da República, ao menos quanto àquelas que tenham por objecto a solução da causa em juízo", cfr Gomes Canotilho e Vital Moreira, in "Constituição da República Portuguesa Anotada", 3 ed. pág. 798.

    Este dever de fundamentação mereceu consagração constitucional no artigo 205º nº 1 da CRP, provindo já da revisão de 1982, artigo 210º/1, mantido na revisão de 1989, artigo 208º/1.

    De notar que nesta última, que deu lugar à actual redacção do artigo 205º/1 imprimiu contornos mais precisos ao dever de fundamentação, pois, onde antes se remetia para a lei os "casos" em que a fundamentação era exigível, passou a concretizar-se que ela se impõe em todas as decisões "que não sejam de mero expediente", mantendo-se apenas a remissão para a lei quanto à "forma" que ela deve revestir.

    Este aprofundamento do dever de fundamentação das decisões judiciais reforça os direitos dos cidadãos a um processo justo e equitativo, assegurando a melhor ponderação dos juízos que afectam as partes, do mesmo passo que a elas permite um controle mais perfeito da legalidade desses juízos com vista, designadamente, à adopção, com melhor ciência, das estratégias de impugnação que julguem adequadas.

    “Ao legislador incumbirá, então, definir a "forma" em que a fundamentação se deve traduzir, sem que, contudo, ele possa esvaziar o sentido útil daquele mandado”, cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional 59/97. Qualquer que seja essa forma, ela terá sempre que permitir o conhecimento das razões que motivam a decisão.

    Mas se a relevância da fundamentação das decisões judiciais é incontestável como garantia integrante do conceito de Estado de direito democrático, ela assume, no domínio do processo penal, uma função estruturante das garantias de defesa dos arguidos, muito embora o texto constitucional não contenha qualquer norma que disponha especificamente sobre a fundamentação das decisões judicias naquele domínio.

    O Código de Processo Penal, expressa no artigo 97º/5, o princípio geral que vigora sobre a fundamentação dos actos decisórios: "os actos decisórios são sempre fundamentados devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão".

    Consagrado este princípio geral, o mesmo Código não deixou de o reiterar, em concreto, relativamente a determinados actos que afectam ou podem afectar os direitos dos arguidos, vg. os relativos ao despacho que decrete medidas de coacção, cfr. artigo 194.º/3 e sentença, cfr. artigo 379.º - de resto, norma, esta, invocada pela assistente.

    No entanto, apesar do cuidado patenteado pelo legislador ordinário, na exigência de fundamentação de todas as decisões jurisdicionais – algumas com grau de exigência mais acrescido - já, ao estabelecer o regime geral das nulidades em processo criminal, o incumprimento daquele dever, não lhe terá merecido particular rigor sancionatório.

    Se as exigências expressas no C P Penal, nem sempre se convertem em exigências constitucionais - o que no caso em apreço acontece - por outro, o vício da nulidade não constitui o único nível de desvalor admissível para qualquer tipo de deficiência, sem que se deva ter em conta se ela atinge, e em que grau, a razão de ser e o fim último da imposição constitucional.

    Na verdade, vigorando em processo penal, nesta matéria, o princípio da tipicidade ou da legalidade, desde logo afirmado no artigo 118º/1 C P Penal, "a violação ou infracção das leis de processo penal só determina a nulidade do acto quando esta for expressamente cominada na lei", não consta daquele regime que a falta apreciação crítica da prova que no despacho de não pronúncia se tem por analisada e/ou a falta ou deficiência de fundamentação constitua vício gerador de nulidade insanável, artigo 119º ou de nulidade dependente de arguição, artigo 120º, ficando elas, deste modo, relegadas para o plano das irregularidades nos termos dos artigos 118º/2 e 123º C P Penal.

    Tendo em conta o necessário compromisso entre interesses que justificam um formalismo rigoroso e os que aconselham uma minimização desse formalismo, subjacente ao regime de nulidades instituído, poderia questionar-se a conformidade constitucional deste regime em caso de incumprimento de formalidades que, essencialmente, visam tutelar direitos fundamentais dos arguidos e, seria, porventura, o caso da falta absoluta de fundamentação do despacho, no caso de não pronúncia.

    Resta, então, determinar qual a consequência para a alegada falta de apreciação crítica da prova que na decisão se diz ter sido analisada.

    Qual a concreta invalidade, que aquela omissão é susceptível de desencadear e com a qual agora somos confrontados.

    Seguramente, que do que vem de ser dito, tal situação justifica um tratamento diverso, menos rigoroso e gravoso do que o inerente ao regime das nulidades, a apontar, assim, para a...

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