Acórdão nº 2/14.0T8PVZ.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Março de 2015
Magistrado Responsável | ANA LUCINDA CABRAL |
Data da Resolução | 10 de Março de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Proc. n° 2/14.0T8PVZ.P1 Comarca do Porto Póvoa de Varzim - Inst. Local- Secção Cível- J Acordam no Tribunal da Relação do Porto I - Relatório B…, solteira, maior, residente na C…, Rua …, .., Vila do Conde intentou o presente procedimento cautelar de restituição provisória da posse, ao abrigo do disposto no artigo 377°, do Código de Processo Civil, contra C…, com sede no …, .., Vila do Conde, pedindo a restituição provisória da posse do quarto n° . das instalações do C1…, sito na Rua …, .., Vila do Conde, com os direitos inerentes à prestação de serviços de roupa de cama, toalhas e produtos higiénicos, nos termos em que eram fornecidos, bem como o direito ao fornecimento da ceia nos termos em que é fornecido aos demais utentes e ainda os serviços de enfermagem e medicamentos e a entrega das chaves e direito a receber visitas, subsidiariamente, caso não sejam demonstrados os factos que constituem o esbulho e a violência, seja mesmo assim decretada procidência com aquela amplitude nos termos do artigo 379°, do citado diploma, ou, ainda, se assim se não entender, subsidiariamente, seja decretada a providência cautelar prevista no artigo 362°, do mesmo diploma, com aquela amplitude, atentos os factos supra referidos que demonstram O fundado receio que a requerente tem de a lesão grave dos seus interesses patrimoniais, morais e físicos e dificilmente reparáveis. Mais requereu a aplicação de sanção pecuniária compulsória para cada dia de que a requerida não cumpra o que doutamente for ordenado.
Por despacho de 11.09.2014 foi ordenada a apensação dos autos aos autos de acção comum que comam termos pelo Tribunal Judicial de Vila do Conde sob o n° 503/14.0TBVCD.
Notificada, pronunciou-se a Requerente alegando que os presentes autos não são dependência daqueles mas antes de acção a propor com pedido de declaração da ilegalidade da decisão de cessação do contrato.
Nessa sequência foi proferido despacho que ordenou a desapensação dos autos e a sua remessa à instância local.
Por despacho de 15/9/2014 foi determinado o prosseguimento dos autos como procedimento cautelar comum (atento os pedidos cumulados) e nessa sequência ordenada a citação da requerida para se pronunciar.
A Requerida deduziu oposição impugnando os factos alegados e concluindo pela improcedência da providência requerida. Alegou, em suma, que celebrou com a Requerente um contrato de prestação de serviços traduzido na assistência e internamento no C1…, não tendo procedido à venda de qualquer quarto, o qual cessou por comportamentos imputáveis à Requerente violadores das mais elementares regras de funcionamento da Requerida, daquela conhecidas. Assim, não assiste à Requerente qualquer direito real sobre o quarto que ocupa sendo que o procedimento cautelar comum não é idóneo a acautelar qualquer dano que a verificar-se já está consumado.
Procedeu-se à produção da prova, com observância do formalismo legal.
Foi proferida decisão a julgar o procedimento cautelar totalmente improcedente e a indeferir a pretensão formulada pela Requerente A Requerente interpôs recurso, o qual foi admitido com efeito suspensivo da decisão recorrida.
Alega, em suma, a Apelante: A. Como consta dos autos a requerente doou à requerida o apartamento que era a residência dela.
- Está a viver de favor numa Ordem Religiosa que não a pode acolher, segundo os seus estatutos religiosos como referiu em sede de depoimento de parte.
- Conforme resulta de fls. 714 da douta sentença "ora da prova produzida resultou que entre as partes foi celebrado um contrato de alojamento e assistência mediante o qual a Requerida se obrigou de forma vitalícia a dar alojamento e assistência e a prestar serviços conexos bem como a prestar assistência religiosa e médica à Requerente".
- Dar alojamento de forma vitalícia é subsumível na prática à morada ou à "casa de habitação", visando a satisfação inerente à sua habitação, com tutela inclusive constitucional.
- Não ficou provado nos autos que a Requerente tenha outro local aonde acolher-se.
- A sua sobrinha, D…, referiu expressamente que não tinha condições para a ter em casa deles e que por isso pediu a umas freirinhas e elas deixaram, mas que não podia estar lá mas elas com pena dela deixaram estar lá (minuto 19,36).
- A Recorrida não provou indiciariamente a existência de qualquer prejuízo concreto com a permanência da Requerente no C1….
- Aliás, como resulta da tomada de declarações do legal representante da Requerida já depois de instaurado o processo disciplinar e tomada a decisão de fazer cessar o contrato de alojamento e assistência referido supra, aquele admitiu que a Requerente fosse ao refeitório buscar as refeições e as tomasse no quarto e por outro lado referiu que o quarto está desocupado, embora haja lista de espera de utentes até este processo estar resolvido.
- Deve assim atribuir-se ao presente recurso efeito suspensivo” B.I – Houve violação do disposto nos art°s 362, 377, 378, 379 e 662 do CPC.
II - A douta sentença não valorizou convenientemente a prova produzida e não fez a devida aplicação da lei à factualidade que dela emerge.
III - Com todo o respeito pela douta sentença entendemos que só valorando erroneamente a factualidade constante dos autos é que o Tribunal pôde decidir como decidiu assim, Tribunal pôde decidir como decidiu IV - E o mesmo entendimento vale para o não atendimento dos pressupostos atinentes ao procedimento cautelar comum que se mostram provados nestes autos.
Assim, impõe-se a reapreciação da mesma principalmente a prova testemunhal gravada.
VI - Deve ser retirada dos factos provados a factualidade constante dos nºs. 48, 52, 54, 72 e 77 (este no tocante "é um espaço solarengo,") por nenhuma prova ter sido feita sobre tais factos.
VII - A factualidade constante do ponto 79 deve ser alterada de molde a retirar-se que a doação foi feita sem a sujeitar a qualquer condição. (ver declarações prestadas pela declarante ao minuto 2:52 e pelo legal representante da requerida aos minutos 3:18, 3:11, 44:44; e 47:02.
VIII - O que aliás também está em sintonia com a factualidade vazada a fls.702 e 703 da sentença aonde se refere "a requerente no seu depoimento de parte confessou ter doado o seu apartamento à ordem por vontade própria e que em consequência dessa sua oferta a requerida prestou-se a custear as despesas com medicamentos e funeral. No que concerne ao depósito de 50.000,00 € tratou-se de uma exigência da requerida." IX - Ora, desta percepção da Meritíssima Juiz no respeitante à requerente e por referência a que tivesse pago 50.000,00 € [conjugado com o depoimento das testemunhas E… e F… que disseram ter pago aquela avultada quantia de 70.000 € para residirem vitaliciamente no C1…], bem como do teor do doc. de fls. 57, confirmado pelo representante legal da requerida ao minuto 43,42, impunha-se que a Meritíssima Juiz também tivesse dado como provado que a requerente entregou a verba 50.000,00 € para ocupar vitaliciamente um quarto, só para ela, no C1…, tanto mais que a fls. 719 da douta sentença a Meritíssima Juiz plasmou que "ora, da prova produzida resultou que entre as partes foi celebrado um contrato de alojamento e assistência mediante o qual a requerida se obrigou de forma vitalícia a dar alojamento e a prestar serviços conexos, bem como a prestar assistência religiosa e médica à requerente" X - Ao minuto 43,42 referiu o Sr. G… Mandatária - É um contrato de revogação de contrato [fls. 57 dos autos), em que aparece o senhor como representante da C… e aparece como outorgante E… e mulher F…? G… – Sim G… - É, exatamente.
Mandatária - Portanto, este é o contrato que há bocado falou ao Tribunal, falou à senhora Juiz? G… - Sim.
Mandatária - E em que há, portanto, essa entrega desse dinheiro que o senhor já explicou? G… - O acordo, o acordo. Ao minuto 44,23: Mandatária - Tem aí uma situação [fls. 54 dos autos] que diz "quarto duplo, mas ocupado exclusivamente pelo próprio". O que quer dizer esse "quarto duplo, ocupado exclusivamente pelo próprio. "? Qual é o sentido disto que aí está? Era um quarto que dava para duas camas, dada a dimensão? G… - 44,51 - Sim Mandatária - Porque é que está aqui "ocupado exclusivamente pelo próprio"? G… - Não sei. Mandatária - Não sabe? G… - Isso não é da minha gerência.
Mandatária - Não sabe dar uma explicação? Mas nunca mais meteram lá ninguém, associado à D. B…? G… - Não. Se fosse agora, metia. Se fosse agora metia. Mandatária - Ai sim, se fosse agora. Se fosse agora, metia, não obstante estar aqui no contrato que era exclusivamente ocupado por ela? G… - Senhora doutora, esses contratos, já lhe disse, estão malfeitos.
XI - Aliás, essa factualidade resultava também de a tal respeito se terem pronunciado as testemunhas H… e D….
Depoimento da testemunha D… ao minuto 1:23 Advogada: "Qual os contornos do negócio?" Testemunha: "A minha tia deu um apartamento e 50.000 € Ela disse que já tinha arranjado um lar, que era novo e que o quarto era para ela só. " Minuto 2:56: Advogada: A C… não podia pôr lá mais nenhum utente?" Testemunha: Não.
A instância da advogada se sabia em que circunstâncias a D. B… foi para aquele C1… a testemunha H… ao minuto 12,57: "A D. B… deu 50.000 € para entrar para o quarto, para habitar o quarto, para ter aquele lugar até ao fim da vida dela foi assim que lhe foi prometido da maneira como fizeram o negócio e além disso deu um apartamento para ser bem tratada e um dia ter tudo o que precisasse, medicamentos, fraldas essas coisas, foi -lhe prometido que tinha esse atendimento como devia ser.".
XII - Foi dado como provado no N° 84 que "Depois exigia que lhe viessem trazer a refeição ao quarto". Porém, deve dar-se outrossim como provado "depois foi autorizada a que lhe viessem trazer a refeição ao quarto", conforme resulta do depoimento do representante legal da requerida ao minuto 8:49; 9:14, 9:40 Ao minuto 9:40: Meritíssima Juiz: Então a senhora comia no quarto Sr. G…? Comia? De quando até quando? G…: Uns anos seguidos, foi quase sempre.
Ao minuto 10:10...
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