Acórdão nº 999/99.8TBAMT-AE.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 16 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelALBERTO RU
Data da Resolução16 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Tribunal da Relação do Porto – 5.ª secção.

Recurso de Apelação.

Processo n.º 999/99.8TBAMT-AE do Tribunal Judicial da Comarca de Amarante – 2.º Juízo.

*Juiz relator – Alberto Augusto Vicente Ruço.

  1. Juiz-adjunto……Joaquim Manuel de Almeida Correia Pinto.

  2. Juiz-adjunto…….Ana Paula Pereira de Amorim.

    *Sumário: I. A protecção da posição jurídica da parte estranha à transmissão de coisa ou direito litigiosos é digna de tutela e implica que a ordem jurídica a assuma, estando o conflito de interesses regulado no artigo 263.º do Código de Processo Civil (anterior artigo 271.º).

    1. A impugnação pauliana julgada procedente torna o acto de alienação do devedor ineficaz em relação ao credor, podendo o credor executar o bem no património do adquirente obrigado à restituição – artigo 616.º, n.º 1, do Código Civil.

    2. Transmitido o bem por um subadquirente a um outro subadquirente, após ter sido instaurada a acção de impugnação pauliana, esta transmissão incide sobre um bem litigioso, pelo que a decisão proferida na acção produz efeitos em relação a este subadquirente, nos termos do n.º 3 do artigo 263.º do Código de Processo Civil (anterior artigo 271.º), podendo o credor executar o bem no património deste último subadquirente.

    3. As normas do artigo 613.º do Código Civil valem na sua plenitude salvo dos casos em que seja de aplicar o disposto no n.º 3 do artigo 263.º do Código de Processo Civil; aquelas normas devem ser harmonizadas com estas últimas quando tenha existido venda de coisa ou direito litigiosos na pendência de uma acção de impugnação pauliana.

    *Recorrente …………………...

    B…, Lda.

    , pessoa colectiva n.º ………, com sede em …, freguesia …, concelho de Amarante.

    Recorrido……………………C…, solteiro, maior, residente na rua …, n.º …., ..º, Porto, em representação dos seus filhos de menoridade D… e E….

    *I. Relatório.

    1. O presente recurso insere-se na oposição que a recorrente B…, Lda., dirigiu à execução movida por C… (em representação de dois filhos menores) contra a Recorrente e ainda contra F…, G… e H…, Lda.

      Com a execução, os Recorridos pretendem obter o pagamento da quantia equivalente, em euros, a 21.100.000$00, acrescida de juros, arbitrada no processo comum colectivo n.º 102/97, da comarca de Amarante, no qual F… foi julgado e condenado.

      A oposição foi julgada improcedente e daí o presente recurso.

    2. As conclusões do recurso são as seguintes: «1. Nos termos do disposto no art. 659.º, n.º 2 do Código de Processo Civil anterior, na versão do Dec. Lei n.º 199/2003, de 10 de Setembro (aqui aplicável por força do disposto no art. 6.º, n.º 4 da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho), a sentença tem de, obrigatoriamente, conter os fundamentos, devendo o juiz discriminar os factos que considera provados, sob pena de nulidade se não especificar os fundamentos de facto e de direito, conforme dispõe o art. 668.º, n.º 1, aI. b) do mesmo diploma legal.

      1. o caso em apreço, por despacho proferido em 13/3/2013 a fls. dos autos ora em recurso com a referência n.º 2220211, já transitado em julgado, foi alterada a resposta dada ao art. 18.º da petição inicial, que passou a ter a seguinte redacção: Artigo 18.º - provado apenas que quando a venda do prédio ora nomeado à penhora foi celebrada entre a ora executada "B…" e a executada "H…", ainda não tinham sido citados todos os primitivos réus para os termos da referida acção " (sic).

      2. Porém, nos fundamentos de facto da douta sentença em crise este facto dado como provado não consta da mesma e não foi levado pelo Meritíssimo Senhor Juiz "a quo" em consideração.

  3. O Meritíssimo Senhor Juiz "a quo" não interpretou e aplicou a lei aos factos, designadamente ao que foi provado no artigo 18.º da petição inicial.

  4. A douta sentença em crise está, assim, ferida de nulidade, o que ora se invoca com todas as consequências legais.

    1. A sentença dada à execução - no caso o Acórdão do STJ proferido na Revista n.º 3.012/06 da 6.ª secção daquele Tribunal, que foi junto com o requerimento inicial da acção executiva - não condena nem impõe a ninguém, nomeadamente à ora Apelante, nenhuma responsabilidade.

    2. Não se vê que aquela sentença (o Acórdão do STJ) imponha a alguém, expressa ou tacitamente, o cumprimento de uma obrigação, ou que contenha uma ordem de prestação.

  5. Esta sentença (o Acórdão do STJ) também não extravasa o que foi pedido, antes pelo contrário, contém-se dentro do pedido deduzido pelo Apelado na acção pauliana.

  6. Acresce que, em 6.º dos factos dados como assentes na fundamentação da douta sentença em crise ficou assente que o Acórdão ora dado à execução não condenou a Apelante a coisa alguma, nomeadamente a pagar ao Apelado fosse o que fosse! (O sublinhado é nosso).

    1. O que o douto Acórdão do STJ em análise decidiu foi que, ao declarar-se a ineficácia das vendas se reconheceu ao Apelado tão-só a possibilidade de executar o bem no património de terceiro, nos termos do art. 616.º, n.º 1 do Código Civil.

    2. Como se vê pelo pedido que foi formulado naquela acção pauliana o Apelado não pediu a restituição pelo adquirente do valor do bem transmitido ou do enriquecimento obtido com a sua aquisição, pois era possível a execução desse bem, como o Apelado claramente o diz na formulação do seu pedido! 12. Está-se, pois, sem sombra de dúvidas, perante uma acção constitutiva que teve por fim autorizar uma mudança na ordem jurídica existente – art. 4.º, n.º 2, al. c) do Código de Processo Civil - pelo que, a sentença dada à execução não constitui título executivo.

    3. Por isso, ao ter-se dado à execução somente a sentença proferida na acção pauliana (o Acórdão do STJ acima referido) que a julgou procedente sem a integrar pelos documentos que permitem a execução da dívida, como aquela não constitui título executivo, então na presente acção executiva verifica-se que há, manifestamente, falta ou insuficiência do título executivo, falta e inexequibilidade do título executivo e inexigibilidade da obrigação exequenda, o que ora se invoca com todas as consequências legais.

    4. A presente execução foi deduzida também contra os Executados, subadquirentes do bem em causa, "H…, Lda." e G…, sendo que este nem sequer foi parte na acção pauliana cuja sentença foi dada à execução 15. Ora, os bens de terceiro só podem ser objecto de execução em dois casos: quando sobre eles recaia direito real constituído para garantia do crédito exequendo; quando tenha sido julgada procedente impugnação pauliana de que resulte para terceiro a obrigação de restituição dos bens ao devedor, sendo que, em relação aos Executados "H…" G… não está demonstrada qualquer uma dessas situações.

    5. Sem se atacar judicialmente o acto de transmissão operado pela Apelante à Executada "H…" e sem se atacar o acto de transmissão da dita sociedade "H…" ao Executado G…, não se vê como se possa fazer excutir o bem por este adquirido, pois que nenhuma obrigação tem este Executado, no presente, de restituir o bem ao devedor.

    6. É que, como dizia o Prof. Vaz Serra, BMJ n.º 75, pág. 295 e RLJ, Ano 111, pág. 156, os subadquirentes adquiriram do verdadeiro titular do direito e, portanto, a sua aquisição não cai pelo simples facto de ser julgada procedente a acção contra o adquirente primitivo. Para que possam ser obrigados, é preciso que sejam por sua vez accionados e se verifiquem, quanto a si mesmos, os requisitos gerais da acção.

    7. O facto dado como provado que foi transcrito na conclusão 23 revela-se de capital importância como se referiu na oposição à execução pois, na altura da venda do prédio da Executada B… para a Executada "H…" a instância ainda não era estável, ou seja, ainda não se tinham tornado estáveis os elementos essenciais da causa: partes, pedido e causa de pedir, nos termos e para os efeitos dos art. 268.º e 481.º, al. b) do Código de Processo Civil.

    8. Ora, como os elementos da instância ainda não se encontravam estáveis nessa altura, ao Apelado não lhe era suficiente lançar mão somente do Incidente de Intervenção Provocada da "H…", era preciso ainda que deduzisse contra esta um pedido específico que se contivesse, ou seja, que encontrasse apoio numa determinada causa de pedir e, não o fez! 20. Aliás, o Apelado nem sequer o Incidente da Habilitação de Cessionário deduziu contra esta Executada! 21. E, se a coisa foi vendida antes da citação não há lugar à restituição.

    9. Razão por que, no caso em apreço, não têm, assim, aplicação o disposto nos 818.º do Código Civil, em relação a estas duas últimas vendas operadas entre a ora Apelante a Executada "H…" e, a operada entre esta e o Executado G….

    10. A sentença dada à execução não tem assim força de caso julgado em relação aos Executados "H…" e G….

    11. Decidindo como decidiu, a douta sentença em crise violou o disposto nos (…).

      Termos em que, no provimento do recurso, deve a douta sentença em crise ser revogada e, em sua substituição deve ser proferida outra que julgue as excepções alegadas na oposição à execução procedentes e provadas e, por via delas, a execução ser julgada improcedente e não provada por falta de título, inexequibilidade do título, falta de pressupostos processuais de que depende a regularidade da instância executiva e inexigibilidade da obrigação exequenda e declarar-se extinta a execução, absolvendo-se, por consequência, a Apelante do pedido executivo, tudo com as legais consequências, com o que se fará, como sempre, salutar e sã JUSTIÇA!».

      1. Os recorridos contra-alegaram pugnando pela manutenção da decisão sob recurso, sustentando, em síntese, que os efeitos da sentença proferida na acção de impugnação pauliana se estenderam aos subadquirentes, nos termos do n.º 3 do artigo 271.º do Código de Processo Civil.

        1. Objecto do recurso.

          De acordo com a sequência lógica das matérias, cumpre começar pelas questões processuais, e, resolvidas estas, com as atinentes ao mérito.

          Tendo em consideração que o âmbito objectivo dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes (artigos 639.º, n.º 1, e 635.º, n.º 4, ambos do Código de Processo Civil), as questões...

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