Acórdão nº 3700/13.1TBGDM.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Fevereiro de 2015
Magistrado Responsável | JOS |
Data da Resolução | 23 de Fevereiro de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Sumário (da responsabilidade do relator): 1 – O Processo Especial de Revitalização não se destina aos devedores pessoas singulares que não sejam comerciantes ou empresários nem exerçam, por si mesmos, qualquer atividade autónoma e por conta própria. 2 - Os honorários que, num processo especial de revitalização, devem fixar-se ao Administrador Judicial Provisório (AJP) não podem deixar de ter em conta o trabalho efetivamente desenvolvido e processualmente verificado, atendendo-se, além do mais, ao número de credores listados e ao resultado das negociações, ou, o mesmo é dizer, ao modo como terminou o processo.
Processo 3700/13.1TBGDM.P1 Recorrente – B… Relator: José Eusébio Almeida; Adjuntos: Carlos Gil e Carlos Querido.
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto: 1 – Relatório 1.1 – O processo na 1.ª instância: B… veio apresentar Processo Especial de Revitalização, nos termos dos artigos 17-A e ss. do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), requerendo que fosse proferido o despacho a que alude a alínea a) do n.º 3, do citado artigo 17-C, nomeando-se como Administradora Judicial Provisória (AJP), a Senhora Dra. C…, que detém vasta experiência em diversos processos de insolvência, estando também especialmente habilitada a praticar atos de gestão.
Para tanto, a requerente alegou (ora em síntese): - É uma pessoa singular, divorciada, mas apesar do divórcio e da celebração de um contrato de promessa de partilha, a apresentante e o seu ex-marido não promoveram a partilha do dissolvido casal, detendo ainda em regime de compropriedade os bens que identifica, e que estão onerados com hipotecas.
- Foram intentadas contra a apresentante processos executivos que igualmente identifica.
- A apresentante e´ professora desde 1989, tendo um vencimento mensal de 2.227,93 Euros.
- A situação em que se encontra esta´ intimamente ligada com a situação de dificuldade económica da empresa “D…, Lda.”, da qual o ex-marido da apresentante foi gerente.
- As responsabilidades assumidas pela apresentante, quer como devedora principal, quer como avalista dos financiamentos daquela sociedade, e não obstante todos os seus esforços, catapultaram a apresentante para uma situação económica e financeira difícil, mas a apresentante é suscetível de recuperação.
- A apresentante não dispõe de capital necessário para efetuar o pagamento aos seus credores, tendo contudo um ativo patrimonial superior às dívidas contraídas.
- A Apresentante, bem como o seu credor E… expressamente manifestaram a sua vontade de encetarem negociações conducentes à revitalização da apresentante, através da apresentação de um plano de recuperação.
- A apresentante propõe para administradora judicial provisória a Exma. Senhora Dra. C….
Foi proferido, a fls. 48, o despacho a nomear a Exma. Administradora Judicial Provisória e os autos prosseguiram os seu termos, tendo sido apresentada (fls. 93) a Lista provisória de Credores. A fls. 108 foi proferido despacho a dar conta de se mostrar ultrapassado o prazo previsto no artigo 17-D, n.º 5 do CIRE e a AJP foi notificada para juntar o plano de recuperação, sob pena de o processo ser encerrado. A fls. 121 foi junta nova Lista Provisória de Credores, retificando a anterior. Esta lista veio a ser indeferida pelo despacho de fls. 134, que igualmente declarou encerrado o processo especial de revitalização, fixando as custas a cargo da devedora. A fls. 146, a AJP veio requerer a fixação de honorários, pretendendo o recebimento de 2.000,00€, acrescidos de IVA, a título de honorários e 500,00€, a título de provisão para despesas.
O Ministério Público pronunciou-se defendendo, no que ora importa: (...) entendemos ser de aplicar a` determinação da remuneração devida pelo AJP a previsão contida no art. 32 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa, com as necessárias adaptações, por ser a que mais se aproxima a` presente situação. Ora, prevê o art. 32, n.º 3 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa que “A remuneração do administrador judicial provisório e´ fixada pelo juiz, na própria decisão de nomeação ou posteriormente (...)”. Assim, tendo em conta o trabalho desenvolvido pela AJP, não obstante o plano não ter sido homologado por ter sido ultrapassado o prazo previsto no artigo 17-D, n.º 5 do CIRE, que entendemos não ser a si imputável, o tempo pelo qual o PER esteve pendente, o número de credores intervenientes (6) e a normalidade das remunerações mínimas devidas nos processos de insolvência, promovo que se fixe de remuneração devida a` AJP o montante de 2.000,00 euros (dois mil euros), o qual será´ adiantado pelo CGT, entrando, após, em regra de custas. Ora o mesmo se diga quanto às despesas, face igualmente à evidente omissão da lei quanto a essa matéria. Ou seja, entendemos ser de aplicar ao pagamento das despesas devidas pelo AJP a previsão contida nos art. 26, n.º 6, do EAI, bem como o disposto no art. 3.º, n.º 1, da Portaria 51/2005, de 20/01, concluindo-se dessa forma que, uma vez que o valor das despesas apresentadas pela Sra. AJP não excede o montante da provisão de €500,00 (quinhentos euros), como preceituado no art. 26, n.º 6, do EAI, dispensando-se a Sra. AJP. da apresentação das despesas efectuadas, conforme o disposto no art. 3.º, n.º 1, da Portaria 51/2005, de 20/01, promove-se o requerido pagamento a titulo de provisão para despesas”.
Na sequência, foi proferido o despacho de fls. 151, do seguinte teor (com sublinhados nossos): “Uma vez que a portaria a que alude o 23.º da Lei n.º 22/2013, de 26/02 nunca foi publicada e que a Portaria n.º 51/2005, de 20/Janeiro foi criada expressamente para a Lei n.º 32/2004, de 22/Julho, nada prevendo quanto à remuneração dos administradores provisórios, concluímos que não é aplicável à determinação da remuneração dos AJP a portaria mencionada, como, aliás, já decidimos no processo n.º 2156/13.3TBGDM. Assim, a remuneração será devida nos termos do art. 32.º, n.º 3 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa que “A remuneração do administrador judicial provisório e´ fixada pelo juiz, na própria decisão de nomeação ou posteriormente (...)”.
Desta feita, tendo em conta o trabalho desenvolvido pela AJP, o tempo pelo qual o PER esteve pendente, o número de credores intervenientes (5) e a normalidade das remunerações mínimas devidas nos processos de insolvência, deve a remuneração devida à AJP ser fixada no montante correspondente a 2.000,00 euros, o qual será suportado pela requerente do PER. Quanto às despesas devidas, tendo em consideração o disposto no art. 22.º da Lei n.º 22/2013, de 26/Fevereiro, é efetivamente devido a` AJP o seu reembolso. Porém, não é de aplicar o disposto no art. 29.º, n.º 8 da Lei 22/2013, de 26/Fevereiro, como o refere o MP, porque previsto para os administradores da insolvência e não para os administradores judiciais provisório, nem o disposto no art. 3.º, n.º 1 da Portaria n.º 51/2005, de 20/Janeiro, na medida em que, conforme já acima expusemos, a portaria em questão não e´ de aplicável aos administradores judiciais provisórios. Assim, a fim de ser determinado o valor a reembolsar à AJP pelas despesas suportadas devera´ a mesma comprová-las nos autos, para o que se concede o prazo de 10 dias”.
Em face do despacho anterior, a requerente veio alegar a omissão do contraditório e a nulidade desta decorrente, motivando o despacho de fls. 161: “Nenhum omissão foi cometida, em nosso entendimento, porquanto, o direito a` remuneração e reembolso das despesas suportadas resulta de norma expressa, não sendo discutível. De todo o modo, de^ conhecimento à requerente do requerimento apresentado pela AJP e da promoção que sobre ele versou exarada nos autos pelo MP para, querendo, se pronunciar.
Já no uso do contraditório que lhe foi deferido, a requerente pronunciou-se a fls. 167, defendendo que os honorários fossem fixados em função “do parco trabalho apresentado pela AJP” e também que fosse decidido “não haver lugar ao pagamento de qualquer despesa”[1].
Foi então (fls. 207/208) o despacho que vem a ser objeto da presente apelação. Nele se escreveu: “Pese embora os argumentos aduzidos pela requerente, na pessoa do seu ilustre mandatário, decido manter o despacho proferido quanto ao valor devido pela AJP a título de honorários e quanto e quanto à necessidade de comprovação das despesas suportadas. Regularmente notificada para os termos do despacho proferido a fls. 151 a 152, a AJP, no prazo concedido para o efeito, não veio comprovar as despesas suportadas no desenvolvimento da sua atividade. Assim, e tendo presentes os fundamentos já referidos no despacho identificado quanto ao reembolso das despesas, atenta a sua falta de demonstração, decido não ser devida a` AJP qualquer quantia a título de reembolso de despesas eventualmente suportadas”.
1.2 – Do recurso: Inconformada com a decisão, a requerente B… veio apelar e pretende que “substituindo-se o despacho recorrido por outro que fixe à AJP remuneração proporcional ao trabalho desenvolvido e consequências da respectiva conduta omissiva, em montante nunca superior a 1/2 S.M.N”. Formula as seguintes Conclusões: a) - A questão que a ora recorrente pretende submeter a` sempre sábia e douta apreciação de vossas excelências, Venerandos Senhores Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação do Porto e´ a de saber se o montante judicialmente fixado a título de retribuição à AJP é excessivo (ou não) em função do exercício do...
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