Acórdão nº 5046/12.3TBMAI.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA GRA
Data da Resolução10 de Fevereiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

5046/12.3TBMAI.P1 Acordam na Secção Cível (1ª Secção), do Tribunal da Relação do Porto:*I – B…, R.L., que também usa o nome abreviado B1…, R.L., NIPC ………, com sede na Rua … n.º .. - .º, …. - … Porto, intentou acção com processo sumaríssimo contra C…, residente na Rua …, nº.., ….-… …, Maia, pedindo que seja declarado que a Autora é titular do direito de gozo da viatura automóvel da marca Mercedes, Modelo …, com a matrícula ..-MH-.., enquanto Locatária Financeira e seja a Ré condenada a: a) restituir definitivamente a posse de viatura ..-MH-...

  1. abster-se da prática de qualquer acto que impeça ou diminua o direito que a Autora pretende ver reconhecido.

  2. a pagar à Autora a quantia de € 2.632,30, a título de dano causado pela privação de uso da viatura, acrescida de juros de mora desde a data de citação até à data de efectivo e integral pagamento.

  3. a entregar à Autora o certificado de matrícula da viatura ..-MH-.., no prazo máximo de 5 dias após o trânsito em julgado da decisão, sob cominação de aplicação de sanção pecuniária compulsória no valor de € 10,00 por cada dia de atraso, ou, caso a mesma declare não o deter, por qualquer motivo, condenar a Ré a pagar à autora a quantia de € 30,00, correspondente ao valor necessário para obter uma segunda via do documento.

  4. a pagar à Autora a quantia de € 64,36, a título de danos causados à Autora pela utilização abusiva do identificador de Via Verde, acrescida de juros de mora desde a data de citação até efectivo e integral pagamento.

A Ré contestou, impugnando os factos articulados pelo Autor.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi, oportunamente, proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, decidiu: - Declarar que a Autora “B…, R.L.” é titular do direito de gozo da viatura automóvel da marca Mercedes, Modelo …, com a matrícula ..-MH-.., enquanto Locatária Financeira.

- Condenar a Ré C… à restituição definitiva da posse de viatura ..-MH-...

- Condenar a Ré a abster-se da prática de qualquer acto que impeça ou diminua o direito que a Autora tem de dispor da referida viatura.

- Condenar a Ré a entregar à Autora o certificado de matrícula da viatura ..-MH-.., no prazo máximo de 10 dias após o trânsito em julgado da presente decisão, sob cominação de aplicação de sanção pecuniária compulsória no valor de € 10,00 por cada dia de atraso, ou, caso a mesma declare não o deter, por qualquer motivo, condenar a Ré a pagar à autora a quantia de € 30,00, correspondente ao valor necessário para obter uma segunda via do documento - Absolver a Ré do demais peticionado pela Autora, nomeadamente do pedido de condenação desta a pagar a quantia de €2.632,30 e da quantia de €64,36.

*Inconformada, a A. interpôs recurso de apelação e apresentou as respectivas alegações, onde, nas conclusões, veio defender o seguinte: A- Por tudo quanto ficou exposto, é notório que a virtude da Justiça que as sentenças judiciais devem incorporar só será granjeada se o aresto a quo vir cair sobre si a espada de Dâmocles que o acórdão ad quem da Relação do Porto representa, ou seja, se vir concedida razão e plena procedência à petição da ora apelante, toda ela desfavorável à composição primariamente sugerida nos autos da Primeira Instância.

B- Prima facie, no que concerne à composição da matéria de facto através da revisitação do itinerário valorativo calcorreado pelo Exmo. Juiz a quo, dever-se-á decretar, salvo mais douto entendimento, que o ponto 2 da matéria de facto tomada por não provada seja expurgado da sentença: “Durante o período referido em 36 dos factos provados a Autora iria utilizar a viatura ..-MH-.. no âmbito da sua actividade”.

C- Com efeito, quando se coteja a decisão final dos autos que correram os respectivos termos da primeira instância no Tribunal Judicial da Maia com o sentido, objectividade e clareza dos depoimentos das testemunhas I… e D…, a íntima convicção de qualquer homem médio logo é invadida por uma inapelável certeza: a viatura Mercedes R, de cujo gozo e fruição a A. foi ilicitamente privada por acto da ora apelada, destinava-se ao uso dos advogados da sociedade autora no exercício das suas funções forenses e seria por eles utilizada no interlúdio temporal que o período de privação preenche.

D- Para tal contribuem os seguintes hiatos integrantes do registo fonográfico da audiência final: -quanto à testemunha I…, os concretos momentos em que aponta ter-se deslocado na viatura de que a apelada se arrogava o domínio exclusivo e conhecer as situações em que os seus colegas de escritório usaram a referida viatura no âmbito da sua profissão: in Habilus, Gravação Áudio: Registo Temporal de 16/10/2013, 11:08:44 às 12:04:40, mais concretamente dos minutos 7:30 a 9:00 e 32:00 a 33:00; -quanto à testemunha D…, as asserções do seu depoimento onde revela que o uso da viatura Mercedes R pela apelada se subordinava ao interesse da sociedade proprietária do veículo, culminado na necessidade de uso da viatura por algum dos advogados, bem como que por tal facto a apelada C… chegou a alternar a condução daquela viatura com a condução de outras viaturas da sociedade apelante - in Habilus, Gravação Áudio: Registo Temporal de 31-1-2014, 9:57:38 às 10:17:53, em especial o hiato entre os minutos 4:00 a 4:30 e 10:00 a 10:30.

E- Defronte disto, com o mui devido respeito que nos merece a livre valoração do Exmo. Juiz, mal parece que terá andado ao assentar aquele ponto 2 da matéria não provada e ao deixar de admitir o supra exposto no espaço ocupado pelos factos provados.

F- É que detendo estas testemunhas conhecimento único de factos verídicos que demonstram a necessidade de se reconhecer outra base factual, mal se percebe como pôde o Exmo. Juiz, na esfera da livre valoração da prova testemunhal, decidir que a autora não iria usar a viatura nem sofreu qualquer prejuízo com a privação do uso.

G- Como expusemos, uma coisa é a livre apreciação da prova testemunhal (396.º CCiv.; 607.º.5 CPC); outra, bem diferente, é servir-se da regra da livre apreciação para subtrair de um depoimento verosímil toda a dimensão favorável a uma determinada pretensão: a primeira é legal; a segunda ostenta um excesso do poder cognitivo.

H-Razão última, portanto, porque se pretende ver suprimido dos factos não provados o ponto 2 e se requer um aditamento do seguinte jaez junto dos factos provados: 1- A Ré usava a viatura Mercedes R com o consentimento do seu marido, administrador da A., mas sempre deixava de o poder fazer quando a utilização daquela se mostrava mister à realização de diligências forenses por parte dos advogados ou advogados-estagiários da sociedade autora; 2- A autora iria utilizar a viatura durante o período da privação ilícita do uso; assim não se faça e logo violados serão os artigos acima in já indicados - 396.º CCiv.; 607.º.5 CPC.

I - Pelo que se demonstra, a alteração da base factual abrirá inelutavelmente o caminho para a indefectível prova dos concretos prejuízos sofridos pela A. a título de dano de privação do uso, uma vez que no interlúdio da privação ipso facto ilegal a viatura seria usada em diligências judiciais.

J - Independentemente da alteração dos pressupostos factuais motivantes da decisão final que integra a sentença judicial, determinada através de um melhor juízo sobre os seus baluartes testemunhais, igual resultado deveria lograr-se por decorrência das regras relativas ao valor probatório da confissão judicial, uma vez que da contestação da R. resulta apodíctico que esta admite expressamente o ponto 15 da Petição Inicial da ora recorrente: K- “a referida viatura era igualmente utilizada, quando necessário, pelos advogados e advogados estagiários que colaboram na Autora, para se deslocarem para as mais diversas diligências, reuniões com clientes, audiências de julgamento, diligências de penhora e toda e quaisquer outras diligências designadas, etc.” L- Porque assim é, uma relação de causa-efeito tem inelutavelmente de tomar o seu espaço na sentença final: este concreto facto tem de ser tido como provado na medida em que consiste numa confissão judicial, a qual tem força probatória plena contra o confitente (358.º.1 CCiv.) e...

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