Acórdão nº 349/13.2PEGDM.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 25 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA DEOLINDA DION
Data da Resolução25 de Fevereiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

RECURSO PENAL n.º 349/13.2PEGDM.P1 2ª Secção Criminal CONFERÊNCIA Relatora: Maria Deolinda Dionísio Adjunta: Maria Dolores Sousa Acordam os Juízes, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto: I - RELATÓRIO No âmbito do processo comum, com intervenção de Tribunal Singular, n.º 349/13.2PEGDM.P1, do 2º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Gondomar, agora Comarca do Porto, Gondomar-Instância Local-Secção Criminal-J2, por sentença proferida a 29 de Maio de 2014, foi o arguido B…, com os demais sinais dos autos, condenado na pena 8 (oito) meses de prisão, pela prática de 1 (um) crime de furto simples, previsto e punível pelo art. 203º n.º 1, do Cód. Penal.

Discordando, o arguido interpôs recurso extraindo da motivação as conclusões que se transcrevem: “A- Fundamenta a M.Ma Juiz a quo a que fundou a sua convicção "... no visionamento do filme de vídeo vigilância do momento em causa efetuado em audiência de julgamento..." No auto de recolha de imagens a fls. ..., a autoridade policial a quem foi confiada a investigação criminal, invoca que as imagens de vídeo vigilância foram recolhidas ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 35/2004 de 21 de fevereiro, diploma que regula o regime jurídico de exercício da atividade de segurança privada. Ora dispõe o n.º 4 do citado artigo 13° que: "A autorização para a utilização de meios de vigilância eletrónica do presente diploma não prejudica a aplicação do regime geral em matéria de proteção de dados previsto na Lei n.º 67/98 de 26 de Outubro, designadamente em matéria de direito de acesso, informação, oposição de titulares e regime sancionatório".

B - Resulta daqui, que as entidades licenciadas para o exercício da atividade de segurança privada, poderão proceder à gravação de imagens e som, através de equipamentos eletrónicos, desde que se observe o regime geral de proteção de dados previsto na Lei n.º 67/98 de 26 de Outubro.

C - Não resultou provado nestes autos que a ofendida (ou outra entidade) procedeu à notificação da Comissão Nacional de Proteção de Dados, antes de implementar o funcionamento do sistema de videovigilância. Esta obrigação resulta das disposições conjugadas dos artigos 7.º, 27º, 28º, n.º l e 37.º n.ºs l e 2 da Lei n.º 67/98 de 26 de Outubro.

D - Não tendo sido observadas as condições imperativas de recolha e tratamento de imagens e som, não podem aquelas imagens e os fotogramas daí obtidos, ser valoradas, como foram, pelo tribunal a quo, atento princípio da legalidade da prova, previsto no artigo 125.º do Código de Processo Penal.

E - São os seguintes os pontos de facto que o Arguido considera incorrectamente julgados (cfr. alínea a) do n.º 3 do artigo 412º do Cód. Proc. Penal): alíneas a), b), c), d) e e) dos factos provados.

F - O arguido de forma coerente, e, respondendo sempre de forma calma, ponderada, objectiva e descomprometida a todas as questões que lhe foram colocadas, pelo MMa Juiz "a quo", pela Senhora Procuradora, não hesitou em qualquer uma delas, admitindo, inclusivamente os factos que bem sabia lhe eram prejudiciais, tais como a sua presença na F….

G - O arguido prestou declarações, - alínea b) do n.º 3 do artigo 412º do Cód. Proc. Penal - que - 21-05-2014,14:14:32 (n.º 4 do artigo 412º do C. P. Penal): Arguido: É verdade que entrei na loja e saí. É verdade que estive lá dias depois, abordaram-me a dizer que um indivíduo furtou relógios... chamei (chamaram?) a polícia ....

MMa Juiz: Chegue aqui... é o senhor a mexer nos relógios? ...

(A resposta não é percetível) MMa Juiz: O que é que o fez voltar? Trazia ou não o relógio dentro do bolso!? Arguido: Não senhor! Como é que eu ia sair do centro comercial no 2º andar com o relógio dentro do bolso?... Com seguranças!.

MMa Juiz: Quando foi lá, foi fazer o quê? Arguido: Ia comprar um presente para a minha namorada ou para minha filha.

MMa Juiz: Quando saiu da loja, viu alguém a correr atrás de si? Arguido: Não senhor, eu saí, escadas rolantes, depois andei no K... ...

MMa Juiz: O senhor recorda-se?! Arguido: É claro que recordo, já fui três vezes à polícia! MM° Juiz: Ah, bom...

H - A estes pontos responderam as testemunhas C… e D…, testemunhas indicadas pela acusação, da forma seguinte. - alínea b) do n.º 3 do artigo 412º do Cód. Proc. Penal - que, respetivamente, 28-04-2014,14:32:52 e 28-04-2014,14:10:2014, (n.º 4 do artigo 412° do C. P.Penal).

I - Importa dizer que estas testemunhas prestaram depoimento de forma pouco credível, não justificaram o porquê de, o arguido depois de ter furtado o relógio regressou à loja, assim como não explicaram porque é que a testemunha E… disse que viu o relógio no bolso do arguido e o viu sair e não foi imediatamente chamada a segurança ou as forças policiais.

J - O tribunal "a quo" entendeu que a testemunha da acusação C… de forma "peremtória, serena objetiva, que viu o relógio em causa, quando estava atender, o que chamou a atenção e fez chamar as colegas".

L - Não se afigura credível que neste quadro de flagrante delito, uma logista experiente não tenha de imediato feito soar o alarme existente na loja, e subsequente pedido de auxílio aos seguranças contratados pelo centro comercial, e, autoridades policiais.

M - Daqui resulta à evidência que a testemunha mentiu quando disse que viu o relógio no bolso do arguido, admite-se como hipótese académica que o dito relógio possa ter sido furtado e que desapareceu do mostruário, não seguramente foi o aqui recorrente quem o furtou.

N - Parece evidente ao recorrente, com devido respeito, que a convicção a MMa juiz foi formada, não na prova produzida em audiência de julgamento, mas outrossim, com a análise do certificado do registo criminal do arguido, é verdade que o recorrente tem um extenso passado criminal, assim é verdade que já pagou à sociedade por crimes que cometeu, não podendo ser condenado, nos presentes autos, única e exclusivamente como com base em ilações que o tribunal "à quo" retirou do registo criminal do arguido.

O - Face à prova produzida o Mm. Juiz "a quo" não podia ter dado como provado os referenciados factos nas alíneas a), b), c), d) e e).

P - A existirem dúvidas, o que não se concede, dada as diferentes versões dos factos apresentados pelo arguido e pelo assistente, sempre deveria prevalecer o princípio constitucional de presunção de inocência, consagrada no artigo 32° da Constituição da República Portuguesa, que assim foi objectivamente violado.

Q - Determina o artigo 43° do Código Penal que a pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano é substituída por pena de multa ou por pena não privativa de liberdade, já o artigo 58.° dispõe que a pena de prisão não superior a dois anos deve ser substituída por prestação de trabalho a favor da comunidade.

R - Importa agora trazer à colação que o arguido foi acusado e condenado pelo tribunal à quo pelo furto de um relógio no valor € 125,00!!! S - Para a boa aplicação da pena em concreto aplicável ao arguido, resultou provado que: al. ff), "que o arguido conseguiu cumprir duas mediadas de trabalho a favor da comunidade de forma que mereceu a avaliação positiva por parte da entidade que beneficiou do trabalho"; al. gg) "trabalho comunitário cumprido"; al. kk) "dinâmica familiar equilibrada, sendo B… descrito como um pai dedicado e preocupado com a imagem que projeta junto das filhas"; al. mm) o arguido é descrito como um indivíduo com interação educada por parte dois vizinhos".

T - Perante estes factos, entendeu adequada e proporcional condenar o arguido na pena de oito meses de prisão efetiva.

U - Obviamente nada tem de adequado e proporcional privar um pai dedicado pelo período de 8 meses, um indivíduo que cumpriu de forma exemplar as penas de trabalho comunitário, uma pessoa integrada no meio social, que é apreciada pelos vizinhos, que está integrado numa família funcional.

V - Para além do mais, como é sabido, o cumprimento na pena de prisão efetiva terá como consequência necessária, dada a interação com outros reclusos, o regresso do arguido a uma vida de toxicodependência, que como resulta provado, o arguido abandonou.

Z - Violaram-se assim os artigos 32º da Constituição, artigos 120º e 125º do Código de Processo Penal*Admitido o recurso por despacho de fls. 204, respondeu o Ministério Público pugnando pela sua improcedência e manutenção do decidido, rematando a motivação com as seguintes conclusões: “1. A título de questão prévia, cumpre desde logo dizer que o recorrente, no seu requerimento de interposição de recurso e respectiva motivação, fez uma quase reprodução integral da motivação do recurso, sendo certo e consabido que o âmbito do recurso é definido pelas conclusões extraídas da respectiva motivação, impondo-se, assim, que se dê cumprimento ao disposto no artigo 417.º, n.º 3 do Código de Processo Penal.

  1. Não obstante o recorrente não ter cumprido esse requisito na motivação apresentada, sempre se dirá que não assiste razão ao recorrente, pois a prova produzida em audiência de discussão e julgamento é suficientemente elucidativa da prática dos factos pelos quais o arguido vinha acusado e evidenciou o seu cometimento.

  2. Com efeito, a prova produzida, apreciada, ponderada ao longo da audiência de discussão e julgamento foi valorada pelo tribunal segundo os cânones legais - cfr. artigo 127.º do Código de Processo Penal -, suporta objectivamente os factos dados como assentes na sentença recorrida e empresta a todo o processo decisório de formação da convicção da Mma. Juiz, foros de justeza, correcção e comportabilidade juridicamente.

  3. O arguido vem, nesta sede, arguir a nulidade da prova, por se ter valorado o visionamento das imagens de videovigilância existentes no estabelecimento em causa nos autos, uma vez que se desconhece se aquele estabelecimento possui autorização da Comissão Nacional de Protecção de Dados para ter tal sistema ali instalado.

  4. Todavia, inexiste nulidade a declarar, como linearmente se pode constatar da análise da variada jurisprudência dos nossos tribunais...

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