Acórdão nº 597/13.5TTMAI.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 09 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA JOS
Data da Resolução09 de Fevereiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 597/13.5TTMAI.P1 4.ª Secção Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do PortoII1. Relatório 1.1.

B…, intentou a presente acção declarativa com processo comum no Tribunal do Trabalho da Maia contra C…, Lda., pedindo a condenação da ré no pagamento da quantia de € 12.296,12 (doze mil, duzentos e noventa e seis euros e doze cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, contados desde a citação até integral pagamento.

Para tanto, alegou, em síntese: que tem uma quota de 5% na sociedade ré, sociedade esta da qual o ainda seu marido, detentor dos restantes 95%, é o único gerente; que casou em Agosto de 2007 e logo em Setembro de 2007 começou a trabalhar no restaurante de tal sociedade como ajudante de cozinheira, tendo durante mais de seis anos desempenhado as funções de chefe de cozinha; que, apesar de desempenhar tais funções, estava classificada como empregada de mesa, auferindo uma retribuição mensal de € 532,00 em vez dos € 877,00 que deveria receber segundo o instrumento de regulamentação colectiva que entende aplicável; que a ré não lhe pagou o subsídio de Natal de 2012 e as remunerações dos meses de Janeiro a Abril de 2013 e que invocou estes factos na carta através da qual resolveu com justa causa o contrato de trabalho, enviada em 14 de Maio de 2013. Pede a condenação da ré no pagamento do valor mencionado, referente às verbas a que se refere na carta e a 11 dias de Maio de 2013, mês de férias e respectivo subsídio vencidos em 01 de Janeiro de 2013, proporcionais de férias e subsídios de férias e de Natal do ano da cessação e uma indemnização pela resolução com justa causa, no valor de € 4.750,41.

Na contestação apresentada a fls. 48 e ss., a R. invocou, em suma: que a autora é detentora de uma quota de 5% e o seu gerente é detentor dos restantes 95%, mas nunca houve qualquer relação laboral entre a autora e a sociedade ré; que a aquisição das quotas da sociedade por parte do casal se deveu a uma decisão conjunta de ter no restaurante a fonte de rendimentos para custear a vida em comum; que nunca a autora esteve sujeita a dever de obediência ou responsabilidade disciplinar, a horário de trabalho fixo ou dever de assiduidade, além de nunca lhe ter sido paga retribuição, o que também nunca foi por si exigido. Conclui pedindo a sua absolvição do pedido A A. apresentou articulado de resposta que foi considerado inadmissível por despacho proferido a fls. 67 e 68.

Proferido despacho saneador e dispensada a enunciação do objecto do litígio e dos temas da prova. O valor da acção foi aí fixado em € 5.302,33.

Uma vez realizado o julgamento, o Mmo. Juiz a quo proferiu sentença que julgou improcedente a acção e absolveu a R. do pedido.

1.2.

A A., inconformada interpôs recurso desta decisão, tendo formulado, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões: «A. A decisão de facto proferida deve ser alterada na medida em que na sentença em apreciação se tomaram como provados factos que careciam de fundamento probatório, e se ignoraram provas que consubstancia factos provados que por serem importantes para a boa decisão da causa, teriam de ter sido considerados.

B. Do facto J) dado como provado na douta sentença, deve ser eliminada a frase “ou exercido qualquer actividade profissional”na medida em que nenhuma prova neste sentido foi produzida, pelo contrário, o que ficou provado foi que “A autora, àquela data era estudante do ensino superior no H..., nunca tendo chegado a concluir aquela formação e trabalhava como empregada de escritório na empresa de Limpezas de seu pai” C. Do facto N) dado como provado na douta sentença, deve ser eliminada a frase “que a aquisição das quotas seria feita exclusivamente com o dinheiro do D...” na medida em que nenhuma prova neste sentido foi produzida, pelo contrário, o que ficou provado foi que em 2006 a sociedade “C..., Lda” foi adquirida pela Recorrente e seu marido, tendo sido inicialmente paga por este uma parcela do valor global e, posteriormente, o valor remanescente, por ambos, através dos proventos da exploração do negócio hoteleiro pertencente à sociedade.

D. Os factos R), V), X), Z), FF) e HH) dados como provados na douta sentença, devem ser todos considerados não provados, por a prova produzida em audiência ter sido de sentido contrário E. Devem ser considerados provados os seguintes factos: - A Autora trabalhou de sol a sol na sociedade Recorrida, cumprindo um horário de trabalho desde a abertura (6h30m) até ao fecho (2h) -Era a autora que tratava da higiene da cozinha, dos respectivos equipamento e dos utensílios - Era a autora a responsável pela conservação dos alimentos e pelo aprovisionamento da cozinha - A Autora recebia ordens e instruções do gerente da Ré, D..., estando por isso subordinada à sua autoridade.

- A Autora não tinha liberdade para se ausentar ou faltar sem qualquer justificação.

- A Ré contabilizava os salários da Autora como custos, e a Autora assinava os respectivos recibos de vencimento como empregada de mesa, no valor base mensal de 532,00€ mensais.

F. Da matéria de facto provada resulta que o local onde a Recorrente trabalhava pertence à sociedade Recorrida; os equipamentos e instrumentos de trabalho pertencem também à sociedade Recorrida; os horários de abertura e fecho realizados pela Recorrente eram ordenados pelo gerente da sociedade Recorrida; e a Recorrente tinha um vencimento fixado em 532,00 € mensais, ainda que efectivamente não o recebesse.

G. Assim, a Recorrente reunia quatro das cinco características indicadas pelo CT, que fundamentam a presunção de existência de um contrato de trabalho, tendo a douta sentença recorrida, ao não considerar a existência deste, violado o artigo 12º/1 do Código do Trabalho H. A Declaração de Situação de Desemprego junta aos autos a fls. 14 e 15, foi emitida pela recorrida de livre e espontânea vontade e, nos presentes autos reconheceu a sua autoria e daí que faça prova plena quanto às declarações que à recorrida têm de ser atribuídas, as quais têm de ser consideradas provadas na medida em que sejam contrárias aos interesses da declarante – artigos 376º nºs 1 e 2 do CC que a douta sentença violou I. Ao mesmo tempo representa uma confissão extrajudicial, pelo que tem força probatória plena contra o confitente, nos termos do artigo 358º/1 do CC que foi igualmente violado J. Acresce que, tendo essa declaração confessória sido feita à recorrente, como parte contrária, tem força probatória plena, nos termos do artigo 358º/2 do CC, normativo que a douta sentença não considerou.

K. Ou seja, tem que se dar como provado que existia um contrato de trabalho e que a resolução do contrato teve por fundamento a existência de retribuições em mora (salários em atraso) desde Janeiro de 2013.

L. Atentas as funções que exercia no estabelecimento da recorrida, à recorrente deve ser reconhecida a categoria profissional de “chefe de cozinha”, à qual, à data da resolução do contrato de trabalho, correspondia o vencimento mensal base de 877,00€ - cfr. CTT publicado a páginas 176 e seguintes do BTE (digital) nº 3, Volume 79 de 22.01.2012, nomeadamente o seu artigo 3º (Classificação dos Estabelecimentos) e Anexo I (Tabela de Remunerações mínimas pecuniárias de base).

M. Consequentemente, a recorrida deve, e por isso tem de pagar, à recorrente, a quantia peticionada de 12.296,12€, descriminada no artigo 12. da petição inicial, acrescida de juros de mora contados desde a citação até integral e efectivo pagamento.» Termina pedindo a procedência da acção.

1.3.

A R. apresentou contra-alegações em que defendeu a rejeição do recurso por ser exclusivamente impugnada a decisão sobre a matéria de facto sem que a recorrente tenha dado cumprimento ao disposto no art. 640.º do CPC 1.4.

O recurso foi admitido com efeito devolutivo (vide fls. 281).

1.5.

Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso.

1.6.

Notificadas as partes deste Parecer, nenhuma delas se pronunciou.

Cumprido o disposto na primeira parte do nº 2 do artigo 657º do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, aplicável “ex vi” do art. 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, e realizada a Conferência, cumpre decidir.

*2. Objecto do recurso Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – artigo 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, aplicável “ex vi” do art. 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho –, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste tribunal prendem-se com a análise: 1.ª – da impugnação da decisão de facto quanto aos factos indicados nas conclusões B. a E. e do relevo para a decisão de facto da declaração de situação de desemprego emitida pela R. e na qual a mesma funda a impugnação nas conclusões H. a K.; 2.ª – de saber se entre as partes se estabeleceu um vínculo contratual de natureza laboral, o que pressupõe a análise da sub-questão de saber se, no caso, pode presumir-se a existência de um contrato de trabalho subordinado, nos termos do disposto no art. 12.° do Código do Trabalho; 3.ª – em caso de resposta afirmativa à questão antecedente, de saber se deve ser reconhecida à recorrente a categoria de "chefe de cozinha" com o inerente direito a diferenças salariais; 4.ª – no mesmo pressuposto da resposta afirmativa à 3.ª questão, aferir da justa causa de resolução contratual.

Previamente haverá que analisar a questão suscitada pela recorrida no que diz respeito à pretendida rejeição da impugnação da decisão de facto deduzida pela recorrente.

*3. Fundamentação de facto*3.1. A decisão da 1.ª instância A sentença recorrida enunciou a factualidade provada que resultou da discussão da causa nos seguintes termos: «[...]

  1. A autora e D… casaram um com o outro em 04/08/2007; B) E… nasceu em 17/12/2011 e está registado...

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