Acórdão nº 3791/09.0YYPRT-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 04 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelCARLOS GIL
Data da Resolução04 de Maio de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

3791/09.0YYPRT-A.P1 Sumário do acórdão proferido no processo nº 3791/09.0YYPRT-A.P1 elaborado pelo seu relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil: 1. Num contrato de aluguer de longa duração é válida a cláusula penal que, em caso de resolução contratual por parte do locador, obriga o locatário a pagar àquele uma indemnização no montante de quarenta e cinco por cento do valor total da rendas vincendas, na data em que a resolução contratual produz efeitos.

  1. Para existir abuso do direito, tem que existir um direito, ou uma faculdade abusivamente exercidas, não se preenchendo a figura nos casos em que inexistem o direito ou a faculdade jurídica em causa.

  2. Não obstante os recorrentes não invoquem expressamente a nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia, tal como a questão vem por eles colocada e tendo em conta a liberdade de qualificação jurídica de que goza o tribunal (artigo 5º, nº 3, do Código de Processo Civil), deve entender-se que foi suscitada a nulidade da decisão recorrida por omissão de conhecimento da matéria do abuso do direito.

  3. A litigância de má fé é de conhecimento oficioso e pode ser suscitada em via de recurso, ainda que não haja sido invocada em primeira instância, mas o pedido indemnizatório fundado em litigância de má fé cometida no tribunal a quo carece de ser deduzido perante esse tribunal.

    *** * ***Acordam os juízes abaixo-assinados da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto: 1. Relatório[1] A 19 de Março de 2012, por apenso à execução, para pagamento de quantia certa nº 3791/09YYPRT, então pendente na 1ª secção, do 1º Juízo de Execução do Porto, B…, Lda.

    , e C… vieram deduzir oposição à acção executiva que lhes foi movida por D… pedindo a extinção da acção executiva ou, subsidiariamente, a sua redução para valor não superior a cinco mil euros.

    Fundamentam a oposição na alegação, em síntese, de que assinaram a livrança exequenda em branco, para garantia do cumprimento das obrigações que para eles resultavam da celebração de um contrato de aluguer de veículo sem condutor. Afirmam que o preenchimento da livrança, no valor de € 15.054,39, efectuado pela exequente, foi abusivo, uma vez que, no momento em que o veículo objecto de tal contrato foi entregue à exequente e em que veio a ser preenchido o título, encontravam-se pagos todos os valores devidos, atinentes àquele contrato, com excepção da cláusula penal. Por outro lado, pretendem que o valor desta cláusula (€ 12.106,43) é exagerado, impondo-se reduzi-lo a um máximo de € 5.000,00, atendendo a que o veículo foi voluntariamente restituído em boas condições e foram pagos todos os montantes devidos até à data da restituição.

    A exequente contestou, invocando a nulidade da sua notificação para os termos da oposição, em virtude de ter sido efectuada pela Sra. Mandatária dos opoentes e, à cautela, impugnou alguns dos factos articulados pelos opoentes, pugnando pela total improcedência da oposição.

    Os opoentes foram notificados para ratificação do processado e em resposta vieram oferecer procuração forense outorgando poderes para ratificação do processado.

    Ordenou-se a notificação da contestação aos opoentes para, querendo, se pronunciarem sobre a nulidade processual arguida pela exequente.

    A 18 de Fevereiro de 2013, E…, Lda.

    veio informar que a exequente D… se fundiu por incorporação na requerente, pedindo, em consequência, que seja admitida a substituir a sociedade extinta por fusão por incorporação, pretensão que foi deferida por despacho proferido a 25 de Fevereiro de 2013.

    Designou-se uma infrutífera tentativa de conciliação, após o que foi indeferida a nulidade processual arguida pela exequente, procedeu-se à condensação da factualidade considerada relevante para a boa decisão da causa, discriminando-se os factos assentes dos controvertidos, estes últimos a integrar a base instrutória e fixou-se o valor da causa no montante de € 15.123,68.

    As partes ofereceram as suas provas.

    Realizou-se a audiência final, numa sessão, já na Instância Central da Comarca do Porto, na 1ª Secção de Execução, J2, após o que foram proferidas respostas à matéria vertida na base instrutória, logo seguidas de sentença que julgou a oposição parcialmente procedente, determinando-se o prosseguimento da acção executiva para pagamento do capital de € 13.026,75, acrescido de juros de mora, à taxa legal, a contar de 25/1/2009, sobre € 920,32, e a contar de 23/4/2009, sobre € 12.106,43.

    A 17 de Novembro de 2014, inconformados com a sentença, os opoentes interpuseram recurso de apelação, terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões: “1. A livrança foi preenchida com o valor de € 15.054,39, incluindo uma indemnização fixada contratualmente que se entende não ser devida.

  4. O contrato de aluguer foi resolvido em Fevereiro de 2009 e nessa data apenas estava em dívida (há dia) uma única renda no valor de € 920,32, valor que a livrança contempla.

  5. Dias antes da resolução, foram pagas 3 rendas no valor de 920,32 cada. O que sucedeu pós interpelação para pagamento sob pena de resolução do contrato.

  6. A Apelada pagou essas rendas, confiando que o contrato se mantinha, e ainda assim de forma insidiosa, a Locadora decorridos 10 dias após vencimento da renda seguinte, resolveu o contrato, o que se integra verdadeiro abuso de direito.

  7. Abuso esse que deve ser declarado nos termos do disposto no artigo 334º do CC que a decisão recorrida ignorou.

  8. Acresce que a sentença recorrida considerou válida e não excessiva a indemnização no valor de € 12.106,43 que a Locadora pretende cobrar, decisão que o Tribunal ad quem não poderá manter.

  9. Com efeito, manter tal decisão seria acolher um comportamento abusivo da Apelada, uma vez que o veículo em causa estava praticamente novo (apenas tinha 16 meses), e valia, no mínimo € 45.000,00, o que significaria que a Locadora Apelada tivesse maior lucro com o incumprimento do contrato.

  10. Por outro lado, manter a decisão recorrida seria proteger um comportamento que se revela abusivo, porquanto a Locadora resolveu o contrato de forma arbitrária e até de má fé, dias depois da Locatária ter regularizado o seu débito e ainda pretende cobrar uma indemnização excessiva e desproporcionada por danos que no caso inexistem.

  11. E não se diga que a Apelada tem direito a esta quantia em virtude da desvalorização do veículo durante os 16 meses de vigência do contrato, pois que, o risco da desvalorização neste tipo de contratos corre por conta do locatário que paga rendas elevadíssimas que já o incluem, como sucedeu no caso dos autos.

  12. Deve assim considerar-se a cláusula 24º do contrato dos autos relativamente proibida e como tal nula, nos termos do disposto nos artigos 12º e 19º do DL 446/85 de 25 de Outubro e artigos 280º e 294º do CC, normas que a sentença recorrida violou, por não aplicação ao caso dos autos.

  13. Acresce ainda que, ficou demonstrado nos autos um preenchimento abusivo da livrança relativamente a outras quantias que lhe foram apostas, reduzindo-se o seu valor em conformidade mas esquecendo o Tribunal a quo de apreciar a má fé da Apelada que é evidente e como tal deve ser condenada como litigante de má fé, em multa e indemnização condigna fixar com equidade pelo Tribunal.

  14. Em suma, deve o Tribunal considerar que no caso concreto de um ALD de um veículo automóvel praticamente novo que é voluntariamente entregue à Locadora é manifestamente desproporcionado consagrar-se como válida uma indemnização equivalente a 45% do valor das rendas vincendas, sob pena de se reconhecer como válido um enriquecimento ilegítimo.

  15. Sem prescindir, a Locadora ao resolver o contrato, depois de receber 3 rendas que estavam em atraso e sem interpelar novamente a Locatária, abusou de um direito, o que não pode ser considerado legítimo pelo Tribunal, face o disposto no artigo 334º do CC.

  16. É que A conduta da Locadora no caso dos autos configura desde logo um verdadeiro venire contra factum proprium, na medida em que deu a entender à Locatária que não iria resolver o contrato se ela pagasse, como pagou, as 3 rendas que estavam em atraso.

  17. Ao resolver o contrato e exigindo a indemnização fixada nesse mesmo contrato, pretende exercer um direito que se encontra em total contradição com a...

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