Acórdão nº 1075/13.8TBCHV.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 26 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelRUI MOREIRA
Data da Resolução26 de Maio de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

PROC. Nº 1075/13.8TBCHV.P1 Comarca do Porto – Tribunal de Vila Nova de Gaia Inst. Central – 3ª Secção Cível – J1 REL. N.º 241 Relator: Rui Moreira Adjuntos: Henrique Araújo Fernando Samões*ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO: 1 - RELATÓRIO B… intentou contra C… a presente acção declarativa sob a forma do processo comum, pedindo que se declare resolvido um contrato-promessa de compra e venda celebrado com esta, respeitante à proporção de 50% em que esta era dona de dois prédios rústicos e cuja venda lhe prometeu pelo preço de 25.000€, com prévia obrigação de os converter em prédios urbanos. Alegando que o contrato-promessa não foi cumprido no prazo razoável que lhe fixou, pretende que se reconheça o respectivo incumprimento definitivo, condenando-se a ré, por consequência a restituir-lhe o sinal em dobro, num total de 50.000€, valor este a acrescer com juros de mora a contar da data da citação.

A R. contestou a R, arguindo a incompetência territorial do Tribunal de Chaves (em termos que vieram a ser providos, mas que ao presente recurso não importam) impugnando parte da matéria de facto alegada e deduzindo reconvenção, onde pediu a condenação do A. a ver declarada a resolução do contrato promessa com perda do sinal entregue a seu favor, bem como a respectiva condenação como litigante de má fé. Alegou, para o efeito, que o A., conhecedor das limitações legais relativas à transmissão do direito prometido vender (resultantes da ausência de partilha de bens entre a Ré e seu ex-marido, de quem o A. era sócio numa empresa), nunca quis celebrar o contrato definitivo, deixando que decorressem vários anos sem nada exigir. De resto, o contrato-promessa em questão estava associado a outro negócio de alienação, da ré para o autor, de 50% das quotas de uma sociedade que ela mantinha com aquele seu ex-marido, a qual se encontrava instalada nos terrenos também prometidos em venda. Por via desses negócios, que também incluíam os suprimentos feitos pela ré à sociedade referida, o autor ficaria dono de 50% das quotas dessa sociedade, bem como de 50% do direito de propriedade sobre os prédios onde a mesma se encontrava instalada, sendo que a outra metade pertencia ao referido ex-marido da ré.

Ora, alega a ré, não tendo qualquer dos contratos um prazo para cumprimento e cabendo a si própria a marcação da escritura do contrato prometido, jamais o autor, ao longo dos sete anos que passaram, manifestou vontade de outorgar o contrato prometido, sem que isso perturbasse a sua actividade naquela sociedade. Em qualquer caso, foi por dificuldades na regularização da situação da propriedade dos prédios, ampliadas com o seu divórcio, que o tempo decorreu sem que conseguisse condições para marcar a escritura do contrato prometido, como sempre foi do conhecimento do autor. Por tudo isso, deve ter-se por inaceitável o prazo de vinte dias fixado pelo autor para que a autora marcasse a escritura e, bem assim, a data que ele próprio marcou para o efeito, agendando a escritura num cartório notarial. Tal actuação, tendente a fazer a ré num incumprimento que seria inevitável, consubstanciaria, assim, um verdadeiro abuso de direito. Em qualquer caso, por não estar em mora, não pode conferir-se à interpelação que o autor lhe dirigiu o efeito de conversão de qualquer mora em incumprimento definitivo. Por outro lado, nenhum facto foi alegado pelo autor do qual possa concluir-se haver motivo justificado para uma perda do seu interesse no cumprimento do contrato-promessa.

Depois de qualificar a actuação do autor como litigância de má fé, em reconvenção, a ré alega verificar-se na actuação do autor uma inequívoca vontade de não cumprir o contrato. Deve, pois, considerar-se resolvido esse contrato, declarando-se a perda, a seu favor, do sinal recebido.

O A. replicou, salientando ter cumprido as suas obrigações contratuais e reafirmando o incumprimento da ré. Contestou que o prazo concedido para a marcação da escritura não fosse razoável e negou carecer de ser demonstrada objectivamente uma perda de interesse no cumprimento do contrato. Peticionou ainda a condenação desta como litigante de má fé.

Foi efectuada audiência prévia com fixação do objecto do litígio e temas de prova, nos seguintes termos: “Objecto do litígio: Apreciação das obrigações do Autor e Ré dos dois acordos celebrados entre ambos.

Temas de prova: 1º - Eventual ligação entre os dois contratos celebrados e repercussões recíprocas neles contempladas.

  1. - Comportamento da Ré e as interpelações para cumprimento, efectuadas pela Ré.” Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, finda a qual foi proferida sentença que declarou a acção procedente e, pelo contrário, improcedente a reconvenção.

É esta sentença que a ré vem impugnar através do presente recurso, que termina com as seguintes conclusões:

  1. Ao dar como provado a existência de um documento escrito denominado “contrato promessa de compra e venda”, entre Recorrente e Recorrido, o tribunal a quo teria necessária e especificamente que reconhecer a ausência de prazo que consta do seu conteúdo, bem como o ónus da Recorrente em providenciar a sua marcação.

  2. Não podendo considerar dessa forma a existência de mora da Recorrente, e muito menos o incumprimento definitivo da sua obrigação, aquando do recebimento da primeira comunicação formal para efeitos de marcação da escritura.

  3. O tribunal considerou provado o período de tempo que mediou entre a outorga do contrato promessa de compra e venda e a comunicação da marcação da escritura – por iniciativa do Recorrido: 7 anos.

  4. Ignorando as justas e legais pretensões invocadas pela Recorrente, nomeadamente a necessidade de suprir o consentimento do seu ex-marido e co-proprietário dos imóveis.

  5. Bem como o exíguo período de tempo concedido para que a Recorrente marcasse escritura ou comparecesse na escritura, e ainda a localização da mesma - A propositura de um prazo de vinte dias para a Ré marcar e celebrar e escritura de compra e venda, dentro do qual consta a data alternativa proposta pelo recorrido, 30 de Setembro de 2013, não é mais do que um comportamento evidenciador da sua má-fé, destinado a tentar forçar o incumprimento do contrato por parte da Recorrente para obtenção de uma vantagem económica de forma ilícita.

  6. Igualmente ignorou ou não conheceu as reais intenções do Recorrido, com a sua conduta, que apenas lançou mão dos expedientes legais, quando a sua intenção era provocar o constrangimento da Recorrente.

  7. Sendo certo que sempre foi sua intenção única e exclusiva a cominação da resolução contratual, ou melhor a perceção do dobro do sinal.

  8. Situação que configura manifestamente abuso de direito na modalidade de venire contra factum próprio.

  9. Acresce que não foi igualmente apreciada, nos termos em que a lei o determina, a perda do interesse no negócio, por parte do Recorrido, situação que nunca podia resultar do mero decurso do tempo.

  10. Não ficando objetivamente demostrada a perda de interesse no negócio por parte do Recorrido.

  11. Nunca se podendo concluir pela resolução contratual.

  12. Porquanto a Recorrente comunicou ao Recorrido a sua impossibilidade temporária e disponibilidade para a realização do negócio.

  13. Não sendo por esse motivo devida qualquer quantia, antes resultando a resolução contratual motivada pelo comportamento culposo (porque intencionalmente lhe deu causa, antevendo o resultado pretendido) do Recorrido.

  14. Flui do exposto, que a douta sentença violou o disposto nos artigos 405º, 410º, 442º, n.º 2 do art.º 762º, números 1 e 2 do art.º 808º, n.º2 do art.º 342º e o n.º 2 do art.º 542º, todos do Código Civil, e ainda os artigos 412º e 413º, ambos do Código de processo Civil, motivo pelo qual se pede a sua revogação e seja proferida outra que contemple a correcta aplicação destas normas.

    Termos em que o presente recurso deve merecer provimento e, em consequência, ser revogada a decisão recorrida com todas as legais...

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