Acórdão nº 2960/13.2TBPRD.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelALBERTO RU
Data da Resolução11 de Maio de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Tribunal da Relação do Porto – 5.ª secção.

Recurso de Apelação.

Processo n.º 2960/13.2TBPRD do Tribunal Judicial da Comarca de Porto Este – Paredes – Instância Local – Secção Cível – J2 (anterior Tribunal Judicial da Comarca de Paredes – 2.º Juízo Cível).

*Juiz relator – Alberto Augusto Vicente Ruço.

  1. Juiz-adjunto……Joaquim Manuel de Almeida Correia Pinto.

  2. Juiz-adjunto…….Ana Paula Pereira de Amorim.

    *Sumário: I - Se a autora pedir que metade da largura de certa faixa de terreno, bem definida em termos físicos, situada entre o corpo principal de dois prédios, faz parte do seu prédio e a outra metade integra o prédio vizinho, estando provado que tal faixa só pode pertencer a um ou a outro dos prédio, ou a ambos, então, se não existir prova de posse correspondente ao direito de propriedade, quer por parte da autora, quer dos réus, nem a questão puder ser resolvida através de títulos, deve ser atribuída metade do espaço a cada parte, nos termos do artigo 1354.º do Código Civil.

    II – Constando de uma escritura de partilhas, na qual foram outorgantes a autora e um antepassado dos réus: (

    1. Que o prédio «X», aí atribuído à autora, «confrontava» com um caminho de servidão localizado a poente, ponto cardeal onde se situa imediatamente o prédio vizinho dos réus partilhado na mesma escritura; (b) Que entre as construções e anexos de ambos os prédios existe um espaço por onde a autora ou outros a seu mando sempre têm passado a pé, de carro de tracção animal ou tractor; e (c) Que um cidadão, medido pela bitola do bonus pater familias, observando o espaço em causa, verificará que se encontra livre e visivelmente delimitado e é adequado a permitir a passagem de pessoas, veículos ou animais para o prédio da autora; Tais factos implicam a existência de uma servidão de passagem por destinação de pai de família (artigo 1549.º do Código Civil).

      III – O espaço físico livre e visivelmente delimitado situado entre as construções e anexos de ambos os prédios, com a função de permitir a passagem de pessoas ou veículos, preenche o conceito de «sinais visíveis e permanentes» referidos no artigo 1549.º do Código Civil.

      *Recorrente…………………...

      B…, residente em Rua …, n.º .., …, ….-… …, Paredes.

      Recorridos…………………..

      C… e D…, residentes em Rua …, n.º …, ….-… …, Paredes.

      *I. Relatório.

    2. O presente recurso insere-se no âmbito duma acção declarativa de condenação, mediante a qual a autora B… pretende, no confronto com os réus C… e D…, que o tribunal declare que ela é titular de uma servidão de passagem a pé e com veículos de tracção animal ou mecânica, constituída por destinação de pai de família ou, em todo o caso, por usucapião, a qual se exerce através de uma faixa de terreno que se estende desde a Rua … (freguesia …, concelho de Paredes), até ao limite da pequena horta que integra o seu prédio, como melhor se expõe na petição inicial.

      Concluiu a petição pedindo a condenação dos réus nestes termos: «

    3. Reconhecer que a autora é dona e legítima possuidora de metade da faixa de terreno identificado em 16, que integra o caminho identificado em 14 e o prédio identificado em 1, todos desta peça processual.

    4. A reconhecer que a autora tem o direito de passagem a pé e com veículos de tracção animal ou mecânica através daquela faixa de terreno, desde a Rua … até ao limite da pequena horta que integra o seu prédio identificado em 1.

    5. A manter livre e desimpedida a articulada faixa de terreno, retirando o muro e outras construções e abstendo-se de colocar quaisquer obstáculos que impeçam a livre circulação sobre o caminho».

      Os Réus contestaram alegando que edificaram de facto o aludido muro, mas fizeram-no porque não existe no local qualquer servidão.

      No final a acção foi julgada improcedente.

    6. É desta decisão que a autora recorre tendo formulado, após notificação do relator para aperfeiçoamento, as seguintes conclusões: «1.º - Os prédios da recorrente e do recorrido marido, supra melhor identificados, ambos eram pertença dos mesmos donos, os falecidos pais da autora e avós do réu marido, E… e F…, e na partilha operada pelo óbito de ambos, os prédios foram divididos e adjudicados entre os herdeiros compreendendo e integrando todas as suas pertenças, conforme uso e costume, designadamente todas os respectivos direitos.

  3. - A recorrente faz acesso ao seu prédio, hoje de habitação, com eira e horta junta, por um caminho que tem o seu início na Rua …, passa pelo prédio dos recorridos e atinge o seu prédio, assim como que, na sua parte inicial, em rampa acentuada, o chão foi pavimentado a cubos e na parte superior, cimentado (por acordo de todos, o primeiro pela autora e o segundo pelos réus).

  4. - Os recorridos construíram um muro, em blocos de cimento, com a altura de cerca de 1,50 metros, que se inicia na ponta norte da sua casa, prolongando-se ao longo do caminho, no sentido aproximado norte-sul e terminando no limite da pequena horta da recorrente, deixando apenas cerca de um metro de passagem para a autora no acesso à eira (e casa, acrescenta-se que o acesso à casa é feito pela eira), e ainda menos, já que vai apertando, no acesso à pequena horta (a largura deixada livre pelo muro para o lado da autora varia entre 1,03 metros e 0,98 metros (no acesso à eira e casa), largura que vai diminuindo até à extrema do acesso à horta enquanto, a largura é de respectivamente 1,05 metros e 1,30 metros, alargando na parte superior, tendo o muro a espessura de 0,20 metros), conforme inspecção ao local.

  5. - Em vida dos autores da herança, como proprietários dos dois prédios utilizavam o caminho para se dirigir quer à casa da habitação, quer ao palheiro e horta, que lhe ficavam defronte, não pertencendo o leito do mencionado caminho exclusivamente a qualquer dos prédios.

  6. - Na invocada partilha nada foi dito em contrário, pelo que terá obrigatoriamente que se presumir, de forma absoluta, que metade do leito do caminho integrou o prédio que ficava do seu lado e que a favor dos prédios se constituíram por efeito dessa partilha sobre a outra metade recíprocas servidões por destinação de pai de família que no caso oneram ambos os prédios.

  7. - Da leitura da escritura de partilha, junta nos autos, nada resulta que permita inferir, como se faz na sentença recorrida, que o caminho integrava o prédio urbano do recorrido marido.

  8. - E tanto é assim, que o caminho não era todo dos recorridos, são eles próprios expressamente a reconhecê-lo ao construírem o muro, ainda que ultrapassando o limite da sua metade, já que 8.º - Não faz qualquer sentido construir o muro, definindo um novo limite para o seu terreno e afirmando de forma clara que para além do muro o terreno do caminho pertence à autora, se todo o leito do caminho lhes pertencesse 9.º - Não se compreende assim como pode entender-se, como o faz a sentença recorrida, que a divisão dos prédios de ambos não se fizesse pela metade do invocado caminho, ou de que neles não se manifestassem os sinais de passagem e as condições de acesso.

  9. - É que, conforme supra se acentuou, foram colocados cubos de pedra na parte inicial do caminho desde a Rua …, por onde todos se servem e cimentado a parte seguinte entre as casas da autora e dos réus, onde agora foi implantado o muro, o que não permite verificar quaisquer sulcos de passagem de veículos.

  10. - Os sinais da existência do caminho e do seu uso como caminho resultam de imediato de ter sido pavimentado a cubos numa parte e cimentado noutra, que naturalmente não permitem hoje verificar os sulcos da passagem de carros de bois, tractores ou pessoas mas que identificam perfeitamente a sua natureza.

  11. - Existe manifesta contradição entre os factos assentes na alínea E – a autora, ora recorrente, faz acesso ao seu prédio pelo caminho, desde que ele lhe ficou a pertencer – e dar-se como não provado que o faz sem oposição de ninguém, exercendo um direito próprio, ou que não pagou impostos sobre o caminho, como se ele por si só fosse sujeito a tributação – Ponto 4 dos factos não assentes – devendo assim dar-se como provada, para desfazer a contradição, a matéria constante do Ponto 4.

  12. - O ponto 7 dos factos não assentes deve ter resposta afirmativa, já que conforme resulta da alínea E dos factos assentes, o acesso ao prédio da autora faz-se pelo caminho e este vem desde a Rua ….

  13. - Inexiste qualquer outro caminho, pois o muro construído pelos recorridos termina e fecha no limite da pequena horta – alínea G dos factos provados.

  14. - Não pode ser dado como provado que o muro não impede a livre circulação da recorrente, pelo simples facto de o julgador aí ter passado, pelo que a resposta deve ser alterada no sentido de, não impedindo totalmente a passagem a pé, a dificulta de forma significativa, já que 16.º - A autora é uma pessoa de avançada idade, que se desloca com canadianas (facto notório, do conhecimento directo do Tribunal que o verificou na tentativa de conciliação que antecedeu a audiência de julgamento) e que portanto não tem a mesma mobilidade.

  15. - A «quelha» julgada suficiente, agora totalmente entre muros (conforme resulta até das fotografias juntas e do auto de inspecção), não permite o acompanhamento por outra pessoa, ou até usar um simples guarda-chuva, que não cabe no espaço disponível.

  16. - É que, no limite, e admitindo que a autora, ora recorrente apenas detinha um direito de passagem de pé, como se conclui da sentença, ele era exercida sem qualquer limitação por todo o caminho, e não pelo diminuto espaço que agora fica livre, pelo que os recorridos, se entendessem que era demais, então tinham que, em acção própria, fazer limitar o uso da servidão.

  17. - A matéria constante do Ponto 1 dos factos não assentes é contraditória, por inclusivamente negar a passagem a pé, dada como provada na alínea E dos factos assentes, e é contrariada pelo depoimento das testemunhas que referem que os prédios eram do mesmo dono, pais e avós da autora e do réu marido, e por aí passavam embora esporadicamente, com veículos de tracção animal e mecânica.

    Deve assim ser alterada a...

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