Acórdão nº 6053/12.1TBVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 07 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelCARLOS QUERIDO
Data da Resolução07 de Setembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 6053/12.1TBVNG.P1 Sumário do acórdão: I. A perícia é realizada, sempre que possível, por “estabelecimento, laboratório ou serviço oficial apropriado”, como preceitua o n.º 1 do artigo 467.º do CPC.

  1. No que respeita à perícia colegial, deverá ser realizada por um colégio de dois ou três peritos, sendo realizada por dois apenas no caso de acordo entre as partes sobre a nomeação, dado que, não existindo acordo, cada parte escolhe um perito e o juiz nomeia um terceiro (art.º 468.º/4 do CPC).

  2. Tendo sido a primeira perícia singular, a segunda deveria manter a singularidade (art.º 488.º, b), do CPC, a contrario).

  3. A segunda perícia realizada nos autos pelo Gabinete Médico-Legal com intervenção de dois peritos não é nula como meio de prova, acrescendo que, caso enfermasse de qualquer nulidade, a mesma encontra-se sanada, por omissão de reclamação da parte – ora recorrente – que dispunha do prazo de dez dias para a arguir, contando-se tal prazo a partir do seu conhecimento (artigos 199º, nº 1, 2ª parte e 149º, n.º 1, ambos do CPC).

    Acordam no Tribunal da Relação do Porto I. Relatório B… intentou em 5.07.2012 ação declarativa de condenação contra C…, S.A., pedindo a condenação da ré a pagar à autora: «… a quantia de Eur. 92.197,16 (Noventa e dois mil cento e noventa e sete euros e dezasseis cêntimos), bem como as despesas e restantes danos derivados de futuras intervenções cirúrgicas ou tratamentos, a liquidar em execução de sentença, todas acrescidas dos juros, à taxa legal, contados desde a citação e até integral pagamento, bem como nos demais encargos legais».

    Alegou a autora em síntese, como fundamento da sua pretensão, que foi vítima de um acidente de viação que consistiu no seu atropelamento quando atravessava a rua numa passadeira destinada a peões, na qual foi colhida por um veículo seguro na ré, sofrendo graves lesões em consequência do embate.

    A ré contestou, aceitando a versão do acidente apresentada pela autora, alegando, no entanto, que «os danos invocados pela autora não são todos ressarcíveis. Bem assim, não têm a dimensão que a autora lhes pretende dar.» Em 14.11.2012 foi proferido despacho no qual: se fixou à ação o valor de € 92.197,16; se dispensou a audiência preliminar; se proferiu despacho saneador tabelar; se definiram os factos admitidos por acordo; e se elaborou a base instrutória.

    Procedeu-se a julgamento, após o que, em 21.01.2015 foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, decide-se condenar a Ré a pagar à Autora a quantia de 44.795,56 EUR acrescida de juros de mora à taxa de 4% desde a data da citação até integral pagamento.

    Custas por Autora e Ré, na proporção do decaimento.

    Registe e notifique.» Não se conformou a autora e interpôs recurso de apelação, apresentando alegações que termina com as seguintes conclusões: 1ª - Provou-se que a A. se encontra afectada com sequelas que lhe determinam a atribuição de uma I.P.P. de 15 % ou 15 pontos em escala de cem. Também ficou provado que despende maior esforço para realizar a sua atividade profissional habitual sendo as dores quantificadas em cinco numa escala de sete.

    1. - O Exmº Senhor Juiz entendeu fixar a favor da autora o montante de Eur. 26.544,00. Salvo o devido respeito, este fica aquém do adequado para a indemnizar condignamente.

    2. - O grau de 15 % de incapacidade que afecta a Autora é um dano patrimonial, sem margem para dúvidas: a não diminuição da remuneração efectiva não é impeditiva da atribuição de indemnização por danos patrimoniais (…).

    3. - Sucede que há duas circunstâncias que o Exmº Senhor Juiz a quo não considerou na devida medida.

    4. – Por um lado, deve ser adoptado o método introduzido pelo Acórdão da Relação de Coimbra de 04/04/1995 (CJ, 1995, Tomo 2, p. 26), com as nuances do Acórdão do STJ de 28/09/1995, CJSTJ, 1995, Tomo III, p. 36, e do Acórdão do STJ de 16/03/1999, CJSTJ, 1999, Tomo I, p. 170, que passaram a considerar (1) que os rendimentos não são estáveis, (2), a contemplar a inflação e (3) a fazer uso de uma nova fórmula de cálculo da indemnização pelo dano futuro.

    5. – Na verdade, os rendimentos abaixo dos mil euros mensais têm aumentado, e a um ritmo superior ao da inflação. O próprio salário mínimo nacional tem sido elevado de modo sustentado e progressivo, aliás com o intuito de estimular a economia.

    6. - É sabido que os rendimentos das profissões que dependem da força braçal, tais como picheleiros, pedreiros, e empregadas domésticas têm vindo a aumentar.

    7. – O Exmº Senhor Juiz a quo considerou um valor estático no tempo, o que prejudicou a autora.

    8. - Por outro lado, é de admitir que a vida activa da lesada se prolongue, pelo menos, até aos 72 anos de idade. As empregadas domésticas com esta idade, na maior parte dos casos, são excelentes profissionais, como é sabido.

    9. - Estas duas circunstâncias são fundamento bastante para a elevação da indemnização a conceder à autora por via da IPP de 15 % que a afecta.

    10. - Considerando os rendimentos anuais da A. à data do sinistro (Eur. 11 060, 00), a idade (54 anos), a expectativa de vida activa até aos 72 anos (18 anos), o grau de I.P.P. de 15 %, e a expectativa de aumento de rendimentos nos próximos anos, deverá ser indemnizada com o montante de Eur. 35 000, 00, já com o recurso a juízos de equidade.

    11. – Quanto ao dano moral, o montante de Eur. 18.000,00 não constitui uma compensação equitativa, face aos factos provados. De modo algum.

    12. - Note-se que a Autora foi brutalmente atropelada em cima de passadeira de peões, por veículo que circulava na cidade a 70 Km/h, foi projetada pelo ar numa distância não inferior a três metros, não chegando a perder a consciência, bateu com a cabeça e sofreu fratura do perónio direito, esperou pela chegada da ambulância cerca de quinze minutos, temeu pela perda da sua vida, sofreu fratura da coluna cervical, fratura da perna direita e clavícula direita, fratura do côndilo occipital esquerdo, fratura da apófise transversa de D1, escoriações na face e antebraço direito, ficou internada no CHVNG entre dois e três dias ficando de seguir tratamento ambulatório, entre pelo menos 05/08/2009 e 15/11/2009 estava com a sua autonomia diminuída, necessitando da ajuda de terceiros, sofreu reacção depressiva, teve de usar colar cervical cerca de um ano, ficou a padecer de dor no arco final dos movimentos no segmento cervical, dor quando sujeita a apalpação em tumefacção de consistência dura e a mobilização ativa e passiva ao nível da articulação acrómio-clavicular à direita, dores no arco final do movimento no membro superior direito e dores ligeiras na mobilidade ao nível da articulação coxofemoral nas duas pernas, o que confere à autora um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 15 pontos, com maior esforço para realizar a sua atividade profissional habitual sendo as dores quantificadas em cinco numa escala até sete; sente dores quando há mudanças de tempo sendo que tais dores causam-lhe angústia e amargura, e tornou-se uma pessoa mais triste e com revolta interna pelo que sucedeu; 14ª – Atento o exposto, pelo sofrimento físico, pelo afastamento da família, pelo choque no momento da pancada, pelas fracturas que sofreu, pelo profundo abalo psíquico e físico, pelas dores que continuará a sofrer, pelas sequelas permanentes que ostenta, e por tudo o mais que consta dos factos provados, acima transcritos, entendemos, sempre salvo o devido e maior respeito, que a verba de Eur. 30.000,00 se mostra mais adequada para ressarcir este conjunto de danos.

    13. - A indemnização por danos não patrimoniais tem que constituir uma efectiva possibilidade compensatória, tem que ser significativa (cfr. Acórdão do S.T.J. de 11/10/94, BMJ 440/449 e, das Relações, Acórdão da Relação de Lisboa de 13/2/97, Colectânea de Jurisprudência, Tomo. I, pág. 123).

    14. - A douta decisão recorrida violou, nomeadamente, o disposto nos artºs 342º nº 1, 483º, 487º nº 2, 505º, 563º, 564, 566º nº 2 570º e 572º do Código Civil, 615º nº 1, alínea d), 616º, 637º, 640º, 644º, 645º e 647º do Código de Processo Civil.

    Também a ré não se conformou com a sentença proferida nos autos e interpôs recurso, apresentando alegações, nas quais formula as seguintes conclusões: 1. O tribunal recorrido analisou erradamente a prova produzida relativa à factualidade questionada nos artigos 1º, 4º e 5º da base instrutória.

    1. O tribunal recorrido julgou provado todos estes factos em sede de sentença, conforme resulta, respectivamente, dos pontos 11.) e 15.) da factualidade dada como assente.

    2. Andou mal o tribunal recorrido na apreciação que fez da prova produzida em julgamento, entendendo a recorrente que o tribunal deveria ter dado como não provada a factualidade questionada nos quesitos 1º, 4º e 5º da base instrutória.

    3. Não foi feita prova em juízo de onde se pudesse concluir que, imediatamente após o embate a recorrida, enquanto esperava pela ambulância, tenha permanecido consciente, tenha sofrido dores, tenha temido pela vida, ou que se encontrava assustada.

    4. Da leitura da sentença, no que concerne à motivação do tribunal para formar a sua convicção e dar como assentes os factos questionados nos artigos 4º e 5º da base instrutória, resulta que o tribunal omite qualquer motivação na resposta dada a estes quesitos, ficando, por essa razão, a recorrente impossibilitada de perceber o porque da resposta dada aos quesitos 6. Resultou da audiência de discussão e julgamento que a recorrida, após o embate, ficou inconsciente, e que, após recuperar a consciência ficou sem saber onde se encontrava e o que se passava.

    5. Isso decorreu, desde logo, do depoimento da testemunha D… – depoimento prestado no dia 10 de dezembro de 2014, com início às 09:52:43 horas e fim às 10:01:29 horas, gravado nos ficheiros com os números 20141210095242_5566009_2871607 e 2014120095906_5566009_2871607 -, a qual, no trecho do seu depoimento, gravado no ficheiro com o número 20141210095242_5566009_2871607, com início ao minuto 00:32 e fim ao minuto 01:39 afirmou ter...

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