Acórdão nº 335/14.5T8OVR-C.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelM
Data da Resolução15 de Setembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação n.º 335/14.5T8OVR-C.P1 Acordam no Tribunal da Relação do Porto 1. Relatório B… instaurou execução, em 2014.10.29, contra C…, apresentando como título executivo uma declaração de confissão de dívida, datada de 2010.09.25, onde a executada reconhece ser devedora da quantia de € 75.000,00.

Antes de ordenar a citação, o Mm.º Juiz a quo proferiu despacho, a fls. 11-18, assim concluindo: Para além dos fundamentos jurídicos invocados nos arestos citados dos tribunais de Relação, também pelos motivos agora expostos considero materialmente inconstitucional a medida que eliminou os documentos particulares do elenco dos títulos executivos, pelo que recuso a aplicação do artigo 703.º do Novo Código de Processo Civil conjugado artigo 6.º, n.º 3, da Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, quando interpretados no sentido de que aquele primeiro normativo se aplica a documentos particulares constituídos em data anterior a da vigência do novo código, mas que eram exequíveis no momento da sua subscrição pelo devedor, face ao disposto artigo 46.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil de 1961, e que não haviam sido dados à execução no momento em que aquela lei entrou em vigor, por violar o princípio da tutela jurisdicional efectiva e o princípio da proibição da indefesa enquanto aceção do direito de acesso ao direito e aos tribunais, consagrados no artigo 20.º, n.ºs 1 e 5, respectivamente, da Constituição da República Portuguesa, bem como o princípio do contraditório consagrado no artigo 32.º, n.º 5, da mesma lei fundamental, extensivo, por identidade de razão a todas as formas de processo (cfr. Acórdão n.º 104/2006, do Tribunal Constitucional, datado de 07.02.2006, publicado no DR-II Serie, n.º 54, de 16·03.2006 (págs. 3857 a 3862).

Aquela interpretação já foi objecto de declaração de inconstitucionalidade no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 847/2014, de 3 de dezembro, proferido no âmbito do processo de fiscalização sucessiva concreta n.º 537/14 (1.ª secção, Relator: Conselheira Maria de Fátima Mata-Mouros).

O título dado à execução (declaração de confissão de dívida) foi emitido na vigência do Código de Processo Civil de 1961, e gozava de força executiva ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do artigo 46.º desse Código.

Em resultado do juízo de inconstitucionalidade por nós expresso, é de admitir a exequibilidade do documento em que se baseia a presente execução.

Inconformada, apelou a executada, assim concluindo: 1- A execução ora em causa tem como título executivo um documento particular de confissão de dívida; 2- Tal documento foi emitido em 25 de Setembro de 2010, na vigência do Código de Processo Civil de 1961, gozando, nessa data, de força executiva ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do artigo 46.º desse código; 3- Porém, o artigo 703º do Novo Código de Processo Civil deixou de reconhecer natureza de título executivo aos documentos particulares, assinados pelo devedor, que importem constituição ou reconhecimento de obrigações; 4- Os acórdãos de 19/06/2014, proc. n.º 138/14.7TCFUN.L1-6; de 24/09/2014, processo n.º 3275/14.4YYLSB.L1-2 do Tribunal da Relação de Lisboa e o acórdão de 07/10/2014, processo n.º 61/14.5TBSBG.C1 do Tribunal da Relação de Coimbra são claros ao considerar que a aplicação do art. 703º do Novo CPC a todas as execuções interpostas posteriormente a 1 de Setembro de 2013, recusando a exequibilidade aos documentos particulares ainda que constituídos validamente em data anterior, não implica uma aplicação retroactiva da lei nova, nem é de considerar inconstitucional por violação do princípio da segurança e da protecção da confiança.

5- Em consequência, as execuções instauradas posteriormente a 1 de Setembro de 2013, não poderão basear-se em documento particular constituído em data anterior e a que fosse atribuída exequibilidade pelo regime vigente à data da sua constituição.

6- As críticas à permissividade legal na formação de títulos executivos, em particular no que concerne aos títulos particulares, já vêm de longe, pelo que não se poderá dizer que os credores tinham razões para crer que o status quo a este respeito não sofreria alterações.

7- Sendo a força executiva de um documento um pressuposto processual da acção executiva, ou seja, um requisito de admissibilidade desse meio de recurso aos tribunais, em princípio deverá ser aferida pela lei processual vigente à data da instauração da acção executiva; 8- A mutação legislativa operada não beliscou a força probatória dos documentos em questão, os quais continuarão, assim, a proporcionar aos credores a mesma credibilidade, perante a ordem jurídica, de que dispunham anteriormente, tão só com o acréscimo da exigência de que, em caso de incumprimento da obrigação titulada, o credor obtenha o reconhecimento do seu crédito em sede de acção declarativa ou de procedimento de injunção.

9- À luz do regime anterior o credor poderia ser igualmente confrontado, na acção executiva, com a necessidade de fazer valer a sua posição no âmbito de acção declarativa aí desencadeada pelo executado.

10- Mesmo que se entendesse, como o Tribunal “a quo” defende, que o procedimento de injunção não é uma alternativa adequada à eliminação da exequibilidade dos documentos particulares negociais, tal não implicava que se tivesse de reconhecer exequibilidade aos documentos particulares anteriores ao novo CPC, mas dados à execução posteriormente a 1 de Setembro de 2013, uma vez que o credor mantinha a possibilidade de recorrer à acção declarativa.

11- As razões subjacentes à aplicação do novo regime aos documentos anteriormente constituídos são constitucionalmente relevantes, pois visa-se, conforme decorre da Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 113/XII, potenciar o rápido descongestionamento do sistema de justiça ao nível das execuções (nos termos do art.º 20.º n.º 4 da CRP, todos têm direito a que a sua causa seja objecto de decisão em prazo razoável) e impulsionar a imediata aplicação de um regime que se considera obviar ao risco de execuções injustas e melhor acautelar o exercício do contraditório (nos termos do n.º 4 do art.º 20.º da CRP, todos têm direito a que a sua causa seja objecto de decisão mediante processo equitativo).

12- O art.º 703.º do NCPC é uma típica norma processual, que não interfere com a validade e força probatória do documento particular em causa, nem com o seu conteúdo ou substância dos direitos subjectivos por ele conferidos, matéria que é regulada pelo direito substantivo, mas apenas com o modo de realização ou tutela desses...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT