Acórdão nº 689/14.3TTVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 21 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução21 de Setembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

ACÓRDÃO PROCESSO Nº 689/14.3TTVNG.P1 RG 486 RELATOR: ANTÓNIO JOSÉ ASCENSÃO RAMOS 1º ADJUNTO: DES. JORGE LOUREIRO 2º ADJUNTO: DES. JERÓNIMO FREITAS PARTES: RECORRENTE: B… RECORRIDA: C… VALOR DA ACÇÃO: 20 637,86 €◊◊◊I – RELATÓRIO 1. B…, residente na …, .., …, Vila Nova de Gaia, intentou, ao abrigo do artigo 98º-C, do Código de Processo do Trabalho, em conjugação com o artigo 387º do Código do Trabalho, a presente acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, contra B…, com sede na …, .., Lisboa, opondo-se ao seu despedimento.

◊◊◊2.

Foi realizada a audiência de partes, tendo-se frustrado a tentativa de conciliação.

◊◊◊3. A Ré[1] apresentou o articulado a que alude o artigo 98-J do CPT, alegando que o despedimento da Autora é lícito, uma vez que foi despedida com justa causa, sustentando que a Autora, sem qualquer justificação ou comunicação antecipada, faltou ao serviço no dia 02.01.2014, contra as ordens e instruções da Ré que lhe havia indeferido o pedido de concessão de gozo de férias nessa data. Mais refere que apenas pelas 19 h desse dia informou a chefia que não comparecia ao serviço nem nos seis dias úteis seguintes, invocando que tal ausência se deveria à necessidade de realização de avaliações escolares.

A conduta da arguida resultou na prática grave de infração disciplinar, uma vez que se traduziu na violação da alínea

  1. Observar e fazer observar as instruções e orientações hierárquicas em tudo o que respeita ao planeamento, organização, execução e disciplina do trabalho, salvo na medida em que as ordens e instruções sejam contrárias aos seus direitos; b) Respeitar com civismo, urbanidade e correção no trato todos aqueles com quem profissionalmente tenha que contactar, nomeadamente colegas de trabalho, responsáveis da entidade empregadora, clientes e público em geral; d) informar os serviços competentes da entidade empregadora sobre qualquer especto relevante para a prestação da atividade laboral nomeadamente aqueles relacionados com a frequência de cursos; j) comparecer ao serviço com assiduidade e cumprir o horário de trabalho procedendo ao registo de tempos de trabalho nos termos que a entidade empregadora determinar e p) guardar lealdade à entidade empregador (…) todos da cláusula 7.ª do ACT e, concomitantemente, do disposto nas als. a), b), e) e f) do n.º 1 do art. 128.º do Código do Trabalho.

    O comportamento da trabalhadora abalou de forma irreparável e definitiva o princípio da confiança recíproca que sustenta e norteia toda a relação jurídico-laboral, razão pela qual o despedimento com justa causa da Autora se afigure como a única sanção proporcionada à gravidade dos factos.

    ◊◊◊4.

    A Autora respondeu ao articulado da Ré, nos termos do artigo 98º-L, nº 3 do CPT, invocando a caducidade do direito de aplicar sanção disciplinar e impugnando a factualidade que lhe é imputada na nota de culpa, alegando que em dezembro de 2013, a Ré resolveu alterar unilateralmente o horário da A. sem contato prévio da mesma.

    Admite que o pedido de antecipação de férias da A. não lhe foi concedido mas que, nessa data, a trabalhadora não se encontrava ao serviço, pois estava em período de exames. Alega ainda que quando marcou as suas férias em março, referiu, nessa altura, à superiora hierárquica a necessidade do dia 2.01. para se deslocar à suíça a visita a familiares, tendo tido o consentimento daquela para o efeito e assim adquirindo a respetiva viagem, não tendo marcado no portal porquanto o programa informático não o permitia, apenas oficializando o respetivo pedido por mail em 11.12.2013. Mais refere que as faltas para os exames eram comunicadas verbalmente e que a respetiva escala de serviço já estava feita a contar com a sua falta.

    Deduziu ainda reconvenção declarando pretender ser reintegrada, pedindo a condenação da Ré no pagamento das retribuições que deixou de auferir desde o seu despedimento até ao trânsito em julgado da decisão; da quantia de € 556,20 correspondente ao serviço D… que a trabalhadora tinha direito e que deixou de poder usufruir, acrescido do valor mensal de € 92,70 até ao trânsito em julgado da sentença; a quantia de € 900,00 corresponde ao valor do apoio escolar para os filhos menores que a A. deixou de auferir desde a data do despedimento até hoje, acrescido do montante de € 150 por mês até ao trânsito em julgado; a quantia de € 60 relativa a prendas de natal para os dois filhos que a requerente não recebeu; a quantia de € 1585 correspondente ao valor das colónias de férias de verão e natal que a A. teve que cancelar por força do despedimento; o valor de € 2700 correspondente ao prejuízo económico de junho a dezembro de 2014 derivado da perda do plano de saúde que beneficiava e ainda de igual montante de € 450 até ao trânsito em julgado da decisão.

    Pede ainda a condenação da Ré na quantia de € 5000 por danos morais sofridos por força do despedimento e a quantia de € 360,26 correspondente aos valores que a Ré ilicitamente descontou no salário do mês de dezembro e janeiro.

    ◊◊◊5.

    Respondeu a Ré pugnando pela improcedência do pedido reconvencional.

    ◊◊◊6.

    Foi proferido despacho saneador, julgando-se improcedente a exceção de caducidade invocada.

    ◊◊◊7.

    Foi realizada a audiência de julgamento.

    ◊◊◊8.

    Foi proferida sentença, cuja parte decisória tem o seguinte conteúdo: Pelo exposto: “I. decide-se julgar totalmente procedente a presente acção que o A./Trabalhadora C… intentou contra a R./Empregadora B… e parcialmente procedente a reconvenção e, em consequência: a) julgar ilícito o despedimento promovido pela Ré; b) condenar a Ré a reintegrar a A. no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade; c) condenar a Ré a pagar à A. as retribuições que a mesma deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão (à razão mensal de € 498,76), deduzido, no entanto e por força da lei, o subsídio de desemprego de que, porventura, haja beneficiado durante aquele período e que a Ré deve entregar à Segurança Social.

    d) Condenar a Ré a pagar à A. a quantia de € 360,26 a título de créditos salariais absolvendo no mais peticionado.

    Custas pela A e da Ré em partes iguais sem prejuízo do apoio judiciário concedido à A.

    Fixa-se à causa o valor de € 20.637,86 – art.98º-P do CPT.

    Registe e notifique.”◊◊◊9.

    Inconformada com a decisão dela recorre a Ré, assim concluindo: A.

    A ora Recorrente discorda com o teor da douta sentença recorrida quanto à interpretação e enquadramento jurídico efetuado pela Douta Juiz do Tribunal de 1ª Instância; B.

    Certo é que, da factualidade assente, ficou devidamente demonstrado que a Autora, após ter visto expressamente recusado pela sua entidade patronal o gozo de férias no dia 02/01, de forma consciente e premeditada, realizando o seu desígnio de não comparecer ao trabalho no dia em causa, faltou, tendo posteriormente apresentado justificação falsa para tal ausência; C.

    Com o seu comportamento a Autora visou desafiar e desrespeitar uma ordem legítima da sua entidade patronal, colocando em causa os deveres de obediência às orientações legítimas da sua entidade patronal e de lealdade para com esta, a que se encontra adstrita; D.

    A Autora, agindo da forma descrita, e mentindo de forma absolutamente consciente, apresentando motivo falso para a sua ausência, colocou em causa de forma irremediável o dever de lealdade para com a sua entidade patronal; E.

    Como resulta do entendimento da própria Exma. Juiz a Quo, a conduta da Autora constitui violação dolosa, e de grave intensidade, do seu dever de lealdade para com a sua entidade patronal; F.

    A conduta da Autora encerra elevada e reiterada intencionalidade dolosa, que afetou, necessariamente, a boa-fé e a confiança que sustenta a relação de trabalho; G.

    Na verdade, não é exigível à Ré, nem a qualquer outra entidade patronal que mantenha ao seu serviço um trabalhador que deliberada e propositadamente se ausenta do serviço para gozar período de férias que lhe havia sido expressamente recusado, e que para justificar tal atuação apresenta falsas declarações à sua entidade patronal; H.

    E nem se contraponha com a circunstância de que o prejuízo patrimonial causado à Ré não se revelar de monta; I.

    Dado que, como é comummente aceite, o dever de lealdade constitui valor absoluto, sendo por isso, insuscetível de gradação; J.

    Conclui-se assim, atenta a específica natureza do vínculo laboral, caracterizado pela sua vocação duradoura e pessoal das relações deles emergentes, que o comportamento da Autora se configura como suscetível de destruir ou abalar seriamente a confiança, tendo criado no espírito da Ré dúvidas e reservas sobre a idoneidade futura da sua conduta, na medida em que quebra a "fides" ou a base de confiança do contrato, valor absoluto e não quantificável do mesmo, preenchendo, por isso, os pressupostos para a resolução do contrato com justa causa, descritos no artigo 351º do Código do Trabalho; K.

    Sendo inegável que a sanção aplicada – despedimento - é adequada e justa, à gravidade e consequências da conduta praticada, razão pela qual é lícita e inexpugnável a rescisão com justa causa do contrato de trabalho da Autora; L.

    Forçoso se torna, por isso, concluir, de tudo quanto ficou exposto, que a Sentença em crise fez incorreta e desconforme, interpretação e aplicação do Art.º 351º do Código do Trabalho, impondo-se deste modo que seja revogada e substituída por outra, que dando provimento ao presente recurso, julgue a ação improcedente, por ser manifesta a existência de justa causa de despedimento e absolva a Ré de todos os pedidos.

    ◊◊◊10.

    A Autora contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso, assim concluindo:

    1. A douta sentença, ora recorrida, julgou totalmente procedente a ação intentada pela trabalhadora e julgou ilícito o despedimento promovido pela entidade patronal, condenando-a a reintegrar a Autora no seu posto de trabalho.

    2. Não se conformou a entidade patronal com tal decisão e interpôs o presente recurso, discordando da...

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