Acórdão nº 822/17.3T8VFR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 27 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelCARLOS QUERIDO
Data da Resolução27 de Novembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 822/17.3T8VFR.P1 Sumário do acórdão: I. O artigo 1437.º do Código Civil não se reporta à legitimidade processual, no sentido da legitimidade ad causam, mas apenas à legitimatio ad processum, daí decorrendo que a representação do condomínio em juízo (parte na ação por força da extensão da personalidade judiciária prevista no art.º 12/e) do CPC) incumbe ao respetivo administrador.

  1. Numa ação intentada por condóminos, em que é pedida a condenação na realização de obras de restauro e impermeabilização do terraço dum prédio urbano em regime de propriedade horizontal, e no pagamento de uma quantia indemnizatória, deverá ser demandado o condomínio, a citar na pessoa do seu administrador.

    Acordam no Tribunal da Relação do Porto I. Relatório Em 9.03.2017 B... e C... intentaram no Juízo Local Cível de Santa Maria da Feira (Juiz 2), do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro ação declarativa de condenação contra D..., Lda., formulando os seguintes pedidos: «Ser a Ré condenada a realizar as indispensáveis obras de restauro e impermeabilização do terraço que faz parte integrante do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito na Av. ..., n.º ...., Freguesia ..., Concelho de Santa Maria da Feira; descrito na Conservatória do Registo Predial de Santa Maria da Feira sob o n.º 82/19851211.

    De igual modo, Deverá Ser a Ré condenada a pagar à Autora a quantia de € 1.080,00, (a que acresce IVA à taxa legal em vigor), correspondente ao custo das obras de restauro a efectuar no imóvel – fracção “D”, a que acresce o valor respeitante aos lucros cessantes, a ser fixado equitativamente pelo Tribunal, em sede de Sentença».

    Como fundamento da sua pretensão, alegam, em síntese os autores, que na sua fração ocorrem humidades e infiltrações com origem numa parte comum do condomínio.

    Citada, a ré, em síntese, veio invocar a sua ilegitimidade passiva por ter sido demandada a título pessoal quando a ação deveria ter intentada contra o condomínio.

    Os autores responderam invocando o disposto no art.º 1437.º, n.º 2, do CC, e reafirmando que a ré é parte legítima.

    Em 5.06.2017 foi proferida sentença com o seguinte teor: «Cumpre apreciar e decidir.

    Independentemente do que é mencionado na petição inicial, na sentença o tribunal não vai alterar as partes que constam no processo nem o respectivo pedido. E a petição inicial é inequívoca: a acção foi intentada contra uma sociedade comercial (sem nenhuma ressalva) e caso os pedidos procedam, forma-se título executivo contra aquela, respondendo o património daquela sociedade perante os autores (pois não foi feita nenhuma ressalva).

    Ora, isto não é admissível, pois confunde patrimónios autónomos. É certo que, como alegam os autores, o art. 1437.º, n.º 2, do CC, estabelece que o administrador pode também ser demandado nas acções respeitantes às partes comuns do edifício (excepção prevista no n.º 3 e que aqui não é aplicável: exceptuam-se as acções relativas a questões de propriedade ou posse dos bens comuns, salvo se a assembleia atribuir para o efeito poderes especiais ao administrador).

    No entanto, apesar da jurisprudência citada pelos autores, e salvo o devido respeito, esta norma tem de ser devidamente interpretada, desde logo com o art. 12.º, e), do CPC: tem ainda personalidade judiciária o condomínio resultante da propriedade horizontal, relativamente às acções que se inserem no âmbito dos poderes do administrador.

    Deste modo, estas duas normas, devidamente conjugadas, dispensam os autores de intentarem acções contra todos os condóminos, podendo demandar o condomínio (o qual não possui personalidade jurídica) quando as acções respeitem aos poderes do administrador, isto é, quando respeitem às acções previstas no art. 1437.º, n.º 2, do CC, pelo que, nesta situação, os autores demandam directamente o condomínio na pessoa do seu representante legal: o administrador do condomínio, sendo que nessa situação, não será o património do administrador que responde pelo não cumprimento de uma eventual sentença condenatória, mas sim o património do condomínio.

    Como se argumenta no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, processo n.º 586/11.4TBACB-A.C1, de 27-01-2015 (Sumário: Numa ação em que um condómino pretende a reparação dos defeitos das paredes comuns dum prédio em propriedade horizontal, bem como ser ressarcido dos prejuízos sofridos na sua fração e causados pela existência desses defeitos, parte legítima é o Condomínio desse prédio. O Administrador desse Condomínio, na sua própria pessoa, é parte ilegítima e intervirá na ação apenas enquanto representante legal do Condomínio), são os condóminos, no seu conjunto e na proporção das respetivas quotas, os titulares dos direitos ou das obrigações, dos créditos ou dos débitos emergentes de responsabilidade civil quanto às partes comuns do prédio. […] Por fim, cite-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo n.º 07B1875, de 04-10-2007: o art. 1437º não resolve, pois, o problema da legitimidade do administrador, que, aliás, não se coloca, porque este age, em juízo, enquanto órgão do condomínio e, portanto, em representação deste. […].

    Como se disse, a acção foi intentada contra uma sociedade comercial (sem nenhuma ressalva), pelo que a condenação teria de proceder contra aquela sociedade comercial, quando, a nosso ver, a acção deveria ter sido intentada contra o condomínio, devidamente representado pelo seu administrador. Como se viu, os autores consideram que acção foi devidamente instaurada. Além disso, a nosso ver, não estamos perante um caso de aperfeiçoamento da petição inicial já que somente o condomínio tem legitimidade para ser parte neste processo e não a administradora a título pessoal. Senão vejamos: O art. 260.º, do NCPC, consagra o princípio da estabilidade da instância. Segundo este normativo, depois de citado o réu, a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei.

    As modificações subjectivas da instância são permitidas em virtude dos incidentes de intervenção de terceiros – art. 262.º, b), do NCPC.

    A intervenção principal pode ser espontânea e provocada. Quanto à intervenção provocada vigora o art. 316.º, do NCPC, que estabelece que qualquer das partes pode chamar a juízo o interessado com direito a intervir na causa, seja como seu associado, seja como associado da parte contrária. Quem faz o chamamento fica incumbido de alegar a causa do chamamento e justificar o interesse que, através dele, pretende acautelar.

    Como se sabe, qualquer das partes pode provocar tanto a intervenção principal activa, como a passiva, ou seja, quer a das pessoas que, nos termos do art. 311.º, do NCPC, podiam intervir espontaneamente ao lado do autor, quer a daquelas que, ao abrigo do mesmo preceito, se podiam colocar ao lado do réu. Pode provocar tanto a intervenção principal dessas pessoas em litisconsórcio com o autor ou com o réu, como a intervenção delas em coligação com o autor.

    Assim, a intervenção provocada não se distingue, do ponto de vista substancial, da intervenção espontânea pois ambas têm por objecto permitir, em demanda pendente, o litisconsórcio ou a coligação de um terceiro com alguma das partes da mesma demanda.

    Há, pois, intervenção principal em litisconsórcio e intervenção principal em coligação.

    Quanto ao litisconsórcio, devemos estar perante dois ou mais sujeitos activos ou passivos da mesma relação jurídica controvertida desde que o pedido seja o mesmo relativamente a todos eles. No litisconsórcio há pluralidade de partes mas unicidade da relação material controvertida.

    Já na coligação, à pluralidade das partes corresponde a pluralidade das relações materiais litigadas, sendo a cumulação permitida em virtude da unicidade da fonte dessas relações, da dependência entre os pedidos ou da conexão substancial entre os fundamentos destes (nas palavras de CASTRO MENDES, Direito Processual Civil, II, 1987, AAFDL, p. 174, há litisconsórcio quando há pluralidade de partes e unidade quanto a certo ponto; há coligação quando há pluralidade de partes e pluralidade...

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