Acórdão nº 2506/17.3T8VFR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelESTELITA DE MENDON
Data da Resolução14 de Novembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 2506/17.3T8VFR.P1*Recorrentes: B… e marido C… Recorridos: D… E… F… G… H… S.A. e outros* Acordam na 2ª secção do Tribunal da Relação do Porto: *Com data de 23/08/2017 foi proferida a seguinte decisão (itálico de nossa autoria para melhor compreensão):“Competência em razão da matéria1.

Nos presentes autos de procedimento cautelar comum instaurado por B… e marido C… contra D…, E…, F…, G…, H…, S.A, I… – SGPS, SA e J…, Lda., são formulados os seguintes pedidos: 1) Que os Requeridos G…, E…, F… e D… se abstenham de deliberar, realizar ou registar qualquer aumento de capital social nas sociedades H…, SA, I…, SGPS, SA e J… Ldª que distorça, desvalorize ou por qualquer meio, forma ou processo tenha subjacente e revele a forma intencional de provocar a redução do valor patrimonial dos bens e participações sociais doados por H… e K… para obterem proveito pessoal contrário à ordem pública e aos bons costumes, através do reforço de participação social nestas sociedades de cada um dos Requeridos até decisão final da sentença que venha a ser proferida na acção por simulação que a Requerente vai instaurar contra todos os Requeridos; 2) Sob pena de cometerem o crime de desobediência, previsto no artigo 348º do Código Penal, em caso de desrespeito à decisão proferida na providência cautelar.

3) Que as Requeridas H…, SA e I…, SGPS, SA e J…, Ldª, G…, E…, F… e D… se abstenham de através dos seus respectivos representantes legais, administradores ou gerentes, accionistas ou sócios, de decidir, deliberar, realizar, executar ou registar qualquer aumento de capital social quer na sua própria sociedade Requerida, quer nas sociedades em que sejam ou possam vir a ser accionistas ou sócias e sejam agora Requeridas nesta providência cautelar, que tenham subjacentes os factos e o direito invocados pela Requerente e que distorçam, desvalorizam ou por qualquer meio, forma ou processo tenham subjacente e revelem a forma intencional dos Requeridos G…, E…, D… e F… de provocar a redução do valor patrimonial dos bens e participações sociais doados a estes por H… e K… para obterem proveito pessoal contrário à ordem pública e aos bons costumes, através do reforço de participação social nestas sociedades de cada um dos Requeridos até decisão final da sentença que venha a ser proferida na acção por simulação que a Requerente vai instaurar contra todos os Requeridos; 4) O não registo na conservatória do registo comercial de qualquer aumento de capital nas sociedades H…, SA, I…, SGPS, SA e J…, Ldª, deliberado e realizado nas formas e circunstâncias referidas na alínea anterior, até decisão final que venha a ser proferida na acção principal; 5) A suspensão de eficácia de todo e qualquer efeito jurídico de qualquer aumento de capital social que as sociedades H…, SA, I…, SGPS, SA e J… Ldª, pretendam registar ou seja registado na conservatória do registo comercial, deliberado e realizado nas formas e circunstâncias referidas no 1.º pedido até decisão final que venha a ser proferida na acção principal.

  1. No seu requerimento inicial os Requerentes enunciam (pontos 152 ss.) que o presente procedimento cautelar é dependência de uma acção declarativa que irão instaurar contra os Requeridos e seus pais, com vista à declaração de nulidade dos actos e negócios jurídicos praticados pelos aqui Requeridos tendentes a deliberarem aumentos de capital social nas sociedades Requeridas, por elas não necessitarem de tais aumentos de capital e porque os aumentos de capital que os Requeridos se propõem fazer têm o único objectivo de desvalorizarem, em termos relativos, as participações sociais que lhes foram doadas pelos seus pais, como meio ou forma de, aquando da abertura das heranças por óbito dos seus pais, tais participações terem um valor simbólico ou residual. Referem ainda que a acção a instaurar terá como fundamento a existência de simulação pelos Requeridos donatários na deliberação e realização dos aumentos de capital social destas 3 sociedades, sustentando que as deliberações sociais para aumento de capital social nas sociedades H…, Sa, I…, SAGPSD, SA e J…, Ldª, as quais não precisam, para o exercício das suas actividades de qualquer aumento de capital social, nada mais são do que razões ou condições falsas, não queridas pelos Requeridos e que estes criaram com o intuito de prejudicar a Requerente.

  2. Devidamente citados, os Requeridos (com excepção do Requerido D…) arguiram várias excepções, entre as quais a de excepção de incompetência do Tribunal em razão da matéria, invocando em síntese serem competentes para os termos da causa principal e, consequentemente, do procedimento cautelar, os juízos de comércio já que o litigio em apreço, resulta de uma deliberação social a ocorrer, e enquadra-se pois assim em mais que uma alínea do preceito em referencia, nomeadamente nas alíneas b), c), d) e h, do art.º 128.º, n.º 1, da Lei de Organização do Sistema Judiciário, sendo as questões suscitadas de natureza meramente comercial, “na medida em que emerge única e exclusivamente de uma deliberação social a ocorrer, e funda-se pois assim num aumento de capital social igualmente a ser ainda aprovado, e pois assim à data ainda não sucedeu”, ou seja, o procedimento cautelar tem a ver fundamentalmente e por simples leitura, com a pretensão dos AA. de impedir que nas três assembleias gerais marcadas das referidas sociedades requeridas, respectivamente H…, S.A, I…, SGPS, S.A e J…, Lda. deliberem e no interesse e sentido das mesmas, um necessário aumento de capital, e que nos termos objectivos dos pactos sociais e respectiva legislação comercial do CSC, é direito intrínseco e exclusivo das mesmas sociedades.

  3. Devidamente notificados da Oposição, os Requerentes responderam, entre outras, à excepção deduzida, enunciando que “ou os Requeridos não leram o requerimento da providência ou não quiseram interpretá-lo, pois a causa e razão de ser da própria providência cautelar, tem subjacente a fraude legal que os Requeridos pessoas em conjugação de esforços dos pais dos Requeridos pessoas estão a praticar e baseia-se na existência de contratos simulados entre os Requeridos pessoas e os seus pais, sendo as empresas meros instrumentos activos da fraude legal que os Requeridos estão a fazer e a tentar continuar a fazer através dos aumentos de capital simulados”.

  4. Cumpre apreciar e decidir.

    5.1.

    Nos termos do disposto no art.º 364.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, o procedimento cautelar é dependência de uma causa que tenha por fundamento o direito acautelado e pode ser instaurado como preliminar ou como incidente da acção declarativa ou executiva. Conforme decidiu o Supremo Tribunal de Justiça (Ac. 01-03-2007, proc. 07A4669, Cons. Sebastião Póvoas), “(…) III-A competência material para a acção é que determina a do processo cautelar. IV- Sendo a medida preventiva requerida como preliminar da acção, a competência em razão da matéria deve aferir-se pela ponderação do pedido, e causa de pedir, desta, nos termos afirmados pelo requerente da medida cautelar”. Diversamente do que sustentado por alguma jurisprudência (minoritária, cfr., por todos Ac. TRL, de 30-05-2013, proc. 1100/12.0TBSCR), afigura-se que a competência em razão da matéria não pode ser excluída da apreciação em sede de procedimento cautelar quando este seja prévio à instauração da acção. Conforme foi decidido no aresto do STJ supra citado, se assim não fosse “(…) seriam, então, materialmente competentes tribunais diferentes para a lide principal e para a lide instrumental. Mas não pode ser. Por um lado, quer para a competência territorial (cf. Cons. Salvador da Costa, in “A injunção e as conexas acções e execuções”, 5ª ed, 2005, 47) quer para a competência material (cf. Des. Abrantes Geraldes, in “Temas da Reforma do Processo Civil”, III, 3ª ed; “Procedimento Cautelar Comum”, 221 – nota – e 213) o tribunal é competente para decidir as medidas cautelares dela dependentes. (cf. v.g. Acórdão do STJ de 4 de outubro de 2006 – 06S383). É o que resulta, claramente, da instrumentalidade geradora de similitude com os procedimentos incidentais e o disposto no [nº1 do artigo 96º do CPC – actual art.º 86.º]. Ademais, deve o processo cautelar ser apensado à acção principal logo que esta seja instaurada, sendo que, nos casos de instrumentalidade actual, deve ser instaurado no tribunal onde corre a acção. Daí que o tribunal competente para o procedimento cautelar comum seja o da acção de que é instrumental e, quando requerido antes de instaurada essa lide, a competência material deve determinar-se face ao pedido, e causa de pedir, da acção, que devem ser alegados no requerimento da medida preventiva” (sic).

    Nesta conformidade, importa apreciar desde já a excepção deduzida, relativamente à qual os Requerentes exerceram o seu direito ao contraditório.

    *5.2.

    A competência material do tribunal, que corresponde a um pressuposto processual da acção, afere-se pela pretensão jurídica deduzida e respectiva fundamentação, ou seja, o pedido formulado e a sua causa de pedir, in casu, no procedimento cautelar, tendo por referência a acção principal da qual aquele está dependente. Com efeito, para a determinação da competência em geral - e, por conseguinte, também em razão da matéria - «deve olhar-se para os termos em que foi posta a acção - seja quanto aos seus elementos objectivos (natureza da providência solicitada ou do direito para o qual se pretende a tutela judiciária, facto ou ato donde teria resultado esse direito, bens pleiteados, etc.) seja quanto aos seus elementos subjectivos (identidade das partes)» (Ac. STJ, 26-06-2012, Cons. Fonseca Ramos), considerando-se a natureza da relação jurídica material em causa, segundo a versão apresentada em juízo pelos...

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