Acórdão nº 474/15.5T8ESP.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Novembro de 2017
Magistrado Responsável | ANA LUCINDA CABRAL |
Data da Resolução | 14 de Novembro de 2017 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Proc. nº 474/15.5T8ESP.P1 Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro Juízo de Competência Genérica de Espinho - Juiz 1 Acordam no Tribunal da Relação do Porto I. Relatório B… SA intentou a presente acção declarativa, que segue a forma de processo comum, contra C… pedindo a condenação da ré no pagamento da quantia de €30.451,36 (trinta mil, quatrocentos e cinquenta e um euros e trinta e seis cêntimos), acrescida de juros vincendos calculados sobre o capital em divida, à taxa contratual de 29,280 %, a contar desde a data de entrada da presente acção até integral pagamento e, ainda, no pagamento de custas e demais encargos legais.
Para tanto, em síntese, alegou que, é uma instituição financeira de crédito que se dedica ao financiamento de crédito ao consumo e à gestão e emissão de cartões de pagamento.
Que no exercício da sua actividade, a Autora celebrou com a ré, em 18.02.1992, um contrato de atribuição de cartão de crédito através do qual esta passou a ser titular de um cartão de crédito com o número ………………, através do qual foi concedido à ré a possibilidade de esta adquirir bens e/ou serviços pelo montante acordado entre esta e o vendedor, bem como efectuar operações de levantamento em numerário na rede de ATMs e aos balcões de bancos aderentes ao sistema Visa, o que a ré fez.
Por outro lado, sobre a autora impende a obrigação de proceder ao pagamento dos bens e/ou serviços adquiridos pela ré a terceiros, os quais são posteriormente debitados na conta cartão associada e relacionados no extrato de conta mensal remetido à Ré para pagamento.
Para além da utilização do referido cartão de crédito, em 20.08.2012 a ora ré subscreveu e remeteu à autora um pedido de utilização de crédito pessoal, no qual aquele solicitou a atribuição de um crédito pessoal no valor total de €16.000,00 (dezasseis mil euros), quantia essa que foi creditada na conta da ré e que deveria ser liquidado em 84 prestações mensais, as quais seriam debitadas na conta cartão da ré e relacionadas nos extratos de conta que lhe iam sendo remetidos para pagamento.
Sucede, porém, que a ré não liquidou à autora o saldo em dívida resultante da utilização do cartão n.º ……………., nem tão-pouco a totalidade das prestações emergentes do crédito pessoal que lhe foi atribuído, o que deixou de fazer em 22.01.2013.
Razão pela qual, o montante de capital em dívida ascende, à data da propositura da ação, ao valor de €16.441,33 (dezasseis mil, quatrocentos e quarenta e um euros e tinta e três cêntimos), a que acrescem, ainda, os competentes juros de mora contratuais, calculados à taxa anual de 29,280% desde 22.01.2013 – data a partir da qual o montante liquidado pela ré deixou de ser suficiente para liquidar o montante em dívida -, e que ascendem, a €14.010,03 (catorze mil e dez euros e três cêntimos) e ainda, a quantia de €184,50 (cento e oitenta e quatro euros e cinquenta cêntimos), referente a encargos de cobrança contenciosa, montante esse que se encontra previsto no artigo 28.º das condições gerais de utilização.
Devidamente citada, a ré apresentou contestação, na qual, apesar de aceitar a celebração dos dois contratos a que a autora faz alusão na petição inicial, e o seu incumprimento contratual, invoca que os referidos contratos são contratos de adesão, em que as cláusulas não são negociáveis por quem pede o crédito, sendo que quando celebrou tal contrato não se apercebeu que teria de pagar uma taxa de juro de 29.280%. Mais acresce que tal taxa de juro é abusiva por claramente exceder os milites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes e pelo seu fim social ou económico, motivo pelo qual deve ser considerada nula.
De igual modo, a partir da entrada da ação em juízo a taxa de juro aplicável deve ser a legal e já não a contratada.
A autora pugnou pelo indeferimento das exceções invocadas pela ré.
Foi dispensada audiência prévia, tendo sido fixado o objeto do litígio e enunciados os temas de prova que não sofreram qualquer reclamação.
Após instrução procedeu-se a audiência final com observância do formalismo legal.
Foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:” Pelo exposto, perscrutados todos os argumentos de direito e de facto supra referidos, julga-se a presente ação procedente, por provada, e em consequência, condena-se a ré C… a pagar à autora B… SA a quantia de €30.451,36 (trinta mil, quatrocentos e cinquenta e um euros e trinta e seis cêntimos), acrescida de juros vencidos e vincendos calculados sobre o capital em divida de €16.441,33, à taxa contratual de 29,280 %, a contar desde a data de entrada da presente ação até integral pagamento.” C… interpôs recurso, concluindo: 1º Em 20.08.2012 a Ré aqui Recorrente C…, subscreveu e remeteu à Autora um pedido de utilização de crédito pessoal, no qual aquele solicitou a atribuição de um crédito pessoal no valor total de €16.000,00 (dezasseis mil euros), o qual tinha como adjacente um contrato.
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A referida quantia de €16.000,00 (dezasseis mil euros) foi creditada na conta da ora Recorrente.
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Nos termos da atribuição do crédito pessoal supra mencionado, e conforme acordado com a Ré, tal valor de €16.000,00 (dezasseis mil euros) deveria ser liquidado em 84 prestações mensais.
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Ou seja as prestações terminavam em Setembro de 2019.
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Esse referido contrato adjacente, com as suas cláusulas, é um contrato de adesão.
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Ou seja, não é negociável por quem pede o crédito, e neste caso não o foi pela Ré aqui Recorrente.
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A Recorrida, com base no aludido contrato, peticiona juros à taxa de 29.280%, pelo incumprimento por parte da Ré aqui Recorrente.
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Sendo que a R., quando celebrou tal contrato não se apercebeu que teria que pagar tal taxa de juros.
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Tal taxa de juro é manifestamente excessiva.
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Há aqui claramente abuso de direito, o qual está previsto no artº 334º do Código Civil.
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Com efeito a taxa de juro de 29.280 % peticionada pela Ré, excede claramente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes e pelo seu fim social ou económico.
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Com efeito, a taxa de juro devida, em caso de incumprimento por parte dos RR, em vigor para os tribunais, é muito inferior à peticionada pela A.
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Ao cobrar tal taxa altíssima, ultrapassa o fim económico a que se destina, tendo a A aqui Recorrida, igualmente, se a taxa de juro fosse consentânea com a legalidade.
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Devendo como tal, tal cláusula do contrato que fixa a taxa de juro de mora em 29.280%, ser considerada nula 15º Tal taxa de juro é manifestamente excessiva, salvo o devido respeito.
Sem prescindir: 16º O contrato de mútuo celebrado entre A e R. aqui Recorrente e Recorrida, previa o pagamento da quantia mutuada em 84 prestações mensais e sucessivas.
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A última prestação seria devida em Setembro de 2019, no caso de haver sido cumprido o estabelecido contratualmente.
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Assim, quando muito, a taxa de juro contratualizada pelas partes somente seria de aplicar, em relação aos juros de mora vencidos, até ao último dia previsto do pagamento das prestações acordadas.
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E não como resulta da condenação da douta sentença, a aplicação de uma taxa de juro de 29,280% ao ano, até efectivo e integral pagamento, o qual poderá ocorrer depois daquela data.
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Assim resulta, que os juros de mora vencidos, desde a data prevista para a última prestação do contrato, até ao efectivo e integral pagamento será à taxa legal de 4% e não a taxa de 29.280% fixada em sentença.
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O Recorrente cumpre a obrigação, quando realiza a prestação a que está obrigado nos termos do artº 762º nº 1 do C. Civil e de acordo com o nº 2 do mesmo artigo as partes devem proceder de boa fé.
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Sendo responsável pelo pagamento dos juros de mora, os mesmos devem ser fixados, após o prazo previsto contratualmente para cumprimento integral das prestações por parte da Recorrente, à taxa legal como dispõe o artº 559 nº 1 do C. Civil.
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Caso contrário estaríamos perante a possibilidade de a taxa de juro, referente aos juros de mora vincendos até efectivo e integral pagamento, se venha a manter muito para além do prazo estabelecido para o pagamento das prestações da quantia mutuada, o que no entender do...
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