Acórdão nº 34706/16.8YIPRT de Court of Appeal of Porto (Portugal), 12 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA CEC
Data da Resolução12 de Julho de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo 34.706/16.8YIPRT Tribunal Judicial da Comarca do Porto Juízo local cível de Vila Nova de Gaia - J 4 Acórdão Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I. RelatórioB…, Lda., com sede em Rua …, …, …, ….-… Vila Nova de Gaia, instaurou procedimento de injunção contra C…, S.

A., com sede em Rua …, nº - …, …. - … Lisboa, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de 3.960,00 euros, acrescida de juros desde a data de vencimento de cada uma das faturas, já computados em 2.233,83 euros, até efetivo e integral pagamento. Alegou que se dedica ao transporte de doentes e sinistrados em ambulâncias e, a pedido da Ré, prestou vários serviços desse género, no valor global de 3.960,00 euros. Apesar de interpelada para o efeito, a Ré não procedeu ao pagamento das faturas.

Contestando, a Ré defendeu-se por exceção e por impugnação. Excecionou a prescrição dos juros, atento o decurso do prazo de cinco anos e ao abrigo do artigo 310º, alínea d) do Código Civil. No mais, impugnou a factualidade invocada, rejeitando qualquer responsabilidade no pagamento reclamado, com base no regime jurídico da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, a que alude o Decreto-Lei nº 101/2006, de 06 de junho, concluindo pela sua absolvição do pedido.

A Autora apresentou articulado de resposta e reconheceu assistir razão à Ré no tocante à prescrição dos juros, recalculando o seu valor em conformidade e reduzindo-o a cerca de 2.125,54 euros.

A Ré questionou o cálculo dos juros efetuado pela Autora, porquanto em seu entender se cifram em cerca de 1.743,15 euros.

Cumprida a marcha processual, realizou-se audiência de julgamento e foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, julga-se a presente ação totalmente improcedente e, em conformidade, absolvo a Ré C…, S.A. do pedido contra ela formulado pela Autora B…, Lda.”.

Inconformada, recorreu a autora, cuja alegação rematou com as subsequentes conclusões: “A. Os apelantes entendem que devem ser alteradas as respostas aos artigos 7º, 9º, 10º, 13º da contestação conforme supra descrito dando-se os mesmos como não provados, com base, além do mais, em elementos do processo, designadamente o depoimento das testemunhas, conjugado com a prova documental carreada para os autos, as regras da experiência comum e a legislação em vigor à data em que foram solicitados e realizados o transportes.

  1. Da conjugação do depoimento das testemunhas resulta claro que os transportes e respetivos doentes transportados aqui em causa não beneficiavam de qualquer comparticipação do Serviço Nacional de Saúde, pois aqueles que beneficiavam foram pagos pela ARS Norte.

  2. Da prova produzida resulta claro que a Autora não faz parte da RNCCI, pelo que o diploma legal invocado pela Ré não se aplica à Autora.

  3. Acresce que, tal diploma não prevê a comparticipação específica de despesas de transporte, mas as despesas que são comparticipadas sempre serão transferidas diretamente para as Unidades de Cuidados de Saúde, neste caso, a Ré – vide artigo 3º, nº 3 do Despacho Normativo n.º 34/2007, de 19 de Setembro e Despacho n.º 6132/2010, de 7 de Abril.

  4. Em 2009, data em que foram efetuados os transportes, no âmbito da RNCCI, não existiam protocolos de transporte.

  5. Os funcionários da Autora não tinham acesso às consultas, limitando-se a transportar os doentes aos locais dos tratamentos/consultas, a Ré era a única entidade habilitada a solicitar as eventuais credenciais através do auxiliar que acompanhava o doente.

  6. Na data em que foram requisitados e prestados os serviços em causa não existia legislação específica para o financiamento dos encargos relativo ao transporte de doentes.

  7. Em causa está um contrato de transporte, encerra uma prestação de serviço oneroso, em que o transportador tem direito a receber uma remuneração, sendo a Ré o expedidor, pelo que é responsável pelo pagamento do preço.

    1. Resultou provado o artigo 20º da contestação, no qual a Ré admite que, quanto aos transportes requisitados, agiu em representação do RNCCI ou dos seus residentes.

  8. No mandato sem representação, o mandatário, age em nome próprio, pelo que é ele quem adquire os direitos e assume as obrigações decorrentes dos atos que celebra.

  9. A Sentença recorrida violou por errada interpretação e aplicação os artigos artigo 1º, nº 2 do Decreto-Lei n.º 101/2006, de 6 de Junho e artigo 3º do Despacho Normativo n.º 34/2007, de 19 de Setembro, bem como os artigos 285º, 346º, 1154º e 1180º do Código Civil. Pelo exposto e no mais que venha a ser suprido por V. Exas., deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se a douta sentença recorrida: - Julgando-se a ação totalmente procedente por provada; - Condenando-se a Ré a pagar à Autora o valor das faturas juntas aos autos, acrescida de juros legais, contados desde 5 anos antes da instauração da ação até efetivo e integral pagamento.” Em resposta, assim concluiu a Ré: “1ª Apenas é admissível a junção de documentos com interesse para a decisão da causa e, na fase de recurso, se a sua apresentação não tiver sido possível até esse momento (cfr. artigo 130º e 442º do CPC).

    2ª O documento junto pela recorrente, sem indicação do facto que com ele se pretende provar, que refere o pedido de inscrição na plataforma SGTD, apresentado em 2016, é irrelevante para decidir dos serviços dos autos alegadamente prestados em 2009 e 2010.

    3ª Deve pois ser ordenado o desentranhamento e consequente restituição à recorrente do documento que acompanha a sua alegação (cfr. artigos 443º e 652º, nº. 1, al. e) do CPC).

    4ª Cingindo-se às conclusões da Recorrente (artigos 684. º, n.º 3, 660.º, n.º 2, e 713.º, todos do CPC), há que concluir que a douta sentença não merece as censuras que lhe dirige quanto à decisão da matéria de facto.

    5ª Resulta do depoimento das testemunhas que parte dos serviços de transporte que realizou lhe foram pagos pela ARS (D…, das 15:55:24 às 16:22:44, do início ao minuto 22:10, E…, na parte transcrita nas alegações e F…, das 16:50:49 às 17:07:24, ao minuto 10:05, gravado em suporte digital no ficheiro 20161213164924_14609866_2871623) e alguns serviços cujo pagamento a ARS recusou resultaram de erros, por as faturas indicarem doentes que nunca tinham passado pela unidade da recorrida (minuto 15:40) e serviços duplicados (minuto 9:00).

    6ª O alegado no artigo 9º da contestação resulta do Despacho Normativo nº. 34/2007, que não se refere a despesas de transporte, mas aos encargos com a prestação dos cuidados de apoio social, isto é, entre outras, às despesas de internamento, que apenas a recorrida presta, como também resulta do depoimento das testemunhas (F…, ao minuto 6:05 e seguintes): a recorrida recebia pelos serviços por si prestados, não por transporte de doentes, que devia ser diretamente pago à recorrente.

    7ª A R. discorda de ter sido dado como provado o facto alegado no artigo 10º da oposição, mas sem indicar qualquer meio probatório que o infirme, apenas pela interpretação literal e descontextualizada do artigo 3º do Despacho Normativo n.º 34/2007. Porém, 8ª O facto incluído no artigo 10º da contestação resulta provado pelo depoimento das testemunhas, unânimes a considerar que foram realizados pagamentos pela ARS, nomeadamente da testemunha F… (ao minuto 3:50).

    9ª Por último, a A. insurge-se contra a inclusão do alegado no artigo 13º da oposição entre os factos provados, como resulta do depoimento da testemunha E… ("o doente ou o familiar que o acompanha deve solicitar a credencial ao médico …" - minuto 9:00) e F… (minuto 7:00 e seguintes).

    10ª Pelo exposto, na parte impugnada pela recorrente, a douta decisão da matéria de facto nenhuma censura merece, carecendo de fundamento as críticas que a lhe dirige, pelo que é por mera cautela de patrocínio que, subsidiariamente, ao abrigo do artigo 636º, nº. 2 do CPC, sempre se dirá: doentes transportados e (pelo menos) outros da RNCCI (por exemplo D…, depoimento gravado no dia 13-12-2016, com início às 15:55:24 e termo às 16:22:44, ao minuto 1:48 e seguintes) significa que a Recorrente se limitou a transmitir os pedidos de transporte destinados aos seus residentes. Com efeito, 11ª Na douta decisão recorrida deu-se como provada “toda a matéria do requerimento inicial”. Porém, 12ª No requerimento inicial a recorrente alegou ter prestado serviços de transporte aos residentes da recorrida pelo preço total de €3.960,00 e o total das faturas, alegadamente em dívida, cuja cópia foi junta aos autos como documentos 1 a 37, é de €1.800,00. Além disso, 13ª Como resulta dos “pedidos” de transporte juntos aos autos pela recorrente (cf. documentos juntos sob os números 38 a 53), no pedido, o residente a transportar era sempre identificado.

    14ª Os residentes são pessoas dotadas de capacidade jurídica, no pleno gozo dos seus direitos; os serviços de transporte foram prestados em 2008 e 2009 e, pelo menos parte deles, foram pagos pela ARS, ponto em que o depoimento das testemunhas foi unânime (cfr. a título meramente exemplificativo os depoimentos das testemunhas da recorrente transcritos nas suas alegações). Assim, 15ª Quando, no requerimento de injunção, se escreve que os transportes foram efetuados "a pedido da requerida", pode parecer que a requerida pediu os serviços para si. Porém, 16ª A integração da recorrida na Rede Nacional de Cuidados Continuados (criada pelo DL n.º 101/2006, de 6.06, alterado pelo DL n.º 136/2015, de 28.07, doravante RNCCI) e o facto, mais que adquirido, de nenhum pagamento alguma vez ter feito, apesar da recorrente ter recebido o pagamento de transportes dos alega, deve o julgamento da matéria de facto ser alterado, dando-se apenas como provado, da matéria incluída no requerimento inicial, que a recorrente "no exercício da sua atividade prestou serviços de transporte em ambulância aos residentes da requerida no valor de €1.800,00, apenas assim se fazendo a costumada JUSTIÇA.” 17ª Resulta das regras da experiência que a recorrida nenhum interesse tinha, nem poderia ter, nos serviços de transporte. Pelo...

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